A atmosfera cosmopolita da capital do Panamá, Panamá City, surpreende até àqueles que ouviram falar um pouco além de istmo ou Canal.
Do caminho do moderno aeroporto Tocumen já é possível sentir o calor caribenho; tanto do sol brilhando, quanto da simpatia da taxista que nos levou até o bairro Bella Vista, onde optamos por nos hospedar. Enquanto todas as curiosidades sobre a cidade e o país já pululavam em nossas mentes, a janela da van nos impressionava com o misto que é o local: de um lado as ruínas da cidade velha, do outro, a nova (que é nova e antiga) com seus arranha-céus, shoppings (ah, você estará no paraíso das compras), várias etnias e lindíssimo centro histórico.
Com a economia dolarizada desde 1904, é impossível não notar a influência dos EUA na cidade. Uma voltinha de taxi e… campos com garotos jogando beisebol, casas com arquitetura tipicamente norte-americana, além dos turistas e moradores made in USA que lotam a cidade.
O Canal do Panamá, os norte-americanos e a independência do país
A presença e simpatia dos norte-americanos pelo local, talvez se deva ao famoso Canal do Panamá, uma das mais impressionantes obras de engenharia da História. A primeira tentativa de construção ocorreu em 1880, pela França. Após quatro anos de investimento e trabalho difícil a companhia francesa (que já havia construído o Canal de Suez – no Egito) faliu.
Em 1885, os EUA consideram a importância militar e econômica do local e negociam com o governo da Colômbia (o Panamá fazia parte deste país até 1903) a permissão necessária para seguir com as obras. Um tratado foi assinado pelos dois países, porém o senado colombiano não o ratificou. Aproveitando essa “lacuna” o então presidente americano Theodore Roosevelt “sugere” aos rebeldes panamenhos a revolta contra a Colômbia e garante apoio de sua marinha na causa da independência. O Panamá proclamou sua independência em 03 de novembro de 1903 e o USS Nashiville protegeu a costa panamenha de qualquer interferência colombiana. Já no fevereiro seguinte, os panamenhos permitiram aos EUA o controle da Zona do Canal.
As obras seguiram e a etapa bem sucedida contou com a fundamental ajuda de um cubano, o médico Juan Carlos Finlay. Baseado em estudos do caribenho, o cirurgião estadunidense Walter Reed demonstrou que a Febre amarela, que havia vitimado cerca de 20.000 trabalhadores franceses na primeira empreitada de construção do canal, era transmitida por um mosquito. Medidas sanitárias e a erradicação do inseto melhoraram as condições de trabalho no local e por consequência na cidade e o canal foi inaugurado em 1913.
Apesar do êxito e alguns tratados, as condições impostas à área seriam o embrião de uma permanente tensão entre os dois países. “Vamos ter um tratado muito vantajoso para os EUA, e devemos confessar, (…) não tão vantajoso para o Panamá” admite o então secretário de Estado norte-americano, John Hay ( in SCHOULTZ, Lars. (1999), Estados Unidos: Poder e Submissão. Bauru, EdUSC. ).
Até 1960 os panamenhos sequer tinham acesso às áreas próximas à Zona do Canal, muitas eram militares e tinham apenas a presença de norte-americanos.
Em 1999 os EUA passaram a administração do Canal ao Panamá. A obra é considerada uma das Sete Maravilhas do Mundo Moderno (pela Sociedade Estadunidense de Engenheiros Civis).
Turismo – Além da interessante história, você pode (e deve) visitar o Canal. O Centro de Visitantes de Miraflores (CVM) permite passeio e visualização do trânsito de barcos e apresenta também exposições e vídeos sobre o funcionamento, história e projetos do e para o Canal.
O horário de funcionamento da bilheteria é das 9h às 16:30h (ou 9 a.m a 4:30 p.m), de segunda a domingo. A entrada custa US$ 8 por pessoa (com direito às exibições de vídeo e acesso aos 3 “mirantes”) e US$ 5 (apenas acesso ao térreo). Nenhum dos ingressos serve para o passeio nos barcos, que devem ser contratados já dentro do CVM.
Mais informações no www.pancanal.com
Dica: Tente chegar antes das 13h (1 p.m) no local, pois assim você garante ao menos ver a passagem dos barcos. Além de ver e participar do simpático mico dos turistas acenando uns aos outros dos mirantes e dos barcos, você passa a entender um pouco da impressionante engenharia do sobe e desce de águas. (Sobem 100 milhões de litros de água em 8 minutos!).
Curiosidade – Um ilustre “zonian” (civil americano nascido ou habitante da Zona do Canal do Panamá enquanto esta pertencia aos EUA) é John Mcain, republicano que perdeu as eleições estadunidenses para o democrata Barak Obama, quando de seu primeiro pleito à presidência.
Casco Antiguo e Panamá Viejo
Marcas vivas da história do país estão por outras duas importantes áreas da cidade: o Casco Antiguo (Centro histórico) e Panamá Viejo (digamos, a primeira Ciudad de Panamá). Dois passeios imperdíveis.
O Casco Antiguo abriga várias praças e belíssimas e importantes construções, como o Hotel Central, que por mais de meio século foi o mais importante prédio da cidade e a Catedral e sua bucólica praça (Plaza de la Catedral) que até o início do século XX era o centro da capital.
Outras áreas que merecem destaque são a Plaza Bolívar, que surgiu do que sobrou de um incêndio ocorrido em 1756 e a Plaza de Francia, espaço com belos prédios e vista para a cidade nova. Caminhando por ali também encontrará Las Bóvedas, uma espécie de galpão que fez parte do sistema de defesa da cidade, datado do século XVIII, restaurado em 1983 e que hoje abriga oficinas culturais. Mais alguns passinhos e você chega ao Paseo Esteban Huertas, o mais conservado trecho da muralha que protegia a cidade. O mar, muitos pássaros e bougainvilles fazem daquele trecho um cenário muito especial.
Dica: O Casco Antiguo é bastante tranquilo, bem sinalizado, nos pareceu bem policiado (a recomendação é não ir para os lados do bairro Chorrillo) e as pessoas bastante solícitas com os turistas. Vale muito a pena conhecer tudo caminhando.
Não deixe de provar em hipótese nenhuma o sorvete artesanal francês da Granclément que fica na Avenida Central y Calle 3ª. A casa oferece sabores tradicionais e até exóticos como de manjericão (albahaca, em espanhol).
Curiosidade – o filme 007 (Quantum of Solace) gravou cenas no Casco Viejo e na história a área seria a de uma cidade na Bolívia. A Plaza de Francia se transformou por conta das filmagens e até um chafariz cenográfico foi montado no local.
Já Panamá Viejo nos remete a um passado um pouco mais distante, 1519 e ao que foi: ponto de partida de Francisco Pizarro rumo a “conquista” do Império Inca no Peru. Turistas de todas as partes do mundo vão ao local visitar o que restou do primeiro núcleo de povoamento urbano no Panamá e saber um pouco sobre a história desse país e por consequência um pouco da colonização da América.
As ruínas, que datam por volta de 1600, estão bem conservadas e foram reconstruídas depois de um grande terremoto ocorrido em 1621. As pedras que podemos observar são de construções simples que tinham influência principalmente do sul da Espanha e que faziam parte dos mais importantes edifícios da época, como a igreja, convento e órgãos governamentais.
Las Casas Reales, infelizmente ruínas muito pouco visíveis, chamam a atenção pelo que foram: depósito de todos os metais preciosos vindos da região andina e um dos maiores e mais importantes edifícios governamentais da América na ocasião. O Panamá era o elo de passagem entre a América do Sul e a Espanha. Segundo documentos históricos, calcula-se que entre os séculos XVI e XVII passaram pelo istmo 60% de toda prata americana.
Sem dúvida a estrutura que mais chama atenção é a da catedral (construída entre 1619 e 1626); estampada em selos e logotipos, se transformou em um dos ícones da nação. Da imponente torre é possível ter bela vista da cidade.
O sítio arqueológico de Panamá Viejo é Patrimônio Mundial (Unesco). As visitas podem ser feitas de terça a domingo, das 8:30h às 18h (8:30 a.m a 6:00 p.m). Vale visitar o museu também, que traz importantes informações para quem gosta de História.
A Panamá moderna
A capital é o centro econômico, administrativo e cultural do país. Prédios modernos, trânsito relativamente carregado e confuso, com seus coloridos ônibus “Diablos Rojos” e grandes centros comerciais impressionam. A cidade abriga grande quantidade de estrangeiros; destaque para os chineses, que têm até uma China Town e grande colônia ali.
Boa pedida é conhecer a Calle Uruguay, onde a juventude panamenha e os turistas vão badalar nos bares e discotecas.
Não deixe de ir ao La Bodeguita e deixar sua assinatura em uma das paredes de lá. O bar e restaurante estilo cubano fica na Calle Uruguay, 1-65.
Outro bar legal (e com música ao vivo em alguns dias da semana) é o Santos Café, que fica na Calle 48 y Uruguai.
Se você vem do sul, está no primeiro país da América Central banhado por águas do Pacífico e do Atlântico então porque não fazer uma visita ao Mercado de Mariscos (fica no final da Avenida Balboa com Calle 15 Este) e provar um ceviche um tanto artesanal?!
Balboa e o Panamá (e a conquista do Peru)
O nome lembra o mais famoso personagem de Sylvester Stallone, mas ele é estátua em Madri e na Cidade do Panamá; nome de rua e estação de metrô na capital espanhola; nome de avenida, de praça, de moeda e até de uma das cervejas mais populares no Panamá: Balboa. Estamos falando mais precisamente de Vasco Nuñez de Balboa, explorador e governante espanhol considerado o primeiro europeu a conhecer o Oceano Pacífico e fundar a primeira cidade em terras americanas continentais, ou seja, em terra firme.
Depois do descobrimento da América, a possessão do Oceano Pacífico é considerada o mais importante capítulo da história da Conquista Espanhola. Vencendo indígenas – alguns com diplomacia, muitos com força – e destituindo compatriotas do poder, o explorador seguiu do Caribe ao Pacífico.
Além do ouro, pérolas em abundância nas ilhas locais instigavam a cobiça espanhola e, com pequenas canoas ele mesmo chegou ao que hoje é conhecido como Arquipélago das Pérolas (Archipiélago de las Perlas), bem pertinho da capital panamenha e um dos pontos explorados pelo turismo local hoje.
Entre seus avanços por ampliar os domínios espanhóis, Balboa foi preso por Francisco Pizarro, a mando do governo local, Pedro Arias Dávila, fundador da Cidade do Panamá e seu próprio sogro. A acusação? Traição e tentativa de usurpar o poder de Dávila, além de criar um governo paralelo nas terras do Oceano Pacífico (conhecido nesse episódio da História como Mar del Sur – batizado de Oceano Pacífico por suas aparentes águas calmas somente em 1520, pelo navegador português Fernão de Magalhães, ou em espanhol, Fernando de Magallanes).
Negando as acusações, Balboa pede julgamento em La Española (atual República Dominicana – o mais antigo núcleo de povoamento europeu de ocupação contínua na América e primeira sede do governo colonial espanhol no Novo Mundo) ou na Espanha.
Não atendido, é condenado à pena de morte em 15 de janeiro de 1519 com mais quatro amigos considerados cúmplices. As cabeças decapitadas ficaram expostas por vários dias no povoado de Acla. Não se conhece o destino dos restos mortais de Balboa, pois os documentos históricos não falam sobre o que ocorreu após o cumprimento da sentença.
E foi assim que Francisco Pizarro, ao entregar Vasco Nuñez de Balboa, conseguiu o apoio de Dávila para a organização da expedição que o levaria à “conquista” do Peru. Mas essa é uma outra história…
A invasão norte-americana
O último tratado entre EUA e Panamá aconteceu em 1977, assinado pelo general Omar Torrijos, que em 1981 morre em um “suspeito” acidente aéreo. Em 1983 assume o comando militar do país, o general e colaborador da CIA, Manuel Antonio Noriega; quem em 1986 é acusado de envolvimento em operações dos cartéis colombianos de drogas e no assassinato do seu opositor, Hugo Spadafora. Ao tentar destituir Noriega, em 1988 o presidente Eric Delvalle é deposto e em 1989, o general anula a eleição vencida pelo oposicionista Guillermo Endara.
Em dezembro de 89 tropas estadunidenses invadem o Panamá para a captura do tirano. Um intenso bombardeio destruiu antigas casas de madeira (típicas no Caribe) nas proximidades do Casco Viejo. O ataque durou duas semanas e calcula-se que 3019 pessoas tenham morrido, na maioria civis das áreas mais pobres do país (os 19 eram militares dos EUA). Foi a conhecida Operação Causa Justa.
Em 03 de janeiro de 1990, Noriega é capturado pelo exército americano (algumas fontes citam que ele se entregou). Ele foi julgado em Miami e condenado a 30 anos de prisão como prisioneiro de guerra por tráfico de drogas e extorsão. No Panamá, ele já havia sido condenado à revelia pelos crimes de violação de direitos humanos e assassinato. Noriega também rendeu um filme, “Noriega – O favorito de Deus” (título original: Noriega: God’s Favorite), vale a pena para quem quer saber mais.
Onde ficar na Ciudad de Panamá
Opções de hostels e hotéis econômicos em Panamá City clicando aqui.
Como chegar
Via Colômbia
Chegamos na Cidade do Panamá através de um vôo de 40 minutos de Cartagena, Colômbia, pela Copa Airlines.
A idéia inicial da viagem era seguir por terra de São Paulo até a Guatemala, mas infelizmente não há estradas que liguem a América do Sul à América Central. A região de fronteira entre Colômbia e Panamá abriga a Selva de Darién, uma das mais perigosas florestas do mundo, não só por eventuais ações de guerrilhas, mas por ter sua natureza intocada (ainda que, algumas regiões da Província de Darién estejam ameaçadas pelo desmatamento).
Via Brasil
Quem tem planos de conhecer toda a América Central ou queira ir somente ao Panamá (o que já vale o investimento) e está sem tempo de percorrer longos trajetos em ônibus como fizemos, deve voar do Brasil direto para Cidade do Panamá.
Copa Airlines, Taca, Avianca, Aeromexico, American Airlines, Delta Airlines e United Airlines operam o destino (por exemplo, a partir de São Paulo-SP).
Importante
Circulando pela cidade – Apesar de aqueles ônibus escolares americanos adaptados super coloridos serem uma atração por si só, circular de taxi na capital panamenha é bastante econômico e o mais recomendável. Inclusive muitas vezes o taxi pode parar e pegar mais pessoas, como se fosse um coletivo. Pergunte e ou combine quanto ficará a corrida antes de entrar no veículo e não haverá problema nenhum!
Visto – Brasileiros com passaporte válido (atente para que ele não venha a expirar dentro de menos de 7 meses) não precisam de visto para entrarem no Panamá nem em outros países da América Central, exceto Belize (mais informações sobre viagens pela América Central, nas próximas edições).
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San Blás um autêntico destino mochileiro, um dos mais imperdíveis da América Central e por obter mais dicas do Panamá com outros viajantes clicando aqui!
Fotos:
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Oi Cláudia, tudo bem?
Gostei de mais do blog e ainda mais da sugestão de viajar pro Panamá.
Tenho duas dúvidas e você pode me ajudar =)
Seria aconselhável ir sozinho?
Sem contar as compras, somente serviço e passagem quanto seria um gasto médio em reais?
Obrigado!
Oi Francy! Que bom que tenha gostado da matéria. Nós estivemos por aí e também adoramos. Ah e além da visita, pesquisamos sobre antes da publicação :).
Deve ser uma escolha difícil pra você!
Abraço!
ADOREIO A SUA MATERIA SOBRE PANAMA.. SABE TUDO VOCE HEM.. EU ESTOU VIVENDO EM PANAMA JA TEM 02 ANOS, E DEVO VOLTAR PARA FORTALEZA EM AGOSTO SE DEUS QUISER, MAIS ME SINTO TAO DIVIDA, ADORO PANAMA, E MUITO GLAMOR POR AQUI.