Por Nathalia Marques*
Às 22 horas de um dia qualquer, duas amigas decidem que querem cair no mundo. Com poucos recursos, a única maneira, viável, seria pedir carona. Sem nada organizado, às 6 horas da manhã, do outro dia, elas pegaram suas mochilas, foram para uma estrada e pediram carona de São Paulo para Arraial do Cabo, seguido de Búzios e Cabo Frio.
Parece história de filme, né? Mas é real e foi exatamente o que Francesca Antoniella Borsanelli, estudante de Biologia, de 26 anos, fez pela primeira vez. Frio na barriga? Medo? “Sim, eu senti bastante medo. Sinceramente, quando saí de casa, pensei que não sabia se voltaria viva ou dentro de um caixão”, comenta a mochileira.
Mas, o medo não foi o suficiente para impedir Francesca de seguir sua vontade e como ela há diversas mulheres que fazem o mesmo. Loucas? Descuidadas? Super corajosas? Bom, é preciso ter cautela antes de usar estereótipos. É certo que no imaginário coletivo, da sociedade em que vivemos, mulher viajando sozinha já é algo anormal. Pedindo carona, então, é um grande tabu. No entanto, é necessário desmistificar essas ideias.
Assim como homens que viajam de carona, essas mulheres são apenas viajantes exercendo seu direito de ir e vir. Que a jornada é mais insegura isso é fato. Francesca explica que as mulheres viajantes correm mais ricos do que os homens. “Principalmente pela possibilidade de ser estuprada ou assediada”, enfatiza.
No entanto, muitas mochileiras comentam que a possibilidade de acontecer algo é menor do que se imagina e dizem isso por experiência própria. Vale ressaltar que de acordo com pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), 67% dos casos de violência contra as mulheres no Brasil são cometidos por parentes próximos ou conhecidos das famílias.
Ao ser questionada sobre indicar esse modo de viajar para outras mulheres, Francesca não reluta em dizer que sim. “Eu indico sim, pois nos 11 dias que viajei dessa maneira não me aconteceu nada. Também indico porque para algumas pessoas viajar de carona é o único modo possível de viajar. Digo isso, principalmente, pela questão financeira. Ou a pessoa viaja assim ou ela nunca viaja. Além disso, acho uma experiência bastante desafiadora e isso mexe com o nosso íntimo”, comenta.
Os perigosos e as vantagens que as mulheres enfrentam viajando de carona
Mesmo indicando as mulheres viajarem de carona, a mochileira não deixa de ressaltar que é preciso tomar cuidados, pois existe, sim, riscos. “Sugiro que elas tenham cuidado, que busquem viajar em carros que tenham outras mulheres ou crianças, pois o risco é menor e que estejam sempre monitorando o trajeto que a pessoa está fazendo pelo GPS do celular”, aconselha.
Apesar dessas questões de segurança, mulher viajando de carona também tem suas vantagens. Isso porque elas têm mais facilidade de conseguir carona do que os homens. “É rapidinho. 30 minutos, no máximo, você já consegue. Têm homens que ficam horas e horas e horas tentando até conseguir. Isso acontece porque as pessoas também têm medo de dar carona para homens e serem assaltadas”, diz.
Bom, entre vantagens e desvantagens, para muitas mulheres pedir carona é a única maneira de conseguir viajar por esse mundão. Loucas? Descuidadas? Que nada! São mulheres comuns que decidem fazer o que querem, que colocam em prático seu direito de ir e vir, mas que para isso enfrentam o medo, a insegurança e julgamento externo.
Nota: Esta matéria foi publicada originalmente no M pelo Mundo e no ano passado foi indicada ao Prêmio Passaporte Aberto, da Organização Mundial de Jornalistas de Turismo.
*Nathalia Marques é editora do M pelo Mundo, site de informações e dicas de viagem para mulheres.