Membros leonseleme Postado Fevereiro 10, 2011 Membros Postado Fevereiro 10, 2011 Atrasado em mais ou menos uns 30 dias, começo a escrever o que ficou dos tempos passados no México e América Central. O ideal é que comecemos a registrar informações e sensações simultaneamente às nossas viagens, pois assim não se perdem detalhes importantes. Em compensação, esperar um tempo para tal iniciativa é nos permitir uma reflexão mais aprofundada do que se passou. Enfim, vou ao que interessa! 12 DE JANEIRO - CANCÚN Primeira vista de Cancún. Chegávamos, meus pais, meu irmão e eu, após escalas, variações de pressão e lanches precários, a jovem, porém suntuosa Cancún. Fundada em 1975, em poucas décadas a cidade se fixou como o maior destino turístico de estadunidenses fora de seu país. Fora da realidade de todos os lugares que teríamos pela frente, Cancún proporciona um turismo caro e fácil, onde todos os passos do visitante são determinados pelos vários pacotes oferecidos. No aeroporto, existem três alternativas para se chegar à Zona Hoteleira, que são os 22 quilômetros de praia localizados na Isla Cancún: uma são os táxis, alternativa mais cara que custa em torno de 600 pesos; outra são os coletivos, vans que podem levar grupos maiores, que para nós quatro saiu a 400 pesos; por último, ainda seria possível pegar um ônibus de linha regular até o centro, e de lá pegar outro até a zona hoteleira. Se eu estivesse sozinho, escolheria tranquilamente a última opção, pois os ônibus de linha em cancún são muito seguros. Levamos algo em torno de 20 minutos até o Q BAY, hotel localizado no Km 3 da avenida Kukulkan. Bem mais simples que os hotéis que vão do Km 9 ao 18 da mesma avenida e também bem mais acessível financeiramente, não precisávamos de nada além para podermos dormir em Cancún. Como nosso vôo chegou próximo do meio dia, depois de toda essa maratona inicial estávamos prontos para comer algo apenas no fim da tarde, quando resolvemos ir ao centro no mercado 28. Nada comparado ao que esperávamos, e com a típica bajulação de vendedores querendo nos empurrar seus produtos, conseguimos achar um restaurante. Nada de excepcional nos foi servido, e não recomendo gasto de esforços para tal programa. Cancún, definitivamente, foi idealizada para que os hóspedes ultrapassem os limites do hotel apenas para passeios empacotados, como à tradicional Isla Mujeres, às ruínas de Chichén Itza, à Isla Cozumel, entre outras atrações. A cidade, em si, oferece caríssimos resorts e seus confortos, e noitadas internacionais, onde se encontram mais turistas do que locais. Após a refeição, voltamos ao hotel e por problemas de fuso, apagamos com as galinhas. 13 DE JANEIRO - CANCÚN Acordei mais cedo que os demais para dar uma já planejada corrida. Ao sair do Q BAY na direção de aumento da quilometragem, em poucos minutos atravessei uma ponte, na região do Embarcadero, e descobri que o nosso hotel ainda se localizava no continente. A partir do Km 4 que realmente começa a Isla Cancún. No caminho, passei por um grande campo de golfe (claro!), pelo recém costruído hotel RIU que, com sua aparência clássica, surpreende qualquer turista ao descobrir que ele possui menos de uma década, até atingir o chamado centro da região hoteleira. Lá se encontram as boites mais badaladas, restaurantes diversos e uma das franquias do Hard Rock Café. Meu irmão, Ícaro, e o contraste. O velho novo hotel RIU. Ao voltar desse misto de exercício físico e passeio, tomamos o tradicional café continental e fomos de ônibus até o Km 18, onde se encontra o sítio arqueológico Maya EL REY. Com uma área bem pequena e pouquíssimas construções, esse contato já foi suficiente para meu irmão e eu termos uma iniciação nessa vasta cultura. Seus pequenos templos e bases sólidas para casas já mostravam o grande desenvolvimento tecnológico dessa civilização. Além disso, de lá pode-se ver claramente o contraste entre esse mundo perdido dos Mayas e a atual Cancún, ao termos ao fundo das ruínas vários hotéis ao longo da costa disputando o mercado paradisíaco de Cancún. A praia, nessa altura da Kukulkan, é bem mais transparente e tem mais ondas comparada ao Km 3, pois está voltada ao mar aberto. Caminhamos um pouco pela areia, tomamos uma chuva e fomos almoçar no centro da zona hoteleira. Lá agendamos o nosso passeio para Chichén Itzá por 40 dólares por pessoa, com almoço incluído, entradas para o cenote nos arredores de Valladolid e para a própria ruína. Depois do almoço, minha mãe e meu irmão foram de volta ao hotel, e meu pai e eu fomos tentar resolver a questão do visto para Belize, que apenas brasileiros, argentinos, e alguns outros países sul-americanos precisam ter. O consulado em Cancún, segundo um funcionário do prédio que procurávamos, "desapareceu sem dar notícias" havia uns 5 anos. Apesar do insucesso, conseguimos descobrir a companhia que fazia o transporte até Tulum (ADO, a empresa que quase tem o monopólio dos transportes intermunicipais na região), nosso próximo destino mais ao sul de Yucatán, e os vários horários disponíveis ao longo do dia. Voltamos para hotel, compramos umas cervejas nacionais, uns petiscos e curtimos o final do dia no Q BAY (curiosidade: Q, em espanhol, se pronuncia CU, o que dificultou minha vida a todos os momentos em que me referia ao hotel). A noite, após sonos e banhos, nos reservou uma pizza. Nada de especial, apenas Dominoes. Saímos de estômago repleto, comemos uns doces e nossos pais nos deixaram lvres para uma típica noitada em Cancún. Tomamos, inicialmente, caríssimas cervejas no Hard Rock Café ao som de uma banda cover de tudo, e um pouco mais. Os caras seguraram bem a platéia de ingleses, americanos, australianos com seus duelos de guitarra. Saímos já prontos para ir para casa, mas passamos por uma boite que atendia a nossa verba e acabamos sendo realmente engolidos por Cancún, cubas libres, tequilas e outras cositas más. O resultado foi que somente tarde da noite estávamos em nossos quartos e no dia seguinte, às 7h15, estaríamos saindo para Chichén Itzá. 14 DE JANEIRO - CANCÚN Ressacas a parte, conseguimos nos levantar, tomar o continental e pegar o ônibus que nos levaria até a agência. Após os pagamentos que faltavam, entramos em um ônibus diferente e seguimos viagem. Dormi durante a primeira hora e a cada despertar notava algo estranho no guia que não parava de falar. Quando retomei minha consciência, percebi que o estranhamento vinha do fato de ele falar, simultaneamente, espanhol e inglês. Era um show a parte do passeio, pois tínhamos um comediante bilíngue. Uma de suas falas marcantes, pronunciadas por nós durante o resto da viagem, era: "deixa-me decirles algo, let me tell you something......". Antes do almoço, visitamos o cenote e lá todos, menos minha mãe, tomamos um belo banho no lago. Apesar de estar lotado de turistas, não deixou de ser bastante agradável. Voltamos ao ônibus, e seguimos para Valladolid. Lá nada mais que fizemos do que dar, de ônibus, duas voltas na praça central. Ficamos com um gostinho na boca, pois até então não tínhamos visto nenhum traço da colonização espanhola em terras mexicanas. Cenote. centro de Valladolid. Na saída de Valladolid, paramos em uma cooperativa de artesãos onde havia uma série de artesanatos relativos aos atrativos e riquezas da região, como uma pedra vulcânica polida que é boa para se massagear a mão pois por ter a propriedade de esquentar rapidamente com o manuseio. A ideia é que os turistas, ali, comprem suas lembranças enquanto não vaga uma mesa no restaurante no lado de fora. A comida servida era de ótima qualidade, com traços marcantes da culinária mexicana, como tortillas e frango adocicado. Quando “listos”, todos voltamos ao ônibus para os últimos 30 minutos antes de Chichén Itzá. cooperativa de artesãos, perto de Valladolid. Nosso bilíngue. A vegetação nessa região é curiosamente monótona. Pela falta de variação no relevo e pela constância nas espécies arbóreas, as planícies por onde passamos eram cobertas por uma vegetação que lembrava o chaco paraguaio, em uma fronteira entre vegetações semi-áridas e tropicais. Finalmente chegamos às ruínas, e a partir de então a estratégia seria dividir-nos em grupos de melhor compreensão do inglês e de melhor compreensão do espanhol. Optamos pelo espanhol, principalmente para variarmos de guia, pois o bilíngue que seguiria com o grupo do inglês. Nas primeiras duas horas, demos cada passo com explicações minuciosas sobre cada antigo templo, do estádio do “Jogo Maya” (o maior do mundo maya), dos observatórios, entre outros. Fiquei realmente incrédulo visto o tamanho conhecimento desse povo, que possui marcas em nosso continente de mais de 2 mil anos. Como apreciavam muito a astrologia e dependiam dos ciclos do sol e da lua para suas tarefas do dia a dia, muitos de seus templos foram concebidos orientados para o nascer ou pôr-do-sol, ou ainda de forma que criassem um efeito particular em uma data importante, como os sete triângulos que são projetados em uma face do templo principal de Chichén Itzá. Depois de andanças em grupo, passando por trilhas com incontáveis barraquinhas de artesanatos ou ambulantes usando de todas as artimanhas para nos convencer a levar seus baratíssimos produtos, tivemos 1 hora de liberdade para simplesmente andarmos sem rumo. Basicamente, fomos até um cenote em um dos extremos do parque e aproveitamos um pouco mais o gramado central. Às 5 horas, começam a nos convidar a sairmos do parque, com apitos estridentes e gritos esgoelantes. Nada a reclamarmos quanto a isso, no entanto. Fomos, felizes e realizados. Sempre vemos essas ruínas em revistas, documentários, mas nada substituirá o estar presente nesses lugares, para se ter estímulos além dos visuais. Observatório em Chichén Itzá. Garoto "Maya" e suas artesanias. O caminho de volta foi bem cansativo, sem aquela expectativa pelo novo, apenas voltaríamos ao hotel e dormiríamos, mas para piorar pegamos um acidente na estrada e ficamos parados por uma meia hora. Nada, porém, quebrou o brilho do dia, e chegamos ao Q BAY com o dia mais que ganho. Ao final do trajeto, foi feito o tradicional pedido de “propina” (gorjeta). Obviamente que nesse caso a requisição foi feita de forma simpática, mas em todos os serviços que usávamos eram pedidos ou quase ordenadas as propinas. Uma série de trabalhadores praticamente vive em função desse adicional no México. 15 DE JANEIRO – CANCÚN / CHETUMAL O dia da Mãe. Não aquele comemorado no segundo Domingo de Maio, mas o dia que minha mãe nasceu, o que não podemos esquecer jamais! Pois então, estávamos prontos para correr, meu pai e eu, mas a dona do dia resolveu adiantar em algumas horas a ida a Tulum. Não tínhamos poder de veto para tal moção, e fizemos de tudo para chegarmos a rodoviária o mais rápido possível. Continental, malas, táxi, e um pouco antes das 10 estávamos pegando o ônibus, que em pouco mais de 2 horas nos levou até Tulum. Não fazíamos ideia de onde ficar, mas bastou a pergunta certa à pessoa certa para encontrar o hostel “Casa del Sol”, que cobrava 10 dólares por cabeça para ficarmos em duas cabaninhas com teto de palha. Os donos do hostel , Albertito e sua esposa Laura, são muito simpáticos, alugam bicicletas, e ainda preparam peixes para os hóspedes que desejarem. Sem tardarmos muito em nossa nova hospedagem, pegamos umas Bicicletas e fomos para as ruínas ao mar de Tulum. Como nos foi explicado em Chichén Itzá, o período de existência dos Mayas é dividido em Pré-Clássico, Clássico e Pós-Clássico. Chichén Itzá, por exemplo, surgiu já no fim do período pré-clássico. Já as ruínas de Tulum representam o fim da era dos Mayas, que só foram migrar para o litoral nos últimos anos de sua existência (período pós-clássico), onde viveram até a chegada dos espanhóis. De Bike, rumo às ruínas de Tulum. Bem menos majestoso que Chichén, as ruínas de Tulum reservam características únicas, como construções que indicassem a maneira de se entrar e atracar na praia da antiga cidade. Como todo esse litoral de Yucatán é protegido pelo 2o maior arrecife do mundo, o Gran Arrecife Maya, é extremamente necessário se conhecer o litoral para sair e entrar nas praias de barcos. Além dessa peculiaridade, a vegetação e a presença do mar, seus sons e cores, dão um toque diferenciado nesses sítios arqueológicos do pós-clássico. Andamos por toda a área, nadamos na praia de águas normas do Caribe, e ao final da tarde, voltávamos para o hostel com todas as compras para fazer um belo jantar. Peito de frango ao creme de leite e champignon, arroz com legumes, e tomates frescos. Excepcional! Ainda, para fechar a noite, tomamos um cappuccino acima das expectativas ao som de reggaes. O sol ainda não tinha marcado presença na viagem, mas nem isso afetou nosso astral. ruínas de Tulum. 16 DE JANEIRO – TULUM / CHETUMAL Havíamos comprado passagens para Chetumal, capital de Yucatán e fronteiriça com Belize, para às 13h00, então resolvemos ir de bicicleta até outras praias nos arredores. O centro de Tulum fica a uns 6 quilômetros do litoral, então percorremos essa distância para chegarmos à praia mais próxima. O trajeto margeava a floresta que separa Tulum do mar, e recém construíram uma ciclovia ligando os dois. Infelizmente, já se notava a construção de um condomínio ”verde”, que devastou boa parte dessa mata. Não tínhamos muito tempo, e logo voltamos para a cidade, pegamos nossas malas e seguimos para um restaurante perto da rodoviária onde fizemos uma horinha até o ônibus chegar. praia pública em Tulum. Quatro horas de viagem, cruzando cidades mais simples, quando pudemos ver um pouco do verdadeiro México. Até então, estávamos presos aos laços turísticos da região e, um pouco antes de deixarmos o país, conhecíamos, ao menos visualmente, alguns traços culturais da atual população mexicana. Los Jaguares. Comilanças. Chegamos junto ao entardecer, reservamos nossas passagens para Flores, Guatemala, na companhia San Juan, e já nos instalamos no hotel ao lado da rodoviária. Banhos, trechos do Último filme do Rocky Balboa, com todos os ensinamentos morais do próprio lutador, e fomos em busca de comida sustanciosa. A cidade, relativamente grande, já não entra no espectro do turismo do estado, e o que vimos na noite desse Domingo eram os locais desfrutando dos atrativos da cidade. Demoramos a achar um restaurante que atendesse aos nossos desejos, algo próximo de um legítimo churrasco. Nos contentamos com um bife na chapa, acompanhado de salada, guacamole, arroz e feijão. Tomamos, aí, a última León da viagem (cerveja escura deliciosa), e fomos dormir exaustos. 17 DE JANEIRO – CHETUMAL / FLORES O ônibus sairia cedo na manhã seguinte, às 7h15. O que nossos pais haviam nos alertado quanto ao sistema de transporte nos países mais ao sul foi confirmado. Ao invés de um ônibus convencional, faríamos o trajeto de um dia nos famosos chicken buses, aqueles em que se colocam as bagagens nos bagageiros acima do teto do ônibus. Nem todos os assentos tinham encostos que cobriam todas as costas, sendo uns do tipo dobráveis que davam ao passageiro pouco espaço para suas pernas. Concluindo, muito dos turistas que vinham apenas de terras mexicanas eram pegos de surpresa, uns reagindo com risos, outros com feições de descontentamento. Mas do que podemos reclamar, afinal foram nossos ancestrais europeus e recentemente ondas imperialistas que deixaram todos esses países da América Central com condições precárias de transporte, educação e saúde. Digo América Central, pois essa companhia San Juan é Guatemalteca. Apesar de tudo, seguimos caminho e em menos de uma hora atravessávamos a fronteira do México com Belize. Na saída do méxico, a primeira facada. Se não me engano, são 10 dólares por pessoa de taxa para sair do país. Tudo bem, todos os países cobram uma taxa como essa, uns na entrada do país, outros na saída. No outro lado da ponte, nos esperava o que já imaginávamos. Brasileiros, assim como alguns outros países na América do Sul (Argentina, Colômbia, entre outros), por alguma questão diplomática, precisam de visto para entrar em Belize. A nossa esperança era a de que eles nos dariam um carimbo de 24 horas para atravessarmos o pais, porém mesmo para isso eles nos cobraram 40 dólares por cabeça. Nos poupamos, sim, de todo o processo de retirada do visto, mas mesmo assim foi uma facada no bolso de mochileiros. Fronteira do México com Belize. Pouco vi de Belize, pois dormi em uma parte do caminho e o país também é extremamente pequeno. Belize City, antiga capital do país, possui boa parte de suas casas em madeira, muitas delas sobre palafitas. A população de Belize é predominantemente negra, e lá fala-se o inglês crioulo. Alguns dos que estavam no ônibus ficaram no porto que os levariam às ilhas caribenhas, conhecidas por belos pontos de mergulho. Compramos uns petiscos no supermercado, pois ainda não havíamos tomado café, e seguimos viagem. Nessas últimas, e ao mesmo tempo primeiras horas em Belize, começamos a ver uma variação no relevo. Desde a chegada no México, essa foi a primeira vez que víamos colinas, e a paisagem como um todo já começava a variar. Não demorou mais do que duas horas para chegarmos a fronteira, e para nosso completo desmérito quanto a pequena Belize, mais 15 dólares cada um de nós teve que pagar. Imagino que boa parte do PIB do país seja dessas taxas absurdas que eles cobram dos turistas. Belize City. Mudando de ares, na Guatemala pagamos o equivalente a 3 dólares para entrarmos no país e notei de cara um leve aumento da precariedade da estrada, mas nada muito diferente algumas pequenas estradas brasileiras. Seguimos mais algumas horas, deixando uns franceses na encruzilhada que leva a Tikal, onde havia uma pequena vila, e seguimos daí mais uns 40 minutos até Flores. Chegamos inicialmente em um centro comercial, único lugar onde havia Caixa ATM, e depois nos deixaram já dentro da ilha em um local onde havia uma série de hotéis baratos. Nos impressionamos, positivamente, de cara com a cidade. Nos últimos anos, ela vem passando por um processo de urbanização bem interessante, com novas ruas, calçadas, píeres, nada que ferisse o charme natural da cidadezinha. Nota-se que no ramo turístico existe um misto de locais com estrangeiros, que vieram e nunca deixaram flores. Graças a esse fenômeno ficamos em um ótimo hotel de um casal local, e comemos boa parte de nossas refeições em um restaurante japonês chamado SUICA, considerado por nós o melhor restaurante da viagem! Antes de lá jantarmos, demos uns mergulhos no lago, e já notamos que aos finais de tarde os píeres ficam cheios de turistas branquelos, o que é uma certa atração para os locais. Depois do jantar, não tardamos a dormir, apenas fomos até praça no ponto mais alto da cidade onde fica a igreja, em uma caminhada de reconhecimento. Fronteira de Belize com a Guatemala. O pier das tardes em Flores. 18 DE JANEIRO – FLORES Esse dia, fora dos planos, acabou vindo a calhar. Cansados de chegar, visitar e partir, resolvemos nos dar um dia de descanso, e Flores, com seu astral leve de um eterno Domingo, parecia o lugar perfeito para tal iniciativa. Como de praxe, acordei cedo e fui correr, buscando explorar terras além da ilha. Os benefícios do turismo não avançaram os perímetros da ilha, e nas cidades ao redor de flores se vê muito lixo nas ruas, esgotos a céu aberto, e ruas bem mais movimentadas e infestadas de tuc-tucs fumacentos. É uma pena tal contraste, mas ao menos o exemplo de flores esta do lado e com o tempo, talvez, as redondezas também usufruirão dos benefícios do turismo. Ao voltar, encontrei meus familiares já tomando café da manhã. Minha mãe comprou umas iguarias locais, suco, e fizeram um café no hotel. Nada mal. Tínhamos combinado, meu irmão e eu, de atravessarmos o lago nadando, mas a preguiça da minha parte, na manhã, foi forte e tivemos que adiar para mais tarde. Antes do almoço, meu pai e eu fomos comprar uns ingredientes para sandubas do dia seguinte, quando iríamos a Tikal, no supermercado e sacar um dinheiro, tudo isso naquele mesmo centro comercial da chegada em Flores. Voltamos cheios de fome e para a nossa casa japonesa na Guatemala fomos comer arroz frito com frango, um prato com curry e sushi de cani. Delicioso! Siestas e tal, no final da tarde não fugi do ringue e atravessei o lago com o Ícaro. A ida já foi levemente sacrificante. Dei uma explorada nessa margem, que não era uma ilha, mas os acessos eram meio difíceis. Voltamos, por incrível que pareça, nadando e chegamos esgotados, mas com pinta de nadadores, pois lá estavam os branquelos dos finais de tarde nos píeres de Flores. No hotel em Flores. Tínhamos passado mais cedo por um hostel bem AMIGÁVEL, chamado “Los Amigos”, onde resolvemos comer algo de noite, pois além do bom ambiente teríamos o wireless tão cobiçado por viajantes em geral. Depois de brownies para uns, saladas para outros, e sucos, Seleme e Cláudia foram se deitar, e eu, depois do vício cibernético, fui me juntar ao Ícaro e umas Belgas bastante interessantes. Adoro a Bélgica, pois lá se encontra o melhor de duas coisas que valorizo muito: chocolate e cerveja. Não ficamos papeando por muito tempo, pois elas iriam encarar o programa radical de pegar o ônibus das 4h30 para Tikal, o que possibilita a vista do sol nascente. Fomos, os dois, de volta ao hotel, curtindo a lua cheia, e capotamos em seguida. Suica, o Japão em grande estilo na ilha de Flores. A travessia. 19 DE JANEIRO – FLORES / RIO DULCE Não optamos pelo radical das 4h30, mas às 6h00 passaria nosso ônibus, da mesma companhia San Juan. Uma hora e meia de viagem até Tikal, sendo os últimos 20 minutos já dentro do parque nacional. A mata, por essas bandas, já era bem densa comparada com Yucatán, mas a região de floresta mais tropical na Guatemala é a próxima de Cobán, onde se encontra a bela cachoeira de Semuc-Champey. Chegamos, finalmente, no estacionamento, onde se inicia um trilha que dá acesso a várias partes do sítio arqueológico. Para pequeno esclarecimento da importância e dimensão de Tikal, a cidade, a exemplo de Chichén Itzá, surgiu ao final do período pré-clássico e clássico, sendo abandonada muito antes da chegada dos espanhóis por um problema de falta de água. Nota-se, claramente, que dentro do parque não se encontra nenhum rio. No seu auge, Tikal chegou a ter algo entre 100 e 150 mil habitantes, de acordo com historiadores, maior cidade do período Maya. Já havíamos decidido em fazer o passeio sem guia. Não por economia, mas como meus pais já conheciam Tikal, eles nos alertaram da grande quantidade de coisas para se ver e da restrição dos circuitos turísticos. Começamos pela Gran Plaza, onde ficam os templos do sol nascente e poente, e as acrópolis sul e norte. São 6 os principais templos, sendo 3 deles aptos a subidas. O mais surpreendente é o Templo 4, provavelmente o maior do mundo maia. Dele podemos ver a ponta de vários outros templos, e toda a mata cobrindo o resto e se esticando até o horizonte. Percebe-se, então, que Tikal está no topo de uma colina. Conhecemos, posteriormente, o templo 5, o Mundo Perdido, onde se encontra o Templo mais antigo da cidade, e o “Palacio de las Acalanaduras”, nas cercanias da cidade. Nesses caminho quase fomos bombardeados pelos macacos acinzentados, que tradicionalmente tentam defecar na cabeça dos turistas.Os sanduíches, que já haviam sido parcialmente comidos no Mundo Perdido, foram liquidados quando voltamos à Gran Plaza. Poderíamos ir até o Templo 6, mas o sol escaldante, que desde Flores não mais nos abandonou, nos fez lembrar da refrescante lagoa em Flores, e resolvemos voltar nos ônibus das 12h30. Além da lagoa a nossa espera, tínhamos que providenciar nossa ida a Rio Dulce ainda naquela tarde. O templo II e a Seiba. Vista das escadarias auxiliares do templo V. Gramados amplos e a a Acrópoles sul. Foi tudo em um “perfect timing”, pois chegamos em Flores, demos uns mergulhos, arrumados as últimas coisas, pegamos um táxi e quando chegamos na rodoviária o ônibus já estava saindo do terminal. Se fossem companhias de ônibus brasileiras, não teríamos tido chance, mas bastou um sinal do motorista do táxi para que um garoto já estivesse pegando nossas malas no porta-malas e passando-as ao ônibus. Foi questão de dois minutos para já estarmos partindo rumo a Rio Dulce. Uma estrada mais sinuosa foi a que pegamos nesse trajeto, mas em bom estado de conservação, diferentemente do nosso ônibus, que uma em cada 3 cadeiras não reclinava e seu aspecto parecia de um ônibus que havia passado pela Faixa de Gaza, mas o motor funcionava perfeitamente. Chegamos a conclusão que na falta de recursos valoriza-se a reforma da máquina, sabiamente, pois antes um ônibus aparentemente destruído, mas andando do que o contrário. Indo de Flores a Rio Dulce. Chegamos em Rio Dulce somente no cair da noite, pois no caminho tivemos que recolher um carregamento de cocos, e deixar e pegar pessoas infinitas vezes. Um holandês ao nosso lado estava indignado com o sistema de transporte na Guatemala, mas me surpreende o fato dessas pessoas simplesmente não se perguntarem o porquê dessa realidade. Ao descermos na cidade, o famoso assédio a turistas com ofertas de hotéis já me pesou nas costas, pois já tínhamos algo reservado. Surpreendentemente, nessa ocasião nos rendemos a uma dessas ofertas, pois tínhamos a dica de que o hotel Casaperico seria muito bom caso conseguíssemos embarcação até lá, e um desses senhores nos disse que seria possível. Fomos, então, depois de comprarmos frutas e cositas para o café da manhã. Mais uma bela coincidência, o que ocorre com maior facilidade quando se tem informações. Por isso, digo que sempre vale a pena sempre se informar antecipadamente sobre bons lugares para hospedagem. Para completar o dia de sortes, o desejo de minha mãe para comer pizza foi completamente atendido, pois justo aquela quarta-feira em que estávamos era o dia de rodízio de Pizzas no Casaperico. Nos deliciamos, usamos o incansável wireless, que em todo lugar está, e fomos dormir contentes depois de um dos dias mais cheios da viagem. 20 DE JANEIRO – RIO DULCE Tinhamos já programado no dia anterior o passeio para Livingston, cidade litoral do Caribenho com um população considerável de afrodescendentes. Saímos um pouco antes das 9 horas e em Rio Dulce um outro grupo se juntou a nós. O barco chamado público que usávamos tinha dois passeios possíveis: um direto, que demora pouco mais do que uma hora para chegar, e o que escolhemos, que ao longo do caminho faz algumas paradas atrativas. O primeiro ponto de interesse ficava um pouco acima do Rio Dulce, exatamente em seu início. Este nasce no Lago de Izabal, e leva suas águas por um curto trecho até a desembocadura em Livingston. Nesse marco do início do rio, fica o Castillo San Felipe construído nas primeiras décadas de ocupação espanhola na região. A partir daí , descíamos o rio rumo a Livingston, e as duas paradas seguintes se deram em ilhas com população considerável de garças. Suas pernas longas, bicos finos e delicados, e as disputas por melhores lugares ao sol deixaram os turistas estasiados. Garças no Rio Dulce. Rio Dulce. O passeio, apesar de apresentar belezas que podem ser encontradas no Brasil, não deixaram de nos encantar. Afinal, não é só com a natureza silvestre que estávamos em contato, mas vimos pessoas, misturas de culturas personificadas de forma não ocorrida no nosso país. O ponto seguinte foi um dos mais preciosos. O barco, inesperadamente, foi se aproximando do bordo direito do rio, em uma áreas coberta por plantas que lembram nossas Vitórias-Régia. Primeiro sozinhos, logo fomos cercados por vários barcos, chamados de Jacuzz, com crianças cheias de artesanias e desejos de poderem vender o quanto mais for possível. O coro de suplicações se iniciou e poucos foram os que não se contagiaram pela cena. Não resisti e comprei uma pulseira. Segundo minha mãe, essa cena a fez se imaginar na Tailandia, ou no Laos, pois os nativos americanos possuem traços asiáticos e as construções e meios de transporte hidroviários lembram muito os dos povos do Sudeste asiático. Antes de Livingston, só paramos em mais um atrativo, uma nascente de águas termais na margem esquerda no rio. Lá paramos por uns dez minutos, entramos na piscina onde a água brota e percebemos que só no espelho d'água que ela se encontra quente, estando o resto fresco como o rio. Desse ponto em diante, o rio se afunilava e entravamos em um curto trecho de cânion, cheio de pássaros fazendo malabarismo diversos. Logo adiante, já se via a foz do rio Dulce e o horizonte se perdendo no mar. Cláudia e o rio Dulce. Artesanias pelos nativos. Chegávamos em Livingston e então seguimos rumo a praia. Nesse caminho, já se via claramente a composição cultural da cidade, partes negras, nativas e espanholas. O astral já era outro, e nos sentíamos de volta a Belize. A praia não era bem cuidada ;se viam garravas e ramos de esgoto se misturando as águas claras do mar. Mas existe uma razão para isso: esse roteiro, Rio Dulce - Livingston, a pouco se tornou turístico e provavelmente ainda não vieram a conscientização que acompanha o crescimento do turismo. Conhecemos uns garotos locais que jogavam no time da cidade, e, lógico, conheciam Robinho, Kaka, Ronaldinho, e companhia. Foram realmente bem receptivos conosco na cidade, e apesar da falta de praias belíssimas, construções bem conservadas, o povo nos foi o atrativo. Não ficamos por muito. Logo deveríamos voltar, e aos poucos fomos fazendo o caminho de volta até o ponto de embarque. A volta, direta, demorou exatos 60 minutos, e ainda me deu tempo de pegar um caiaque e ver o pôr-do-sol no meio do rio Dulce. Saída de escola em Livingston. peixes secando na praia. Os "media-cancha" de Livingston. A noite, ao jantar, conhecemos uma garota australiana, Sacha, e com ela ficamos conversando até tarde. Fui, antes que o Ícaro, dormir, depois de algumas partidas de xadrez. 21 DE JANEIRO – RIO DULCE / ANTÍGUA Às 8 da manhã, saía o ônibus rumo a Ciudad de Guatemala. Pegamos, um pouco antes, um barco até Rio Dulce. A viagem nos proporcionou belas vistas, subimos bastante até chegar a capital, mas uma coisa me feriu como estudante de Engenharia Ambiental. Boa parte do percurso acompanhamos o rio Motagua, e este se encontra em avançado estado de assoreamento. Já em Antígua, descobri que a mineração de Jade nas áreas próximas a bacia que provocam esse efeito, o que é extremamente preocupante para a população que depende do rio e para a vida que necessita do seu natural modo de cursar. Hotel Casa Perico (periquito). Um pouco depois do meio-dia, chegávamos na Ciudad de Guatemala, onde pegaríamos a conexão até Antígua. Turisticamente falando, a cidade tem muito a oferecer, principalmente os principais museus do país, pois as construções coloniais foram muito afetadas por consecutivos terremotos e poucas ainda se encontram. A grande questão é que como uma cidade de milhões de habitantes, ela traz todos os problemas de grandes metrópoles, que muitas vezes são retiradas dos circuitos turísticos mesmo tendo o que oferecer. Para não dizer que pulamos a cidade, passamos pela praça onde se localiza o antigo palácio nacional, que atualmente é um museu de arte, e a Igreja Matriz. Solo, nada más. Seguimos por mais uma hora e pouco até Antigua Guatemala que, como o nome diz, foi a antiga capital do país, mas em função dos terremotos ocorreu a mudança que gerou a atual configuração política. A história mostra que várias cidades da América Central mudaram de localidade, em função de tremores incessantes, buscando terras mais calmas. Ciudad de Guatemala. Ficamos, como todos, na Gran Plaza. Sacha, que desde Rio Dulce nos acompanhava, tinha indicado um hostel, Gato Negro, mas tinham apenas um quarto bastante desagradável. Nos despedimos da Sacha e seguimos a procurar. Poucos minutos foram gastos para chegar ao Hostel Santiago, recém-aberto, mas dotada das típicas áreas internas das construções espanholas, arejado e barato. Cansados, não pensamos nem uma vez inteira, e jogamos nossos corpos, surrados pelos ônibus Guatemaltecos, nas camas. Não dormimos direto, saímos ainda para comer e comprar as passagens dos meus pais para a Nicarágua. Meu Irmão e eu iríamos sozinhos para conhecer o lago Atitlán, e nossos pais que já o conheciam iriam direto para a Nicarágua alguns dias antes. Fomos a agência Bon Voyage, que vende passagens da Ciudad de Guatemala direto para a Nicarágua pela empresa King Quality, e rapidamente resolvemos a questão. Para o problema do rombo estomacal, fomos a um restaurante de pollos assados e comemos asas e coxas acompanhadas de saladas, feijão, guacamole, e outras coisas mais. Ficamos bem satisfeitos e voltamos ao Santiago para dormir. Lavanderia no Hostel Santiago, em Antígua. Gran plaza de Antígua à noite. 22 DE JANEIRO – ANTÍGUA Mais uma corrida de reconhecimento. Às 7 lá estava eu explorando ruas e vielas da cidade. Eu queria achar um destino, a ser alcançado por uma estrada tranquila, mas eu ainda não me orientava muito bem nessas novas terras, e fiquei limitado aos perímetros de Antígua. Conheci, nessas voltas, a grande feira da cidade e o mercado de artesanatos, e logo percebi o fluxo de turistas e locais nesse sentido. Foi agradável, mas ficar restrito ao calçamento das cidades históricas não deixa um corredor realizado. Nos arrumamos e fomos comer no Café Barista, o mais requintado na cidade, localizado na Gran Plaza. Já sentíamos falta de produtos matinais a base de farinha de trigo, e então recorremos aos croissants com “jamón e queso”. Sem pressa, que sempre esteve presente em nossa viagem, ficamos ali aproveitando o fato do incansável wireless estar presente. Depois, seguimos para os mercados, sem o Ícaro, do qual nos perdemos. Andanças, impressões, muvucas, compras diversas fizeram parte desse passeio, mas tem coisas que não mudam. Na saída nos demos de cara com dois policiais, encostados em um 4x4, postados como xerifes, tendo seus sapatos engraxados no ponto de maior destaque no local, com cara de “bom dia, nós somos os caras”. Essas situações me desanimam. Mas seguimos em frente, voltamos ao santiago para resgatar o Ícaro e irmos a um museu da Jade, dentro de uma fábrica de joias. Depois de uma explicação padrão sobre as diferentes jades existentes e dos locais e modos de exploração no país, fomos a um antigo convento, chamado Santo Domingo, onde hoje existe o hotel mais caro de Antígua e um museu com objetos coloniais e mayas. É bastante agradável o espaço interno, com fontes, belos jardins e umas adaptações da arquitetura contemporânea que não afetam o patrimônio. O museu ficou para a próxima, mas dizem ser bastante interessante. obras em Antígua. Mercado de Artesanias em Antígua. Fábrica de jóias com jades. Jardins internos do convento Santo Domingo. O próximo destino era uma cidade próxima chamada de Ciudad Vieja. Comemos no mercado umas brochettes com papas fritas e de lá mesmo pegamos o ônibus. A Ciudad Vieja, que foi também capital do país (antigamente com outro nome), fica aos pés do vulcão água, atualmente inativo, mas responsável por uma erupção devastadora que, em 1541, levou à segunda mudança da capital colonial para a atual localização de Antígua, de onde podemos ver os vulcões Água e Fogo, o primeiro a sul e o segundo a leste. Nada de mais havia na cidade, apenas uma igreja antiga e uma escola onde podem se encontrar fósseis humanos, em posição fetal, depois de pegos pelas lavas do vulcão Água. Muitos dos que trabalham em Antígua lá vivem pelo fato dos custos de vida serem menores. Voltamos e descansamos. Depois de longas conversas, o Ícaro resolveu ir mais cedo para a Nicarágua, junto a meus pais, e resolvi sozinho conhecer o lago Atitlán. mercado ao céu aberto em Antígua. Ciudad Vieja. Saímos mais tarde para comprar a passagem do Ícaro e comer algo. Como eles sairiam cedo no dia seguinte, meus pais foram dormir e nós dois fomos tomar umas poucas cervejas. Passamos ainda por um bar com músicas estadunidenses e praticamente só estrangeiros, o que foi um pouco estranho, mas essa realidade é justificada pelo fato de Antígua, além de turística, ser tradicionalmente conhecida por suas várias escolas de espanhol para estrangeiros. Não tínhamos muito dinheiro, e fomos dormir em seguida. 23 DE JANEIRO – ANTÍGUA / ATITLÁN Enquanto meus familiares foram ainda de madrugada para Manágua, na Nicarágua, a van que iria a San Pedro, no lago Atitlán, sai às 9h00. No final da tarde anterior, quando comprávamos a minha passagem e a do Ícaro para Manágua, conversando com um dos funcionários da agência de turismo ele nos disse que também era corredor e que seu grupo corre aos Domingos (hoje) de manhã. Então, os encontrei nessa manhã na Gran Plaza para acompanhá-los em um dos treinos para a meia maratona que ocorreria no final de semana seguinte. Saímos na direção norte e subimos a montanha que fica atrás da cruz vista de pontos na cidade. Por uma estrada asfaltada seguimos por uns 35 minutos, sem praticamente nenhum tráfego de carros e vistas fantásticas de Antígua e região. Poderíamos ter subido mais e contornado a montanha chegariamos em Antígua pela estrada que a liga a Ciudad de Guatemala, mas preferimos voltar pelo mesmo caminho. Eles continuariam correndo, “Km a Km” (nome do grupo), mas eu já tinha que pegar minha condução hasta Atitlán! Acostumado com o ritmo guatemalteca, não fiquei surpreso pelo ato de termos saído apenas às 10h00, mas estávamos em bom número e fui confortavelmente. Passamos pela cidade de Chemaltenango, a quase uma hora de Antígua, e por outros povoados, a uma altitude maior que 2 mil metros. Seguimos por estradas bastante sinuosas, inicialmente duplicada e bem conservada, para depois continuar por caminhos bastante estreitos e esburacados. Ao final da viagem, começamos a ter uma bela vista do lago, seus contornos, cores e algumas vilas que o cercavam. Na estrada para Atitlán. Ao meio dia e meia, chegamos a San Pedro, segundo maior povoado nos arredores do Atitlán e base para a subida no vulcão San Pedro, um dos meus desejos por lá. Me senti bem andando sem rumo pelas ruelas da cidadezinha, livre de decisões em grupo, vendo o número de possíveis albergues que eu achasse necessário. Conheci um francês nessa jornada, Nicholas, com quem estive por uns 20 minutos, e fomos sondando os preços e oportunidades. Escolhi, finalmente, o Hostel Yo Mama, com seu estilão bem relax e bastante acessível financeiramente. Não tardei a sair e comprar umas coisas para fazer um almoço. Eu estava com muita fome, pois vinha me segurando com biscoitos e frutas, e então fiz uma deliciosa omelete vegetariana. Conheci os “moradores” do hostel (isso porque logo percebi que boa parte deles estava lá por semanas, outros por meses) e a maioria era norte-americana. Não interagi muito inicialmente, mas aos poucos fui me interessando por eles. Uns estavam lá por terem desistido dos estudos, outros davam duro no aprendizado do espanhol nas escolas de San Pedro e alguns outros estavam em férias indeterminadas de seus trabalhos, estudos, todos, porém, apegados a falta de ritmo, rotina, constâncias da localidade. Antes de dormir, comi um hambúrguer no estilo guatemalteca e digo que foi o mais saboroso dos últimos tempos. Cansado por tudo que já tinha sido o dia e comprometido com a subida do volcán San Pedro às 7h00 do dia seguinte, me recolhi, feliz com minha decisão de poder estar sozinho por uns dias. Porto de San Pedro. San Pedro. Às margens do Atitlán. 24 DE JANEIRO – ATITLÁN / ANTÍGUA Às 6h00, me levantei sem pressa para cumprir todos os passos antes da subida. Fui tomar café com uma garota alemã que voltava para Antígua naquela manhã, e logo depois segui para o ponto de encontro com o guia Santos. Esse simpático senhor, além de guiar turistas nessas caminhadas, trabalha na colheita de café e milho, produtos fortes na região. Nascido no litoral, seguiu para San Pedro em busca de trabalho, escassos e mal remunerados em suas terras de origem. Por várias ruas e pela estrada seguimos até a entrada do parque, e já pude notar que o Santos possui uma consciência ambiental, pois quando quis jogar meu copo de café fora ele disse que na portaria haveriam latas de lixo por separação. Lá assinamos o livro de controle e seguimos vulcão acima. Na base do mesmo, ainda existem plantações de café e milho, mas a medida que subíamos a mata nativa se fazia mais presente até representar o total. Diferentes espécies de plantas apareciam enquanto outras desapareciam a medida que subíamos. A temperatura também amenizava com o aumento da altitude. Do mirante que surgiu uma hora após o início da subida, já tivemos uma boa vista, mas o clima já indicava que lá de cima teríamos uma visibilidade restrita. A subida foi dura, mas como éramos só os dois imprimimos um ritmo forte e em uma marca impensada de 2h30 chegamos ao topo. Lá já estava um casal de alemães a espera da saída de uma nuvem que nos impedia de ver o lago inteiro, mas logo vimos que ela não sairia tão cedo. Mesmo assim, tínhamos umas belas frestas e só o estar lá e não ter mais o que subir foi revigorante. Não quis ficar lá por muito. Comemos um bolo, tirei umas fotos e já descíamos em seguida. Bem mais rápida, a volta foi deliciosa e poco depois do meio-dia estávamos novamente em San Pedro. Meus companheiros de hostel, que mal tinham acordado, ficaram incrédulos com que eu já havia feito. No topo do Volcán San Pedro. "rio de lava". Hostel YO MAMA. Eu ainda deveria voltar para Antígua, então não tardei a partir da cidade e seguir caminho. Como todos chegam a San Pedro e ficam sem previsões, minha ida não foi compreendida pela maioria, mas eu estava preso a datas e não pude usufruir do desapego por muito. A travessia até Panajachel, maior cidade da região, é muito bonita, mas o barco não facilita nossa vista, pois sua frente é muito inclinada e as laterais são cobertas por plástico fosco. Não é compreensível que um barco que atenda muitos que não conhecem a região seja mal elaborado. Um bar "roots" em San Pedro. Mapa do lago. Chegando em Panajachel, logo vi que ela já tinha características de cidades maiores: ruas largas, muitos carros, distâncias longas, e visto o custo das vans turísticas, resolvi me arriscar noa coletivos (chicken buses) para chegar em Antígua. Percebi que boa parte dos passageiros eram guatemaltecos, mas uma garota me pareceu diferente, e ao conversar um pouco com ela soube ser Nicaraguense. Bela surpresa, e para completar a coincidência ela iria pegar o mesmo ônibus no dia seguinte para Manágua. Conversamos um pouco, peguei umas dicas de lugares para se visitar em Manágua. Chegando em Chemaltenango, desci para pegar outro ônibus, enquanto aquele seguiria até Ciudad de Guatemala, onde Lucila estava hospedada. Me despedi, mas ainda nos veríamos no dia seguinte, e segui meu caminho até Antígua em um coletivo bem mais cheio que o anterior. Passamos por um caminho que eu não reconheci, mas logo estávamos no estacionamento de coletivos ao lado da feira de Antígua. O resto da noite ficou reservada para comprar itens para a viagem até Manágua, pois já estava quase certo que eu passaria aquela noite em um hostel onde os músicos e hippies itinerantes se hospedam. Depois das compras e de ter organizado minhas coisas, meu corpo não me segurou do sono e, com os despertadores acionados, dormi feito pedra. No chicken bus rumo a Antígua. 25 DE JANEIRO – ANTÍGUA / MANÁGUA A van que nos leva até Ciudad de Guatemala passou pelo hostel às 4h00, pois de lá o ônibus da King Quality sairia às 6h30. Todos que entravam na van tinham a mesma cara amassada de sono, uns iriam pegar avião e outros como eu iriam a Manágua. Nos deixaram, finalmente, em um hotel que prestava serviços a King Quality e, enquanto o ônibus não chegava, pudemos usar os computadores. Um pouco antes do esperado, o ônibus nos pegou, pois ainda iríamos até a agência da empresa para o embarque dos outros passageiros. Encontrei, então, a Lucila e nos sentamos próximos dentro do ônibus. Dormi nas primeiras horas e depois vi um filme muito interessante sobre o funcionamento das bolsas de valores e suas crises cíclicas. No ônibus, tinham australianas que vinham comigo desde Antígua, umas meminas da Nova Zelândia, um el salvadorenho, a Lucila e outros com quem não conversei. Em uma das conversas que pesquei, o rapaz de El Salvador falava do número enorme de policiais, em torno de 200 mil (acho um certo exagero nesse valor) e advogados do país, o que não reflete algo positivo. Todos, porém, estavam cansados e o ônibus foi bem silencioso até Manágua. Para chegar em tal destino, passamos por outros dois países, El Salvador e Honduras, nessa ordem. A vegetação perto da fronteira desses dois é bem mais árida que no restante das que vimos na viagem, e em boa parte do trajeto pôde se ver cumes de vulcões. Nas fronteiras, tivemos pouco trabalho, tendo que ser pago 4 dólares para sair de El Salvador, 3 dólares para sair de Honduras, e 10 dólares para entrar na Nicarágua, sendo necessário sairmos do ônibus somente na fronteira de Honduras com a Nicarágua. A viagem por essa companhia é bem confortável, pois eles servem lanches e os ônibus estão em ótima conservação. Uma hora mais tarde que o previsto, às 23h15, chegamos em Manágua, e pouco depois chegavam meu pai e meu irmão para me buscar e irmos para a casa de nossos amigos brasileiros que lá moram. Conversamos poucos, estávamos todos cansados e ao chegarmos na casa fomos dormir. Fronteira de El Salvador com Honduras. 26 DE JANEIRO – MANÁGUA / GRANADA Fim da aventura e início da mordomia. Depois de termos que diariamente pensarmos em o que comer, onde ir, como ir, chegávamos ao fim da viagem em uma condição mais tranquila. Ainda iríamos a Granada e a Isla Ometepe, mas depois ficaríamos sem grandes pretensões em Manágua. Tomamos um variado café, e a idéia matinal seria dar uma relaxada, mas com a proposta de irmos a praia para buscar uns peixes, não resisti e todos fomos em um passeio até o litoral do pacífico. Grande parte da população nicaraguense vive próximo ao pacífico e o pouco do desenvolvimento do pais, muito massacrado pelas décadas de revolução contra ditaduras e o imperialismo estadunidense, também se encontra na região. Os acessos a costa caribenha continua muito precário e a população daquele região vive predominantemente no campo. O caminho nos reservou algumas belezas naturais, grandes plantações de cana-de-açúcar destinados, principalmente, à fabricação de rum, e alguns povoados bem simples. Em menos de uma hora, chegávamos ao ponto em que um quilo de peixe é mais barato que 2 reais. Vale a viagem! Compramos os peixes, demos umas andadas, mas queríamos ir a um lugar mais bonito para nadarmos. Dito e feito, fomos levados a uma praia uns 6 km ao sul e já tínhamos uma condição mais favorável. Nadamos, comemos uns camarões e não tardamos a voltar, pois iríamos almoçar em Manágua. Mal chegava eu de longa viagem e já iríamos a Granada, uma hora ao sul de Manágua que é uma das cidades com maior patrimônio colonial na Nicarágua. A viagem, porém, só ocorreu no final da tarde, após uma siesta coletiva. Sem pressa, nos arrumamos e fomos. A viagem já se deu a noite e rapidamente notamos a nossa chegada na Granada nicaraguense, bem menos iluminada que Antígua, mas com características singulares. Meu estômago já vinha dando sinais de fraqueza e não fui feliz nessa noite. Apesar de tudo, jantei depois de nos instalarmos para repor o que eu havia perdido nas más digestões. Comi, fui ao banheiro e dormi, e fui ao banheiro, e........ Os peixes "nica". Pacífico na Nicarágua. Vista de Manágua, do lago Manágua, e do volcán Momotombo ao fundo. 27 DE JANEIRO – GRANADA / ISLA OMETEPE Acordamos sem pressa e mais uma vez o continental marcou presença em nosso café da manhã. Ainda não havíamos decidido os meios que nos levariam a Ometepe. Sendo aquela uma terça-feira, tínhamos duas opções: pegando uma balsa a tarde que saía de Granada mesmo, às 13h00, ou indo de ônibus até San Jorge, de onde saem barcos e balsas em maior número até a ilha. A decisão inicial foi pela segunda opção, pois não queríamos ficar “presos” em Granada por meio dia (não sei porque pensamos dessa forma, talvez fosse o fim da viagem junto ao calor abafado que fazia que nos fez querer seguir em frente). Seguimos, então, rumo ao “Terminal Rodoviário”, passando pelo grande mercado de Granada e seus arredores fervendo com barraquinhas ao ar livre. Feira de Granada. Minha mãe criou uma expectativa de que o país teria melhorado depois dos dois anos que se passaram desde a oportunidade em que meus pais foram à América Central. A Nicarágua, porém, pouco mudou em termos de infra-estrutura e a rodoviária de Granada continuava sendo um terreno baldio onde vários “chicken buses” emitindo suas fumaças negras sem rescrição. Os turistas são constantemente enganados quanto a trajetos e horários dos transportes públicos na América Central. Descobrimos que o ônibus só sairia em 30 minutos e isso significa o dobro pelo menos. Além disso, estaríamos sujeitos às inúmeras paradas que esses fazem ao longo do percurso. Não animamos, e nos lançamos a outra possibilidade. Fomos até o porto e compramos as passagens para a balsa que sairia em duas horas. Portanto, voltamos ao hotel para fugirmos do sol e comermos algo antes da partida. Depois de deliciosos hambúrgueres e de trocar uma ideia com um participante da revolução Sandinista, atualmente viciado em internet (segundo ele, 20 horas do seu dia são passados a frente do computador!?!?), seguimos de volta ao porto para pegar a balsa. Nos acomodamos e os motores não tardaram a ligar. Quando saímos, eu já havia me acomodado ao lado de fora para continuar lendo o livro “A revolução Nicaraguense”, da editora UNESP e escrito por um alemã de quem não recordo o nome. Fui interrompido, depois de uns minutos, por um alemão simpático, Sacha, que me perguntava de hotéis em Altagracia (cidade da chegada na Isla Ometepe). Não soube responder precisamente. Tínhamos, nós quatro, uma reserva na Finca Magdalena, mas ficaria bem caro para chegarmos lá depois que os ônibus coletivos parassem de circular. Outro alemão que conhecemos, Adrian, da minha idade, vinha fazendo um voluntariado na Costa Rica e fazia esse passeio apenas para cumprir o tempo que precisava deixar o país para não ficar ilegal. Víamos esses dias que costarriquenhos, que possuem uma forte política ambiental, e nicaraguenses travavam uma discussão sobre possíveis impactos ambientais pela Nicarágua sobre o rio fronteiriço San Juan, em região de disputa antiga entre os dois países. Seguimos viagem conversando, aproveitando o avançar do barco e as vistas que iam mudando, para então termos ao fundo os dois vulcões que compõem a ilha: Madera e Concepción, o último ainda ativo em ligeiramente maior. Altagracia, maior cidade da ilha, fica aos pés do Concepción e pouco depois das 18h00 lá chegávamos. Do ferry, a vista da Isla Ometepe. Havia na chegada um esquema de pescaria a turistas desorientados. Fomos bem pescados e nos levaram até um hotel simples e confortável. Lá jantamos, depois andamos na praça principal, mal iluminada como Granada. O país tem um considerável déficit energético e por isso o consumo público é regulado. Encontramos nossos alemães, e o Ícaro e eu tomamos umas Victórias até mais tarde. Logo fomos, pois eles iriam na manhã seguinte às 6h00 subir o Concepción. 28 DE JANEIRO – ISLA OMETEPE Tínhamos com um dos planos para a Isla Ometepe a subida do volcán Madera. Nossos pais haviam quase alcançado seu topo dois anos antes, mas o mal tempo e a trilha sempre barrenta os impediu de ir até o fim. Nós todos, em ritmo de final de viagem, fomos um a um desistindo do programa. Cláudia, Seleme, eu e depois meu irmão, nessa ordem, jogamos a toalha e resolvemos ficar na boa vida. Seguimos para uma praia mais ao sul da ilha chamada de Santo Domingo. Nós três homens da família fomos correndo, e a Cláudia foi de ônibus com suas amigas franceses e as bagagens. Eram somente 10 quilômetros, mas o sol forte fez desses bem desgastantes e chegamos um pouco depois do ônibus, que saiu 30 minutos depois de nós. Sabíamos do hotel Finca Santo Domingo e lá mesmo ficamos. A praia de Santo Domingo, em função das chuvas do período de inverno que passaram, simplesmente desapareceu. A água agora cobre toda a faixa de areia e ela se choca diretamente com a parede de contenção do hotel. Na falta dessa atração, fomos ao Ojo de agua, uma nascente subterrânea onde a água é represada formando duas piscinas cristalinas à sombra de árvores. O percurso até lá foi de uns 2 km, sendo cobrado 2 dólares por pessoa na entrada. Nadamos, descansamos, experimentamos as famosas empanadas e outros petiscos, e voltamos com a intenção de comermos um almoço tardio. Ojo de agua. Urraca, ave bela, porém comum na isla Ometepe. A Finca Magdalena, onde ficaríamos na primeira noite na ilha, me interessou pelo fato de terem práticas de técnicas da permacultura. Apesar de não termos dormido lá, nesse final de tarde resolvi conhecê-la e para tal aluguei uma bike. O caminho margeia, a princípio, todo o comprimento da praia Santo Domingo até uma encruzilhada, de onde tomei a esquerda em direção a Balgue. Poucos quilômetros adiante virei à direita e subi até a fazenda. Se criaram na região aos pés do volcán Madera uma série de cooperativas de produtores agrícolas, cada um aplicando métodos próprios, tanto que a propriedade onde haviam práticas de permacultura ficava a uns 10 minutos de caminhada da Magdalena. Me perdi no trajeto até a Finca Bona Fide, mas uma das garotas que lá estava fazendo um voluntariado me resgatou e me conduziu até a propriedade. Os donos não se encontravam, mas dentre os voluntários existem os que ficam por meio ano e esses eram os responsáveis pelo programa de voluntariado, e como todos estavam ocupados com o curso que seria dado nas duas semanas seguintes fiz o reconhecimento das técnicas de permacultura sozinho. Tenho pequena experiência e conhecimento teórico a cerca dessa, quase, filosofia de vida. A ideia da subsistência está intrínseca em todas as práticas da permacultura, fazendo do todo que compõe a propriedade o menos impactante ambientalmente e socialmente. As construções normalmente fazem uso de recursos locais, nesse caso madeira, bambu e folhas de coqueiros; usa-se da combinação de espécies vegetais para uma produção mais rica e que preserve a biodiversidade local; plantas medicinais também fazem parte das culturas. Todos os detalhes da propriedade são pensados de forma a melhorar o aproveitamento da luz solar, circulação do ar, reutilização ou captação das águas, entre várias outros. Tudo pode ser encontrado na Finca Bona fide e como ela já existe a uns 15 anos, o trabalho voluntariado que cresceu ao longo dos anos possibilitou o grande avanço da mesma. À parte disso tudo, a vista que temos de lá é fantástica e a chuva que presenciei foi belíssima, como uma cortina de água balançando à frente do volcán Concepción e com algumas frestas luz vindas do céu. Conversei com uns e outros, mas logo tive que voltar a Santo Domingo, pois começava a escurecer. Encruzilhada na Parte sul da Ilha. Banheiro seco da Finca Bona Fide. Chuva e o volcán Concepción. Finca Bona Fide e arredores. Cheguei e resolvemos jogar Buraco, relembrando os velhos tempos de jogatina. Ao gosto de pipoca, demos, minha mãe e eu, uma leve surra no Ícaro e no Seleme. Ao final, fomos para os quartos e o sono nos acompanhou. 29 DE JANEIRO – ISLA OMETEPE / MANÁGUA Acordamos cedo para pegar o ônibus das 7h30 a Moyogalpa, onde pegaríamos a balsa ou o barco até San Jorge. Quando descobrimos que esse passava às 7h00, na verdade, já era tarde. A alternativa que surgiu foi perfeita, pois saindo no exato momento da descoberta ainda conseguiríamos pegar a primeira balsa, que sairia às 8h00. E não foi diferente. Pegamos a balsa chegamos às 9h00 em San Jorge, e tive a surpresa de encontrar ainda na balsa o Adrian que já voltaria para Costa Rica naquele mesmo dia. Ao atingirmos a margem oeste, passamos por um corredor de taxistas nos pressionando para seguirmos com eles. Entendemos, nesse trecho, que o ônibus para Manágua só poderia ser pego no mercado da cidade vizinha. Tínhamos que pegar um táxi, mas demos preferência para um condutor que não estivesse nos importunando. O motorista nos falou da possibilidade de pegarmos o Expresso Manágua que segue praticamente direto até a capital. Seria algo mais interessante, pois os ônibus regulares param em todos os pontos da estrada em que é requisitado, o que atrasaria muito a volta. O expresso passou poucos minutos depois de termos deixado o táxi, e em menos de 2 horas estávamos em Manágua. Ainda não tinhamos comido e resolvemos parar no Shopping Galerias para tomarmos um café tardio. Ainda no ônibus haviam salgados, bolos, e outras iguarias locais que custavam 5 córdobas (menso que 50 centavos de reais). No café onde comemos no shopping, um sanduíche apenas já custava 100 córdobas (uns 8 reais), para mostrar bem as disparidades nesse país. A desigualdade social é uma marca pesada e angustiante nesse país, principalmente depois de tanto que a população lutou pelo fim de ditaduras e do imperialismo norte-americano almejando um futuro mais justo, mas nem a Frente Sandinista foi capaz de reverter essa condição. Entretanto, o sanduíche que comemos não seria servido em muitos outros lugares e nos deliciamos apesar do que está por trás daquele sabor. De lá, fomos diretamente até a casa de nossos amigos na Caretera Sur, e descansamos até a hora do almoço. Comemos ainda satisfeitos dos sanduíches, e descansamos até à noite, quando iríamos, o Ícaro e eu, sair com a Lucila para o aniversário de seu amigo. Não foi nada extravagante, apenas uma reunião de amigos ao fundo do quintal. Tomamos umas cervejas locais, Flor de Caña, entre outras coisas. Foi interessante poder ter presenciado essa situação nada turística e bem íntima de jovens “nica”. Ficamos lá até umas duas da manhã e a própria Lucila que nos conduziu de volta para casa. Dormi pensando que apesar de todas as diferenças sociais e ambientais entre regiões do mundo, a globalização cria uma série de interseções culturais de modo que nos “aquis” ou nos “lás” do mundo se possa escutar as mesmas músicas, filmes, livros, fazendo da casa do amigo da Lucila relativamente próxima da casa de meus amigos no Brasil em termos do que se vive em uma confraternização. 30 DE JANEIRO – MANÁGUA Tomamos café com o Flávio, dono da casa e nosso amigo. A sua esposa, Josiane, estava nos EUA para um encontro das mulheres do café. No Brasil, ela tem uma propriedade cafeeira próximo a Manhuaçu, em Minas Gerais. Ela chegaria no dia seguinte no horário do almoço. Esperávamos, depois do café, pelo meu tio, Ariel, que acabava de chegar de viagem ao Brasil. Iríamos fazer um churrasco, antecipado por partidas de tênis. Por volta das 10 horas, chegava ele, sua esposa e minha prima. Esse meu tio é bem carismático e bastou sua chegada para que o ambiente ficasse mais animado. Jogamos uns 3 sets de tênis em um ritmo bem descontraído, com variações constantes das formações dos times. Ao final do jogo, já se sentia os aromas das carnes assando, estalos da gordura pingando na brasa, e não tardamos a nos posicionar em posição privilegiada a espera do produto. Os cortes nicaraguenses não deixavam a desejar e os acompanhamentos, saladas, farofa e uma inovadora maionese de batata doce, completaram o grande banquete, tudo isso acompanhado de bons vinhos, cubas libres com o verdadeiro rum e cervejas. Um sorvete encerrou os trabalhos e a ideia seguinte era a de ir fazer o famoso Canopy, que conhecemos com tirolesa, por cima de uma antiga cratera de vulcão, atualmente um lago. Churrasco nicaraguense. Não imaginava que seria algo tão intenso. São três sequências de tirolesas que passam por cima do lago e com uma visão fantástica da cidade. A partida da canopy era da antiga residência do Somoza pai, que a muito foi destruída por um terremoto e da qual resta apenas uma parede. O cara era tão insano que tinha no que seria o porão de sua casa uma prisão. Parte dos opositores de seu governo, presos, ficavam ali abaixo de seus pés. Inacreditável! Bom, o passeio foi fantástico e depois do primeiro friozinho na barriga da descida inicial, as outras duas foram só curtição. Fomos o Ícaro, a Selena, minha prima, e eu nas descidas. No fim, havia uma caminhonete que nos levava de volta ao topo. Como é uma atração turística e relativamente cara, chegamos com vários olhos estranhos voltados a nós, o que foi um pouco embaraçoso. Seguimos, de lá, para o topo de uma das colinas nos arredores de Manágua onde há um restaurante. O caminho foi meio sinuoso e com o estômago ainda cheio atingi o topo meio tonto. Tomamos lá em cima um vinho branco geladinho e fizemos o último brinde da noite. Curtimos as últimas luzes do dia e descemos para a cidade. O Ariel nos deixou em casa e ficou de passar na manhã seguinte para acompanhar meu pai em uma visita a UNE, uma das universidades de Manágua. Ainda antes de dormir, tomamos um sopa com o Flávio. Dormi cedo depois de adiantar mais umas páginas da Revolução Nicaraguense. Tirolesa. Vista de Manágua de um restaurante. 31 DE JANEIRO – MANÁGUA Eu tinha o desejo e minha a necessidade de ir ao mercado Roberto Huendes. Para isso, pegaríamos uma carona com o Ariel e meu pai até lá. Tomamos café e às 10h00, como combinado, lá estava meu tio. Nos deixaram na porta do mercado e seguiram para a UNE. Além de artesanatos, se encontram alimentos, roupas e alguns dispositivos eletrônicos. Suas dependências são bem grandes e cobertas. Mais organizado que eu imaginava, os vendedores são bem menos bajuladores, e nos sentimos feito locais caminhando ao longo dos corredores. Minha mãe comprou várias caixinhas de madeira, onde se pode guardar anéis, como presentes para suas amigas. Consegui encontrar uma camisa com a silhueta do Sandino, a último do único lugar que a vendia no mercado! Saímos de lá e fomos a um supermercado comprar umas garrafas de Flor de Caña, para depois voltarmos à casa. Tortillas sendo feitas no Mercado Roberto Huembes. Mercado Roberto Huembes. A Josiane chegou um pouco depois de nós, contando várias histórias interessantes sobre o seu encontro nos EUA. O Flávio não tardou a chegar e fomos todos, menos meu pai que ainda não havia retornado da reunião, almoçar. Comemos um belo peixe acompanhado de legumes refogados e um purê de batata doce. Reservei aquela tarde para empacotar minhas coisas, pois na manhã seguinte já pegaríamos nosso avião para Belo Horizonte. Iríamos à noite sair com o Ariel e família, o Flávio e a Josiane para comermos uma pizza e comemorar nossa partida de terras centro-americanas. Foi uma noite deliciosa, mas já estávamos com as nossas cabeças no Brasil a alguns dias e desejávamos o dia seguinte da partida, a nossa casa, as nossas camas. Pizza revolucionária com ovo frito (muito gostosa). 1 DE FEVEREIRO – MANÁGUA / AVIÃO O Ariel, novamente, combinou de passar para nos levar ao aeroporto por volta das 10h30. Tomamos café com todos, e nos despedimos do Flávio em seguida quando ia ao trabalho. Terminei de ler o livro, de arrumar as últimas coisas e lá estava o Arielzito a nossa espera. Agradecemos a Josiane por tudo e seguimos viagem até o distante aeroporto Augusto C. Sandino. Lá, antes do embarque, compramos uns charutos nicaraguenses e cubanos, comemos umas asinhas de frango empanadas fritas e seguimos para o salão de embarque, não sem antes nos despedirmos no Ariel. Sim, a viagem chegava a seu fim, mas quase ficavamos um dia a mais em Manágua por conta de nos distrairmos na hora do chamado para o embarque, mas os nossos nomes soaram nos auto falantes e conseguimos nos safar. O que vale registrar sobre o vôo é o trecho que fizemos de Manágua a San Salvador, no qual acompanhamos uma série de vulcões abaixo de nós, uns ativos outros não, mas que impressionavam pelo porte e pela quantidade. O círculo de fogo é algo realmente assustador. O resto da viagem foi tranquila, mas obviamente dormi mal em função do cada vez maior desconforto das aeronaves. Vista do avião de um vulcão, provavelmente em Honduras. Vulcão próximo a San Salvador. Chegamos em BH, em função do fuso, já no início da manhã, realizados e esgotados! REFLEXÕES FINAIS Sempre quando faço viagens, independente do número de dias e do quão longe vou, sou levado àquele sentimento misto que envolve as descobertas, só que eu nunca havia divulgado essas experiências em forma composta de textos e imagens. Essa realização não só promove um efeito de inspiração como nos auxilia a compreender melhor tudo que se passou e as implicações disso em nossa vida. Fico, agora sim, completamente realizado com essa grande aventura cultural que fizemos, pois ela já não é só minha e de meus familiares, mas de todos que de alguma forma se identificaram com esses passos que demos. Espero que minhas palavras não tenham diminuído muito a magia de cada um dos lugares e experiências relatadas, pois ser completamente fiel ao que foi vivido é impossível dada a complexidade e infinidade de detalhes. Desejo a todos profundas viagens futuras! Citar
Colaboradores Marcos A Postado Junho 24, 2011 Colaboradores Postado Junho 24, 2011 Cara, Tu sabe me detalhar essa viagem de Chetumal até Flores??? A mesma companhia de buses que saiu de Chetumal te deixou em Flores? Vc teve que parar em Belize City e trocar de companhia? Qual foi o preço da passagem e vc comprou quando chegou em Chetumal? Att. Citar
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