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QUE PAÍS É ESSE?

 

 

 

Durante a viagem pra Suíça, na aeronave, conheci alguns brasileiros com experiência de vida interessante. Às vezes quando acordava, via pela tela do computador, o local exato onde íamos passando. Um comissário olhou também a TV e falou ao outro num sotaque paulista: "fulano, estamos sobrevoando Barcelona, vamos dar uma olhada".

 

Meia hora depois eu observava tudo aquilo que era montanha branca e já estávamos na Suíça.

 

Não fiz muita questão de me ligar na janela como todo o mundo estava fazendo. Minha cabeça só pensava na fila que esperava a todos lá embaixo. Zurique, aeroporto dos grandes entro numa das três filas. Na frente um passageiro suíço. Procurei observar como ele fez para poder repetir. O policial respondeu o cumprimento e sorriu para ele, carimbou o passaporte e depois deu obrigado. Ainda pensei se seria mesmo a minha hora... Dei bom dia em inglês, respondeu com um sorriso. Pediu minha passagem, carimbou o passaporte e com outro sorriso, me disse obrigado.

 

Lá na saída estava uma "galera," comecei a vasculhar Daniel na multidão, o filho do suíço que me tornei amigo no Brasil. Vi toda a família, e mais Claudia, a namorada do filho, que tem um brinco no nariz e o cabelo preto igual a muitos brasileiros.

 

Sem perder tempo, fomos à quitinete de Daniel. Fica num quinto andar de um prédio antigo sem elevador. Dei a idéia pra ele ficar subindo pelo lado de fora com uma corda. Cada um ajuda a levar o restante da mudança: umas almofadas pretas, uma cadeira reformada, um pôster do Pão de Açúcar e uma mesinha desmontável que trouxeram do Brasil. A paisagem medieval vista pela janela me despertou a vontade de fazer uns desenhos. A calefação do prédio vem do piso do apartamento. Lá fora a maior temperatura no inverno fica pelos dez graus. Um avião sobrevoa a cidade tirando foto infravermelho, depois o governo descobre as casas que estão deixando escapar calor e avisa ao proprietário para vedar melhor portas e janelas. Desse jeito, o país economiza mais óleo diesel usado na calefação, e polui menos.

 

Nove horas da manhã, saímos para um café. O filho do suíço foi na frente num BMW, é até fraquinho comparado com o carro do pai. Disseram que aqui qualquer pessoa pode ter um automóvel desses, pode ser diretor de empresa, agricultor ou jardineiro. Fomos até a oficina mecânica de Daniel. Nas paredes ele tem pôsteres de Airton Senna e aonde passa, vai deixando um rastro de lembranças do nosso país.

 

Saímos de Zurique. Duas horas de carro pela auto-estrada a 120 km por hora. Ia lendo as placas em alemão e também nessa mesma velocidade, esquecia as primeiras palavras. Tudo limpo, desde o aeroporto até chegar aqui em Mörigen, cidadezinha de 342 habitantes e com mais de 600 anos! Talvez por conta da velocidade, mas achava a paisagem simples. Ao longe umas casas grandes não me impressionavam. Entramos depois numa rodovia e por fim, chegamos nos sítios. O suíço parou o carro para comprar frutas, não tinha ninguém para atendê-lo. Morangos, cerejas e geléias. Umas placas com os preços e uma caixinha ao lado. Ele desceu do carro, pegou as frutas, fez a conta, colocou as moedas na caixa e pegou o troco. O agricultor está ocupado em outra atividade, só chega no final do expediente para contar o dinheiro e guardar as mercadorias.

 

Seguindo viagem, passamos depois no que eles chamam de aldeia. Era Aarberg. Fiquei admirando as casas medievais quando o carro parou no semáforo. O nome desse lugar soa feio, mas desde então, sonho com Aarberg; olho o céu pensando em Aarberg caminho pensando em Aarberg. É muito difícil para um brasileiro compreender esse negócio deles ficarem preservando as casas há mais de mil anos. Hoje não pudemos voltar a essa aldeia, primeiro vamos verificar as bicicletas, aqui só circulam com o selo do imposto anual, a campainha, a lanterna.

 

Logo no início parece estranho o ônibus não ter cobrador. Na parada tem máquinas onde o passageiro coloca a "grana", recebe o bilhete e o troco. Alguma vez pode aparecer um fiscal. É meio estranho deixar a bicicleta sem cadeado na parada, pegar o trem ou o ônibus e depois de umas tantas horas, quando voltar, encontrá-la no mesmo local. Pra tudo que é lado, as bicicletas ficam encostadas nas paredes das casas.

 

A vida segue tranqüila e a primeira noite aqui foi tranqüilíssima, como deve ter sido nesses últimos dois mil anos. Buzina de carro, não se escutava, até Daniel chegar de Garanhuns-PE, trazendo esse hábito e alguns outros. É tudo tão silencioso que pra se ter uma idéia, nos apartamentos, nem se pode dar descarga ou tomar banho depois das dez horas da noite, isso para o barulho não incomodar os vizinhos.

 

É um povo cheio de vida, loiro, mais ou menos alto, rico, cada peido que dá é uma nota de cem dólares. Engraçado: nas ruas, nos carros, muitos olham pra mim. Serei então uma mistura de extraterrestre com o homem da caverna?

 

Fomos a uma festa de rua numa cidade vizinha. Daniel, Claudia, e Alex, o amigo deles (que come igual a um estivador do porto do Recife). Seria o carnaval fora de época. Nenhum tipo de propaganda de bebida, nada de som alto. Uns tipos loucos: gente com cabelo vermelho, outros, azul, verde... Punks de todos os sabores, roupas extravagantes e brincos por todo o corpo. Cada um na sua e todo o mundo numa boa.

 

Tenho conhecido uma porrada de gente legal. Chego a ler na cara delas a vontade de puxar conversa, como nem todos têm coragem de iniciar o papo, trato de usar a espontaneidade brasileira e já desenvolvo amizade. Termino indo até a casa e dá pra se tornar amigo da família, como em qualquer outro lugar do mundo. O problema maior é o idioma alemão-suíço. Não consigo entender nada quando estão falando entre si.

 

O cidadão deve ser a coisa mais importante de um país, e por isso mesmo é fundamental o governo investir na educação, saúde, cultura...

A casa dessa gentil e amável família suíça é um pedaço do Brasil: livros sobre o nosso país pra todos os lados, discos, quadros, papagaios, araras, passarinhos e como se ainda não bastasse... Na TV está passando a novela "Mulheres de Areia". Quando esqueço tudo isso e coloco a vista pra outras coisas, na janela, por exemplo, observo logo a diferença do nosso país, mas que é o nosso querido Brasil: desrespeitado pelos políticos e por cada um de nós quando não damos importância às leis.

 

Edmilson Vieira é artista plástico e cronista dnv01@uol.com.br

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Olá Edmilson: o que tu relatas é incrível. Se fosse no Brasil. roubariam todas as caixas de frutas e todas as bicicletas. E aqui no nosso país o governo jamais está interessado em seus cidadãos, ele está interessado apenas em aumentar os impostos, para garantir o superávit primário necessário para pagar os juros das dívidas interna e externa.

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É questão de escola e tb o passado de neutralidade dos suíços. Eles não querem saber do que é dos outros.

Vi que vc é de Porto Alegre, morei aí por dois anos, trabalhei naquela empresa CEEE.

abraço

Edmilson

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