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TRAVESSIA EXPEDICIONÁRIA VALE DO SÃO LOURENCINHO

A CONQUISTA FINAL

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...............Já é final de tarde quando nos posicionamos à beira do grande abismo no fundo do vale e, enquanto parte do grupo já procura uma forma de descer ao pé da grande cachoeira, eu fico por ali, a contemplar aquele espetáculo, mas a minha demora em ir ao encalço do grupo fez com que me tornasse o “cú de tropa” da equipe. Não que eu fizesse questão de sempre ser a linha de frente, mas ser a rabeira é o lugar mais ingrato que se possa imaginar. Cinco integrantes escalam o paredão e somente eu e o Loures ficamos tentando ver se não haveria um caminho menos íngreme para subir e, como ficamos com medo de nos separar da galera, resolvemos encarar a grande subida mesmo. O Loures subiu como deu e eu fui atrás tentando me agarrar em tudo que é tronco, cipós e pedras para tentar me elevar para o alto, mas o peso da mochila e a minha pouca força para sustentar meu corpo no vazio, quase fez com que eu despencasse de volta. Assim que eu consegui subir, só deu tempo de ver o Loures correndo desesperado em minha direção: -“ CORRE DIVANEI, VESPAS, VESPAS! ”

 

Não tive tempo nem de tomar fôlego pela subida, dei meia volta e me lancei barranco abaixo com corpo, alma e mochila e só parei quando a força da gravidade se cansou de rir da minha cara. O Loures também não se fez de rogado e sem nenhuma vergonha de passar vexame, também voou de volta para beira do rio São Lourencinho. De onde estávamos agora só podíamos ouvir o grupo no topo do barranco. Os gritos ecoaram por toda a Serra do Mar Paulista. Não eram só simples pedidos de socorro, eram gritos de agonia e desespero. Eram gritos de quem pareceria estar encarando a própria morte de frente e tentava escapar de qualquer jeito. Foi o mesmo que presenciar o dia do juízo final e ouvir os gritos das vítimas que seriam arrastadas para as profundezas do inferno. Em mais de 20 anos, esse foi o momento mais tenso que já passei nessa minha vida de aventuras, muito porque, eu e o Loures não podíamos fazer nada diante daquela situação e eu mal conseguia me sustentar sobre as minhas pernas. Ficamos inertes, parados, sem sair do lugar, mal respirávamos, não trocamos uma palavra durante essa cena de horrores e quando veio um silêncio ensurdecedor, vindo da direção onde estava o grupo mais acima, apenas imaginamos que aquela expedição selvagem havia se transformado numa tragédia.....................

 

Eu ainda estava perdido pelo deserto do Jalapão – TO , quando recebi a mensagem da galera da capital Paulista pedindo para que eu organizasse o evento ,porque no carnaval iríamos tirar o Vale do São Lourencinho do mapa das travessias selvagens da Serra do Mar de São Paulo. Na ocasião mal respondi a mensagem, mas quando voltei para casa percebi que a coisa era séria mesmo e diante do inevitável, já deixei bem claro que dessa vez só iria com um grupo forte e não haveria nada e nem ninguém que iria me impedir de descer aquele vale e uma vez no leito do rio, seria caminho sem volta.

 

O Rio SÃO LOURENÇINHO era um rio diferente de todos até então, justamente por não seguir o mesmo curso da maioria dos rios que, ao percorrerem todo o planalto, despencavam violentamente nas bordas da Serra e ia terminar sua vida no grande Oceano Atlântico, mesmo que se juntando por um breve momento a outros rios. O São Lourencinho depois de se jogar do planalto, surpreendentemente, se enfiava nas entranhas de um vale gigantesco e mudava seu curso quase que total para oeste e correndo por dezenas de quilômetros, voltava aos vestígios de civilização, indo serpentear por mais dezenas e dezenas de quilômetros em direção ao interior, até finalmente se juntar ao grande Rio Juquiá, esse por sua vez, afluente máximo do Rio Ribeira do Iguape.

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Nossas pesquisas sobre esse grande rio já durava mais de um ano e havíamos ido duas vezes ao seu encontro, uma para localiza-lo e a outra, uma expedição para localizar sua nascente, mas desta vez seria algo mesmo grandioso, onde a intenção era nos jogarmos gargantas abaixo até atingirmos a planície litorânea, coisa que nem sabíamos se era possível. Iria ser uma jornada suicida e de antemão, já intimamos todo mundo a “assinar” um atestado de responsabilidades individuais, deixando bem claro que todos estavam cientes de que ninguém seria responsável pela vida de ninguém e cada qual seria obrigado a cuidar da sua segurança, porque ali não existiria nenhum líder, guia e muito menos algum chefe de expedição. E esse tipo de procedimento passa longe de ser exagero, muito porque, não foram poucos os acidentes que já sofremos nessas expedições, inclusive com um acidente fatal.

 

Numa sexta-feira infernal, eu me encontrava travado dentro do ônibus que me trouxe de Sumaré-SP para a capital do Estado, parado completamente a menos de 1 km da famosa Rodoviária do Tietê, quando o Natan me avisa por telefone que nosso transporte motorizado para o inicio da travessia havia furado e que agora teríamos que partir para o plano “B” : o foda-se e seja o que Deus quiser. Me apresento com uma hora de atraso no local marcado e para não ser esculhambado, já dou logo um abraço em cada integrante daquele grupo de gente doida que se propôs a por suas vidas em risco por um propósito em comum, que na verdade, poucos entenderão . Além de mim, o grupo seria composto pelo Eduardo Loures, Daniel Trovo, Marcos Prince, Silvestre Natan, Vgn Vagner e pelo Rafael Soares. Não restavam dúvidas, aquele era um grupo extremamente forte e dessa vez eu tive certeza que aquela expedição lograria êxito com os pés nas costas, mais uma vez, estava enganado.

 

Na estação Faria Lima pegamos um ônibus para Juquitiba, que em pouco mais de uma hora nos deixou enfrente a entrada do Viva Parque e quando nos posicionamos embaixo do portal, foi que nos demos conta que já se aproximava da meia noite e estávamos realmente num beco sem saída, sem a mínima chance de conseguir um transporte para nos levar por uns 20 km estrada a dentro até o bairro rural de Pedra Lisa, num fim de mundo qualquer, perdido nas bordas das florestas da Serra do Mar. O grupo se separou em várias frentes , no intuito de conseguir um transporte . Tentamos conseguir que uma Kombi escolar nos levasse, mas o proprietário não quis nem abrir a porta da residência. Tentamos de tudo que foi possível, mas nada dava certo, até que uma Kombi com caçamba, voltando das entranhas dos bairros rurais e indo para São Paulo, surgiu à nossa frente. Claro que o sujeito não queria de jeito nenhum fazer uma viagem de volta para o fim de mundo de onde ele acabara de voltar, mas bastou balançar duas notas de 100 reais para os dois caras crescerem os olhos e antes mesmo que eles resolvessem pensar bem, já estávamos com as mochilas em cima do veículo, que rapidamente fez meia volta e se enfiou na escuridão da noite e foi se perdendo em tudo que é estradinha errada até que nos desovou bem na entrada da trilha e aquela foi a ultima vez que vimos àqueles caras, que provavelmente se perguntam até hoje, que diabos ia fazer sete elementos num mato sem cachorro.

 

Sem perder tempo, jogamos nossas mochilas às costa, ligamos nossas lanternas e nos pomos a caminhar pela estradinha serra à dentro e em 1 km passamos por um lago e em mais outro km tropeçamos num rancho infestado de cães raivosos, mas como da outra vez, lá estava o proprietário para segurá-los , no intuito de nos ver longe da sua propriedade o mais rápido possível . Meia hora depois acessamos o que já foi uma casa e hoje mal se consegue ver os escombros e foi ali que montamos nosso acampamento, lá pelas três da madrugada. Na verdade apenas bivacamos coletivamente até que um novo dia viesse a nos iluminar novamente.

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Surpreendentemente o dia que nasce é um lindo dia de sol, já que a metereologia havia previsto muita chuva para o feriado de carnaval. O grupo estava muito bem disposto e logo depois de rápido desjejum, partimos floresta à dentro, que logo atravessa um riacho e em pouco tempo nos leva novamente para o morro do escorrega. A trilha agora está bem demarcada e sinalizada depois que a abrimos por duas vezes, então de agora em diante não teremos dificuldades para percorrê-la e sem muito esforço atingimos a crista das samambaias e sem pestanejar em meia hora estávamos de novo no fundo do vale e aí foi só segurar o fôlego, subir mais uma crista até que a antiga estrada do Maluf, que hoje nem trilha é mais, acaba de vez e aí é hora de descermos até o vale e seguirmos o curso da água, desescalar pequenas cachoeiras e também nos surpreender com o horário em que desembocamos no GRANDE RIO SÃO LOURENCINHO.

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Ali estava ele mais uma vez. Parecia que me olhava e ria da minha cara, como a me dizer que não adiantava nem tentar, mais uma vez ele estaria pronto para me derrotar. E dessa vez ele se encontrava mais lindo do que nunca, uma beleza transparente, translúcida e sem igual. Ele se apresentou calmo desta vez, nem parecia o Lourencinho raivoso de outrora, mas mesmo assim eu desconfiei, poderia ser mais um subterfúgio para enganar os desavisados e antes mesmo que ele nos fizesse de besta, juntamos a equipe e botamos a faca nos dentes, unimos forças e nos lançamos vale à dentro, ele nos desafiou e a gente resolveu aceitar o desafio, mas cientes de que a jornada que estava por vir seria uma das maiores aventuras das nossas vidas.

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Onde estávamos não era necessariamente a nascente do rio, isso porque já havíamos explorado essa parte na segunda tentativa, quando fomos obrigados a abortar a descida por causa de um temporal que se abateu sobre a serra e que perdurou por três dias sem cessar. Mas agora não havia tempo ruim que nos fizesse voltar atrás e já nos primeiros passos, parte do grupo se jogou na água para aplacar o calor, mesmo não passando de dez horas da manhã. Não houve nem tempo para esquentar a caminhada porque na primeira curva do rio, já nos deparamos com uma garganta e a primeira cachoeira dessa parte do vale. No início alguns tentam se livrar da água, muito porque não são todos que portam mochilas estanque e evitam que suas cargueiras encharquem, mas isso é só questão de tempo porque logo à frente não há escalada que resolva e aí é hora mesmo de tocar o foda-se e mergulhar nos grandes poços e dar início à descida do maior parque aquático natural que já se tem notícias.

 

A próxima descida nos leva para mais uma pequena cachoeira e outro poço enorme e na próxima curva o vale se fecha e se comprime na forma de uma garganta, onde as pedras escorregadias já fazem o Vagner conhecer a dureza da rocha, explorando o terreno com sua bunda volumosa. À frente outro poço com correnteza, onde todos se pincham para dentro e se deixam levar pela velocidade da água. O ritmo é frenético, todos nós estamos com energia de sobra e o avanço é rápido porque todos são experientes em caminhar sobre rochas molhadas e dá gosto de ver a competência desse grupo, todo mundo em sintonia, desde os mais velhos até os jovens, são um só time e isso me agrada muito.

Mais algum tempo de caminhada e o trajeto faz com que tenhamos que varar uma pequena língua de mato pela direita e mais uma vez, presos nas pedras, nos jogamos novamente nas corredeiras. Alias, se jogar de cima de grandes pedras para dentro da correnteza iria ser praticamente a tônica desse primeiro dia, tanto que não deu tempo nem de escorrer a água da roupa e depois de uma passagem pela esquerda, já era hora novamente pular de cima de mais uma cachoeira.

O dia já ia se encaminhado para sua primeira metade e resolvemos que faríamos uma pausa para um lanche logo que encontrássemos um grande afluente que vínhamos perseguindo do nosso lado esquerdo, acontece que o afluente havia passado e nem nos demos conta de que aquele rio manso era o curso d’água que procurávamos. Bom, já que o tal afluente passou batido, resolvemos estacionar o esqueleto em um lugar mais favorável, mas antes desse trecho aparecer levamos o primeiro susto ao quase pisarmos numa cobra, ainda bem que era somente uma serpente inofensiva, que foi logo capturada pelo Prince para uma sessão de fotos e depois devolvida para sua pedra quentinha à beira do rio.

Com a barriga cheia, o caminho segue, mas não demora muito uma grande garganta nos trava o trajeto, meio que uma espécie de mini garganta do diabo, para aqueles que são de são Paulo e já se aventuraram pelo vale da morte ou pelo menos até a entrada do vale depois da cachoeira da fumaça de Paranapiacaba. Na entrada da garganta não era possível pular no rio e isso só foi possível depois que a gente passou se equilibrando nas bordas do cânion, até que atingíssemos o seu meio e dela despencasse no vazio. Aliás, essa pratica de se jogar de cima de grandes rochas nunca parava e em seguida nem mal andamos dez minutos outro poço gigante nos convida para um salto e mais à frente outra garganta faz a alegria dos mais afoitos saltadores de penhascos.

O Lourencinho dá uma alargada e começamos a progredir mais rapidamente até estacionarmos em mais um grande lago cercado por paredões de pedra e não tendo como fugir, o jeito foi jogar as mochilas e voar de novo para a água. A gente pulou daquela altura, mas eu sempre fico desconfiado , vai que um grande tronco ficou estacionado no fundo, então eu já pulava meio que evitando submergir muito, meio que uma espécie de barrigada controlada, mas quando outro grande poço chegou tivemos que estacionar e analisar bem nossos próximos passos.

Não era uma altura muito grande, mas claramente necessitava de certo cuidado. Alguns de nós estávamos meio tensos, mas o Rafael empacou e não ia de jeito nenhum, ficou sambando na pedra feito mulata de escola de samba e quando eu o questionei se ele ia ou não, ele se virou e me confessou que tinha medo de altura. Medo de altura? Viche ! Naquele lugar não havia espaço para esse tipo de medo não, e vendo que não havia outra saída, o sambista, (opsss) o Rafael fez o “sinal da cruz” e se lançou no grande lago e depois disso nem sei que fim ele tomou porque eu mesmo já despenquei atrás dele e tentei nadar o mais rápido possível para longe da cachoeira que insistia em nos querer juntinho dela. Mas quando eu comecei a nadar para beira das rochas, vi que algo estranho estava acontecendo. Quanto mais braçadas eu dava, menos eu saia do lugar e para piorar, eu havia saltado de cima da cachoeira com a mochila presa ao corpo, fazendo com que eu afundasse mais ainda. Foi um desespero ficar rodando e não avançar e para piorar, o Vagner também foi pego pelo redemoinho, que se formava porque a correnteza batia nas grandes paredes do poço e voltava para onde estávamos. Nesse vai e volta acabei foi engolindo um pouco de água e só consegui sair daquele sufoco porque consegui me segurar numa fenda da rocha e dela não larguei de jeito nenhum, até eu conseguir tomar fôlego, me acalmar e me lançar para longe da torrente de água. Por sorte o Vagner também conseguir chegar onde eu estava e nós dois juntos tratamos logo de picar a mula dali e ficamos de longe vendo o resto do grupo tentar desenroscar a corda que havíamos usado para descer algumas mochilas mais pesadas.

 

Há mais de três anos a gente vem se dedicando a essas expedições selvagens à Serra do Mar Paulista e durante todo esse tempo, já tiramos do mapa pelo menos uma dezenas de rios selvagens, mas nenhum destes rios, destas travessias de cânions e gargantas, nos apresentou tantos poços e lugares incríveis para lazer aquático, quanto o São Lourencinho. Esse é um rio diferente, tanto que foram muito pouco os vara- mato que tivemos que fazer e praticamente 90 % do trajeto é feito se jogando de cima das rochas e nadando dentro das gargantas, ainda mais porque esse rio tem uma característica bem peculiar, os poços são sempre bem protegidos, ou seja, sempre que o rio vai despencar vale abaixo, ele é precedido por lagos mansos, nos dando uma boa segurança para atravessar a nado. Mas como toda regra tem uma exceção, chegamos à beira de mais uma grande cachoeira e ali ficamos travados. O maluco do Trovo queria se jogar de uma altura de mais de 15 metros, sem saber se era possível sobreviver à queda no grande poço logo a baixo, mas depois de muito custo, conseguimos persuadi-lo a desistiu daquela ideia maluca e logo em seguida o Loures puxou a fila e foi abrindo mato no facão pelo lado direito, até que jogamos uma pequena corda e descemos freando como dava, uns despencando no barranco abaixo, outros freando com os dentes mesmo e aí tomamos o rumo do rio novamente e fomos escorregando até pararmos no espelho d’água.

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O dia já se aproximando do seu final e todo o grupo já está empenhado em achar um lugar razoável para acampar, quando mais uma enorme cachoeira se apresenta diante de nós. É realmente grande, mas é uma queda d’ água inclinada e com muita habilidade fomos descendo por dentro dela, aproveitando cada apoio para conseguirmos nos equilibrar sem despencar. Essa era uma cachoeira realmente linda e suas águas despencavam tomando vários lugares na rocha, como se cada pequeno riosinho resolvesse tomar um caminho diferente e por isso mesmo resolvemos batizá-la de CACHOEIRA VÁRIOS CAMINHOS. Um ajudando o outro e logo já estávamos nos jogando novamente no grande lago que se formou aos seus pés e mesmo antes de abandoná-la completamente, a gente já avistou uma garganta gigantesca e que provavelmente seria a grande cachoeira até aquele momento. O Trovo foi à frente e ficou olhando para o vazio e quando estávamos nos aproximando, ele já indicou que deveríamos sair pela esquerda, que era provavelmente para onde se dirigia o rio, mas antes fizemos uma pausa para apreciarmos aquele grande espetáculo de uns 50 metros de queda.

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A galera tirou algumas fotos do abismo, mas como eu já havia citado, a noite já se avizinhava e precisávamos achar um local para acampar a qualquer custo, já que ali era impossível descolar algo descente mesmo para armar sete redes. Dos sete integrantes, cinco foram à frente, tentando achar caminho pela esquerda, escalando um paredão gigantesco. Eu e o Loures ficamos mais atrás, acho que me demorei guardando a câmera que não era à prova d’ água e quando me juntei ao Loures, a gente achou que aquele caminho que eles estavam fazendo era totalmente desnecessário porque vislumbramos a possibilidade de evitarmos uma subida muito íngreme. Todos estavam a pelo menos uns 50 m ou mais paredão acima e já rasgavam a floresta no meio, quando eu e o Loures resolvemos deixar de lado qualquer outro caminho e tentar reencontrá-los novamente, não era hora de haver separação perto de acamparmos.

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O Loures se agarrou à parede e foi escalando como deu e já foi se encaminhando para onde estava o resto do grupo. Já quando fui tentar subir, não encaixei a pegada na raiz mais acima, minha mão escorregou e só não despenquei porque minha mochila travou nos cipós que envolviam a árvore. Voltei novamente e dessa vez cavei uma raiz e enfiei minhas mãos e me elevei e quando novamente alcancei o galho da árvore, me segurei nela com toda a minha alma, apoiei meu pé numa pedra, que por pouco não rolou de volta e dei impulso, me catapultando barranco acima. Quando me senti seguro, soltei logos uma meia dúzia de palavrões para amaldiçoar o desgraçado que havia escolhido aquela merda de caminho. Levantei-me, puxei um pulmão inteiro de ar e quando me preparava para dar o primeiro passo, só vi o Loures correndo na minha direção feito um touro bravo. Olhos arregalados, gritava desesperadamente para que eu voltasse para o buraco de onde eu acabara de subir. Foi nesse momento que eu ouvi o primeiro grito de desespero vindo do outro grupo e da boca Loures eu só ouvi as palavras: - VESPAS, VESPAS, CORRE DIVANEI!

Não importa o tempo que levei para subir, dei meia volta e sem por as mãos em lugar nenhum, despenquei de volta para baixo da parede. Escorreguei, cai, rolei, passeio feito uma piramboia ensaboada pelos cipós e espinhos e por tudo que é vegetação e em menos de um piscar de olhos já me encontrava de volta à beira do rio. O Loures veio logo atrás, arrastando mato no peito e logo se juntou a mim.

A cena que se seguiu foi um verdadeiro filme de horror. Gritos agonizantes, berros desesperados, pedidos de socorro. Eu e o Loures não nos movemos, na verdade nem respirávamos e ficamos paralisados diante daquela situação. Diante da agonia do grupo acima, eu só pensava que havia chegado a hora que a gente nunca quis que chegasse: a hora de retirar um corpo do meio da Serra. Alguns minutos depois a gritaria parou e um silêncio tomou conta de tudo e foi nessa hora que o nosso coração disparou, o que acabou por nos tirar da letargia em que nos encontrávamos.

Sabíamos que não seria seguro subir pelo mesmo caminho, então combinamos de nos afastarmos uns 50 metros para a esquerda e abrirmos novo caminho. A gente precisava saber o que havia acontecido com o grupo, mas não podíamos correr o risco de nos juntarmos aos acidentados, então caminhamos devagar, com extremo cuidado, sempre gritando para ver se alguém nos respondia. Uma voz vinda de longe reverberou nos nossos ouvidos como música. O Prince ou o Trovo, não sei direito, respondeu aos nossos chamados. O grupo já estava distante do foco do acidente. Por sorte estavam todos em pé e aquilo nos aliviou a alma e nos consolou o coração.

O grupo contou que haviam dado o azar de bater de frente com um enxame de abelhas e vespas e a maioria havia levado dezenas de picadas e necessitavam de serem medicados, mas era preciso voltar ao rio o mais rápido possível. Desesperados, nem quiseram dar muitos detalhes, já tomaram à dianteira e foram rasgando mato no peito e ao verem que o terreno havia ficado menos íngreme, empreenderam uma diagonal em direção à água. Na verdade, tocaram como deu, de qualquer jeito, sem se preocuparem muito com a grande inclinação que o terreno ainda apresentava. Nesse caminho, o Loures descia junto com o Rafael e por um grande azar, viu uma última vespa se depreender do cabelo enrolado do menino e pular direto para o seu olho e foi assim que eu me tornei o único explorador a sair dessa expedição sem experimentar nenhum “beijo” envenenado.

 

O local que saímos era mesmo muito bonito. Um grande lago aos pés de uma grande cachoeira que despencava de um afluente que alias, era o hospedeiro de uma cachoeira gigante que só conseguimos ver quando estávamos encima do barranco, onde o acidente aconteceu. Era uma cachoeira tão grande, que chegamos a calcular que poderia ter mais de 100 metros de queda e por isso à batizamos de MÃE DA SERRA , mas o local era realmente imprestável para acampar, mal havia árvores para montarmos nossas redes, só que naquela situação, com o dia já estando nas últimas, teríamos que nos virar por lá mesmo. Improvisamos tudo como foi possível e tivemos que nos contentar em acamparmos uns longe dos outros, mas deixamos os moribundos agrupados.

 

O saldo era o seguinte: O Prince estava muito bem, apesar das picadas. O Loures também estava bem, mas seu olho inchou tanto que desfigurou seu rosto. O Trovo ficou enjoado, mas ainda se mantinha em condições de ajudar a medicar os “feridos”. O Natan foi outro que também ficou meio grogue, mas nada que nos preocupasse muito. O Rafael era o cara que mais nos preocupou. Começou a vomitar sem parar, na verdade, estava em choque e esse foi o primeiro a receber os anti- inflamatórios que eu levei, mesmo assim vimos logo que ele seria o cara que ia requerer muito cuidado, principalmente quando ele citou que deveríamos chamar o resgate para tirá-lo do meio do vale, mas isso a gente iria discutir muito tempo depois.

Como nada é tão ruim que não possa piorar, a caixa de pandora se abriu sobre o coitado do Vagner. Ele havia sido agraciado com muitas picadas, mas antes mesmo do efeito do veneno invadir seu corpo, ele se tornou personagem de mais uma desgraça no meio daquele vale no centro selvagem da Serra do Mar. Estávamos todos reunidos embaixo de uma tenda, conversando sobre o rumo daquela expedição e ao mesmo tempo um fogareiro fervia uma grande panela de água para prepararmos uma parte da janta. Estávamos em um terreno inclinado e ao chegar ao estado de ebulição, a água fez balançar o fogareiro e o mesmo tombou de lado, fazendo com que a panela de água fervendo caísse toda no pé do Vagner. Poucas vezes vi alguém gritar tanto. Urrava mais que jagunço com cólica de rim. Imediatamente jogamos um cantil de água fria sobre seu pé e já o fizemos engolir alguns analgésicos, depois de deitá-lo numa rede.

Pronto, a tragédia estava completa. Havia um homem que vomitava sem parar e agora outro com um pé que se transformou numa pururuca. Reunimos-nos para uma conversa franca. No começo a palavra resgate até que andou saindo da boca de alguns, mas foi preciso lembrar a todos de onde estávamos. Havíamos descido um dia todo por um cânion dos diabos, só nos jogando de cima de grandes paredões e atravessando a favor da correnteza, grandes torrentes de água. Se fosse possível subir, jamais o faríamos em menos de dois dias, então essa hipótese estava mais que descartada. Até então tínhamos a esperança de saímos daquele vale em mais três dias de expedição, portanto aquele negócio de resgate era totalmente um absurdo da nossa cabeça, muito porque não havia comunicação com o mundo externo e se quiséssemos sair vivos, só poderíamos contar com nós mesmos. Para piorar, o Vagner começou a sentir o efeito do veneno e agora além de gritar, também tremia e vomitava. Fomos ministrando alguns remédios e tentando acalma-lo como podíamos. O pé dele estava feio, mas eu sabia que não haveria risco de morte por causa de um pé gravemente queimado, mas era preocupante se caso ele entrasse em estado de choque grave. O Rafael continuava a vomitar e aos pouco os outros começavam a sentir o efeito do veneno. Medicamos todo mundo e aí eu fui tentar deitar um pouco, estava exausto e um pouco abalado com toda aquela situação.

 

Mal me deitei na minha rede e já ouvi os gritos desesperados do Loures, gritando para que ajudássemos socorrer o Vagner. Quando desci da rede, me esqueci da inclinação do terreno e quase despenquei barranco abaixo. Chamei o Prince e corremos para lá, bem na hora de ver o Vagner mais uma vez, quase dar seu ultimo suspiro de vida. Estava tremendo feito vara verde e teve que engolir mais um antitérmico e um analgésico. Mas não era só ele não, os outros já começavam a sentir também o efeito devastador das picadas de vespas. O Natan já tava xarope e não dizia nada com nada e o Trovo já começava a dar sinais que seria outro a sucumbir de vez.

 

A noite foi mesmo tensa, parecíamos estar num hospital de guerra e foi assim, entre gemidos e murmúrios que o dia nasceu novamente. Parte da galera passou quase toda a noite vomitando e cagando e ao amanhecer , alguns que passaram a noite delirando, juraram de pés junto que uma onça havia nos visitado e que o próprio felino havia defecado perto das nossas redes, uma bela desculpa esfarrapada para quem não se deu ao trabalho nem de trepar no barranco para se aliviar, mais uma lorota para entrar na lista de tantas outras. ( rsrsrsrssrr)

 

O fato é que o Rafael estava novamente restabelecido e o Vagner não sentia mais dores nas queimaduras do pé. Mesmo assim ainda nos preocupava como ele sairia andando de dentro do vale pelos próximos três dias. Desmontamos nosso acampamento e o Trovo e o Rafael foi o encarregado de fazer o curativo no pé no Vagner. O resto do grupo ainda tinha uma missão a cumprir: Subir o rio por uns 20 minutos para fotografar a grande cachoeira que havíamos visto somente por cima no dia anterior, pouco antes do acidente acontecer. Então sem perder tempo, já nos jogamos nesse poção que estávamos acampados e nadamos até o pé da pequena cachoeira e já a escalamos rapidamente, deixando também para trás a grande cachoeira do afluente da Mãe da Serra e nos lançamos em mais um grande lago superior, até que à nossa frente se descortinou um dos maiores espetáculos do vale: Uma grande cachoeira de uns 40 ou 50 metros de altura despencava vertiginosamente para dentro de um grande lago. Foi um momento mágico aquele que vivemos ali, sabíamos nós que muito provavelmente aquela era a primeira ou uma das primeiras equipes a botarem os olhos naquela maravilha. Tínhamos certeza que havíamos feito história naquele momento e se um dia alguém chegou ali, jamais contou para ninguém e seria provável que a foto que havíamos tirado ali, seria a primeira foto publica de que se tem notícia e não haveria um nome mais significativo para batiza-la se não o de CACHOEIRA DAS VESPAS.

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Fizemos a maior festa naquela cachoeira, mas o tempo urge e tínhamos muito caminho pela frente, portanto lavamos mais uma vez a alma e retornamos rapidamente para junto do resto do grupo, que já nos esperavam ansiosos para partir. O Vagner calçou suas botas e não as tiraria mais durante o restante daquela expedição, comprovando que os meninos haviam feito um grande trabalho no que tange aos curativos.

 

O dia já se aproximava das onze da manhã quando partimos. O sol reinava soberano no céu e o calor se fazia presente, como nunca antes havíamos pego em uma travessia selvagem. O rio não mudara em nada, se comparado ao dia anterior, continuava com suas águas translucidas e se apresentava sempre à nossa frente com as mesmas gargantas e poços impressionantes, que fazia a alegria da galera, mesmo porque, o moral do grupo já estava novamente de volta e todas as angustias e preocupações foram deixadas no “acampamento vômito”.

 

Um pulo, dois pulos, três pulos e um mergulho profundo em mais um cânion e vamos deslizando por baixo de grandes pedras, envolto em grandes correntezas. Quando tem que escalar, a gente escala, quando tem que saltar de grandes pedras para outras pedras tão grandes quanto, a gente salta. A vida naquele vale selvagem se resume a vencer obstáculos e cada um se dedica a superar seus próprios medos e suas próprias limitações. Se pudéssemos olhar de fora veríamos claramente que esse é um grupo envolto numa felicidade incontrolável, veríamos os olhos de cada um brilhar a cada curva porque esses meninos haviam encontrado o que se propuseram a buscar. Fomos atrás de aventura, não uma falsa aventura, uma aventura autêntica, aventura verdadeira, aquela que só nos faz buscar a vontade incontrolável de permanecer vivos. Mais uma mochila é jogada no vazio e mais um homem pensando ser Ícaro, voa para dentro do rio e desaparece no fundo do poço para reaparecer mais à frente e assistir de camarote os outros Ícaros tomarem o mesmo caminho e ganharem nota dez no quesito salto sincronizado e todos seguem juntos até serem vencidos momentaneamente por mais uma cachoeira, onde o grupo de reuni para estudar como será vencer mais esse obstáculo.

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O calor era forte e por isso mesmo uma nuvem matreira começou a nos acompanhar. Vencemos a próxima cachoeira por dentro dela, cada um se segurando como pode para não ser carregado pela água e quando a coisa complicou, bastou deixar a força do rio nos levar direto para o poço logo abaixo, de onde saímos nadando até o início da próxima garganta fechada. E essa não era uma garganta qualquer, era uma garganta com um lago exprimido por suas paredes que tinha uma extensão de uns 100 metros de comprimento. Justamente nessa hora a nuvem que nos acompanhava desabou sobre nossas cabeças em forma de um temporal, por isso mesmo tratamos logo de nos jogarmos no rio e passarmos aquele trecho rapidamente antes que uma possível cabeça d’ água pudesse vir a nos atingir. Foi sul real estar nadando naquela garganta com uma chuva momentaneamente devastadora. Uma cena linda de ver e de viver. Eu era o último homem e acompanhava de perto o Vagner, os dois dando braçadas inúteis, que mal levava a gente a lugar nenhum. Então resolvi me aproximar da parede rochosa e usá-la como uma espécie de trampolim para me impulsionar mais à frente, foi nesse momento que o Vagner, que não sabe nadar, mas estava de colete, começa e se torcer todo como se estivesse sido possuído pelo caboclo “puxa perna”. Se contorcendo de dor, começou pedir ajuda, mas eu mesmo já estava envolvido na minha desgraça pessoal, já que além de não enxergar coisa alguma com aquele aguaceiro todo, ainda tentava escapar da minha própria mochila que insistia em querer me afogar, já que estava com ela nas costas. Respirei fundo e consegui me desprender da mochila e me valendo de um galho de um tronco submerso, cheguei até o Vagner e agarrei sua mão e o trousse para junto de mim e ficamos os dois agarrados feito siri no pau até que ele conseguiu se livrar das câimbras e eu consegui tomar fôlego e juntos saímos em grande estilo, ou nem tanto .( rsrsrssr)

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Do mesmo jeito que veio, a chuva se foi, não durou nem 15 minutos e logo em seguida o sol voltou a ser novamente o oitavo companheiro dessa expedição. À frente, o rio se estreita um pouco e com muita dificuldade o Prince conseguiu passar para a outra margem, correndo o risco de ser jogado vale abaixo. Nesse momento vimos logo que ali seria necessária uma corda para dar uma segurança. principalmente para os “ meio quilo”, como eu, por exemplo. Do outro lado do rio, o Loures e o Prince seguravam uma ponta da corda, enquanto a gente se agarrava nela e se jogava na correnteza, sendo arrastado até a beira da queda, até se agarrar na pedra e se puxar para cima. Mas eu não dei bobeira porque já assisti vários filmes como aquele. Amarrei a corda envolta do meu corpo e me segurei o máximo que pude e antes de me atirar na água, já dei um aviso em alto e bom som para que os caras prestassem atenção para não me deixar cair cachoeira abaixo. Passei fácil, mas ainda assim sempre fico tenso nessas passagens de cordas, onde sua vida depende exclusivamente de outrem.

 

O terreno começa a ficar menos íngreme e aí começa o festival de gente boiando nas águas e despencando nas pequenas cachoeirinhas. Era só se segurar e deixar a natureza seguir o seu curso e quando era hora de ver o mundo como passageiro da correnteza, bastava apenas erguer os pés e se deixar despencar para o desnível mais abaixo, num verdadeiro parque de diversões aquático. Quando o rio se alargava e ficava raso, era hora de caminhar e ganhar terreno, avançando rapidamente, seja pelas margens do Lourencinho, seja pulando de pedra em pedra e às vezes corendo o risco de escorregar e ir parar com a fuça no fundo do rio.

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Bom, havia sido mais um dia lindo de travessia e a galera estava toda em êxtase com o lugar. Quando comecei os estudos sobre o São Lourencinho, muitos torceram o nariz, dizendo que era pouco provável que o lugar tivesse algum potencial para uma expedição de peso, mas agora estávamos convencidos de que estávamos vencendo um dos lugares mais fascinante do país, mas o dia estava mesmo no seu final e quando tropeçamos em uma grande afluente do lado esquerdo, nadamos para a sua margem e demos de cara com uma clareira plana, cheia de árvores gigantes e surpreendentemente, com sinal de passagem humana. Dois cortes de facão denunciavam que alguém já estivera por ali, o que nos levou a crer que poderia haver uma trilha, mesmo que muito selvagem, que pudesse nos levar de volta à civilização, já no litoral.

 

Independente se haveria ou não a tal trilha, não tínhamos o que discutir. Aquele era o lugar mais perfeito que já havíamos encontrado em mais de três anos de expedições, uma área linda e que poderia agregar dezenas de pessoas e então foi unanime a decisão de acampar ali e sem pensar muito, jogamos às mochilas ao chão e encerramos mais um dia de caminhada. Montamos as redes com calma, colocamos todos os toldos e fomos cuidar do jantar e para garantir a segurança do grupo, montamos os fogareiros no ”alto da colina”, vai que né .......... ? ( rsrsrssrsrsr)

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A noite foi quente, fez um calor de lascar e infelizmente os borrachudos ou mosquitos pólvora não deram trégua para quem, como eu, não havia levado o mosquiteiro. Consegui dormir apenas por duas horas e pouco depois das seis da manha já pulei para fora da rede para mais um dia de aventuras. Vasculhei o local em busca da tal trilha que poderia haver, mas nada encontrei. Começamos a desconfiar que se essa tal trilha existisse, poderia estar bem mais abaixo do rio e então paramos de procurar, desmontamos tudo e partimos nos valendo das margens planas e de mato ralo, onde caminhamos por um tempo, mas logo o mato fechou e logo cedo a gente já caiu no rio e atravessamos um grande poço de águas esverdeadas para avançarmos mais rapidamente pela margem direita.

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O rio se alargou muito e agora suas curvas ficavam profundas e a todo momento era preciso empreender umas braçadas para transpor de um lado para o outro. O caminhar era tranquilo e rendia muito, mas as pedras lisas ainda não perdoava quem se desse ao luxo de perder a concentração. Por vezes era possível andar pelo mato, mas não durava muito e logo lá estávamos nós, nos jogando no rio e nadando sem parar. Menos de uma hora de caminhada, numa curva do rio demos de cara com um rancho improvisado de pescador. E mesmo tentando, não vislumbramos qualquer trilha que pudesse nos tirar de dentro daquele vale e nos devolver ao litoral, mesmo que fosse por um dia inteiro de andanças.

 

O céu e a mata vai passando rápido e às vezes tudo vira de ponta cabeça e posso avistar parte do grupo que vem logo atrás de mim. Sou como um graveto a deslizar sem rumo e sem direção nas águas correntes do São Lourencinho. Uma pedra mais afoita insiste em abalroar minha bunda ou minhas costelas, mas logo quando posso, volto à posição original e bem em tempo de prender a respiração, antes de afundar na torrente mais à frente. É um grande barato se deixar levar pela correnteza. A gente volta a virar criança, não quer que aquilo acabe nunca mais, somos passageiros da vida e nessa hora não estamos mais nem aí para nada, a gente não se importa com coisa alguma, não estamos sobre as regras de nenhuma sociedade e cada qual faz o que bem quiser, age como bem quiser. Aquilo não faz parte do mundo, é como se entrássemos num portal para fora da realidade e embarcássemos em outro mundo de sonhos e a felicidade fica plena quando mais malucos vem sonhar os nossos sonhos, no caso, se jogando na mesma corredeira e se deixando levar para a terra da aventura.

 

Logo as grandes ilhas, que vínhamos acompanhando pelo mapa, aparecem e aí é preciso escolher um dos lados do rio, que nessa hora fica raso e de fácil locomoção e quando o dia já ia pelo meio, estacionamos numa grande ilha onde o rio se partia em três e ali paramos por uma meia hora para um lanche providencial. Ainda não sei o porquê, mas parte da galera resolveu batizar aquela ilhota de rio de Ilha São Matheus, talvez em alusão a alguma referência local perto de suas casas , mas que eu ainda desconheço.

 

O fato é que mesmo a gente avançando rápido pelo rio, agora sem muito desnível, eu já há muito tempo tinha chegado à conclusão de que o tempo estabelecido para aquela travessia já tinha ido para o saco faz tempo, inclusive cheguei até a comentar informalmente com alguns deles. Já estávamos no começo da tarde do terceiro dia e pelas minhas contas ainda tínhamos pela frente quase 20 km de muito rio para descer, mesmo que no seu final, vislumbrando a possibilidade de encontrarmos alguma trilha pela margem nos últimos 5 km. Naquele ritmo, e não havia como ir mais rápido que aquilo, só chegaríamos ao final na quarta feira de cinzas, perfazendo assim cinco dias de caminhada. Mas um acontecimento iria mudar radicalmente os rumos daquela expedição.

 

Depois de atravessar muito rio à nado o destino nos presenteou com uma surpresa, quando o rio fez um grande cotovelo de quase noventa graus. Todo o grupo tentou passar pela margem direita do rio, mas eu nadei para outra margem e subi o barranco tentando cortar caminho pela floresta para ganhar tempo e foi quando subitamente tropecei em um acampamento de caçadores. Quando vi aquela lona azul se destacando no meio da mata, de onde subia uma fumaça proveniente de um fogão a lenha improvisado, dei um grito e alertei a galera sobre o achado. Mas nem havia necessidade do aviso, logo o grupo ouviu os latidos estridentes dos cães que denunciavam os caçadores escondidos no mato. Parte do grupo se aproximou e chamou-os, mas os caras desconfiados, somente responderam rispidamente as perguntas que eles fizeram. Nosso grupo perguntou como poderíamos voltar o mais rápido possível para a civilização e os caçadores, que segundo me falaram, já que eu estava na margem oposta, disseram que estávamos a meras duas horas de uma habitação, descendo o rio. Claro, aquilo era uma mentira deslavada e logo percebemos que os caras queriam era se livrar da gente o mais rápido possível. A gente sabia que aquele rio corria encravado no meio de um vale gigante e era totalmente selvagem e a única maneira de achar uma saída era cruzar por uns 10 km de floresta morro acima até atingirmos o a borda da serra e aí descer vertiginosamente de cima de uma montanha de mais de 300 metros para o litoral.

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O caso é que a gente notou logo que aqueles caras eram homens de pouca conversa e ao perguntarmos sobre uma possível trilha, eles desconversaram rapidamente e apenas disseram que existia a tal trilha, mas jamais conseguiríamos segui-la, já que era totalmente fechada e sem uso e nos perderíamos muito fácil e que deveríamos pegar mesmo o caminho da roça,( opssss), do rio. No fim , todo mundo atravessou o rio e vieram ao meu encontro , perto do acampamento dos caçadores. Eu estava convicto que qualquer trilha, mesmo fechada ou não, seria muito melhor que continuar pelo rio. E foi mesmo uma grande sorte a nossa de encontrar essa trilha bem atrás do acampamento e antes mesmo que os caras resolvessem vir atrás de nós, nos enfiamos mato adentro e aceleramos o mais que pudemos, até nos perdermos da vista deles.

No começo a trilha até que era nítida e corria em nível, atravessando um riacho por várias vezes, mas uma meia hora depois, quando atingiu o fundo do vale, se perdeu no meio do nada e aí ficamos a ver navios em plena Mata atlântica. Realmente começamos a perceber que os caçadores tinham razão quando disseram que a trilha quase não existia, muito porque, eles mesmo não faziam questão nenhuma de deixá-la aberta, no intuito de que ninguém pudesse encontra-los nas suas atividades ilícitas naquele fim de mundo. O grupo teve que se revezar para que aquela travessia pudesse continuar e a todo momento era preciso usar nossos faros de trilheiros para buscar o rabo do caminho, que insistia em mudar de direção a todo momento, até que finalmente encostou no pé de uma montanha e sem dó e nem piedade, tocou o pau para cima e foi aí que a porca torceu o rabo para o meu lado.

 

Eu já havia entrado nessa expedição meia boca. Estava fazendo tratamento do joelho e só me arisquei mesmo porque não passava pela minha cabeça ficar de fora dessa descida final, além de que, eu havia passado meses estudando e me dedicando para que esse rio pudesse sair do mapa, inclusive já havia estado naquele fim de mundo por duas vezes, uma para achar o rio e a outra para encontrar e explorar sua nascente. Junte se a isso mais dois fatores: eu não havia dormido mais que duas horas na noite anterior por causa dos malditos pernilongos e agora havia comprado uma mochila estanque, que é ótima para a parte aquática, mas por não conter uma barrigueira, já tinha destruído meus ombros. Vai ter uns filhos da puta que vão citar um terceiro fator e irão jogar mais o peso da minha idade nessa conta, mas é pura intriga desses novinhos folgados. (rsrsrsrsr) O fato é que com aquela subida interminável, eu comecei a bambear as pernas e só acompanhei o grupo de perto porque não me dei por vencido, mas minha vontade era mesmo de arriar a mochila e acampar logo. Aquela subida desgraçada não acabava nunca e quando ela chegou a sua metade, notei que uma parte do grupo já compartilhava do meu sofrimento. A água acabou, mas o desgraçado do morro não e quando pense que finalmente iríamos desembestar ladeira abaixo, a subida continuou até dar uma nivelada e nos jogar bem numa grande moita de bambus, onde outrora deveria haver um rancho. Aproveitamos para tomar um balde de água junto ao riacho aos pés do bambuzal e quando já havíamos secado o córrego, partimos novamente para mais uma rodada de sofrimento. A trilha contorna o bambu pela nossa esquerda, passa para o outro lado da água e mais uma vez se perde na floresta. Não demora muito e a gente chega a uma grande clareira, bem numa parede inclinada, onde em seu sopé foi construído mais um rancho, que por estar abandonado, não passava de uma tapera, mas que os meus olhos enxergaram um grande hotel de luxo e até mencionei da gente acampar ali, mas todos fingiram não me ouvir e me deixaram no vácuo.

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Foi nessa hora que o Prince e o Loures já sinalizaram que também queriam acampar e que aquela correria toda, que parte do grupo resolvera empreender, já não fazia mais sentido, porque estava claro que de um jeito ou de outro, aquela expedição seria finalizada dentro do prazo que havíamos estipulado e que a única coisa que poderia acontecer era a gente conseguir sair na civilização altas horas da madrugada e termos que dormir em algum lugar miserável até o sol raiar. Mas gente é bicho teimoso e como não foi possível persuadi-los a acampar em um lugar mais descente, perto da água, botamos a faca nos dentes e fomos nos arrastando atrás. Eu já nem fazia mais questão de dar nenhuma opinião, apenas tentava manter o foco nas ultimas energias que ainda me restavam e tentava esquecer as bolhas enormes que os meus pés carregavam. Em um dado momento a nossa trilha desembocou bem no barraco de lona de dois mateiros e quando notamos, já estávamos de frente com os dois senhores. Imediatamente os caras trataram de fazer com que a gente nem se aproximasse da rústica habitação. Alguns acham que não, mas na minha opinião os caras escondiam alguma coisa ilícita no barraco, muito provavelmente mais um animal morto proveniente de alguma caçada. O bom foi que os caras nos levaram até onde havíamos perdido a trilha e nos disseram que rapidamente estaríamos de volta à civilização.” Tá , sei !” Pra mim foi mais um jeito de se livrar da gente, porque não demora muito e a gente novamente já não encontrou trilha alguma, que muito provavelmente havia sido engolida por várias arvores tombadas. A noite já havia desembarcado na floresta quando um monte de gente tonta rodava para lá e para cá tentando uma conexão para casa. Eu apenas estacionei meu esqueleto cansado e assisti de camarote o Natan e companhia saírem voados quando uma cobra quase passeou sobre o corpinho dos meninos, mas a seguir todo o grupo presenciou o Eduardo Loures tombar de cima de um barranco, depois que uma jararacuçu resolveu dar um bote na sua perna e se não fosse a proteção de couro, esse seria mais um a sair carregado dessa travessia. O fato é que o Loures levantou assustado e com mais um corte na testa e esse coitado foi mais um a voltar todo estropiado para casa.

 

Aquela cena do Loures tomando o bote da cobra e rolando barranco abaixo foi a deixa para a gente dar um basta naquela situação dos infernos. Era hora de parar, botar a cabeça no lugar, descansar e deixar aquela exploração para o outro dia. Por sorte encontramos um ótimo lugar para passar a noite. Montei minha rede perto de uma pequena fogueirinha que o Prince fez, com a ajuda de outros. Eu já estava farto de tanto borrachudo que mesmo com muito repelente não davam trégua. A noite estava linda e nem toldo usamos, mas havia um problema: ninguém tinha água para cozinhar e nem para matar a sede e logo vimos que aquela seria uma noite de cão. Foi quando o Loures e o Trovo se propuseram a descer em alguma “piramba” e encontrar algum veio de água. Os caras partiram e só retornaram lá pelas onze horas da noite e na bagagem, uns 10 litros de água fresca. Foram recebidos com festa e com todas as honras do qual haviam merecido. Todos se levantaram de suas redes e foram cuidar do jantar em volta da fogueira e quando a gente não aguentou comer mais nada, nos jogamos para dentro dos nossos sacos de dormir e morremos, até que um novo dia viesse a nos despertar para mais uma jornada de aventuras.

 

Acordei renovado, totalmente descansado e disposto, era outro homem depois de uma ótima noite de sono, mas ao contrário de mim, a nossa situação continuava na mesma: Ainda estávamos “perdidos” em um lugar qualquer no meio da floresta e encima da montanha. Claro que sabíamos que bastava perdermos altura em direção ao litoral que encontraríamos uma saída. Tentamos seguir por um caminho que ao primeiro momento nos pareceu uma trilha, mas do mesmo jeito que apareceu, sumiu do nada e aí não nos restou outra alternativa senão a de apontar o nariz para direção que pretendíamos e arrastar uma floresta inteira no peito, às vezes nos valendo de pequenos veios d’ água ou canaletas de chuva para conseguirmos prosseguir com mais destreza. Fomos perdendo altitude aos poucos e em um determinado momento encontramos um riacho, onde paramos para um bom descanso e um gole de água, mas ao recebermos a visita indesejada de uma jararaca raivosa, tratamos logo de picar a mula dali e voltar para nossa labuta.

 

A descida final é por dentro do riachinho e quando encontramos uma mangueira preta, não tivemos mais dúvidas de que a saída estava muito próxima. Mais uns minutinhos e um telhado de uma habitação nos saltou aos olhos por uma fresta da floresta e aí corremos para sua direção e desembocamos em um gramando, onde um casebre abandonado, sabe-se lá há quanto tempo, nos recebeu com um grande sorriso no rosto. Havíamos conseguido, finalmente estávamos de volta à civilização! Era um local caindo aos pedaços, onde um grande trator, mesmo carcomido pelo tempo, sobrevivia bravamente. Aproveitamos para descansar, comer umas goiabas, chupar umas canas e nos lançar ao ócio por algum tempo.

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Havíamos conseguido um grande feito ao localizarmos aquele rabo de trilha à beira do rio, quase no final do terceiro dia. Claro que a gente teve que navegar por mais de 10 km arrastando mato no peito e nos expondo a todo o perigo que a mãe natureza nos impôs. Por incrível que pareça fomos sair bem próximo ao local conhecido por abrigar a cachoeira do Ouro, no sopé da Serra do Mar, em Peruíbe. De onde estávamos, bastou sair da propriedade abandonada para ganhar a rua, onde viramos para a direita e em alguns minutos interceptamos a própria Estrada do Ouro e pegamos o sentido contrário ao da cachoeira famosa e em 20 minutos, jogamos nossas mochilas ao chão, bem encima da ponte, onde o próprio rio cruzava por baixo e onde nos disseram que seria um ponto de ônibus.

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O dia nem havia chegado a sua metade e como o ônibus ainda ia demorar, parte do grupo matou o tempo se jogando de cima da ponte. O grupo estava mais unido do que nunca, mas quando uma família, que fazia um churrasco na beira do rio, resolveu jogar alguns pedaços de carne no meio da galera, foi aí que alguns resolveram mostrar a cara da fera irracional que habita nos seus interiores. Saiu no lucro os que só levaram cotovelada no nariz e para não perder amizade, não vou apontar o dedo para os caras que usaram de subterfúgios baixos para levar vantagem sobre os demais. Só quando o ônibus chegou é que aquela cachorrada se espalhou e todo mundo tratou logo de pegar suas mochilas e se atirar para dentro do veículo motorizado e finalmente dar um descanso para suas pernas. O “cata traste” levou mais de uma hora para nos desovar na rodoviária de Peruíbe e antes de voltarmos para a capital Paulista, nos encostamos-nos a um restaurante para comemorar o sucesso daquela expedição. Por sorte conseguimos um ônibus rápido para o terminal do Jabaquara, onde a galera se despediu e cada um foi se perder para a maloca de onde havia saído a quatro dias atrás e eu só cheguei em Sumaré, no interior do Estado, no final da noite, cansado e mais que feliz que pinto no lixo.

 

Foi mais uma grande EXPEDIÇÃO e sem dúvida nenhuma, foi mais uma grande honra poder tido a oportunidade de botar mais um grande rio no mapa do Estado de São Paulo. Foram muitas idas e vindas, madrugadas perdidas estudando mapas e traçando estratégias para que a empreitada pudesse sair do papel. Foram necessárias três incursões naquele fim de mundo selvagem, com logística difícil e complicada. Foi necessário juntar uma dúzia de pessoas, de velhos aventureiros que se dispuseram a deixar suas famílias e suas casas para um objetivo em comum. Esse vale do Rio São Lourencinho foi mais um achado nessa serra desconhecida, mesmo estando tão perto da maior cidade da América do Sul. Deparamos-nos com grandes cachoeiras, cânions incríveis, vales espetaculares e gargantas encantadoras e tudo regado por uma água com 100% de pureza, que corre livre dos olhos da raça humana, já que nasce longe de qualquer vestígio de civilização. O grupo que finalmente venceu aquele vale não é nem de longe um grupo com super poderes, com habilidades fora do comum, ninguém é mestre em escalada, nem em mergulho, nem em navegação, nem são os mais fortes e muito menos os mais rápidos. É um grupo formado por gente comum, como outro qualquer, mas o que nos difere é a grande capacidade de aguentar todo tipo de desgraça que a natureza selvagem pode nos jogar às costas. Esse é um grupo que brilha os olhos, quando ouve a palavra AVENTURA SELVAGEM e quanto a isso, a SERRA DO MAR PAULISTA, não deve nada a nenhuma outra serra do Brasil.

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Divanei Goes de Paula – fevereiro/2017

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  • 1 mês depois...
  • Colaboradores
Postado

Show, depois de assistir o vídeo de vocês cheguei a conclusão que meus trekkings são uma voltinha no shopping hahaha. Parabéns !!!

  • 4 semanas depois...
  • Membros de Honra
Postado

Obrigado Ricardo RM,

Esse projeto de Expedição selvagem na Serra do Mar Paulista já dura uns 5 anos e sempre estamos trazendo lugares novos, descobrindo novos caminhos.

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