Membros Micael Salton Postado Julho 3, 2014 Membros Postado Julho 3, 2014 Tentam nos convencer que o agora é o fim da história e que o inferno de tédio ou de esforço diário por que passamos é a maneira natural das coisas serem, como se ser escravo fosse algo inerente a ser humano. Se você já parou, olhou em sua volta e pensou que há algo muito errado acontecendo com o mundo e com sua própria vida, se você espera os finais de semana ou as férias para “poder viver um pouco”, se você passa a maior parte do dia em um pântano de tédio efetuando uma atividade alienante em proveito de pessoas das quais você nunca viu o rosto, talvez seja a hora de despertar desse sono e agarrar sua vida de volta. Aprender e mostrar a mudança, apresentar possibilidades, uma maneira diferente de viver e de encarar a vida, bem vindo(a) ao Projeto Alternativa Propomos assim abraçar o nomadismo como forma de vida. Nosso meio de locomoção são as bicicletas, não deixaremos nunca de pegar caronas, atividade a que nos acostumamos tanto no último ano, mas uma capacidade maior de autonomia é necessária. Começaremos nossa jornada incerta no interior de Goiás, não temos planos ou roteiros estritamente definidos, sendo o primeiro plano chegar a Amazônia e de lá provavelmente cruzar a fronteira para Venezuela, mas nossa mente está sempre aberta para mudanças drásticas de e tudo é possível. Por hora eis o relato de nossa primeira de 200km, destinada a ser apenas uma teste acabou sendo incrivelmente rica e prazerosa. Saímos de Brasília dia 10 para percorrer os 200km até Alto Paraíso, a primeira vez realmente na estrada com bicicletas carregadas. Logo na saída subidas intermináveis e muito trafego, foi como poderia se esperar, o pior trecho para testarmos nosso equilíbrio com tudo montado. Em uma das subidas o bagageiro de Karine quebrou, paramos em um posto onde um caminhoneiro conseguiu uns pedaços de arame que usamos para remendar o estrago. Partimos desanimados, o pensamento de ter de voltar para Brasília era muito desgostoso. Dizia para mim mesmo que logo a estrada que queríamos chegaria e tudo melhoraria com menos carros e ambientes menos urbanos, aquela loucura de cidade grande simplesmente parece não combinar com o que significa de bicicleta. No fim a entrada para a DF-345/GO-118 chegou, mas apenas às 20:00h, após um longo trecho de uma subida pouco íngreme mas muito extensa em que empurramos as bicicletas praticamente o tempo todo, usando as lanternas de cabeça e as luzes sinalizadoras atrás. Logo que entramos na DF-345 já avistamos o nosso destino, secundárias que beiram a rodovia, usadas por tratores e maquinas agrícolas para mover-se entre as fazendas, lugares perfeitos para passar a noite, atrás do cerrado, escondido o bastante do asfalto e dos poucos carros que passavam. O começo da noite de stealth camping trouxe um pouco de ansiedade com vozes longínquas alcançando nosso ouvidos aguçados pelo silencio, mas logo o sono chegou e a noite passou tranquila. No outro dia nosso estoque de barras de cereal e frutas já acabava e comida de verdade era necessária, uma placa de self-service (buffet livre) a R$10,99 atiçou o estomago e seguimos pelos 15km até o destino. Chegamos e além do almoço tomamos um banho de graça no posto. As 14:00hs pedalamos sol a dentro para um dia inteiro até São Gabriel – Goias, onde o bagageiro emendado quebrou de vez derrubando tudo de cima da bicicleta, não havia mais conserto com arame, teríamos que amanhecer ali e tentar soldar a coisa toda. Ganhei um saco de amendoim e a informação que o posto permitia acampar para passar a noite, além de ser perfeitamente seguro. No posto ganhamos uma salinha VIP para montar a barraca, tomamos o segundo banho grátis do dia, ultra quente para relaxar. Cozinhamos um miojo no fogão de um caminhoneiro que nos prometeu carona no dia seguinte, o sono não demorou para chegar Acordamos e assim que a serralheria abriu levei o bagageiro para arrumar. Conseguimos sair pouco antes das 9:00hs mas antes de chegar na estrada vimos o caminhoneiro da noite anterior passando, a carona tinha sido perdida. Pedalamos 20km de grandes descidas chegando aos 50km/h e ao parar para curtir a sombra de uma placa na estrada um caminhão buzinou e encostou, deu ré e quando vi já cortávamos o cerrado acomodados na caçamba aberta, sempre a melhor forma de caronar. Levou-nos até São João da Aliança, seu Esmeraldo disse que sempre ajuda quem viaja e nos pagou um almoço. Deixamos São João esperando passar a noite na estrada e chegar em Alto no dia seguinte, mas tudo mudou quando um carro encostou. Em 10min estávamos na fazenda do Mário do Balanço, na beira de um rio com um balanço incrível onde me diverti muito. Mário planta quase de tudo, tem vaca, galinha, porcos e abelhas, ajudei-o com as abelhas realizando um sonho antigo. Mário cuida de tudo junto de sua companheira, é uma quantidade de trabalho enorme que ele realiza diariamente acordando cedo e dormindo já tarde, provamos de seu queijo caseiro, do leite da vaca, do mel direto das abelhas que trabalham com pólen nativo da reserva de cerrado que ele mantém, um mel surpreendentemente cheiroso, de sabor pungente e muito característico, uma delícia acompanhando o bolo de milho plantado na fazenda, colhido e feito na hora. No dia seguinte ajudamos Mário a colher mexiricas para vender em Alto e ganhamos a carona até nosso destino, além de tudo Mário ainda tinha generosidade o bastante para pagar-nos o marmitex no restaurante do posto. Nos despedimos com promessas de voltarmos para ajudá-lo um pouco com sua terra. Os 200km de teste acabaram, aprendemos algumas coisas e ficou claro que nossa disposição de bagagem sem uso de bagageiros laterais é problemática. Será preciso reforçar os bagageiros traseiros, os dianteiros apesar de fixados com gambiarra trabalharam perfeitamente. Um arame fincado no pneu provou que o anti furo realmente funciona e vale seu investimento. No fim o sentimento de estar em uma correnteza que apenas o leva de um lado ao outro está de volta, seja de carona ou de bicicleta, as mesmas coisas boas acontecem e cada vez que um elo se fecha é como uma explosão de satisfação. Acordar em um posto, aceitar o dia de pedalada e no fim ganhar uma carona, aceitar que ficará na estrada e acabar num lugar incrível com pessoas incríveis, o que mais pode acontecer? Tudo pode acontecer e essa é a melhor parte, abraçar a mudança como forma de vida e esquecer tudo que o aprisiona. Mais informações sobre nomadismo e viver viajando > https://www.facebook.com/projetoalternativa Em breve outro capítulo, próximo destino grande é o Palmas - TO até lá. Citar
Membros bibarequena Postado Julho 4, 2014 Membros Postado Julho 4, 2014 Que legal gente! Já fui muitas vezes pra chapada.. Sensacional ... Tudo flui, criamos o que nos vem. Viver em confiança! Muita força pra vocês! Citar
Membros Micael Salton Postado Julho 4, 2014 Autor Membros Postado Julho 4, 2014 Que legal gente! Já fui muitas vezes pra chapada.. Sensacional ... Tudo flui, criamos o que nos vem. Viver em confiança! Muita força pra vocês! Valeu pela força Biba! Estamos agora perto de continuar nossa jornada, vai acompanhando aqui pelo fórum e pelo face. Abração Citar
Membros Micael Salton Postado Julho 17, 2014 Autor Membros Postado Julho 17, 2014 Saímos de Alto Paraíso dia 09/07 pela GO-118, subindo ainda mais até a Serra do Pouso Alto a 1676 metros de altura. A estrada é fantástica, com morros e formações típicas de chapadas em todo o caminho, muitas subidas e muitas descidas, descemos algumas cortando o asfalto a mais de 70km/h. A noite foi chegando e ainda faltavam aguns km para Teresina de Goiás, abastecemos as garrafas de água numa fazenda de criação de peixes e achamos um canto escondido no mato, plano, relativamente livre de montinhos de vegetação e atrás do capim alto. Passamos uma noite tranquila, com poucos carros passando na estrada. No outro dia seguimos para pegar o almoço em Teresina, compramos o tradicional marmitex do Goiás que dá pra duas pessoas e seguimos para os 80km até Monte Alegre. No caminho, várias pontes cruzando rios secos com o leito rachado, o calor ía aumentando até chegarmos na ponte que atravessa o corrego Sucurí, águas correntes e transparentes, uma dádiva, descemos o barranco e nos banhamos. No final do dia, quando já pensávamos em achar um lugar pra acampar, um caminhãozinho buzina e para no acostamento, nos leva na caçamba forrada de palha até a cidade. Os dois estavam indo carregar abacaxis perto de Palmas e nos prometeram carona no dia seguinte, porém no fim saíram para comer e nunca voltaram para o posto em que nos deixaram. Passamos a noite ali e na manhã seguinte nem sinal deles, essa volatilidade das coisas é uma realidade da estrada e dos personagens da estrada, nenhum compromisso é sagrado, o incerto é a regra. Dia 11 percorremos os 35km até Campos Belos, trecho igualmente lindo com serras e formações rochosas sempre beirando a rodovia quase deserta. Na cidade, por acaso ganhamos a informação de um balneário municipal no Rio Bezerra onde poderíamos passar a noite embaixo dos quiosques de churrasco, seguimos rápido pelos 5km até o local. Além de ser na beira do rio, tinha banheiro, bar e piscina, aproveitamos para descansar e passamos duas noites ali, no segundo dia ainda fomos incluídos num churrasco com muita carne e cerveja a vontade. Dia 13 saímos depois do meio dia, pedalando até Arraias, já no Tocantins, 24km. Paramos no posto na saída da cidade, jantamos marmitex e dormimos uma noite, que foi interrompida pelo espetáculo sonoro de um asno que parecia estar solto no asfalto. Os cachorros residentes do posto estranharam nossa presença e incomodaram uma boa parte da noite com sua movimentação em volta da barraca. De Arraias teríamos 104km de absolutamente nada até Conceição do Tocantins, nos munimos com miojos, uma perna de mortadela, goiabada e bolachas, o alforje que Karine costurou em Alto Paraíso caiu como uma luva para transportar as ferramentas e as comidas. Além disso incluímos mais 2l de água além dos 4l que sempre levamos preso no cano superior do quadro, todos nos falavam sobre como era isolada essa região do TO e o dia ainda pela manhã prometia muito sol e cada vez mais calor. O frescor de altitude das chapadas tinha ficado para trás, afinal, estávamos a caminho da capital mais quente do país, não tinha do que reclamar senão apenas nos prepararmos. Os primeiros 10km foram de descidas, até o meio dia deixamos mais 50km para trás, quando o calor começou a cobrar o preço nosso progresso passou a ser pontuado por rápidas pedaladas de uma sombra até a outra, buscamos proteção espremidos em sombras incertas de árvores esquálidas, ficar no sol principalmente em baixa velocidade nas subidas era como estar em um forno, sentia a pele queimando apesar de constantemente passar o protetor, os joelhos não protegidos queimaram, ficou claro que devíamos parar e esperar, mas a promessa de um grande rio adiante nos impulsionava mais um pouco. Desde o início da manhã passou por nós apenas 1 caminhãozinho com possibilidade de nos dar carona, de resto apenas poucos carros pequenos e carretas em alta velocidade, mas mantivemos a esperança de uma carona o tempo todo, até que no momento de maior necessidade a 13:30 da tarde, com o asfalto que mais parecia uma chapa quente, um caminhão pequeno apareceu no horizonte. Quando ele se aproximou vi que tinha um alto faltante em cima da cabine, típico de fruteiros itinerantes, na hora soube que eles iriam parar. Quando chegaram perto fizemos sinal, apontei para o sol na cabeça, Karine fez cara de sofrimento e eles pararam, seguimos acomodados na palha, protegidos do sol pela lona, 350km até Porto Nacional, tempo em que deu até para uma soneca. Em Porto Nacional tivemos a primeira visão do rio Tocantins. Fomos para o posto na saída da cidade, muito grande, repleto de caminhões e de pessoas, tomamos banho para tirar o calor do dia, esperamos anoitecer sentados no restaurante do posto, conhecemos pessoas sempre curiosas sobre nossa viagem e surpresas quando ouvem que estamos vindo de Brasília, para mim ainda tão perto mas uma distância enorme para muita gente. Sempre perguntam até quando viajaremos e como faremos para voltar, é engraçado ver que o foco da preocupação não é o processo em si mas sim quanto este irá durar e como voltaremos. O conceito do nomadismo é ainda muito obscuro para muitos, tentamos sempre explicar mas poucas vezes somos compreendidos de verdade, contudo todos sempre incentivam e ficam animados com nossa história. Achei um canto atrás de uma borracharia que poderia nos acomodar pela noite, seria um camping mais estilo industrial com chão sujo de óleo, pneus e entulho por perto, não era do nosso agrado mas era o que tinha. Comemos um marmitex e depois ainda ganhamos um picadinho de churrasco de graça do garçom do restaurante. As horas foram passando e ficou claro que estávamos apenas deixando o tempo correr, sentados nas cadeiras. Pouco depois das 21h foi respondido o motivo dessa espera: sem aviso uma menina se aproximou e perguntou se não gostaríamos de passar a noite na casa dela. Ali pertinho nos acomodamos na casa de Brenda que estuda Biologia na UFT, natural de Belém ela pode ainda nos contar algumas coisas sobre essa cidade que está no nosso horizonte próximo. Parecia tudo uma enorme combinação, relaxamos na noite morna do Tocantins sentindo mais forte do que nunca a estranheza do tempo e de como as coisas acontecem, como tudo acaba se encaixando, quando precisamos de uma carona ela apareceu, quando precisamos de uma casa ela apareceu e tem sido sempre assim, isso faz todo esforço valer a pena. Dia 15 teríamos os últimos 60km até Palmas, saímos cedo da manhã. Às 11:00 o calor já baixava minha pressão me deixando com pernas de gelatina, uma sensação de não conseguir vencer a inércia mesmo em terreno plano, até mesmo pedalar em descida leve requeria um esforço maior do que o normal. Retomamos o processo de pedalar de sombra em sombra tentando com muito esforço vencer 3 a 4km entre cada parada. Paramos numa tendinha para tomar um coco gelado e ficamos na sombra evitando o momento de prosseguir, chegou outro desses clássicos caminhãozinhos com carroceria de madeira, pedimos carona e o rapaz nos levou mais 15km para frente até Taquaralto, ainda faltavam 18km até Palmas. Descemos as bikes na frente de um bar fechado e vi que meu bagageiro da frente tinha se desmanchado, todas as soldas do corpo de dentro haviam soltado. Ficamos na sombra da cobertura do bar um bom tempo amarrando o bagageiro com corda de varal, até a dona sair e nos convidar para almoçar. Comemos com ela e sua mãe, antes de sairmos ainda ganhamos uma garrafa de 2l congelada para termos água geladinha no caminho. Como de costume enormes subidas antecedem a chegada na cidade e havia pouca sombra disponível, a água gelada foi um alívio grande pelo caminho após empurrar as bikes lomba a cima. Já perto de alcançar o centro um carro parou no acostamento, o motorista saiu, chegou perto e nos ofereceu 10 reais e um pote de saponáceo para limparmos as bikes, bastante aleatório mas sempre bem vindo, nos deu boa vindas à cidade, dei para ele o adesivo do projeto que ele colou imediatamente no para-brisa do carro e partiu. Por fim entramos em Palmas e encontramos nosso contato no couchsurfing que nos recebeu muito bem e nos hospeda nesse momento. Nos próximos dias descansar, resolver algumas coisas nas bikes e explorar Palmas até o momento de seguir mais uma vez, sempre para o norte. A dúvida persiste: Manharão ou Pará? Acho que a estrada vai escolher, ainda temos muitos km de TO para cima e muita coisa pode acontecer no caminho, quando se aceita o imprevisível a surpresa é constante e não há nada melhor que isso. Para mais informações sobre nossa viagem e nomadismo acesse http://projetoalternativa.com/ Para se manter atualizado curta a página no facebook https://www.facebook.com/projetoalternativa Citar
Membros bad-and-ugly Postado Dezembro 7, 2016 Membros Postado Dezembro 7, 2016 Gente, terminar de contar essa história pra gente! [= Citar
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