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Da Consolação à Brigadeiro em plena Parada Gay... a pé!


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CAMINHADA “ARCO-IRIS” NA PAULISTA

A falta do q fazer é algo incrível. Recém chegado do sul de uma breve travessia neste último feriado, me vi no domingo irremediavelmente à toa em casa. Resoluto a fazer qq coisa q não fosse responsabilidade doméstica, assistir Faustão e mto menos sem inspiração pra começar o relato da recente pernada (q so sai semana q vem), decidi ir visitar meu pai, q reside numa travessa da Av. Brigadeiro, próximo da Av. Paulista. Entretanto, a famosa via estava interditada por conta da “15ª Parada do Orgulho LGTB” - a tal “Parada Gay” - e td trânsito naquela região havia sido desviado pros cafundós dos arredores. Pois bem, como sempre tive curiosidade em conhecer essa manifestação de diversidade e nunca tive oportunidade por conta de trips no mato, aquela foi a desculpa necessária pra me embrenhar noutro tipo de “selva urbana”, em meio a muita purpurina, miçanga e lantejoula. O “programa de índio” proposto era o sgte: ir no contra-mão daquela “muvuca arco-iris” começando na Av. Consolação e terminando na Av. Brigadeiro, rasgando o miolo daquela multidão em pleno catarse, repleto de plumas, paetês e muita frescura. Eis uma nova e pitoresca modalidade de trekking urbano, antropologicamente falando.

 

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A bagunça por sinal já começava bem antes de chegar no inicio da Consolação. O trânsito, q já se mostrava engarrafado na Rebouças, ia sendo desviado bem antes da chegada ao Hospital das Clínicas. Fugindo da lentidão, desci do busão e continuei a pé, juntamente com uma curiosa “gangue de emos” q provavelmente tb se dirigia pra artéria central de Sampa, dada sua indumentária apertada e alguma maquiagem no rosto. A partir dali bastou seguir o fluxo de gente subindo o resto da avenida q começou a se dispersar pelos meandros das Alamedas Jaú e Itu. O som bate-estaca já era audível bem antes de chegar ali, proveniente de vários trios elétricos q já começavam a fazer a curva pra descer a Consolação abaixo. A temperatura ambiente era até agradável, e a piada pronta em afirmar q estava “bem fresco” foi inevitável. Até demais.

São exatas três horas da tarde e a primeira impressão é a de estar no meio de uma “micareta eletrônica” fora de época, onde um “mar” de gente se concentrava em torno dos trios elétricos deixando alguns vácuos humanos entre a passagem de uma e outra. Neste hiato é possível caminhar alguma coisa, quase desimpedidamente, de preferência longe da arrebentação da próxima “onda” humana. Já logo de cara sou abordado por crentes de uma tal igreja Nova Vida, estendendo panfletos na minha direção. “Deus te ama e vai te livrar deste antro de perversão!” , diz uma velha senhora, em tom de sermão. De fato, se a intenção deles é arrebanhar fieis arrependidos ali era o lugar certo.

 

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Como se fosse justiça divina, o negrume medonho do firmamento ameaçava mandar água a qq hora afim de colocar à prova a chapinha dos travestis e monas presentes. Contudo, a muvuca era totalmente indiferente a isso, apenas obedecendo o compasso hipnótico e ritmado do bate-estaca eletrônico, trilha sonora onipresente durante td aquela tarde. Pois bem, adentrei então no contrafluxo de mar de gente sacolejando de lá pra cá, no comecinho da Paulista. Dali já era possível observar a avenida td tomada de uma multidão considerável, algo q so me recordo ter visto “in loco” durante a Copa do Mundo e a tradicional Corrida de São Silvestre. Esta última, alias, da qual até já participei e já redigi alguma coisa a respeito pelo q vagamente me recordo.

Pingos fustigam o rosto obrigando alguns a se refugiarem nos ptos de ônibus ou nas marquises próximas, mas a água q cai repentinamente não é páreo pra empolgação da maioria, q não sabe se dança ou fica se esfregando. Mulheres exuberantemente robustas em trajes mínimos chamam bastante a atenção da galera com coreografias em plena rua, mas não pela beleza ou sensualidade mas pela bizarrice de possuírem um gogó maior q o meu. E lá vou eu, avançando na contra-mão daquela Sodoma em miniatura, me espremendo e acotovelando entre os demais curiosos e transeuntes.

 

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Curioso é reparar q o lance é “programa de índio” mesmo, pois está repleto de famílias inteiras e mtos idosos prestigiando o espetáculo proporcionado, repleto das mais pitorescas figuras q se pode imaginar. A criançada - à distancia segura, diga-se de passagem - se diverte com versões desmunhecadas, pouco ortodoxas e bem toscas de seus conhecidos super-heróis como Homem-Aranha, Batman & Robin (pleonasmo!), Mulher-Maravilha, Lanterna Verde, Mulher-Gato e por ai vai. Nem o truculento Capitão Nascimento escapou desse balaio, já q rebolava animadinho de cuturno, boina e sunga do Bope na dianteira de um trio elétrico. Enqto isso, um pelotão das policias civil e militar acompanhavam td espalhados ao longo de td avenida. O comércio e o Metrô, claro, estavam devidamente com as portas bem fechadas. Lacradas herméticamente até.

Forçando o avanço contra a corrente na base da cotovelada durante um tempão, qdo dei por mim percebi q mal conseguira chegar sequer na Bela Cintra! Mas após a passagem de um trio elétrico tocando algo remixado do Village People com Gloria Gaynor consegui ganhar mais alguns metros à frente, desviando no caminho de vários obstáculos do trajeto, onde ninguém é de ninguém: casais de mulheres se atracando, jovens anabolizados se pegando, travestis desfilando seminus com lábios, peitos e bundas enormes, deformados pelo silicone e botox. E claro, pencas de drag-queens q mais pareciam palhaços de luxo de tão fantasiados q tavam. Na pista ao lado vendedores, ambulantes e marreteiros disputam fregueses equilibrando td sorte de tranqueiras na cabeça, desde isopores cheios de cerveja, energéticos, vinho e refri, até bonés, óculos e uma espécie de tiara com formato de chifrinhos, algo digno da ocasião, já q estava rodeado de gente saída de td sorte de inferninho subterrâneo.

 

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Na altura da Augusta o empurra-empurra aumenta diante da passagem do trio elétrico da Salete Campari tocando uma versão poperô de “It´s Raining Men” q deixa a bibaiada em polvorosa, unidinha e coesa. Mas não demora prum nauseante odor - misto de urina e maconha - invadir minhas narinas e obrigar a abrir passagem pra sair dali. Em vão, claro. “Onde fui me meter?”, pensei. Bem, como quem ta na chuva é pra se molhar, deixei a massa me arrastar 50m avenida abaixo até conseguir me desvencilhar e andar mais calmamente, na outra pista da Paulista. Ou pelo menos respirar mais aliviado.

No caminho encontro um belo clone de Paquita a quem gentilmente peço pra bater uma foto comigo, sob o olhar desconfiado e nada amigável da companheira, uma robusta jovem trajada de heroína saída de algum mangá japonês. Seria a Sailor Moon? Agradeço e puxo o carro rapidinho, antes da mal encarada maruja me enchesse de porrada por deixar cair metade do seu copo de vodka q tive q segurar pra bater nossa foto. Interessante reparar q tal qual uma “rave”, a batida marcada da música e o “aditivo” - seja ele alcoólico ou químico - colaboram pra catarse (e transe) daquela massa tão bizarra e heterogênea, onde tds parecem amigos de infância com o único impulso de dançar e pular. Pensando bem, aquilo ali não difere muito de um fervoroso culto religioso, comício ou até um clássico de futebol. Somente isso pra explicar boa parte daquele povo em pêlo naquela friaca pós-chuva, na qual não é contagiado pela multidão apenas quem ta de gaiato nesse contexto. Isto é, gente bisbilhoteira como eu.

Após a passagem do ultimo trio elétrico a caminhada fica relativamente mais sussa. Entre a Frei Caneca e a Rocha Azevedo já era possível avaliar o estrago da festa sob a forma de muita sujeira no chão, pilhas de panfletos, latas, cartelas de camisinhas e principalmente muita molecada travada, estatelada no chão como se tivesse saído de uma guerra. Alguns hare krishnas tentam me vender algum incenso mas ignoro e passo batido. A galera punk-metaleira, em suas apertadas roupas de couro escura, tb esta presente assim como a gótica, emo ou dark, sei lá. É, ali é onde tds as tribos se reúnem independente da orientação sexual. E tal qual a “Virada Cultural”, a impressão posterior q se tem é q neste trecho da Paulista abriram as portas e catacumbas do cemitério e tds seus residentes vieram parar aqui.

 

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Àquela altura já estou ligeiramente apertado e a vontade de utilizar os banheiros químicos disponibilizados pela comissão organizadora é gde. Contudo, a enorme fila, o mau cheiro e o receio de alguém surgir do fundo do vaso sorrateiramente diluem td e qq vontade de esvaziar a bexiga. E lá vou eu dando continuidade à minha vagarosa caminhada-solo pela Paulista, agora sem as gdes dificuldades do inicio. Ainda bem.

Ao passar pelo Masp um tumulto e a sirene da policia despertam minha atenção, agrupando alguns curiosos num canteiro, entre eles este q vos escreve. Mas td indica q estavam apenas levando alguém em coma alcoólico prum posto médico na frente do Trianon. É nesse momento q sinto alguém mexendo no bolso traseiro da minha bermuda. Instintivamente dou um forte coice pra trás e me viro pra encarar o dono daquela “mão leve”. Mas naquela muvuca td apenas vi alguém se misturando rapidamente no povo pra se perder de vez na multidão. “Filho da puta!” , pensei, ainda não sabendo ao certo se o fulano era trombadinha ou mais uma biba assanhada passando a mão. Ou as duas coisas. Felizmente nada havia sido levado, razão pela qual a partir dali fiquei mais atento e procurei sempre estar em movimento, evitando ficar parado na multidão.

Contudo, o grosso do “tsunami arco-iris” já havia sido deixado pra trás. Após a Pamplona a avenida já estava quase q semi-deserta, onde apenas alguns gatos-pingados zanzavam aqui e acolá. Um cordão de isolamento da policia afastava os poucos pedestres q ainda perambulavam pra dar espaço pruma tropa de garis, q fazia do pente-fino q se seguiu uma autêntica faxina em larga escala, deixando outra vez a via impecável pro dia sgte. O trânsito normalizaria somente algumas horas depois e td voltaria a ser como antes. A Paulista voltava a ser a pacata e movimentada via de Sampa.

 

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Eram quatro e meia qdo finalmente cheguei na Brigadeiro. Vivo, inteiro e ileso, menos mal. Dali pra casa do meu pai foi num piscar de olhos. Enfim, foi uma hora e meia pra concluir uma caminhada q não toma nem um terço desse tempo! E após esta pernada bizarra, divertida e no minimamente curiosa, cheguei a conclusão q valeu somente pela experiência. Resumindo, não é nenhuma travessia de alto risco (será mesmo?) pois nada mais é q um bate-perna no meio de uma manifestação alternativa, um pequeno universo onde o q realmente vale é a libertação momentânea. Imediatamente me veio à mente aquela crente no inicio me chamando de pervertido. Mas como já dizia sabiamente Nelson Rodrigues: “Td pervertido é uma pessoa normal pego no flagra.”

Editado por Visitante
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  • 4 meses depois...
  • Membros de Honra

Olá Jorge!

 

 

PQP, meu cachimbo!!! Ri prá caramba com este relato... ::lol4::::lol4::::lol4::

Cara, não gosto de aglomerações de modo geral e com certeza nunca faria uma pernadinha dessas, mas que é uma baita de uma selva isso é ::lol3:: E a "fauna" então, bem "colorida" mesmo.

 

Parabéns pelo bom humor e pela coragem. Não sei se conseguiria numa situação dessas manter o mesmo bom humor. Terminou muito bem com a citação do Nelson Rodrigues.

 

Abraço,

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