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China - 20 dias - Shanghai, Xian e Beijing - junho de 2011


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Olá

estou adorando o relato, por favor continue está muito interessante.

e parabéns pela bela viagem!

Sueli

 

Oi Sueli

 

Obrigado. Que bom saber que tem gente acompanhando! Pode deixar que eu vou continuar postando tudo aqui no Mochileiros. Essa viagem realmente foi muito legal. Inesquecível.

 

Abraço

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Oitavo dia. Sábado, 11 de junho de 2011.

 

Depois de uma semana aqui, já estávamos quase sem roupa limpa e, como as poucas lavanderias que vimos na rua são distantes, mesmo sendo mais caro, decidimos lavar roupa no hotel mesmo (apesar de serem conhecidos no mundo todo como donos de lavanderias, os chineses na China acho que só lavam roupa em casa. Vimos muito poucas lavanderias na rua).

 

No hotel o preço era por peça a ser lavada. Deixávamos de manhã e eles nos devolviam à noite. Dois sacos de roupa cheios custavam 400 Yuans (R$ 100), muito mais caro do que eu e a Dani estamos acostumados a pagar em outros lugares, mas não tínhamos uma opção mais prática.

 

Neste sábado, não bastando as inúmeras opções de passeios em Shanghai, nos programamos para conhecer também uma cidadezinha do seu entorno. Mas antes, tivemos nosso último compromisso de negócios aqui na China.

 

Quando voltamos de Nantong na quarta-feira, o rapaz da empresa de consultoria nos disse que tinha encontrado mais um possível fornecedor aqui mesmo em Shanghai. Então ficou combinado de irmos neste sábado visitá-lo.

 

De tão perto que era do nosso hotel, fomos à pé. Na véspera, ligamos para o Paulo e ele foi com a gente também. No caminho, passamos por ruelas tão estreitas que não entravam carros. Apesar de estarmos há uma quadra do Bund, as casas eram bem simples e uma feira acontecia. Depois de conversar com o pessoal da empresa, voltamos para o hotel pelo mesmo caminho e demos uma olhada em tudo.

 

Uma grande variedade de verduras, legumes e frutas estava exposta. Mas o que chamava mais a atenção eram os caramujos, rãs, enguias, lagostinhas e outros animais vivos. Os camarões pulavam dentro da bacia. Mais fresco impossível!

 

No hotel, nos despedimos do rapaz da empresa de consultoria e perguntamos para o Paulo sobre Qibao. Primeiro ele não entendeu o que era porque estávamos pronunciando errado. Foi preciso mostrar o mapa para ele e aí, lendo em caracteres chineses, ele reconheceu. A pronúncia certa é ”Tchipao” (eu e a Dani estamos decididos a resolver esse problema com o idioma estudando um pouco de mandarim!).

 

Tínhamos visto fotos do lugar, que parecia bem interessante, o guia da Lonely Planet indicava como um bom passeio e sabíamos que havia um metrô que levava para lá, mas não tínhamos certeza se realmente valia a pena ir. Então ele, muito gentil, perguntou: ”Eu, boa companhia?”. Para a gente, não poderia ser melhor. O Paulo já era como um amigo para nós e acho que ele também já se sentia nosso amigo. Ele tinha toda a paciência de explicar tudo que perguntávamos e com certeza ir a Qibao com ele seria mais proveitoso.

 

Então fomos à pé até a estação East Nanjing Road (linha 2) do metrô e depois de 17 paradas e uma conexão, descemos na estação Qibao (linha 9). À primeira vista parecia que não valeria tanto à pena ir lá. Na porta da estação, uma grande e movimentada avenida e um shopping center moderno. Não era bem isso que queríamos. Então percebemos que aquela tradicional cidadezinha que víamos nas fotos era apenas uma parte de Qibao, a cidade velha. Caminhamos uns cinco minutos até encontrarmos o portal de entrada da parte antiga de Qibao. Aí sim sentimos que tínhamos encontrado o que buscávamos.

 

Qibao é uma cidade da região metropolitana de Shanghai que mantém conservado uma pequena parte de seu centro antigo. As contruções desse vilarejo, em arquitetura clássica chinesa, datam da dinastia Song do Norte, ou seja, por volta do ano 1000 D.C.! Um canal de água bem verde corta a cidade e é invadido pelas casas e cruzado por estreitas ruas com pontes arqueadas. Não fomos, mas existem barquinhos tradicionais que fazem passeios pelo canal. Sem dúvida as poucas ruelas antigas ainda preservadas têm um visual extraordinário. Parece que voltamos no tempo. Infelizmente, a impressão que temos é que o panorama dessa parte antiga está ameaçado. Não tão ao longe já vemos alguns prédios modernos sendo construídos. Nada muito alto, mas já interferem na paisagem.

 

Como era sábado, as ruas estavam tomadas de gente. Pouquíssimos ocidentais. A maioria era chinês. As famílias chinesas aproveitam os fins de semana para passear e comer fora de casa. Aliás, comer parece ser a principal atividade de quem vem à Qibao. Até existem lojas de roupas e outros artigos (muito pouco artesanato), mas o que domina as ruelas da cidade antiga são os quiosques de comida.

 

Tínhamos planejado almoçar em um dos restaurantes de lá mas começamos a provar tudo o que o Paulo dizia que era bom. Ao ver que gostávamos, ele começava a trazer mais e nem deixava a gente pagar! Comi uns cinco tipos de espetinhos diferentes: tofu frito (que não cheira bem, mas é gostoso), camarões, linguiças… comemos também uns guiozas no vapor recheados de verduras (que são muito bons quentes) e um pão redondo e chato (como um pão árabe), coberto de gergelim e recheado com temperos e carne. Muito bom.

 

Há opções para todos os gostos e muito da culinária local tradicional. Amontoados de carnes revezavam o espaço com comidas irreconhecíveis mergulhadas em molhos. O mais diferente que vimos foi um tipo de passarinho (ou pintinho, ninguém conseguia nos explicar o que realmente era) que vinha inteiro em espetinhos e era tão macio que parecia nem ter ossos. O gosto era de frango assado e era vendido em todo lugar.

 

Provamos também alguns docinhos feitos em formato de coelho, abóbora e outras frutas, todos coloridos. O problema é que o doce deles não passa de ligeiramente adocicado para nós. Não é ruim, mas é sem graça. Um docinho, entretanto, era realmente bom. Era como um novelo de lã (parecia algodão doce) rechado de farinha de amendoim e outras castanhas. Esse era bem doce e gostoso. Compramos até uma caixa para levar para o hotel. Um outro doce que era muito bom era um tipo de pipoca de arroz com amendoim que vinha em pedaços grandes, tipo um pé-de-moleque crocante. Todos esse petiscos variavam de 5 a 10 Yuans cada. Comemos tanto que até desistimos de almoçar.

 

Vimos um lugar que o Paulo disse já ser uma raridade hoje em dia. Uma casa de chá tradicional e nada comercial. Lá, um monte de velhinhos (e os velhinhos na China são muito velhinhos) ficam sentados em bancos em volta de mesas compridas tomando chá, fumando e jogando cartas e uma espécie de jogo de damas chinês.

 

Existem muitos restaurantes na área (alguns com vista para o canal). O Paulo nos disse que um dos pratos mais tradicionais da região é a sopa de cabeça de peixe. Passamos em frente à um restaurante especializado neste prato e todas as mesas estavam ocupadas e isso já era quase 16:00 horas!

 

De longe, víamos uma pagoda no horizonte, então resolvemos ir até ela. Uns quinze minutos de caminhada, já fora da cidade velha, e chegamos ao templo budista onde a pagoda ficava.

 

Não é um templo antigo, mas vale a visita (custa só 5 Yuans). O seu Chico e o Paulo, que não queriam subir, ficaram conversando nos jardins e eu e a Dani entramos. Os jardins são bem cuidados e colocando protetores de pano nos sapatos, pudemos subir a pagoda, que tem 7 andares. Em cada andar, uma imagem de Buda, ou do Mensageiro, ou de Bodisatva. Havia uma janelinha em cada andar e de lá de cima podíamos ver todo o templo e a cidade antiga do alto.

 

Quando descemos fomos ao pátio central e ouvimos, de longe, os monges rezando no ritmo da batida de uma espécie de sino feito de madeira. Sabendo que eles não gostam de ser fotografados, tiramos uma foto bem de longe, discretamente.

 

O chuvisco, que não parou o dia todo, começava a engrossar. Já era umas 18:00 horas e, então, voltamos para Shanghai. Pegamos o metrô e o Paulo ficou duas estações depois da nossa, que era mais perto da casa dele.

 

No hotel, vimos que nossas roupas tinham chegado. Fomos conferir e percebemos que eu tinha uma cueca manchada e a Dani tinha uma blusa manchada da mesma cor, além de terem quebrado o zíper de uma jaqueta dela. Descemos na mesma hora para falar com o pessoal da recepção. O problema é que eles não entendiam o que a gente queria. Achavam que queríamos lavar aquela roupa. Mas ela já estava lavada! Eles falavam ao telefone com o pessoal da lavanderia, chamavam outros funcionários e nada… Enquanto isso minha cueca passava de mão em mão em pleno lobby do hotel!

 

Eles até que se esforçavam, mas ficavam muito sem graça por não entender o que queríamos. Então pediram para voltarmos um pouco mais tarde, quando um outro funcionário, que falava melhor inglês, estaria lá. Subimos e não demorou muito um funcionário ligou e disse que podíamos deixar as roupas pela manhã que eles mandariam de volta à lavanderia para que eles resolvessem o problema.

 

Esquentamos água na chaleira elétrica e cozinhamos nossos cup noodles apimentados que compramos em uma das lojas de conveniência do entorno do hotel. Eles têm dezenas de opções de macarrão instantâneo, mas é difícil encontrar um que não seja apimentado. O pior é que sempre é uma surpresa pois as embalagens são só em chinês e nunca sabemos se tem ou não pimenta.

 

Comemos, tomamos banho, eu escrevi um post no blog e fomos dormir. O domingo seria nosso último dia de passeio em Shanghai. Na segunda-feira bem cedo iríamos seguir viagem para Xian.

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Nono dia. Domingo, 12 de junho de 2011.

 

Amanhecemos o dia meio cabisbaixos. Esse seria nosso último dia em Shanghai, cidade que adoramos. De tudo que tínhamos planejado conhecer, só restava a Praça do Povo e o Shanghai Propaganda Poster Art Centre. Deixamos nossas roupas com problemas na recepção para que a lavanderia ajeitasse e fomos à pé para a praça. O clima, como sempre, estava nublado, mas pelo menos não chovia.

 

A Praça do Povo é um grande parque verde todo ajardinado e rodeado de prédios importantes. Muitos dos grandes hotéis de luxo de Shanghai estão nessa região, instalados em edifícios de arquitetura ultramoderna.

 

Tanta modernidade e ostentação não inibe que a simplicidade chinesa se manifeste em pequenos detalhes. Como todos os espaços públicos nos fins de semana, a praça também fica cheia de famílias passeando. É muito comum ver velhinhos fazendo exercícios e vários professores, em roupas típicas, ensinando Tai Chi Chuan. Engana-se quem pensa que se trata de um monte de velhinhos entrevados. Muitos põem o pé mais alto que a cabeça e outros pareciam ser mais flexíveis que muitos jovens de 20 anos!

 

Caminhando pela praça, topamos com uma cena inusitada e que só comprova que é necessário muito mais que dinheiro e concreto para se mudar o espírito de um povo. Enquanto os pais cantavam músicas que pareciam ser infantis (do tipo Meu Pintinho Amarelinho) para os filhos bem pequenos, esses se divertiam brincando com pintinhos e patinhos de estimação. Isso em plena moderníssima Praça do Povo de Shanghai!

 

É nessa praça onde fica a Prefeitura da cidade, um prédio enorme e com guardas fardados em posição de sentido. Aqui também fica o Museu de Shanghai, que já visitamos em um dia de chuva.

 

Bem perto fica o arrojado edifício do Centro de Exibição do Planejamento Urbano de Shanghai. Sim, eles têm um museu só para mostrar a trajetória de urbanização da cidade e da preparação para um futuro ainda mais próspero.

 

Neste centro eles têm exposições muito boas sobre as transformações que Shanghai sofreu ao longo de sua história. Muitas delas são multimídia, como a dos planos para o metrô, do aeroporto e de novos complexos viários e edifícios. Tem até uma sala de projeção em 360 graus que nos leva à um voo panorâmico pela cidade. Outras são mais tradicionais, com fotos mostrando o antes e o depois de pontos famosos de Shanghai. Mas talvez o que mais chame a atenção seja a imensa maquete da cidade que toma quase um andar inteiro. É a maior maquete que eu já vi. Eu, a Dani e o seu Chico ficamos impressionados.

 

Além de detalhadíssima, mostrando a cidade com os edifícios que já existem e com os que estão em planejamento e em construção, a maquete ainda fica toda iluminada.

 

No primeiro piso do centro há panfletos em outros idiomas, mas há também muitas placas em inglês explicando as exibições. O ingresso custa 30 Yuans (R$ 7,50) e, para conhecer bem o espaço, uma hora e meia é suficiente. Recomendo a visita.

 

Saindo do Centro de Exibição do Planejamento Urbano, caminhamos pelas avenidas em volta da praça. Passamos em frente ao novíssimo Grande Teatro de Shanghai, onde operários desmontavam a estrutura que serviu ao XVII Festival Internacional de Cinema de Shanghai, que tinha acabado de terminar.

 

Começamos a nos encaminhar para a Nanjing Lu, para procurar um lugar para almoçarmos. No caminho, tivemos mais amostras do paradoxo chinês, um povo tradicional que está em rápido processo de transformação. Apesar da modernidade e do movimento frenético da área comercial próxima, um grande grupo, a maioria mais maduros, dançava músicas tradicionais no meio da rua.

 

Escolhemos comer na Pizza Hut. Mas não queríamos comer só pizza, então, buscamos opções completamente estranhas ao que a Pizza Hut oferece no Brasil, provando que mesmo grandes multinacionais estão se adaptando ao gigantesco mercado chinês.

 

Pedimos uma travessa de entradas chinesas, um risoto de frutos do mar, um risoto gratinado com bacon e queijo e uma pizza (que aqui são até pequenas, uma grande equivale à uma média no Brasil). Encontramos também um prato que nos chamou a atenção e, claro, pedimos: espetinho de polvo com cabeça recheada com ovo de codorna. Muito bom! Para beber, eu e o seu Chico pedimos Tsingtao e a Dani pediu suco. Comemos muito bem e a conta deu apenas 212 Yuans (R$ 53).

 

Voltamos para o hotel e descansamos um pouco e, quando era umas 15:00 horas, eu e a Dani pedimos para a moça da recepção anotar em chinês o nome do Shanghai Propaganda Poster Art Centre para mostrarmos ao taxista. Já tínhamos tentado ir lá de metrô, mas fomos impedidos de sair da estação por uma chuva forte.

 

Estranhamente, o motorista nos deixou em frente à um conjunto de edifícios residenciais na região da antiga concessão francesa (que ninguém conhece por esse nome). Olhamos no mapa e vimos que realmente era por ali, mas não havia nem sinal da placa do museu. E agora, como pedir informação?

 

Nos aproximamos da portaria do edifício e o porteiro, que já deve estar acostumado com turistas ocidentais procurando o museu da propaganda, sem nenhuma palavra, nos deu um cartãozinho com um mapa em inglês indicando que, para acharmos o museu, deveríamos entrar no conjunto residencial e, em um dos blocos, pegar um elevador e descer ao subsolo.

 

O acervo é único na China e é formado por uma coleção particular de cerca de 5000 posters originais da propaganda comunista (nem todos expostos, claro) dos anos 50, 60 e 70 voltados à doutrinar as massas.

 

Posters originais dessa época são rarissímos. Com o fim do fervor político propalado pela Revolução Cultural de Mao Zedong, com a ascensão de Deng Xiaoping ao poder e a implantação do ”socialismo de mercado”, o governo deixou de patrocinar atos hostis ao ocidente e a ordem era que o material de propaganda anti-capitalista (incluindo os posters) fosse destruído. Muito pouco se salvou, daí a importância do acervo desse museu.

 

Esse museu retrata muito bem uma parte da história recente do país que parece ser ignorada por museus públicos chineses (talvez não seja mais conveniente para o governo relembrar essa época).

 

Em contraposição às atuais boas relações entre China e as potências capitalistas ocidentais, a agressividade retratada nos posters especialmente contra os Estados Unidos, a França e a Grã-Bretanha é impressionante.

 

Em outros exemplares, laços de amizade entre China e União Soviética eram exaltados e a China era apresentada como promotora da paz e amiga de todos os povos.

 

Outros posters declaravam apoio à revoluções comunistas na Ásia, na África e na América Latina.

 

Posters estimulavam os jovens a se engajarem na luta proletária e alardeavam o desenvolvimento tecnológico dos países comunistas (com especial menção à corrida espacial).

 

Outras obras conclamavam o povo à levar até o fim a Revolução Cultural, a defender a libertação de Taiwan e davam a interpretação oficial acerca da entrada do Exército Chinês no Tibet.

 

Nem precisa dizer que a figura de Mao é quase onipresente. Ele está em vários posters como figura principal e o culto de sua personalidade é exacerbado. Junto com ele sempre aparecem Stalin, Lenin, Marx, Engels e até um jovem Fidel.

 

O museu faz um trabalho de recuperação, catalogação e reprodução do acervo, transformando-o em posters novinhos, cartões postais e livros vendidos com exclusividade em sua loja. Além dessas reproduções, muito material original do auge comunista é vendido (com destaque para cupons governamentais de racionamento de alimentos e gás, retratando a excassez de produtos típica da época). Os preços da loja são muito bons.

 

O Shanghai Propaganda Poster Art Centre é um museu que atrai mais estrangeiros que locais. No metrô, percebi que todos ficavam olhando e apontando para a sacola da loja do museu que eu carregava. Nela, uma figura de propaganda estava estampada e acho que, até para eles, aquilo parecia ser um pouco fora de lugar hoje em dia.

 

O pequeno museu escondido é muitíssimo interessante. Vale a pena procurar. Quem passar por Shanghai e se interessar por história, deve dar uma olhada lá.

 

Saímos do museu da propaganda no final da tarde e ficamos passeando pela região da antiga concessão francesa, uma área que até hoje parece muito chic, cheia de casarões com jardins, ruas arborizadas e muitos pequenos comércios. É uma área bem agradável para passear e também deve ser para morar. Entramos em um supermercado e, ainda zonzos com tanta propaganda comunista, ficamos abismados com a variedade de produtos à venda. Era um supermercado que podia estar muito bem nos Estados Unidos, terra do capitalismo.

 

Ainda a propósito da temática do museu da propaganda, voltando para o hotel passamos por uma praça em que um recém inaugurado monumento fazia referência ao aniversário de 90 anos do Partido Comunista Chinês, a ser comemorado em 01 de julho de 2011. Já tínhamos visto outras referências à data espalhadas pela cidade e na televisão. Isso é que é o tal do ”socialismo de mercado”, economia capitalista e sistema político socialista.

 

Chegando no hotel, pegamos nossas roupas semi-consertadas, arrumamos nossas coisas para a viagem do dia seguinte (percebemos que já tínhamos comprado muita coisa) e descansamos um pouco. Quando era umas 21:00 horas eu e a Dani tomamos banho e fomos dar uma última olhada no Bund e nos arranha-céus de Pudong. Mas, infelizmente, todas as luzes já estavam apagadas e não havia mais quase ninguém nas ruas. Talvez tenha sido um sinal. Para ver de novo aquela paisagem cheia de luzes, teríamos que voltar à Shanghai. Uma coisa é certa: vontade não nos falta!

 

No hotel, eu fiquei escrevendo no blog até tarde e a Dani e o seu Chico foram dormir. No dia seguinte cedo, iríamos embora para Xian.

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Décimo dia. Segunda-feira, 13 de junho de 2011.

 

Nosso voo para Xian saía às 08:30 horas. Acordamos cedo e foi só o tempo de tomarmos café, fazer o check-out no hotel e pegarmos o taxi. A corrida do nosso hotel (Bund) até o Pudong International Airport durou uma hora e custou 250 Yuans. A distância é enorme e toda percorrida em vias expressas. Se tivéssemos ido de metrô seria muito mais cansativo e demoraria muitíssimo mais. Em um grupo de três, como nós, compensa mais ir de taxi.

 

Além das bagagens de mão (que o seu Chico nunca leva), a Dani levava uma mala, o seu Chico outra e eu levava minha mochila cargueira e uma outra mochila menor. No aeroporto, por 30 Yuans cada volume (R$ 7,50), embalamos o que íamos despachar com aqueles filmes plásticos. A minha mochila menor foi colocada dentro de uma caixa de papelão onde eu escrevi meu nome. Foi só o tempo de plastificar as bagagens e fazer o check-in (não tinha fila) e logo depois embarcamos.

 

Como eu já disse por aqui, o aeroporto de Shanghai é gigante e não é bom arriscar chegar tão em cima da hora quanto chegamos. Qualquer imprevisto e pode-se perder o avião. Só um aeroporto tão grande quanto este pode se dar ao luxo de ocupar cadeiras da sala de embarque com esculturas. E pensar que nos aeroportos do Brasil não tem lugar nem para as pessoas sentarem!

 

Embarcamos e ficamos mais de meia hora esperando até que o avião decolasse. Xian fica no meio do país, na província de Shaanxi, e a viagem durou 2 horas e 35 minutos. O voo foi tranquilo e quando chegamos em Xian de novo sentimos vergonha dos aeroportos tupiniquins. Parece que nós paramos no tempo! O aeroporto de Xian nem é tão novo quanto o de Shanghai e Beijing, mas é grande, muito confortável e bem cuidado.

 

Mesmo não precisando, pois o aeroporto atual está muito bom, estão construindo outro novinho bem em frente, moderníssimo e enorme, com direito a sistema viário e tudo (viaduto aqui é uma banalidade). Aqui me parece que eles não esperam a necessidade se instalar e se antecipam pensando na demanda 20 anos à frente.

 

Desembarcamos, pegamos a bagagem e fomos procurar a melhor forma de ir para o hotel. Em Xian não tem metrô (mas uma rede com várias linhas está em construção). Encontramos uma empresa de taxis que também alugava carros com motoristas para tours. O taxi para o hotel custou 200 Yuans (uma hora de viagem). Mas decidimos não fechar nenhum tour para o dia seguinte.

 

No caminho para o hotel, confortavelmente instalados em um Buick zerado, dirigido por um motorista que falava um pouco de inglês (bem pouquinho mesmo) e se chamava Lee, vínhamos conversando sobre o fato das nossas três malas caberem no porta-mala do carro e ainda sobrar espaço… EEEPA!!! Não estávamos só com três malas! Eu tinha a minha mochila grande e… Esqueci de pegar minha mochila pequena que estava embalada na caixa!!! O Lee percebeu que alguma coisa estava errada e na mesma hora expliquei, em inglês bem pausado, o que tinha acontecido e pedi para ele voltar para o aeroporto. Ele pegou o celular e ligou para a empresa, explicou em chinês e depois me passou o telefone. Eu estava tão nervoso que a mulher, que falava pouco inglês, não entendia nada (reconheço que meu inglês estava todo descoordenado). Eu disse o número do voo e da bagagem e ela disse que iria procurar.

 

Chegando no hotel, eu estava tão atrapalhado falando no telefone e fazendo o check-in ao mesmo tempo que o pessoal da recepção deve ter achado que eu era doido. Subimos, deixamos as bagagens e eu e a Dani voltamos para o aeroporto com o Lee. Lá se ia toda a economia feita com árduas pechinchas em tudo que eu comprava. Teríamos que pagar mais 400 Yuans pela corrida hotel-aeroporto-hotel.

 

No caminho só pensava nas coisas que tinha comprado (e anunciado aqui pelo blog), nos carregadores do meu celular e o do meu netbook e nas roupas que tinha colocado na mochila para proteger e não quebrar nada. Isso é o que dá sair muito da rotina. Como nunca levo uma caixa comigo, esqueci de procurar por uma no aeroporto!

 

Chegando lá, fui com a moça da empresa de aluguel de carros que falou comigo ao telefone ao setor de bagagens esquecidas (fiquei até feliz em saber que eu não era o único idiota que esquecia as coisas). Em cinco minutos, a caixa com minha mochila apareceu intacta. Foi um alívio.

 

Depois disso tudo, resolvemos fechar o tour para o dia seguinte com eles. Como eram atrações distantes pelo menos uma hora do centro da cidade, não queríamos perder mais tempo procurando a melhor forma de ir, o Lee falava um pouquinho de inglês e o carro era realmente muito bom, acho que fizemos um bom negócio. Custou 700 Yuans por oito horas até o Exército de Terracota e outras três atrações, sem almoço nem ingressos.

 

Chegamos no hotel e já era quase 16:00 horas! Combinamos com o Lee de nos buscar às 09:00 horas na manhã seguinte, subimos, pegamos o seu Chico e saímos direto para aproveitar um pouco da cidade e procurar um lugar para almoçar.

 

Ficamos no Citadines Xian Central. Um hotel novinho e muitíssimo bem localizado à um passo da Torre do Tambor (Drum Tower), dentro das muralhas, pelo qual pagamos 1100 Yuans (R$ 275) por duas diárias em suíte com duas camas de casal e café incluso. Recomendo.

 

Com o atraso do voo e a minha patetice de esquecer minha mochila no aeroporto, nós, que já tínhamos apenas duas noites em Xian, teríamos que nos desdobrar para visitar tudo o que queríamos em menos de um dia e meio. Ainda bem que estava anoitecendo bem tarde em Xian, por volta das 20:00 horas, e o clima não era chuvoso como em Shanghai.

 

Quando compramos as passagens ainda não tínhamos a noção exata do que encontraríamos em Xian. Sequer tínhamos conciência do gigantismo dessa metrópole de quase 5 milhões de habitantes. A única coisa certa que tínhamos que conhecer lá era o Exército de Terracota, uma das maiores descobertas arqueológicas de todos os tempos.

 

Com alguma pesquisa e a leitura do guia Lonely Planet, Xian começou a se mostrar um grande destino (mas aí, infelizmente, as passagens já estavam compradas…). Para quem gosta de história, como eu e a Dani, ir à esta cidade é voltar ao passado. A importância de Xian na história da China é gigantesca e a herança arquitetônica da época áurea da cidade está lá para confirmar isso.

 

Xianyang, cidade onde fica o aeroporto de Xian, foi capital da primeira dinastia imperial chinesa, a Qin, responsável pela unificação da maior parte do que hoje conhecemos como China. Xian, por suas vez, foi capital do império durante as subsequentes dinastias Han, Sui e Tang (esta última considerada o período áureo da cultura chinesa) e foi a cidade politicamente mais influente da China até o século X. Sucessivos períodos de crise com secas, fome, terremotos avassaladores e a constante ameaça de ataque de povos do norte fizeram a capital ser transferida para Luoyang, na província vizinha de Henan, o que marcou o declínio da cidade.

 

Xian também foi o ponto de partida (ou chegada) da Rota da Seda, uma das mais importantes rotas de comércio entre o ocidente e o oriente na antiguidade. Em razão do comércio, vários povos, culturas e religiões criaram raízes na cidade tornando-a a mais cosmopolita da China antiga. Como testemunha dessa era de ouro, Xian apresenta edifícios milenares e uma muralha gigantesca que cerca a cidade velha.

 

Ao sair para passear, demos de cara com um desses magníficos edifícios, a Torre do Tambor (Drum Tower). Mas a deixamos para mais tarde. Logo ao norte dela fica o famoso bairro muçulmano de Xian, lar da comunidade Hui (mulçumanos chineses) e local onde se encontra a Grande Mesquita de Xian (Xian Great Mosque) e várias ruas de lojas e feiras.

 

Adentramos em uma dessas ruas do bairro muçulmano, que lembram muito um mercado árabe. Aliás, muitas placas na rua, entalhes nas paredes e pinturas à venda nas lojas estavam escritas em árabe e não em chinês (o que não facilitava em nada a nossa vida). O Islã está na região desde o século VII!

 

Quem busca comprar peças interessantes de artesanato e arte regional, vai encontrar nas ruas do bairro muçulmano de Xian um paraíso. Muitas bugigangas também estão expostas e, com as poucas palavras que sabem em inglês, os vendedores, com sua habitual insistência/quase inconveniência, vão tentar lhe convencer a comprar tudo. Tem que saber escolher e exercitar a paciência na discreta busca por um achado. Aqui, a regra da negociação tem que ser levada ainda mais à risca. Além de chineses, esses comerciantes estão embebidos em cultura árabe e comércio é com eles mesmos! Nesse primeiro dia demos apenas uma olhada nas lojas, filtrando o que merecia mais atenção e analisando os preços, mas não compramos nada.

 

Com medo de perdermos a hora, buscamos logo a Grande Mesquita de Xian, antes que ela fechasse. O portão de entrada da mesquita fica no meio da feira. O ingresso custa 25 Yuans. Lá dentro, nos aguardava um oásis de tranquilidade em meio ao movimentado comércio do bairro.

 

A história da Grande Mesquita de Xian remonta ao ano de 742, quando ela foi fundada. Simplesmente esse templo tem mais de 1250 anos de vida! A construção, diferentemente de outras mesquitas, não é una, é um conjunto de prédios ao redor de jardins. Esses jardins são separados entre si por portais feitos alguns em pedra e outros em madeira.

 

A mescla de arquitetura árabe, que usa muita pedra, com a arquitetura tradicional chinesa, que usa muita madeira, resulta harmoniosa e única. Dizem que a Grande Mesquita de Xian abriga muitas das maiores obras-primas da arquitetura do país. Até o minarete, torre existente em todas as mesquitas, usada para chamar os fiéis para as orações, aqui é uma pagoda chinesa de três andares.

 

No último dos quatro jardins se encontra o Pavilhão da Adoração, local onde os fiéis fazem as orações e único local onde os visitantes não-muçulmanos não podem entrar. Da porta, podíamos ver um bonito salão todo coberto de tapetes azuis, com paredes e teto ricamente decorados criando o ambiente ideal para rezar.

 

Saímos da Grande Mesquita de Xian com a impressão de que tínhamos cumprido uma missão. Um lugar como aquele merece ser visitado. Nunca pensei que a primeira mesquita que eu visitaria seria na China!

 

Caminhamos por algumas ruas de comércio do bairro muçulmano e vimos a variedade de comidas e produtos vendidos ali. O curioso é que os Hui têm feições chinesas, mas usam roupas árabes. Muitas mulheres usavam véu. É uma mistura bem diferente.

 

Como já estava tarde, apesar do sol ainda alto, eu e a Dani decidimos parar de judiar do seu Chico e levá-lo para comer. Até chegamos a procurar um restaurante no bairro muçulmano, mas já era tarde e não achávamos nenhum restaurante que parecesse bom e tivesse cardápio com fotos. Não queríamos arriscar comprar uma comida muito apimentada.

 

Eis que, em mais um dos paradoxos da China, ao lado da monumental Torre do Tambor, um edifício do século XIV em arquitetura clássica chinesa, sem qualquer preocupação com a paisagem histórica, encontramos um reluzente McDonalds e decidimos comer por lá mesmo.

 

O seu Chico não comia no McDonalds há mais de 20 anos. Eu e a Dani escolhemos sanduíches de carne e ele um de frango (média de 30 Yuans o trio). Na primeira mordida ele deu um pulo e pegou o refrigerante. O sanduíche, justo o dele, era apimentado! Ele até achou que eu tinha feito de brincadeira, mas não tinha como saber pois os atendentes não falavam inglês e a placa estava toda em chinês! Então eu fui comprar outro sanduíche igual ao da Dani e acabei comendo o dele. Surpreendetemente o sanduíche estava realmente muito apimentado. Olha que eu gosto de pimenta, mas aquele McChicken me fez lagrimar. Comi a comida mais apimentada da viagem em um McDonalds!

 

Depois de comer, era hora do seu Chico se recolher ao hotel. Levamos ele lá e saímos de novo para conhecer dois dos mais famosos cartões postais da cidade, a Torre do Tambor e a Torre do Sino. Ambos eram há duas quadras do nosso hotel e podíamos fazer tudo à pé.

 

A Torre do Tambor (Drum Tower) é uma construção do século XIV feita em madeira sobre um pedestal de pedra que se destaca em meio à praça. Sua função era a de marcar as horas durante as noites e também anunciar emergências à população, como um ataque, por exemplo. No pátio externo, no lado norte e no lado sul, podemos ver duas fileiras com doze tambores. Hoje a Torre não serve mais como marcador de horas, mas apresentações com os tambores são realizadas lá em horários determinados (incluso no ingresso). Não assistimos porque já tinha passado a hora. Pode-se visitar o interior da Torre do Tambor que abriga uma exposição sobre a trajetória do instrumento na China. Mas o mais interessante mesmo é observar a estrutura de madeira toda pintada com temas coloridos. Subindo, podemos dar a volta pela sacada, de onde se tem vistas muito bonitas do entorno e da Torre do Sino.

 

Saindo da Torre do Tambor (Drum Tower), fomos à Torre do Sino (Bell Tower). Esta também é uma construção do século XIV e servia para marcar as horas durante o dia e, assim como a Torre do Tambor, alertar a população em emergências.

 

A Torre do Sino (Bell Tower) está no centro de uma rotatória, cercada por um jardim colorido e pelo trânsito intenso de quatro das principais avenidas de Xian. Para chegar à ela é preciso passar por uma passagem subterrânea. Da mesma forma que a Torre do Tambor, no interior da Torre do Sino também está montada uma exposição de instrumentos musicais. Aqui também o que mais chama a atenção é a arquitetura de madeira e a decoração com pinturas que cobrem detalhadamente todos os espaços. Por estar bem no centro da cidade murada, a vista da Torre do Sino é imperdível. De lá podemos ver que, diferentemente de Shanghai, mesmo os prédios mais novos ainda guardam certa identidade com a arquitetura tradicional. Alguns, apesar dos telões de LED na fachada, são cobertos pelos pontudos e curvos telhados escuros e, pelo menos nas redondezas das duas Torres não existem arranha-céus.

 

O ingresso para visitar a Torre do Tambor e a Torre do Sino juntas (chamadas Torres Irmãs) custa 40 Yuans. Separados custam 27 Yuans cada. São pontos imperdíveis e que podem ser visitados em duas horas.

 

Ainda tínhamos planejado ir aos muros da cidade, mas como a Dani já estava cansada e reclamando de dores nas pernas, fiz ela prometer que no outro dia, mesmo depois de passar o dia todo fora no tour dos Soldados de Terracota, visitaríamos os muros da cidade, o bairro muçulmano outra vez e iríamos ver as luzes da cidade acesas. Ela, sem alternativa, aceitou. Sempre me vem à cabeça a ideia de que pode ser que nunca voltemos. Tínhamos que aproveitar tudo que pudéssemos!

 

Na volta para casa, já escuro, passamos em uma mercearia bem em frente ao hotel e compramos chá gelado (descobrimos uma marca muito boa, mas não sabemos o nome pois está tudo em chinês), água e refrigerantes.

 

Outra noite fiquei escrevendo o blog até tarde e dei mais uma olhada no guia da Lonely Planet. A Dani e o seu Chico já estavam no terceiro sono quando fui dormir. No dia seguinte iríamos ver o Exército dos Soldados de Terracota.

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Décimo primeiro dia. Terça-feira, 14 de junho de 2011.

 

Depois do dia cansativo da véspera, acordamos renovados. O dia seria longo, com muitos lugares interessantes para visitar. Tomamos café no hotel e, como combinado, às 09:00 horas o Lee estava lá.

 

O tour que tínhamos comprado incluía o transporte à quatro atrações: o Exército dos Soldados de Terracota, a Tumba do Imperador Qin Shi Huang, as Termas Huaqing (Huaqing Hot Springs) e o Museu Arqueológico do Vilarejo Banpo.

 

Entretanto, eu havia lido na internet e depois no guia da Lonely Planet que, desses pontos, apenas os Soldados de Terracota e as Termas Huaqing seriam imperdíveis. A Tumba do Imperador ainda não foi aberta pois a estrutura é muito delicada e o risco de desabamento e dano às relíquias é muito grande. O que se pode ver é apenas o formato exterior da tumba enterrada, que se parece com um morrinho. Já o Museu Arqueológico do Vilarejo Banpo é considerado um dos mais importantes locais para pesquisas sobre a pré-história na China. Mas, também segundo o guia, apresenta muito pouco para quem não é especialista em achados arqueológicos (parece uma vila tradicional normal e bem pequena).

 

Como queríamos conhecer a Grande Pagoda do Ganso Selvagem (Big Wild Goose Pagoda), explicamos ao Lee, em inglês bem pausado e sem frases muito complexas (uma verdadeira missão), que queríamos ir apenas ao Exército dos Soldados de Terracota, às Termas Huaqing e substituir as outras duas atrações pela Grande Pagoda do Ganso Selvagem. Ele entendeu e acho até que gostou, pois os dois passeios que deixaríamos de ir são distantes, nos arredores de Xian, e a pagoda é bem perto do centro.

 

Ao sul da cidade murada, ainda na área urbana de Xian, a Grande Pagoda do Ganso Selvagem é um ponto imperdível da cidade, sendo inclusive um dos seus cartões-postais.

 

A cidade fora dos muros está toda em transformação. Monumentos, praças, jardins, muitíssimos conjuntos habitacionais, está tudo sendo construído e ainda se vê poucas pessoas nas calçadas e poucos carros nas largas avenidas. Percebe-se que aqui existe uma certa preocupação em harmonizar a história e a arquitetura da cidade antiga com as novas construções. Apesar dos prédios altos, com uns 20 andares, arranha-céus como os de Shanghai aqui não existem e mesmo os edifícios mais novos têm detalhes de arquitetura tradicional. Depois de uns 15 minutos, estávamos em frente à Grande Pagoda do Ganso Selvagem, ou melhor, em frente ao Templo Budista Da Cien, onde ela fica.

 

O Lee ficou nos esperando no carro e nós ficamos à vontade para entrar e passar quanto tempo quiséssemos. O ingresso custa 50 Yuans, mas não dá direito a subir à pagoda. Para isso existe outro ingresso que custa mais 30 Yuans.

 

O templo Da Cien é constituído por vários pavilhões em arquitetura tradicional intermeados por pátios e jardins bem cuidados. A pagoda que domina a paisagem é uma construção de linhas simples, mas bastante significativa. Com 64 metros de altura (equivalente à um edifício de 20 andares) e mais de 1350 anos de vida, a sólida construção já resistiu à terremotos e às intempéries, mantendo-se intacta e imponente. Com certeza faz inveja à muito engenheiro de hoje em dia!

 

A construção do templo data de 648 D.C. e a pagoda foi construída quatro anos depois. O fundador do templo foi um monge budista que peregrinou 17 anos pela Índia, terra natal do Budismo, coletando relíquias, imagens de Buda e sutras. Ao retornar, com apoio do imperador, que dedicou o templo à falecida imperatriz, construiu o templo e a pagoda para ali guardar as peças trazidas. À época, o Templo Da Cien se transformou em um grande centro de tradução de sutras do sânscrito para o chinês.

 

O nome que batiza a pagoda, ”Grande Pagoda do Ganso Selvagem”, vem de uma lenda segundo a qual, um monge, de um ramo do Budismo que não proibia comer carne, estava tristonho pois não havia encontrado carne para comprar. Ao ver um bando de gansos selvagens voando, este monge pediu à Bodisatva (divindade budista) para que ela lhe providenciasse carne. Na mesma hora, o ganso líder do bando quebrou as asas e caiu no chão. Os monges, assustados, entenderam que Bodisatva tinha lhes enviado uma mensagem, a de serem mais piedosos. À partir daí eles se abstiveram de comer carne e, ainda segundo a lenda, a pagoda foi construída no exato lugar onde o ganso caiu.

 

Saímos do Templo Da Cien e voltamos para o carro, onde o Lee nos esperava. Pegamos a estrada (que, como todas que conhecemos aqui, era muito boa) e, uma hora depois, estávamos no estacionamento do sítio arqueológico dos Soldados de Terracota, que parecia até vazio, talvez por ainda ser um pouco cedo (11:30 horas).

 

No caminho, eu pensava como as coisas acontecem de repente. Em setembro de 2010, quando eu e a Dani fomos ao Canadá, ficamos eufóricos em frente ao Royal Ontario Museum, em Toronto, ao ver que estava em cartaz uma exposição sobre os Soldados de Terracota, inclusive com a mostra de uns 4 ou 5 soldados trazidos da China. Achamos aquela uma oportunidade única. Na época, não imaginávamos que menos de um ano depois estaríamos em Xian vendo todos eles ao vivo!

 

A história por trás do Exército de Terracota é fantástica. O imperador responsável pela unificação da China, Qin Shi Huang, fundador da dinastia Qin (221 A.C. a 206 A.C.), e imperador da China por 36 anos, foi o responsável pela unificação de vários reinos rivais, centralizando o poder sob uma burocracia organizada e por isso é visto por muitos especialistas como o primeiro Imperador da China, título que, aliás, ele mesmo se concedeu.

 

Conhecido também pelo seu desdém pelo Confucionismo e por ter mandado queimar vivos 460 dos melhores sábios confucionistas chineses, o imperador resolveu que ao morrer seria sepultado em local a ser mantido sob sigilo eterno. Sua tumba, que fica próxima ao local onde estão os soldados, é considerada muito perigosa para ser escavada e diz a lenda, é constituída de vários palácios cobertos da mais fina arte.

 

Como todos os 700 mil operários que trabalharam na construção da tumba e dos soldados de terracota foram mortos e ali sepultados, bem como não existe qualquer documento escrito a respeito, a localização da tumba e do exército permaneceu em sigilo por mais de 2000 anos até ser descoberta em 1974.

 

O costume da época era sepultar junto com o imperador, todo o seu exército, para que o mesmo seguisse protegido na outra vida. O Exército de Terracota foi feito sem o conhecimento dos soldados de verdade e os substituiu na tumba do imperador, que resolveu poupar suas vidas. A mesma sorte não teve a família imperial. Junto com o imperador foram enterrados 23 de seus filhos!

 

Hoje, o sítio arqueológico é um verdadeiro complexo estruturado para suportar um grande fluxo de turistas. Logo na entrada, fomos abordados por uma guia chinesa chamada Ana (nome ocidental) oferencendo seus serviços. Como ela falava inglês muito bem e nos cobrou 150 Yuans, o que pareceu razoável, resolvemos contratá-la, o que depois se mostrou uma decisão acertada pois ela nos deu muitas informações que provavelmente não teríamos se fizéssemos a visita sem um guia.

 

O local é enorme e, para chegar até o pátio central em torno do qual se localizam as escavações cobertas por galpões, temos que comprar o ingresso que custa 110 Yuans (R$ 27,50) e também a passagem em um carrinho elétrico que nos leva da portaria até esse pátio e custa mais 5 Yuans (R$ 1,25). Como em todas as outras atrações, a maioria dos visitantes aqui é de chineses que vêm de outras províncias do país.

 

Descemos do carrinho e nos encaminhamos primeiramente à uma grande sala onde estão expostas várias peças de bronze que foram encontradas soterradas junto aos soldados de terracota. Em seguida, nos encaminhamos para a escavação 1, a mais famosa (existem outras, mas pouco se pode ver pois quase tudo ainda está enterrado). Ao entrar no galpão, o visual é impactante.

 

A sensação é de ver a história diante de nós. É incrivel como aquilo pode existir. Nenhuma das inúmeras fotos que eu já tinha visto traduz aquela cena perfeitamente. É grandioso.

 

O Exército dos Soldados de Terracota representa um dos mais importantes achados arqueológicos de todos os tempos. A descoberta, entretanto, se deve ao acaso.

 

Em 1974, um agricultor da região, ao perfurar um poço em busca de água acabou encontrando a parte frontal dos túneis e dentro deles os milhares de soldados de terracota em formação de batalha. Hoje, este mesmo senhor, já bem velhinho, autografa livros que contam a história dos soldados em uma das lojas do complexo.

 

A terracota de que são feitas as peças é uma mistura de 6 materiais. Entre eles argila, minerais e… arroz! Chegamos a pegar em uma pedra feita da terracota e ela não esfarela, é bem sólida.

 

A Ana ia nos explicando detalhes e nos apontando os soldados que exemplificavam o que ela contava. Ela nos disse que cada um deles é a cópia fiel de um dos soldados do exército do imperador. Nenhuma das 6000 peças é igual à outra.

 

Os corpos, em tamanho natural, são maciços até a cintura. Da cintura para cima são ocos. A cabeça, que também é oca, era uma peça feita separada do corpo e se encaixava em um buraco no lugar do pescoço (que também servia para liberar o vapor na hora em que as peças eram colocadas no forno). O mais incrível é que, para se certificar de que não haveriam trocas, cada corpo tem um buraco diferente e apenas a cabeça pertencente àquele soldado encaixa perfeitamente.

 

Nem todos os 6000 soldados estão expostos. Muitos ainda estão enterrados e outros em processo de restauração. Ao fazer as escavações iniciais, os arqueólogos encontravam os soldados em mil pedaços.

 

Lá mesmo, dentro do galpão, uma equipe de especialistas trabalha na remontagem desses quebra-cabeças em forma de gente. Perguntei à Ana se havia uma previsão para a finalização dos trabalhos. Segundo ela, se nenhuma tecnologia nova aparecer e, considerando o ritmo atual dos trabalhos (apenas 1000 soldados foram desenterrados e restaurados nesses 37 anos desde a descoberta), tudo será concluído dentro de 180 anos! Ou seja, lá por volta do ano 2200!

 

Apenas um soldado dentre os 6000 foi encontrado intacto e sequer precisou de restauração. Trata-se de um arqueiro ajoelhado que se encontra em exposição em um salão separado juntamente com os únicos seis generais e outras peças importantes. A maioria dos soldados de terracota tem feições de outras regiões da China. Especificamente esse arqueiro é muito querido pela população local pois, além de ter sido o único a ser encontrado inteiro, sua fisionomia leva a crer que ele era natural da província de Shaanxi, onde fica o sítio arqueológico.

 

Depois de umas três horas de visita, fomos caminhando por uma grande via de saída, ladeada por muitas lojinhas. Chegando no estacionamento, pagamos a Ana e ela pediu ao Lee para que nos levasse à um restaurante que ficava na estrada.

 

Por causa da hora, o restaurante estava até vazio e o almoço não demorou. Aqui também, apesar de atenderem muitos turistas, ninguém falava inglês, era tudo na base do cardápio com fotos. Pedimos um prato de coelho com legumes e outro de frango com molho pouco picante e agridoce. Pedimos também arroz, chá gelado e refrigerantes. Comemos muito bem e a conta deu apenas 180 Yuans (R$ 40).

 

De lá, pegamos a estrada e fomos à última atração inclusa no tour, as Termas Huaqing (Huaqing Hot Springs). Paramos o carro em um estacionamento em frente, atravessamos a estrada e compramos os ingressos (70 Yuans cada). O Lee ficou nos esperando.

 

O Palácio Huaqing é um complexo de pavilhões imperiais entremeados por pátios, jardins e vários lagos. Tudo fica ao pé de uma montanha que tem um templo taoista no topo. Para subir tem que pegar um teleférico que é pago à parte e nós não fomos.

 

As fontes termais são conhecidas e utilizadas há mais de 6000 anos. O Palácio Imperial, entretanto, é mais novo, tendo ”apenas” 3000 mil anos de história. A construção data da dinastia Zhou Ocidental (1100 A.C. a 711 A.C.), sofrendo alterações e acréscimos ao longo das dinastias subsequentes.

 

Dentro de alguns dos pavilhões ficam as piscinas de pedra por onde corria água quente e que eram de uso exclusivo do Imperador.

 

A época de ouro do Palácio Imperial foi durante a dinastia Tang, quando ali chegaram a viver 3000 concubinas do Imperador. Em frente a um dos pavilhões está a escultura de uma delas em mármore branco. Esta concubina é famosa por ser considerada uma das quatro mulheres mais belas da antiguidade. Os turistas chineses adoram tirar fotos em frente à esta estátua!

 

Saímos das termas e, uma hora depois, por volta das 18:00 horas, chegamos à cidade. O Lee nos deixou de volta no hotel e combinamos de ele vir nos buscar na manhã do dia seguinte para nos levar ao aeroporto. O seu Chico ficou no hotel e eu e a Dani saímos de novo para conhecer os muros da cidade.

 

Xian é reconhecida como a maior cidade murada do mundo na atualidade e uma das poucas cidades chinesas em que os muros ainda estão de pé e em perfeito estado de conservação. O ingresso para subir os muros custa 40 Yuans e está à venda em vários pontos ao longo de toda a extensão. Nós subimos pelo Portão Sul, considerado o mais importante e bonito.

 

A construção dos muros data do século XIV, durante a dinastia Ming, possuindo a função de proteger a Capital do Império de ataques dos povos nômadas do norte.

 

Com 12 metros de altura, os muros formam um retângulo perfeito e têm uma extensão total de 14 km, compreendendo em seu interior 12 km quadrados da cidade! Em volta dos muros ainda há um fosso cheio de água. No alto dos muros, parece que estamos em uma larga avenida.

 

Mesmo parecendo tão grandes, os atuais muros não são suficientes para traduzir o esplendor da antiga Xian Imperial. Na época de ouro, muros que hoje não existem mais, compreendiam 85 km quadrados da cidade, 7 vezes mais que os atuais!

 

A cada 120 metros de extensão, uma torre servia de posto de guarda para que os soldados que defendiam a cidade pudessem atacar os inimigos invasores sem se expor. Caminhamos ao longo dos muros, observando a cidade e esperando pelo pôr-do-sol. Valeu a pena.

 

No cair da noite, a iluminação torna a muralha ainda mais bonita. Cada uma das infindáveis lanternas vermelhas enfileiradas se acende junto com as luzes das torres. Sem dúvida, os muros da cidade são um passeio imperdível.

 

Descemos pelo Portão Sul, o mesmo pelo qual subimos, que também fica todo iluminado e é mais bonito pelo lado de dentro dos muros que por fora. Logo tivemos a visão da Torre do Sino e da Torre do Tambor também iluminadas, ressaltando ainda mais a beleza da cidade antiga.

 

No caminho, encontramos um Dunkin Donuts e resolvemos comprar uns para levar para o hotel. A caixa com 12 saiu por 60 Yuans (R$ 15). Além dos sabores mais conhecidos, havia alguns bem diferentes como o de carne seca meio apimentada, meio adocicada. Já tinha provado um pão com essa mesma carne seca em Shanghai. É bem gostoso.

 

Ainda sobrou tempo para uma última passada pelo antigo Bairro Muçulmano de Xian. Na feira, buscando por uma boa compra, encontrei um par de leões esculpidos em pedra. Os leões na China são símbolos de proteção e segurança e estão em frente à bancos, hotéis e palácios imperiais. O macho pisa uma esfera que representa o mundo. A fêmea pisa um filhote que representa a família. Quando perguntei quanto custavam a vendedora me mostrou a calculadora com um preço bem alto. Eu ri, disse que não podia e fiz menção de ir embora. Então ela colocou a calculadora na minha mão e praticamente me obrigou a dar uma oferta. Eu coloquei um preço que era menos do que um terço do que ela tinha posto, esperando que a negociação seguisse para um meio termo. Para minha surpresa, a vendedora aceitou! Depois, já embrulhando as peças em jornal, ela pareceu um pouco arrependida e repetia: ”good price, very good price” (bom preço, muito bom preço). Saí do bairro muçulmano feliz da vida com os leõeszinhos na mochila. Aqui é assim, não tem que ter vergonha de pechinchar, nem de ser cara-de-pau!

 

Xian é uma cidade que surpreende pelo tamanho, pelo constante movimento e principalmente pelo rico passado ainda bastante vivo. Uma pena termos ficado tão pouco tempo. Da próxima vez ficaremos mais alguns dias. Acho que uns 4 dias são suficientes para quem quer conhecer tudo com calma.

 

Depois de uma jornada tão cansativa, não nos restava mais nada a fazer a não ser dormir. No outro dia embarcaríamos com destino à nossa última parada na viagem, Beijing.

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Décimo segundo dia. Quarta-feita, 15 de junho de 2011.

 

Nosso voo para Beijing era às 10:00 horas. Na véspera já tínhamos arrumado nossas coisas e de manhã só tínhamos que tomar banho, café e fazer o check-out. O Lee ficou de nos buscar às 08:00 horas. Do centro de Xian até o aeroporto é uma hora de viagem.

 

Confesso que não queria ir embora. Xian é uma cidade muito agradável e acho que ainda poderíamos aproveitar bastante por aqui. Mas só de pensar em ter que ir ao aeroporto e explicar que queríamos remarcar as passagens (até os funcionários da Air China falam muito pouco inglês) e depois avisar ao hotel de Beijing, esperar que eles respondessem rápido e não debitassem do meu cartão o dia que cancelaríamos… muita complicação.

 

Esse problema com a comunicação é tão grande que depois de um tempo a gente começa a desistir até mesmo de tentar falar e se fazer entender. Em razão do idioma acabamos não interagindo tanto com os chineses. Em todos os outros países que visitei eu falava a língua local e a interação com as pessoas era bem maior. Na próxima vez que nós viermos quero poder falar pelo menos algumas palavras em mandarim.

 

O Lee não pôde vir, mas mandou outro motrista no lugar dele (que também falava pouco inglês). Para nosso azar, o trânsito estava bastante congestionado. Chegamos a achar que poderíamos perder o voo. Chegamos no aeroporto e o embarque já tinha até começado. Por sorte não havia fila no check-in.

 

Mais uma vez, nosso voo atrasou. Ficamos embarcados por uma hora até a decolagem. O voo até Beijing, que dura 1 hora e 50 minutos, foi tranquilo. Dormimos quase todo o tempo que ficamos no avião que, por incrível que pareça, era mais confortável e espaçoso que o que faz o voo internacional vindo de São Paulo.

 

Devido ao atraso, chegamos em Beijing às 12:50 horas. Para pegarmos as bagagens temos que pegar um trenzinho que anda uns 10 minutos dentro do gigantesco aeroporto de Beijing. Depois, tivemos que descobrir onde pegar o trem que vai para a cidade.

 

Quando encontramos, compramos as passagens, que custam 25 Yuans cada (R$ 6,25), e ficamos esperando o trem chegar. A estação do trem é aberta e não tem ar condicionado. Aí percebemos que o que uma turista portuguesa tinha nos dito em Shanghai era verdade. A cidade estava um forno! Ali na estação, que é toda feita de vidro, devia estar uns 40 graus!

 

Além do calor e da poluição no horizonte, no caminho percebemos que as distâncias aqui em Beijing são grandes e existem muitas cerquinhas brancas isolando as calçadas e as pistas. Logo íamos sentir na pele o quanto é difícil ser pedestre na capital chinesa.

 

Essse trem (que tem ar-condicionado e é muito confortável) faz o caminho entre o aeroporto e duas estações do metrô, a Sanyuanqiao (linha 10) e a Dongzhimen (linha circular). Nessa última estação tínhamos que descer e pegar o metrô, pagando nova passagem, que aqui custa 2 Yuans (R$ 0,50). Depois de três estações e duas conexões, chegaríamos à nossa estação, a mais perto do nosso hotel, chamada Zhangzizhonglu (linha 5). Parece moleza, mas na verdade é bem cansativo fazer isso carregando as bagagens. As conexões entre estações são feitas por corredores intermináveis e também há muitas escadas e muita, muita gente.

 

O metrô de Beijing é moderno, limpo e a rede é grande, mas acho que eles precisam expandir ainda mais pois vive lotado. Parece que sempre é horário de pico! Claro que eles já estão fazendo isso e umas quatro linhas novas estão em construção.

 

A nossa estação ainda era uma das mais tranquilas. Na região do entorno do nosso hotel todas as ruas têm um nome parecido, começando por Dongsi… É meio confuso. Ao sair, fomos procurando pelo número do hotel e então vimos que tínhamos saído pela saída do outro lado da rua. O problema é que não havia como atravessar a larga e movimentada avenida Dongsishitiaolu pois as calçadas eram isoladas pelas cercas brancas e os cruzamentos eram bem distantes uns dos outros. Tivemos que voltar para a estação do metrô e atrevessar a rua pela passagem subterrânea. Saímos na outra saída do metrô e descobrimos que nosso hotel ficava bem ao lado, há uns 50 metros da estação. Ótimo! Assim não precisaríamos atravessar nenhuma rua para pegar o metrô.

 

Na recepção do hotel finalmente tirei das costas a minha pesada mochila que, junto com o calor da rua, estavam me matando. Demos sorte na escolha dos hotéis. Os de Shanghai e Xian eram ótimos e esse aqui de Beijing também parecia muito bom.

 

Ficamos no Ping An Fu Hotel, que fica na Dongsishitiaolu, quase esquina com a avenida Dongsi, à nordeste da Cidade Proibida. Tínhamos feito duas reservas separadas. Uma para nós três por quatro dias. Outra para mais quatro dias só para mim e para a Dani, pois o seu Chico voltaria para o Brasil mais cedo.

 

Avisei na reserva que queria uma cama extra no quarto para esses quatro primeiros dias e, como ninguém me respondeu, achei que estava tudo certo. Mas não estava. A solução que a recepcionista deu foi nos colocar em dois quartos. Por sorte a gerente do hotel falava inglês muito bem e estava lá na hora que chegamos. Ela foi muito educada e resolveu tudo rapidamente mandando colocarem a cama extra que eu tinha pedido. Pelos primeiros quatro dias pagamos 1.810 Yuans (R$ 452,50). Os outros quatro dias seriam mais baratos ainda pois não incluiriam a cama extra.

 

Aqui eles têm a prática de fazer uma reserva no nosso cartão de crédito como garantia em um valor maior que o valor da hospedagem. Por isso, é bom sempre ter bastante limite no cartão. No check-out eles estornam o valor e debitam o valor correto. Foi assim também nos hotéis de Shanghai e de Xian. Outro valor que nunca está incluso na hora que fazemos a reserva é o imposto de 15% sobre o valor total da hospedagem. É bom ficar atento para não perder o controle dos gastos.

 

Já era 16:00 horas quando, finalmente, chegamos no nosso quarto, muito confortável, por sinal. E a cama extra nem deixou o quarto apertado. Depois de toda essa maratona, estávamos morrendo de fome e foi só o tempo de deixar as coisas e saímos outra vez para procurar um restaurante.

 

Dobrando a esquina, na avenida Dongsi, havia muitos restaurantes e lojas de conveniência e outros comércios. Apesar de, no mapa, não ser uma área longe do centro e de atrações como a Cidade Proibida, a área não é muito turística, é mais para chineses mesmo. Percebe-se isso até pelos letreiros que não tinham nada escrito em inglês. Escolhemos um restaurante que pareceu arrumadinho. Infelizmente nunca saberemos o nome dele pois só havia placa em chinês.

 

Esse restaurante é um dos maiores símbolos da dificuldade em se comunicar que tivemos na China. Ninguém lá, nenhum dos quase 10 funcionários, falava uma palavra sequer de inglês. Nem mesmo a palavra Pepsi, uma marca mundialmente famosa, que era vendida lá, eles entendiam! Palavras simples como chicken, pepper ou rice também não eram entendidas.

 

Para pedir, tínhamos todo um procedimento. Primeiro os funcionários ficavam rindo entre eles e um empurrava para o outro a missão de nos atender (para eles também deve ser muto difícil não poder se comunicar). Aí nos davam um cardápio cheio de fotos (sem nenhuma palavra escrita) dos pratos que eles serviam. Era até bastante extenso, com muitas opções. Depois, apontávamos o que queríamos, o rapaz abria um outro cardápio que tinha o nome do prato escrito em chinês e ao lado em inglês e ele nos mostrava o que era o prato.

 

O detalhe é que quem escreveu o cardápio também falava muito pouco de inglês! Faltavam letras, algumas delas estavam trocadas por outras ou na ordem errada, palavras inteiras eram trocadas (sauce por salt) e fora que, às vezes, o prato tinha pimenta mas não estava escrito lá!

 

Para pegar refrigerante ou chá gelado eu me levantava, ía direto ao refrigerador com porta de vidro e pagava o que queríamos pois não adiantava dizer os nomes das marcas. E eles nem se importavam.

 

Todo o atendimento era feito sem uma palavra! Era como se fôssemos surdos-mudos! E isso na capital do país mais populoso do mundo, cidade-sede das últimas olimpíadas! A ideia de que o inglês é uma língua mundial e que basta esse idioma para poder se comunicar com o mundo todo aqui na China cai por terra completamente. A China me abriu os olhos. O mundo como conhecemos é bem pequeno! Existe muita diversidade por aí.

 

O seu Chico sempre fica no hotel depois do almoço. Mas eu e a Dani sempre saímos de novo. Dessa vez, saindo do restaurante, voltamos para o hotel e tivemos que nos render. Os últimos dias tinham sido bem puxados e nos deixamos descansar um pouco.

 

Combinamos de tirar um rápido cochilo e depois sair para dar uma olhada na Praça Tiananmen, a famosa Praça da Paz Celestial. Estávamos tão cansados que acabamos dormindo pesado. Quando nos espertamos já era 21:00 horas. Demos um pulo e fomos tomar banho para sair.

 

Ao sair, ficamos surpresos com a ”névoa” de poluição que escurecia ainda mais a noite. Desde Shanghai, que é bem mais úmida que Beijing, percebíamos que toda aquela neblina não era normal. Muito daquela neblina era poluição. Beijing é considerada uma das cidades mais poluídas do planeta. Lembro de ter lido notícias de que a cidade teve muitos problemas com o Comitê Olímpico Internacional nos meses que antecederam os jogos por causa da má qualidade do ar. Vários atletas ameaçaram até boicotar as Olimpíadas. Um mês antes da abertura o governo mandou fechar temporariamente indústrias poluidoras do entorno de Beijing. É o outro lado do desenvolvimento.

 

Pegamos o metrô, que ainda estava cheio e, por volta das 22:00 horas chegamos na estação Qianmen. Teoricamente seria só sair da estação e daríamos de cara com a praça. Teoricamente.

 

Aqui todas as estações têm muitas saídas e nunca sabemos exatamente onde estamos. Esperávamos sair e encontrar muitas luzes que indicassem para que lado ir. Mas era tudo muito amplo, sem nenhuma referência conhecida a ainda por cima estava tudo muito escuro e deserto. A forte ”névoa” não deixava que enxergássemos muito longe e a única coisa que podíamos ver eram dois edifícios antiquíssimos que, depois de muito procurar uma placa identifiquei como o Portão Frontal e a Torre dos Arqueiros, ambos resquícios da antiga muralha que circundava a área.

 

Identificado o Portão Frontal, consegui ver adiante um grande prédio e atrás dele a ponta de um obelisco. Olhando no mapa localizei a praça. Mas como chegar lá era outra história. Estávamos presos pelas cercas brancas. Depois de atravessar várias vezes as avenidas por passagens subterrâneas desertas, topando com corredores interditados e nunca conseguir chegar à praça, percebemos o porquê. Simplesmente a praça estava fechada! Por isso todos aqueles postes dourados de design stalinista estavam apagados!

 

Não precisa ser nenhum gênio para imaginar a razão de fecharem a praça à noite. Os acontecimentos de 1989 falam por si. Ali, no coração da República Popular da China, a segurança do regime está em absoluto primeiro lugar!

 

Constatada a impossibilidade de ver alguma coisa, não restava mais nada a fazer a não ser voltar para o hotel.

 

Nosso primeiro contato com Beijing nos fez sentir pela primeira vez a realidade comunista. Em Shanghai e em Xian parece que tínhamos mais liberdade de andar e as ruas eram mais aconchegantes. Aqui em Beijing as distâncias são grandes, os prédios públicos monumentais e as ruas quase não têm arborização. A quantidade de cercas separando tudo nos faz sentir um pouco presos e dificulta muito passear pela cidade. Beijing, sem dúvida, é muito diferente.

 

No outro dia estávamos decididos a ir conhecer a Grande Muralha da China. Como chegar lá ainda era uma incógnita.

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Décimo terceiro dia. Quinta-feira, 16 de junho de 2011.

 

Tiramos o dia para conhecer a Grande Muralha. Visitar esse que é o principal cartão postal do país era o maior motivo do seu Chico ter prorrogado a estadia dele até Beijing.

 

A Muralha da China atravessa várias províncias do norte do país, mas as áreas mais conhecidas são as próximas à Beijing. Os dois pontos mais visitados são Badaling (70 km à noroeste de Beijing) e Simatai (110 km à nordeste de Beijing).

 

Na véspera tínhamos perguntado para uma das atendentes do hotel qual era a melhor forma de ir até a Muralha. Segundo ela nos disse, a melhor forma era pegando uma excursão em um quiosque turístico próximo ao Portão Frontal da Praça da Paz Celestial. O guia citava essa possibilidade e também a de irmos em ônibus de linha (mas seria complicado e arriscado por causa das dificuldades de comunicação). Ainda tentamos saber se havia um serviço como o que usamos em Xian, onde alugamos um carro com motorista que nos levou onde queríamos e ficamos livres para visitar os lugares. Infelizmente ela não conhecia nenhum serviço desse tipo (ou então não entendeu o que dizíamos, o que é bem possível pois ela falava pouco inglês).

 

Tudo que nós queríamos era fugir das irritantes excursões em que se anda de um lado para o outro seguindo um guia com uma bandeirinha berrando em um megafone (pouco se preocupando se está incomodando alguém), sem nenhuma liberdade de escolha e com tudo cronometrado. Incrivelmente esta é a forma predileta dos chineses fazerem turismo e existem muitos grupos como esses nos pontos turísticos. Só de olhar já é irritante, imagina fazer parte da excursão!

 

Ainda não tínhamos nos dado por vencidos. Pegamos o metrô e descemos na estação Qianmen, em frente à praça. Logo encontramos o tal quiosque turístico oferecendo excursões para a Grande Muralha de Badaling. Fomos perguntar se haveria a possibilidade de irmos em um carro particular, no estilo de Xian. Mas simplesmente ninguém entendia uma palavra de inglês! Isso em um quiosque turístico que vende excursões para o principal ponto de interesse do país! Até que surgiu uma moça não sei de onde que falava inglês, nos atendeu e prometeu a ida às Tumbas Ming, que ficam no caminho da Muralha, guia em inglês e ”almoço chinês”, tudo por 160 Yuans (R$ 40) para cada. Como já era umas 10:00 horas da manhã e estava saindo um ônibus naquele momento resolvemos ir e ver no que ia dar. As opções que tínhamos eram pegar a tal excursão ou continuar procurando por conta própria um outro meio melhor de ir e correr o risco de perder o dia nisso.

 

Pois bem, engoli meus princípios de viajante independente e cedemos às circustâncias. Eu e a Dani ainda tínhamos esperança de que uma excursão não fosse tão desagradável quanto pensávamos que era.

 

Logo que entramos no ônibus percebemos que nós três e mais dois belgas que sentaram do nosso lado no fundo do ônibus éramos os únicos ocidentais. Todos os outros eram chineses. Logo a guia começou a distribuir crachás (não gosto nem de lembrar…) e a falar muito. Ficamos esperando, esperando e nada de versão em inglês. Aí percebemos que ela não falaria nada em inglês e que seríamos completamente ignorados durante todo o trajeto.

 

Puxei assunto com os belgas, que também estavam contrariados na excursão e ainda fomos repreendidos porque estávamos falando alto! Tínhamos que ficar ouvindo ela falar em chinês, sem entender nada e ainda por cima calados! E pagamos por isso! Simplesmente a mulher falou por uma hora e meia e tudo em chinês! Cheguei a cochilar.

 

Pois bem, depois de muito ouvir a guia falar, chegamos à nossa primeira parada, uma das Tumbas Ming, reconhecidas como patrimônio mundial pela Unesco. Já tinha lido no guia da Lonely Planet que esse não era um ponto tão imperdível e que não deveríamos esperar nada muito surpreendente.

 

O lugar é até bem simples para uma tumba imperial. Há várias dessas tumbas na região, onde estão os restos mortais de 13 dos 16 imperadores da Dinastia Ming (de 1368 D.C. a 1644 D.C.). Na entrada da tumba que visitamos, a do Imperador Wanli (o ingresso custou 60 Yuans), que foi a mais escavada e pesquisada, vemos alguns portais, um grande bosque de ciprestes muito antigos e uma torre ao fundo, chamada Torre das Almas. Em baixo desta torre está um palácio subterrâneo dividido em cinco salas interligadas por corredores. As escavações foram feitas na década de 50 e a estrutura não é suntuosa, mas a visita é interessante. Não é todo dia que podemos ver o sarcófago de um imperador que governou a China há 400 anos atrás, quando o Brasil ainda engatinhava!

 

Estranhamente, os chineses tem o hábito de jogar dinheiro em toda a parte, como oferenda. Em templos e ao pé de esculturas religiosas acho até compreensível, mas não sei qual o significado de jogar nos sarcófagos do imperador e da imperatriz. Em volta dos grandes caixões vermelhos podíamos ver muitas moedas e notas de dinheiro.

 

O passeio à Tumba Ming durou uma hora e meia mais ou menos. Eu, a Dani, o seu Chico e os belgas tivemos que nos virar com as placas pois a guia não falava nada que não fosse em chinês.

 

Voltamos para o ônibus e alguns minutos depois descemos em uma gigantesca loja de jade, nossa segunda parada nesse périplo. As peças eram até bonitas (um pouco caras), mas a questão é que não queríamos compar jade, queríamos apenas ver a Muralha!

 

Tivemos que ficar lá esperando os turistas chineses olharem todas as milhares de peças à mostra e as vendedoras tentarem tirar algum dinheiro deles. A própria guia, tentava arranhar o inglês com a gente, tentando nos levar para olhar as peças (e ganhar comissão na venda, claro).

 

Pelo visto, apesar de nunca ter ido à parte alguma em excursão antes, a impressão que eu tinha estava correta. É uma verdadeira enganação com o único objetivo de arrancar dinheiro dos turistas. E pensar que estávamos ali só pelo transporte até a Muralha e já tinham se passado umas três horas e nem sinal dela.

 

Depois de quase uma hora esperando todo mundo olhar a loja, fomos encaminhados para o ”almoço chinês” que estava incluído na excursão e ficava bem ao lado da loja.

 

Chegamos à um salão enorme, com capacidade para umas 500 pessoas, cheio de mesas redondas, preparado para a quantidade descomunal de turistas que deve passar por ali na alta temporada. Nos sentamos e ficamos esperando. Logo outros chineses sentaram e as moças começaram a pôr a comida na mesa. Muito arroz branco, peixe, vários tipos de legumes cozidos e uma espécie de pão feita de massa de guioza. Todos pegavam um pouco com os pauzinhos e punham no prato.

 

O estranho era que ninguém se conhecia mas estavam todos sentados à mesa dividindo a mesma comida como se fossem amigos de longa data. Já tinha lido sobre os almoços coletivos, mas não poder escolher o que se quer comer é dureza. Não que a comida fosse ruim, mas não era o que queríamos comer! E não tínhamos opção. Não tinha outro restaurante por lá.

 

Acabado o almoço, pegamos o ônibus e dessa vez iríamos direto para a Muralha. A guia nos vendeu ingressos para um filme sobre a muralha que passa em um cinema 360 graus ao preço de 25 Yuans (para vender ela bem que se esforçava no inglês). Mais uma meia hora e chegamos. Confesso que esperava encontrar muito mais gente no local, mas estava até razoavelmente tranquilo.

 

Compramos os ingressos para entrar no parque (40 Yuans – R$ 10). Mas, como em todos os lugares, o ingresso é compartimentado. Para subir à Muralha tínhamos que pegar um teleférico que nos levaria ao alto das montanhas e a passagem do teleférico custava mais 80 Yuans (R$ 20).

 

A guia nos avisou para estarmos de volta às 16:20 horas. Como já era 15:00 horas, tínhamos apenas uma hora e vinte para aproveitar a Muralha! Achamos aquilo o fim. Perdemos um tempão na loja de jade e só teríamos uma hora e vinte minutos para a Muralha?! Enfim, não era hora de reclamar. Tínhamos era que aproveitar que finalmente estávamos lá e livres da excursão por alguns minutos.

 

Uma aventura nos esperava e não estávamos preparados para ela (principalmente a Dani!). O teleférico era altíssimo, balançava muito e era bem rápido. Por mais que fosse novo e parecesse bem conservado, dava um pouco de medo.

 

Eu e o seu Chico nos divertimos com o ataque que a Dani deu quando o carrinho começou a subir. Ela gritava desesperadamente que não queria mais ir, que queria voltar, invocou todos os santos, chamou pela dona Dóia, fechou os olhos e, chorando de medo, apertou o braço do pai dela! Eu e o seu Chico só fazíamos rir.

 

Chegando lá em cima, mesmo com a neblina que impedia que enxergássemos muito longe, fomos recompensados com uma vista estonteante. É muito mais do que aquilo que vemos nos postais. Eu costumo dizer que nem sempre as fotos traduzem o que podemos ver ao vivo. A Muralha é um desses casos.

 

O setor mais perto da estação do teleférico é muito cheio de turistas. Conforme andamos ao longo da Muralha e nos distanciamos do teleférico, mais bonita fica a paisagem (e as fotos).

 

A Grande Muralha, na verdade, é uma construção formada por várias outras muralhas que foram erguidas separadamente por vários reinos em diversos períodos da história chinesa e depois foram unidas formando uma só estrutura que atravessa o país de leste a oeste. Essa unificação se iniciou na Dinastia Qin, há 2200 anos e o objetivo era proteger a China de ataques dos povos nômades do norte (principalmente os Mongóis).

 

A extensão total da Muralha é uma questão muito controversa. Há estudos que dizem que ela mede cerca de 5000 km. Outros chegam a falar em 8000 km! A falta de conservação em grandes extensões dificulta uma medição precisa pois há lugares em que não restam mais que vestígios da Muralha. O próprio guia Lonely Planet não arrisca dar essa informação. Uma coisa é certa: é uma obra colossal, ainda mais para a época em que foi feita.

 

Ficávamos imaginando quantas pessoas não haviam morrido para construir tudo aquilo em um lugar tão inóspito, no alto das montanhas e sem a facilidade das máquinas. Li no guia que a maioria dos operários era de presos políticos e que era o exército imperial quem comandava os trabalhos.

 

A Muralha além de uma barreira física ao ataque dos inimigos, também servia como meio de comunicação entre a fronteira norte e a capital do império, uma vez que, ao sinal de aproximação de tropas em qualquer parte da longa extensão da Muralha, as torres davam sinal de fumaça que ia sendo repassado de torre em torre.

 

Por estar localizada no cume das montanhas, de onde se tinha uma visão privilegiada dos inimigos que atacavam, são comuns ladeiras muito ingremes ao longo da Muralha. Algumas delas possuem degraus, mas outras são completamente lisas e fica difícil andar sem segurar no corrimão. Chegamos a ver até algumas pessoas caindo.

 

Os belgas me contaram que foram à Simatai e que gostaram muito. Disseram que lá não há quase turistas e a Muralha parece mais natural pois não está tão conservada quanto em Badaling. Justamente por ser um trecho mais conservado, Badaling atrai mais turistas. Mas também disseram que, mesmo com o tempo neblinado que estava fazendo, a vista de Badaling ainda era mais bonita pois a Muralha é mais sinuosa. Em Simatai a construção não tinha tantas curvas.

 

Eu odeio excursão e agora que já passei por uma, odeio com conhecimento de causa. Não indico para ninguém. Só viemos porque não encontramos outro jeito. Só aconselho ir às Muralhas de excursão se não tiver outra opção. A única coisa que não pode acontecer com quem vem à China é deixar de visitar esse lugar. É tão fantástico que faz todo o sacrifício de aturar uma excursão valer a pena.

 

Passeamos bastante pela Muralha e tiramos muitas fotos. Na hora prevista, pegamos o teleférico para descer. A descida não dá tanto medo quanto a subida (deve ser a história de que para baixo todo santo ajuda). Até a Dani se controlou e nem chorou, apesar de deixar o braço do seu Chico dormente de tanto que ela apertou.

 

Fomos ver o filme em 360 graus. É bem interessante, mas está todo em chinês e não há legendas. Acabado o filme, voltamos para o ônibus. Aí a guia fez uma contagem dos passageiros e recolheu os crachás (graças a Deus!). Depois começou de novo a falar e só parou quando chegamos à Praça da Paz Celestial, duas horas depois. Já estava até tonto de tanto ouvir aquela mulher falando. Acho que ela contou toda a história de 2000 anos da Muralha!

 

Chegamos em Beijing e já estava escurecendo. Com fome, escolhemos o KFC mais próximo para jantar. Ao sair, topamos com uma placa onde estava escrito que aquele era o primeiro KFC da China, inaugurado em 1987, em plena praça Tiananmen. Comunismo estranho esse da China, cheio de fast food e lojas de grifes de luxo.

 

Pegamos o metrô, que ainda estava cheio, e voltamos para o hotel. O dia tinha sido exaustivo e apesar da chateação da excursão, estávamos muito contentes. Agora era só tomar banho e dormir.

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Décimo quarto dia. Sexta-feira, 17 de junho de 2011.

 

Hoje decidimos ir à uma rua de comércio de Beijing, a Wangfujing Dajie. Olhando no mapa, parecia perto da estação Dongsi do metrô. Mas não era. Para se orientar por mapas em Beijing temos que ter em conta apenas as avenidas maiores. Há muitas vielas e ruas pequenas que às vezes nem estão no mapa, o que faz os quarteirões serem enormes e a gente se confundir bastante.

 

Essas ruelas são os famosos Hutongs. São como vilas residenciais, geralmente bem humildes (mas não miseráveis), onde vive grande parte da população de Beijing. Estão em extinção em razão do boom imobiliário na China. Provavelmente, em alguns anos, apenas alguns poucos Hutongs ainda existirão.

 

Só depois descobrimos que para ir à parte comercial e de pedestres da Wangfujing Dajie temos que descer na estação Wangfujing. Parece óbvio, mas não para quem olha o mapa. Andamos bastante e o calor estava de rachar, mas chegamos.

 

Comparada com a Nanjing Lu, em Shanghai, a Wangfujing Dajie parece meio sem graça. Apesar das inúmeras lojas de grifes internacionais (Gucci, Dior, Hermès, Channel…) e de outras lojas mais populares, na verdade acho que a área ainda está em consolidação como um centro comercial. Há quadras inteiras fechadas com outdoors escondendo obras. A estrutura do lugar é muito boa, tudo é muito limpo, organizado e seguro. O que falta mesmo são mais opções de lojas e aquele brilho da Nanjing Lu, que é bem mais extravagante.

 

Com o calor de matar que estava fazendo, resolvemos tomar um sorvete em uma loja grandona da Häagen-Dazs. Os preços são muito semelhantes aos do Brasil. A diferença é que a loja oferece um cardápio cheio de opções refinadas, verdadeiros pratos à base de sorvete. Ficamos com os mais simples mesmo. Destaque para o sorvete de chá verde que o seu Chico pediu, que eu só vi na China.

 

Na Wangfujing Dajie encontramos a primeira igreja católica que vimos na China, a Igreja de São José, que é bem bonita. A construção original é de 1655, mas ela já foi destruída e reconstruída três vezes por causa de um terremoto, um incêndio e da Guerra dos Boxers.

 

Eu e a Dani não somos muito de viajar para fazer compras ou gastar nosso tempo em shopping center, estávamos ali mais passeando do que buscando comprar alguma coisa. Seguimos pela Wangfujing olhando as lojas e confirmando o que já tínhamos percebido desde Shanghai: os preços das lojas aqui são muito parecidos com os do Brasil. Engana-se quem pensa que, por ser a China, é tudo de graça. Barato mesmo só alimentação, transporte e hospedagem. O que também tem bons preços são as marcas locais, que nós desconhecemos no Brasil (tipo Erke e Anta, duas marcas de produtos esportivos) e as falsificações (isso se você souber negociar bem). Mas, francamente, para comprar falsificações acho que é mais barato e prático ir à 25 de Março, em São Paulo, do que vir até a China!

 

A única coisa que eu resolvi comprar foi uma calça jeans. E para isso eu fui muito prático. Entrei na Gap e em meia hora já tinha comprado. Os preços regulam com os das lojas nos Estados Unidos.

 

Descendo a rua em direção à estação Wangfujing do metrô, do lado direito, escondido por propagandas, vimos um portal tradicional que dava acesso à uma ruazinha. Fomos ver o que era e tivemos uma surpresa.

 

Tratava-se de uma espécie de feira onde vendia todo tipo de souvenir e, pela primeira vez, encontramos as comidas estranhas que povoam o imaginário ocidental. As bancas de comidas ao longo da rua ofereciam todo tipo de bizarrice. Escorpiões, estrelas do mar, besouros, aranhas, baratas, casulos, centopéias, cavalos marinhos, calangos, carne de cobra e de filhote de tubarão, além de outras coisas irreconhecíveis eram vendidas no espetinho.

 

O mais comum mesmo eram os escorpiões, que eram espetados vivos nos palitos e ainda se mexiam. Quem quisesse comer era só pedir para jogar o espetinho no tacho de óleo quente para ele fritar um pouco.

 

Eu e a Dani, que não temos problema algum com comida, tínhamos prometido que quando encontrássemos essas coisas iríamos provar. Mas confesso que ver bem de pertinho esses bichos é um impacto forte para qualquer estômago. Não é tão fácil quanto pode parecer.

 

Na verdade, não era só o fato de saber o que era. A apresentação também não estimulava muito. Podia ser o prato mais comum do mundo, mas ali, exposto daquele jeito, ainda se mexendo não estimulava mesmo. Talvez em outro lugar se encontre espetinhos mais apetitosos.

 

O seu Chico já estava cantando aos quatro ventos o nosso recuo. Então, criamos coragem e buscamos por um espetinho com escorpiões bem pequenininhos. Encontramos na banca de um chinês bem simpático que nos deu o empurrãozinho final dizendo com seu forte sotaque: ”Verrrry Gooood!!!”

 

Câmera na mão, espetinho com quatro escorpiões comprado e eu provei primeiro. Ao ver que eu não caí duro no chão, a Dani pegou um para ela.

 

Para nossa surpresa, não era ruim mesmo. Tem gosto e consistência de casca de camarão frito. Não é uma delícia maravilhosa, mas valeu a experiência. A título de curiosidade (pois eu sei que essa não é a informação mais buscada da internet), cada espetinho custou 10 Yuans. Outros bichos mais carnudos/suculentos/recheados são um pouco mais caros.

 

Antes que alguém pergunte, eu não vi carne de cachorro nem de rato. Não duvido que tenha em outro lugar, mas ali eu não vi.

 

Uma coisa tem que ser dita. Os chineses podem até ter comido essas guloseimas com mais frequência no passado, em momentos de grande dificuldades, mas hoje eles não são muito fãs não. A dieta cotidiana deles é até bem ”normal”. Esses exotismos só existem porque tem turista besta (que nem eu e a Dani) para comprar. Não vi nenhum chinês comendo essas coisas, só turistas!

 

Depois dessa experiência gastronômica, era hora de almoçar de verdade. Pegamos o metrô na estação Wangfujing e descemos na estação do nosso hotel, a Zhangzizhanglu. Fomos direto ao restaurante da Dongsi Daijie (aquele que eu não sei o nome porque só está escrito em chinês). Comemos bem, comida chinesa ”normal” e depois fomos caminhando para o hotel.

 

O seu Chico ia ficar descansando e eu e a Dani íamos sair de novo. Mas o calor estava tão forte que decidimos dar uma encostadinha e aproveitar o ar-condicionado. Foi só o tempo de darmos uma descansada e saímos de novo. Nosso destino: o famoso Templo do Céu.

 

Pegamos o metrô e descemos na estação Tiantandongmen (linha 5) que, segundo o mapa, nos deixa ao lado do parque onde fica o templo. Como sempre, saímos meio desorientados da estação e seguimos em frente. Andamos uns 200 metros procurando pela entrada do parque, que é todo murado e nem sinal. Tentamos perguntar mas ninguém entendia o que queríamos. Então fomos abordados por um motorista de riquixá (bicicleta com dois lugares atrás) falando um inglês bem basicão.

 

Ele disse que a entrada era longe e ofereceu o serviço dele. Perguntamos o preço e ele mostrou três dedos (trinta Yuans). Então eu disse que estava caro e continuamos andando. Aí ele veio de novo e mostrou dois dedos (vinte Yuans). Tendo em vista que já era quase 16:00 horas e o sol estava de matar, topamos. La fomos nós de riquixá no meio do trânsito caótico de Beijing.

 

O cara cruzava as avenidas sem obedecer o sinal vermelho, parava no meio do cruzamento… teve horas que achamos que seríamos atropelados! Ele chegou a puxar assunto, perguntou de onde éramos e então dissemos: ”Paxi” (é assim que se diz Brasil em chinês e não adianta dizer com a pronúncia inglesa que eles não conseguem repetir nem ligam o nome ao país).

 

Pois bem, depois do cara muito pedalar (uns 15 minutos), avistamos o que seria a entrada principal do parque. Estranhamente o cara parou bem longe e apontou. Então descemos, eu abri a carteira e puxei as duas únicas notas que estavam lá, uma de vinte e uma de cinco (nunca ando com muito dinheiro na carteira!). E não é que o cara tentou nos aplicar um golpe!

 

Ele puxou uma plaquinha onde estava escrito que o serviço era tabelado e custava 300 Yuans! E ele, bonzinho que era, fez por 200 (e não por 20 como qualquer pessoa normal teria entendido quando ele mostrou dois dedos). Simplesmente 200 Yuans era mais do que tínhamos pago para ir à Muralha da China em uma viagem ida e volta de 140 km de ônibus!

 

Aí eu ri na cara dele, engrossei logo a voz e falei em português mesmo: ”Ta me achando com cara de leso?!” A Dani, que não viu a placa, não entendeu nada, mas deu logo um pulo para trás e segurou a mochila e a câmera. E eu repetia: ”No, no, no!”. E esticava os 25 Yuans para ele.

 

Achei que naquela hora seríamos assaltados no meio da rua. Mas, na verdade, o cara parecia mais nervoso do que a gente. Ele sabia que se fosse pego pela polícia estava ferrado. Por isso ele tinha parado longe da entrada do parque. E, ainda por cima, ele não esperava que a gente reagisse daquele jeito. Acho que esperava que nós pagássemos sem discutir como os gringos que ele está acostumado a pegar devem fazer.

 

Então eu peguei os 25 Yuans, dei na mão dele e saí andando em direção à entrada do parque. Ele também nem discutiu mais, viu que o papo dele não tinha dado certo e foi embora rapidinho. No final das contas quem se ferrou foi ele que pedalou que nem um condenado para levar quase 200 quilos (a maioria meus, claro) em baixo de sol forte achando que ia se dar bem me arrancando R$ 50 e, no final, ficou com o equivalente a R$ 6,50!

 

Chegamos no parque aborrecidos, mas dispostos a não deixar aquele espertalhão estragar nosso passeio. Compramos o ingresso para entrar no parque (40 Yuans) e a atendente disse que era só para o parque pois o ingresso do Templo do Céu (que custa outros 40 Yuans) era vendido só até as 16:00 horas!

 

Ficamos desolados e mais aborrecidos ainda. Todo aquele estresse não tinha adiantado de nada. Mesmo assim entramos. Fomos andando e vendo como o parque é bem cuidado até que chegamos nos portões do Templo do Céu.

 

A moça já estava arrumando tudo para fechar e me pediu os ingressos. Como nós não tínhamos, nos fizemos de desentendidos e decepcionados: ”Oh! There are tickets to get in?!” (Oh! Existe ingresso para entrar?!). Me afastei fazendo cara de coitadinho e logo depois voltei com a Dani e tentei pela última vez, mesmo sem acreditar que pudesse dar certo: ”Can we take one photo?” (Podemos tirar uma foto?). A mulher, compadecida com o drama que eu estava fazendo, nos liberou para entrar!

 

Saímos correndo antes que ela mudasse de ideia. Aquilo foi quase um milagre! Entramos sem pagar ingresso e depois do horário de fechamento! Acho que tínhamos que ver aquele lugar mesmo.

 

O Templo do Céu é uma das poucas construções de arquitetura tradicional com telhados redondos. É um ícone de Beijing. Trata-se de um templo taoísta utilizado pelos imperadores Ming e Qing (as duas últimas dinastias) para pedir e agradecer as boas colheitas. A construção data de 1420, tem 38 metros de altura e está sobre uma base composta por três circulos concêntricos de mármore branco. Tudo isso fica em um amplo pátio cercado por um muro.

 

O lugar é realmente muito bonito, vale a visita. Tivemos muita sorte de conseguir entrar. Com menos de 15 minutos que estávamos lá, os guardas começaram a expulsar todo mundo para fechar. Saímos com a sensação do dever cumprido. Seria muito frustrante ir embora sem ao menos uma foto.

 

Caminhando até a saída, demos uma olhada no parque. Como todos os outros que conhecemos, muito bem cuidado e cheio de velhinhos, muitos fazendo exercícios, outros jogando cartas ou um jogo de tabuleiro que parece damas.

 

Ao sair, demos de cara com a estação do metrô. E não é que ela fica bem ao lado da entrada leste do parque! Quando chegamos, saímos e seguimos em frente sem olhar para trás. Aquele sem-vergonha do riquixá deu um voltão com a gente, sendo que a entrada era logo ao lado da estação. Por sorte deu tudo certo.

 

Olhando no guia, vimos que havia um tal Mercado de Pérolas ali ao lado. Atravessamos por uma passarela e fomos lá. Não é nada de mais. É como um grande shopping centerda 25 de Março em São Paulo. São uns 6 andares cheios de falsificações, quinquilharias, roupas e vendedores insistentes. O local estava cheio de turistas americanos e europeus. Para nós, brasileiros, não é nenhuma novidade. Nada que não possamos encontrar com facilidade no Brasil. Tem muitas lojas de pérolas mas, como não entendemos nada, preferimos nem olhar. A possibilidade de sermos enganados era grande (depois da história do riquixá ficamos traumatizados).

 

Ao sairmos, resolvemos emendar direto para a Praça da Paz Celestial e tentar ver a cerimônia de descida da bandeira, que acontece todo final do dia, quando escurece. Então pegamos o metrô, sempre lotado, e descemos na estação Qianmen, na extremidade sul da praça.

 

A Tiananmen, ou Praça da Paz Celestial, mais lembrada no ocidente pela repressão aos protestos pró-democracia de 1989, tem um significado muito grande (talvez mais para o governo do que para o povo). A praça foi planejada por Mao para ser o centro político do país, o coração da República Popular da China (por isso tenha sido escolhida como palco para os protestos).

 

O esquema de segurança é impressionante. A praça é toda cercada. Nas entradas, temos que passar por detectores de metais e revistas. Nos postes dourados com design stalinista, muitas câmeras vigiam cada passo das pessoas que ali estão. Há postes com até 5 câmeras! Isso sem falar nos muitos guardas, fardados e à paisana.

 

Apesar de tudo não dá para negar. É imponente. Ali sentimos a repressão do sistema político fechado, mas também sentimos a sensação de estar pisando um lugar histório, cheio de significado. Muitos prédios importantes ficam localizados ao redor da praça Tiananmen. Um deles é o Grande Salão do Povo, onde a Assembléia do Partido Comunista Chinês, o maior partido do mundo, acontece. Do outro lado da praça fica o gigantesco Museu Nacional da China. Ao norte da praça, no portal da Cidade Proibida, de onde Mao Zedong declarou a República Comunista, a famosa imagem do grande timoneiro observa tudo.

 

No meio da praça, considerada a maior do mundo, um grande vazio é quebrado apenas por um obelisco, por bandeiras vermelhas, esculturas de inspiração soviética e por um único prédio, o mausoléu de Mao Zedong, onde seu corpo está conservado e exposto à visitação pública! Não entramos, mas soubemos que, depois de uma revista rigorosa (não se pode entrar com nada além das roupas) apenas se passa por perto do corpo em fila e não se pode parar. Para entrar é preciso chegar muito cedo e as filas são enormes. O culto à personalidade de Mao Zedong ainda é muito forte aqui.

 

Depois de conhecermos a praça, nos aproximamos do lugar onde fica hasteada a bandeira. Muita gente fica esperando em volta e conseguir um lugar na frente é muito difícil. Para quem é baixinho fica até difícil ver alguma coisa.

 

Esperamos bastante e, quando o sol já havia sumido no horizonte e já estava começando a ficar escuro, por volta das 20:00 horas, um grupo de soldados saiu da Cidade Proibida marchando simetricamente e com toda a pompa. Eles se posicionaram em frente à bandeira nacional que foi baixada, dobrada com toda cerimônia e depois levada por eles para dentro da Cidade Proibida.

 

Logo em seguida as luzes começaram a acender e iluminar os monumentos e a praça começou a ser evacuada. Carros-som e guardas à pé encaminhavam, na base do grito, a multidão que estava vendo a cerimônia para as saídas. Não tínhamos mais tempo nem para uma foto. Era hora da ”praça do povo” fechar. Apenas uma pessoa tem autorização para ficar ali eternamente: Mao Zedong, deitado em seu mausoléu.

 

Saímos da praça já completamente escuro. A Dani já estava quase desmaiando de cansada e só ficou até o fim porque eu obriguei. Comemos outra vez no KFC e voltamos para o hotel de metrô.

 

Chegamos cansados e só fizemos desabar na cama. O seu Chico já estava com tudo arrumado. O dia seguinte seria puxado pois à noite ele ia voltar para o Brasil e ainda tínhamos que ir a dois lugares essenciais de Beijing: a Cidade Proibida e o Parque Olímpico.

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Décimo quinto dia. Sábado, 18 de junho de 2011.

 

Dois pontos de Beijing são imperdíveis e, mesmo tão diferentes entre si, são a cara da cidade: o antiquíssimo Palácio Imperial, mais conhecido no Ocidente como Cidade Proibida, e o moderníssimo Parque Olímpico das Olimpíadas de 2008. Hoje era o dia em que o seu Chico ia embora, então não tínhamos opção, tínhamos que ir aos dois!

 

Como nosso tempo era curto e os locais eram grandes e distantes um do outro, acordamos cedo, tomamos café e fomos pedir para a moça da recepção do hotel escrever em chinês o nome dos locais que íamos visitar para mostrarmos para o taxista. Aí percebemos uma coisa curiosa. Hoje em dia, na China, ninguém conhece a Cidade Proibida por esse nome. Dissemos que queríamos ir à Forbidden City e a moça não entendeu. Pensei até que estava pronunciando errado. Aí peguei o mapa e mostrei para ela e vi que lá estava escrito: The Palace Museum (O Museu do Palácio). Aí foi rapidinho, ela escreveu o nome em chinês, assim como o nome do Parque Olímpico, e fomos.

 

O ingresso da Cidade Proibida custa só 60 Yuans (R$ 15). Isso é uma coisa boa aqui. Por mais famosa e significativa que seja a atração, o ingresso é barato. Todos são na faixa de R$ 5 a R$ 30. Para os chineses deve parecer mais caro tendo em vista os baixos salários do país.

 

Na porta, um vendedor me ofereceu um livro de fotografias de lá. Olhei e achei interessante. Quando perguntei o preço ele me disse que custava 60 Yuans. Na hora eu fiz cara de indignação, devolvi o livro e fui andando mostrando desinteresse (tem uma hora que fazer teatro toda vez que vamos comprar alguma coisa começa a ficar natural hahaha). Aí começou a negociação. Ele veio atrás dizendo que agora era 40 Yuans. Continuei andando e dizendo que não queria mais e ele atrás, baixando o preço. Quando chegou em 20 Yuans aí sim eu parei e comprei. O que custava R$ 15 saiu por R$ 5! Eu realmente tinha gostado do livro e corri o risco de acabar não levando me fazendo de durão. Por sorte esse vendedor era dos mais insistentes!

 

Por falta de atenção, acabamos cometendo um erro que atrapalhou nosso passeio. O taxi nos deixou na entrada norte, na rua que fica entre a Cidade Proibida e o Parque Jingshan. Acontece que aquela é a “porta dos fundos” da Cidade Proibida, a saída. Todos os pavilhões do palácio ficam de frente para o sul, para a Praça da Paz Celestial. Só percebemos isso quando já estávamos dentro, indo contra o fluxo da multidão. Fica a dica: sempre peça para o taxista ir para a entrada sul, onde fica a foto do Mao, que fica de frente para a Praça da Paz Celestial.

 

Depois de algum tempo, começamos a confirmar o que já havíamos lido sobre ao turismo na China. Uma das coisas é que o turismo aqui não é voltado para estrangeiros. Uns 95% (ou mais) dos turistas que estavam nos pontos turísticos que visitamos eram chineses. E chinês fazendo turismo é sinônimo de grupos enormes com guia com autofalante no último volume! Em alguns lugares não havia ninguém que falasse ao menos o básico de inglês para nos atender, era tudo na base da mímica e da calculadora para negociar os preços.

 

Outra coisa que constatamos é que nos fins de semana os lugares turísticos ficam lotados, ou melhor, superlotados (a Cidade Proibida não foi exceção). Quando estamos em um local turístico é quando mais sentimos que estamos no país mais populoso do mundo. O mais interessante é que os chineses, de tão acostumados com multidões, não parecem se incomodar nem um pouco com isso.

 

Fora a superlotação e o fato de termos entrado pela saída, ainda estava um calor de matar em Beijing! As pessoas faziam de tudo para se proteger do sol. Aqui eles têm uma neurose com isso. Ficar queimado de sol não é bonito. É coisa de agricultor, de gente pobre do campo, trabalhador braçal. Algumas mulheres chegam a usar umas luvas compridas igual a das noivas (o que deve piorar ainda mais o calor). Sombrinhas, bonés e até toalhas eram usadas para se cobrir!

 

A Cidade Proibida estava tão lotada que até tirar fotos era uma missão, principalmente dos salões cerimoniais onde ficam os tronos do imperador. Nesses salões não podemos entrar, só podemos olhar da porta, onde a aglomeração era absurda. E pensar que ali era um lugar reservado, onde só o imperador, a sua família e seus empregados podiam entrar…

 

A Cidade Proibida foi construída durante a dinastia Ming (de 1368 D.C. à 1644 D.C.), demorou 14 anos para ficar pronta e serviu como palácio imperial por cinco séculos à esta dinastia e à dinastia Qing, a última dinastia da China, que se encerrou em 1912.

 

A Cidade Proibida é como uma outra cidade dentro de Beijing. Durante o Império, apenas o Imperador, a sua família e os empregados mais graduados podiam entrar lá (daí o nome). Quem cruzasse os muros sem autorização era condenado à morte.

 

Durante muito tempo existiu a lenda de que ali existiam 9.999 salas. Hoje se sabe que existem “somente” 8.707 salas no palácio, que é considerado o maior do mundo. A Cidade Proibida foi declarada Patrimônio da Humanidade pela Unesco em 1987, que também a reconheceu como o maior conjunto de antigas estruturas de madeira preservadas do planeta. É sem dúvida um dos lugares com maior significado histórico que eu já visitei.

 

Desde pequeno, eu já devo ter visto umas cinco vezes O Último Imperador, o filme de Bernardo Bertolucci que tem cenas filmadas ali e conta a história de vida do último imperador da última dinastia chinesa. Nunca pensei seriamente que conheceria aquele lugar. E agora eu estava lá! Nem parecia real!

 

A multidão e o calor tornaram a visita um pouco cansativa, mas mesmo assim valeu a pena. Eu e a Dani estávamos decidos a voltar à Cidade Probida em um dia de semana mais calmo em que visitaríamos o lugar sem pressa. Só tínhamos ido nesse sábado para que o seu Chico não fosse embora sem conhecer.

 

Já era mais de 11:00 horas quando saímos da Cidade Proibida. Ainda tínhamos que ir ao Parque Olímpico e voltar para o hotel no máximo às 17:00 horas pois o voo do seu Chico era às 21:00 horas e o aeroporto é longe. Então pegamos um taxi e, depois de uma meia hora, chegamos ao Parque Olímpico.

 

Acho que o taxista pegou um caminho errado ou então quis nos enganar. Ele nos deixou bem longe do estádio. Tivemos que andar muito, embaixo de sol forte, até chegar ao Ninho do Pássaro. A área é gigantesca e, agora que não há mais o movimento que deve ter tido na época dos jogos, parece um grande deserto com apenas alguns prédios fechados onde funcionaram as instalações do evento.

 

O entorno do Ninho do Pássaro e do Cubo D’Água parece meio abandonado. Poucos prédios por perto e grandes áreas vazias fazem parecer que o Parque Olímpico não foi integrado à cidade. Eu e a Dani tivemos a mesma impressão quando visitamos o Parque Olímpico de Montréal, no Canadá, onde aconteceram as Olimpíadas de 1976.

 

No meio do caminho entre o lugar onde o taxista nos deixou e o Ninho do Pássaro, entramos em um prédio onde ainda funciona um pequeno shopping center subterrâneo. Algumas lanchonetes e cinemas foram as únicas coisas que se sustentaram depois do fim dos jogos. Compramos refrigerantes para aliviar o calor e a fome que já começava a pegar e fomos ao banheiro. Depois saímos e seguimos para o estádio olímpico.

 

Uma coisa é incontestável: a arquitetura do estádio é fantástica. Realmente dá um impacto muito grande. Se o objetivo era impressionar o mundo, eles conseguiram.

 

No entorno da praça entre o estádio olímpico e o parque aquático os espaços estão mais bem conservados e há mais movimento. O ingresso do Ninho do Pássaro custa 50 Yuans (R$ 12,50).

 

Não sei porque eu tinha a ideia de que a estrutura do estádio era feita de metal. Acho que por causa da cor cinza. Na verdade, todas aquelas vigas entrelaçadas são de concreto mesmo. É bem interessante. Ficávamos imaginado aquele lugar lotado em plenas Olimpíadas. Deve ter sido muito bacana.

 

Dentro do estádio vimos que ele também serve à propaganda do governo. Em cada assento havia um panfleto e uma bandeirinha da China. No meio do gramado um palco estava sendo montado. Ali iria ser realizado mais um evento comemorativo aos 90 anos do Partido Comunista Chinês que se aproximava. Realmente para a propaganda governamental o local é ideal, bastante representativo da ”Nova China”, moderna e forte.

 

Dentro do estádio há uma loja com souvenirs oficiais do Ninho do Pássaro e da Olimpíada de 2008. O seu Chico até comprou uma caneca decorada com os mascotes do estádio para dar de presente para a netinha dele.

 

O seu Chico já estava quase jogando a toalha. Também, não era para menos. O calor estava realmente de matar, já tínhamos andado muito e ainda não tínhamos almoçado.

 

Mas ainda restava visitar o Cubo D’Água. A Dani e o seu Chico nem queriam entrar. Já estavam tão cansados que para eles bastava tirar umas fotos. Mas eu forcei a barra e comprei ingressos para todo mundo. Cada um custou 30 Yuans (R$ 7,50).

 

Lá dentro, a recompensa: ar-condicionado! O lugar estava bem agradável e é enorme, bem maior do que imaginávamos. Além das piscinas de competição e outras para treino, o Cubo D’Água abriga ainda um parque cheio de brinquedos e tobogans que é aberto ao público (tem que pagar ingresso à parte). Com o calor que fazia o lugar estava cheio. Se eu soubesse tinha trazido uma sunga!

 

Assim como o Ninho do Pássaro, o local também é usado para propaganda do governo. A piscina principal, aquela onde o Cielo ganhou medalha de ouro, estava seca e um palco estava sendo montado para as comemorações dos 90 anos do Partido Comunista.

 

A estrutura do Cubo D’Água é bem interessante. São lonas plásticas imitando bolhas de ar que ficam constantemente sendo infladas por meio de bombas. De quebra, a estrutura ainda ajuda a isolar o local e manter a temperatura controlada tanto no forte calor do verão quanto no frio rigoroso do inverno.

 

Lá também tem lanchonetes e loja de souvenirs do local e das Olímpiadas de 2008. Os preços são razoáveis. Tomamos um sorvete e nos preparamos psicologicamente para enfrentar o calor lá de fora outra vez.

 

Depois de muito andar procurando acesso à uma rua que não fosse fechada pelas famigeradas cercas brancas, conseguimos pegar um taxi.

 

Chegando no hotel, fomos direto para o “nosso” restaurante na avenida Dongsi (aquele que não sabemos o nome pois só está em chinês). Já éramos de casa e as garçonetes até nos reconheciam. Pedimos o de sempre: arroz, guioza de carne de porco no vapor, brócolis e porco com molho agridoce. O refrigerante eu mesmo buscava na geladeira e eles nem se importavam com o meu abuso. Ali sempre comíamos bem e barato.

 

Voltando para o hotel, foi só o tempo de tomarmos banho e já estava na hora de ir para o aeroporto, levar o seu Chico.

 

O taxi do centro (próximo à Cidade Proibida) até o aeroporto custa 80 Yuans e leva mais ou menos uma hora até lá. Como a passagem do trem que liga o aeroporto ao sistema de metrô custa 25 Yuans e nós éramos 3, mais vale ir de taxi. Pelo menos não temos que carregar as malas e enfrentar o sempre cheio metrô de Beijing. O problema é que quando nós chegamos não temos o nome e o endereço do hotel escrito em chinês para mostrar para o taxista. Sem isso não dá para ir de taxi e o trem acaba sendo a opção mais prática e independente.

 

Outra coisa importante é saber com certeza o terminal do aeroporto. O aeroporto de Beijing é tão gigantesco que existem duas estradas. Uma que leva ao terminal 1 e outra ao terminal 2. É bom ficar atento para evitar perder o voo por causa de um engano.

 

Chegando ao aeroporto, fizemos o check-in do seu Chico e fomos tomar um café. Não demorou muito e ele foi para a sala de embarque. A Dani já estava fazendo cara de choro. Nem parecia que iríamos nos reencontrar em São Paulo quatro dias depois!

 

Para o seu Chico acho que a China foi uma experiência e tanto. Nessa viagem ele abriu o caminho para o crescimento da empresa. Tenho certeza que vamos estar todos por estas bandas de novo não vai demorar muito (assim espero!). Além dos negócios muito bem encaminhados, nós passeamos bastante e ele ainda aprendeu a comer com pauzinhos!

 

Voltamos para o hotel de taxi (mais 80 Yuans). O dia tinha sido estafante. Muito calor e muita andança. Agora, a Dani e eu tínhamos só mais quatro dias para explorar Beijing. O cansaço já começava a bater, mais ainda tínhamos muito a fazer!

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Décimo sexto dia. Domingo, 19 de junho de 2011.

 

Desde que chegamos à China, literalmente não paramos. Acordamos sempre cedo, saímos para passear e conhecer os lugares e só vamos dormir tarde. Essa, para mim, é a melhor forma de fazer uma viagem valer a pena.

 

Existem vários tipos de viajantes. Tem gente que prefere passar a noite na farra, dormir até tarde, acordar e ir para o shopping center. Acaba que, assim, a pessoa viaja e não conhece realmente o lugar.

 

Claro, cada um tem sua forma de se divertir. Nem todo mundo gosta de museus, de arquitetura, ou mesmo se interessa em provar as comidas e conhecer os hábitos e a cultura local. Mas, convenhamos, tem coisas que não precisamos viajar para fazer. E farrear, dormir e comprar são algumas delas.

 

Pelo menos agora que estou jovem, ainda prefiro dormir pouco, provar todo tipo de comida e vivenciar bastante os lugares que eu visito. Conhecer um lugar para mim é isso. É entender como se vive lá.

 

Claro que esse estilo de viagem tem o seu lado ”ruim”. Eu e a Dani sempre voltamos para casa mais cansados do que fomos e, às vezes, no meio da viagem, geralmente perto do fim, perdemos o pique. Hoje foi um dia desses.

 

Quando acordamos, já umas 10:00 horas, fomos logo resolver a situação do quarto. Como o seu Chico tinha ido embora, essas últimas quatro diárias seriam só para 2 pessoas, o que dá diferença no preço pois não precisaríamos mais da cama extra.

 

Descemos, a moça estornou a garantia que tinha feito quando fizemos o primeiro check-in e debitou o valor correto referente aos quatro primeiros dias. Depois, repetiu o procedimento para os próximos quatro dias debitando 2.000 Yuans (R$ 500) como garantia. O valor total (quatro diárias em quarto para duas pessoas mais 15% de imposto) seria de 1.370 Yuans (R$ 342,50). No check-out final seria feito o estorno da garantia e o débito desse valor correto. Por sorte, pudemos ficar no mesmo quarto, evitando ter que arrumar e levar as nossas coisas para outro quarto.

 

Quando saímos, já era quase 12:00 horas. Fomos direto para o Museu Nacional da China, instalado em um prédio absurdamente grande na Praça da Paz Celestial.

 

Chegando lá, vimos que não só a gente tinha pensado em ir ao museu naquele domingo. Havia uma fila descomunal para entrar. Todo mundo em baixo de um sol escaldante. Todo mundo mesmo, velhinhos, crianças e grávidas (aqui não tem esse negócio de prioridade não).

 

Depois de mais de uma hora na fila fomos encaminhados para outra fila pois estávamos com mochilas e elas tinham que ser examinadas. No raio-x eles identificaram um vidrinho de 5 ml de perfume (já quase vazio) dentro da mochila da Dani. O guarda disse, na base dos gestos, que era proibido e apontou uma lixeira!

 

Aí foi o fim. Não era pelo perfume, era pelo abuso! A equipe de segurança ficou espantada com o que eu disse: Ok! So, we don´t want to enter anymore. We´ll go away. Give me my bag! (Ok! Então a gente não quer mais entrar. Vamos embora. Me dá a minha mochila!). Isso a Dani estava dando pití, dizendo que aquilo era um absurdo e tal…

 

E era mesmo. O vidro só estava dentro da mochila dela porque até no aeroporto ele passaria na bagagem de mão sem problemas. Podemos embarcar em um voo internacional com ele, mas não entrar no Museu Nacional da China?! Era psicose demais! Íamos fazer o que com o perfume? Espirrar em um quadro do Mao? Incendiar o museu?

 

Confesso que o nosso aborrecimento com a situação também foi influenciado pelo sol quente de quase duas horas de fila. Mas, até agora, o único lugar onde sentimos o controle do regime sobre a população foi aqui em Beijing, principalmente no entorno da Praça da Paz Celestial onde cercas brancas, muitas câmeras, guardas e revistas constantes abundam.

 

Em Shanghai o clima é de maior liberdade. Engraçado é que, antes de chegar à China, eu imaginava que íamos sentir esse Estado Policial a todo momento. Menos mal que nos sentimos assim só em ocasiões pontuais porque é muito desagradável!

 

Ficamos tão chateados que, quando nos desvencilhamos das inúmeras divisórias de filas e chegamos à calçada, até apaguei as fotos que tínhamos tirado em frente ao museu, só de raiva (como se adiantasse alguma coisa).

 

Talvez tenhamos exagerado. Afinal, deixamos de conhecer um museu que, provavelmente, tinha muito a mostrar. Aconselho a todos que vão à Beijing a irem ao Museu Nacional da China sem mochila para que não passem pelos mesmos problemas.

 

Pegamos o metrô e fomos outra vez para a Wangfujing Dajie, a rua comercial de pedestres. Como não esperávamos o problema no museu, ficamos sem uma programação definida para o dia. Tínhamos tempo de sobra.

 

Na Wangfujing encontramos uma livraria enorme, a Foreign Languages Store, especializada em livros nos mais diversos idiomas. Entramos e fomos atendidos por funcionárias que falavam um inglês muito bom, o que é uma raridade encontrar.

 

Conversando, elas se surpreenderam ao saber que no Brasil todas as regiões falam a mesma língua. A realidade deles é muito diferente. Na China, há mais de 10 dialetos principais que se dividem em vários outros sub-dialetos. O mandarim é, na verdade, o dialeto de Beijing, oficializado pelo governo como o idioma nacional, sendo o mais falado. Daí a surpresa das atendentes com o nosso único idioma.

 

Nessas conversas que temos com os locais percebemos que eles sabem muito pouco sobre o Brasil. Em geral apenas o clichê do futebol. Sequer o carnaval parece ser famoso por aqui. Não é de se estranhar tendo em vista que nós brasileiros sabemos tão pouco sobre a China também. Somos culturas de costas uma para a outra.

 

Comprei alguns livros didáticos de mandarim e um dicionário português-mandarim. Uma raridade! Nunca tinha visto um. Comprei também uns livretos que têm a foto e o nome escrito em inglês e em chinês em baixo. Muito útil em um momento de desespero comunicativo.

 

Saindo da livraria, entramos em uma rua transversal onde vimos uma estátua de um simpático pato amarelo em frente a um restaurante em que a especialidade era o Pato de Pequim.

 

Já tínhamos visto em muitos lugares os patinhos pendurados com a cabeça caída. Ao lado do nosso hotel havia um restaurante com uma vitrine cheia desses patos. A receita do Pato de Pequim é mundialmente apreciada e inclui esse procedimento de deixar o pato com cabeça e tudo pendurado para secar. Queríamos provar, mas ainda não sabíamos onde havia um bom restaurante que servisse. Esse parecia ser muito bom. O nome era Quanjude Roast Duck Restaurant.

 

E não era um restaurante qualquer. São seis andares de um refinado restaurante cuja especialidade eram receitas à base de pato. Em frente, várias pessoas tirando fotos (esse era um bom sinal!). Na portaria, moças em impecáveis vestidos vermelhos de corte tradicional, com ponto eletrônico e microfone, nos receberam e nos encaminharam para um dos andares onde outras moças nos esperavam e nos levaram até a nossa mesa, em um enorme salão onde o dourado predominava. O restaurante estava cheio.

 

No cardápio gigante podíamos escolher entre arroz de pato, salada de pato, souflé de pato, pastéis de pato… e, claro, o carro chefe da casa, que não podia ser outro: o Pato de Pequim.

 

Pedimos uns bolinhos de trigo adocicado de Pequim, guioza de camarão, arroz de pato frito, salada de pato e, é claro, o Pato de Pequim, com os seus devidos acompanhamentos. Enquanto esperávamos, começamos a olhar as outras mesas para saber afinal, como se comia o tal pato. O problema é que aqui muitos restaurantes não têm talher e se tivéssemos que destrinchar o bicho só com o kuwé (pauzinhos) ia ser meio complicado.

 

Mas logo percebemos como é o esquema. O cozinheiro traz o pato assado inteiro em um carrinho e corta ele todinho em pequenos pedaços diante da nossa mesa. No nosso caso, não foi o pato inteiro pois ficamos com medo de ser muito e pedimos só metade.

 

Logo de início, o garçom serve a pele crocante, adocicada e suculenta do peito do pato, uma parte privilegiada. Depois outra parte especial que eu não consegui identificar de primeira, mas provei e gostei. Aí eu virei a parte que tinha ficado no prato e vi que se tratava da cabeça do pato e que eu tinha comido o cérebro dele.

 

O Pato de Pequim é assado e crocante, com a pele ligeiramente adocicado e a carne quase derrete na boca. É servido acompanhado de pequenas e macias panquecas cozidas no vapor, finas tiras de cebolinha e pepino crus, molho de soja, alho socado e açúcar cristal. Colocamos um pouco de cada ingrediente na panqueca, aí é só enrolar e pôr de uma vez na boca.

 

A mistura desses sabores é indescritível, única. Comemos até não aguentar mais. Não dava vontade de parar. É sem dúvida uma das coisas mais deliciosas a se comer por esse lado do mundo!

 

A conta saiu bem mais cara do que a média dos outros restaurantes onde comemos nessa viagem, mas valeu cada centavo. Por tudo, incluindo as bebidas e o serviço, que aliás foi impecável (foi o primeiro lugar onde nos cobraram 10%), pagamos 437 Yuans (R$ 109,25), uma pequena fortuna para os padrões chineses.

 

Na saída, percebemos que tínhamos tirado a sorte grande. Aquele era um restaurante realmente fora do comum. Vimos uma placa onde dizia que o próprio Mao Zedong elogiou o Pato de Pequim de lá, um motivo de orgulho para eles. Essa mesma placa contava um pouco da história do restaurante que foi fundado em 1864, ainda durante a dinastia Qing, tendo, portanto, 147 anos de tradição.

 

O Quanjude Roast Duck Restaurant fica no Hutong Shuaifuyuan, que cruza a Wangfujing Dajie, mais precisamente do lado direito de quem sai da estação Wangfujing e segue em direção à parte de pedestres. Recomento fortemente.

 

Saindo de lá estávamos até tristes, mas não nos rendemos. Durante o almoço lemos no guia sobre uma rua cheia de lojas de antiguidades e arte, a Liulichang Xijie. Então fomos para lá.

 

Pegamos o metrô na estação Wangfujing, descemos na estação Qianmen Xidajie e caminhamos uma quadra rumo ao sul na Nanxihua Jie. Olhando no mapa parece fácil, mas é um pouco mais complicado, pois quando saímos da estação ficamos meio desorientados.

 

Essa rua, apesar do entorno movimentado, é bem tranquila. O ambiente é de uma vila tradicional, pitoresca, interessante. São dezenas de lojas de antiguidades e obras de arte, com a fachada decorada, uma ao lado da outra.

 

Os Hutongs que cruzam a rua são cheio de casas e as pessoas que moram lá ficavam nos observando enquanto passávamos. Ali, em plena Beijing, uma metrópole gigantesca, ainda vemos as pessoas tranquilas na porta das casas, jogando cartas e conversando ao som das cigarras dentro de suas pequenas gaiolas e de um cântico tibetano que vinha de uma das lojas e ecoava por toda a rua.

 

Há muita coisa bonita, mas também muita quinquilharia. Comprei uma imagem de Buda meditando, feita de cobre, dourada. Todo preço pode ser negociado. Comprei por um terço do preço original.

 

Procuramos também por vasos de porcelana chinesa. A Dani queria levar um para a mãe dela. O problema é que os que nos agradavam eram caríssimos (algo em torno de R$ 1.000 ou mais!).

 

Os preços, em geral, são altos. As melhores peças são quase impossíveis de serem compradas de tão caras. Mas, certamente, para um paciente colecionador de arte chinesa, a Liulichang Xijie é o paraíso.

 

Andamos a rua toda de ponta a ponta e entramos em quase todas as lojas, a maioria delas abarrotada de peças. Como era domingo, algumas lojas já estavam fechando. O dia passou muito rápido.

 

Estávamos muito cansados e decidimos voltar para o hotel mais cedo. Chegando lá, tomamos banho e comemos alguns pães e refrigerantes. A Dani logo dormiu. Eu vim escrever no blog, que já estava bem atrasado. No outro dia íamos retornar à Cidade Proibida para uma visita com toda a calma. Estávamos decididos a fazer o dia render bastante!

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