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"Ando devagar porque já tive pressa
E levo esse sorriso
Porque já chorei demais

Hoje me sinto mais forte
Mais feliz, quem sabe
Só levo a certeza
De que muito pouco sei
Ou nada sei..."

                                     (tocando em frente)

          Não penso em forma melhor de resumir essa experiência ímpar na minha vida (e com certeza na vida de muita gente que o fez) do que parafraseando uma letra tão bonita e reflexiva, cantada por tanta gente. 

          O ano era aproximadamente 2018 ou 2019. Eis que nas minhas buscas por aventuras futuras, e como alguém que namora o famoso Santiago de Compostela há um tempo, descubro a versão brazuca da grande peregrinação. Anos passam, até que resolvo atender ao chamado do caminho em 2022.

          A época escolhida foi o mês de Agosto, quando o inverno está mais ameno e a primeira "alta temporada" do CF já passou (Julho é um mês muito forte de peregrinos e bicigrinos, juntamente com o mês de outubro, em virtude das festividades de Nossa Senhora Aparecida). Peguei uma via bastante tranquila, o que de certa forma foi uma coisa boa, já que não precisaria me preocupar com reservas nas pousadas, por exemplo. Apesar de alguns períodos de frente fria no sul/sudeste brasileiro, o clima se mostrou estável na maior parte do tempo. 

          Mas, antes disso, aproveitando que iniciaria no ramal de Águas da prata, resolvi passar uns dias na vizinha, Poços de Caldas, e conhecer um pouco desta comentada cidade, em primeiro lugar.

Dias 3-6/08: desvendando a terra das águas medicinais

          Após uma viagem de ônibus de quase 5 horas da grande São Paulo até Poços, eis que chego na tranquila cidade. Apesar do clima ameno e do frescor característico das cidades escondidas em elevações, o sol estava bem forte. A primeira coisa que percebi foi a pequena quantidade de ônibus disponíveis, sendo que nenhum aparecia para me retirar da rodoviária, um pouco afastada do centro turístico/comercial. Por motivos pessoais não uso uber, e o 99 não estava me ofertando valores muito justos para os 4km que me separavam do hotel, então, por que não botar as pernas para trabalhar e já exercitá-las para o que me esperava alguns dias depois? 

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Da avenida Mansur Fraiha já era possível ver um projeto de monotrilho abandonado, dizem que a gestão local tem planos para recuperá-lo, o que seria bom para o turista. Lá em cima as torres de rádio do conhecido mirante da cidade.

          O bom destas andadas é que vamos conhecendo alguns pontos da cidade, e vendo onde dá para almoçar mais barato, comprar mantimentos, ou mesmo se há atrações turísticas que passam batido. Após uma horinha do "cooper vespertino", o relógio floral anuncia minha chegada ao centro turístico. Sim, ele funciona e é lindo, mas penso que deveria haver uma plataforma melhor para que as pessoas consigam tirar fotos mais bonitas. De drone, os registros devem sair espetaculares. 

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Atrás deste, um monumento em homenagem aos poços-caldenses que fizeram parte da FEB durante a segunda guerra mundial.

          Minha hospedagem ficava convenientemente próxima ao Parque José Affonso Junqueira, o principal point do turismo de Poços, fato que tornaria a visita aos principais pontos turísticos fácil (e até repetitiva, caso eu gostasse de algo em particular). Poucos atrativos da cidade (também legais, diga-se de passagem) ficam afastados, então, para quem não dispõe de um carro próprio, e não quer ficar dependendo de bus/aplicativo, dá para curtir uns 70% da cidade só no centro #ficadica.

           Hospedagem acertada, só me restava andar pelas redondezas. Cidade interiorana, mas com o centro comercial fervoroso do seu jeito. Dei sorte de dar de cara com o letreiro de Poços com a fonte ligada, e o sol da tarde embelezando a mesma para belos registros.

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Simplesmente lindo

          Nesta região encontram-se: as Thermas Antônio Carlos, a principal casa de banhos termais da cidade, algumas fontes de água potável (com certificados atualizados e tudo mais, o que aumentou minha confiabilidade para beber água quando desse na telha), o Xadrez Gigante (apesar de ser péssimo enxadrista, pude me divertir com as fotos tiradas), a Praça do Imigrante (dedicada à contribuição e influência italiana na construção da cidade), o Calendário Floral (atualizado e igualmente bonito), o antigo Palace Cassino, entre outros pontos. Difícil não tirar um dia somente para este pedaço.

          A cidade é conhecida pelas suas águas medicinais para consumo e banho, fato que cativou e levou Dom Pedro II à cidade para a instalação de um projeto ferroviário. Não é preciso andar muito para dar de cara com uma fonte, com água fresca e própria para consumo. Comprar água mineral aqui? Teria que ser louco para tal. 

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          Antes do fim do dia, queria uma visão privilegiada da cidade. Atraído pelo pequeno Cristo no alto de um morro, corri para a trilha do Mirante do Cristo, onde é possível fazer várias coisas, mesmo afastado da parte urbana. A trilha começa na Fonte dos Amores, porém, não a visitei nesse dia. Trilha fácil, que exige apenas bons joelhos para aguentar as escadas naturais, pois o desnível é moderado. 20 minutos e você já está lá em cima.

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          Por sorte, como era dia de semana, peguei a região bastante tranquila, o que permitiu uma melhor contemplação e contato com a natureza local. Lá em cima você ainda pode ir para o mirante das torres de rádio, visitar um observatório abandonado, cruzar com trilhas de MTB (o ciclismo é forte na região, até porque Poços faz parte da Rota do Vulcão, circuito ciclístico que pega as cidades da antiga "caldeira" vulcânica que formou a região), e ver o pôr do sol do outro lado do morro, onde é realizado vôo de parapente. Um charme. Local ideal para ensaios fotográficos, também.

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          Um porém: o mirante não tem iluminação de postes, então se você subiu a pé, o recomendado é que você desça antes das 17:30 para não pegar a estrada de acesso "no breu" (a trilha do mirante fica perigosa no escuro e a fonte dos amores tem um portão que fecha, o que não torna a trilha uma opção de retorno). Há um serviço de bondinho que liga o parque José Affonso ao mirante, porém este se encontrava em reforma na ocasião. Por que falo isso? Simples, tive que descer tudo pela estrada no completo escuro em dois dias :lol:

          No dia seguinte, fui conhecer o que não tinha visitado no dia anterior. Para minha sorte, uma grande exposição de carros antigos iria acontecer na cidade, após 2 anos de cancelamentos em virtude da pandemia. Deu para ver todo tipo de auto, seja customizado ou conservado. Vi modelos que nem sabia que existiam.

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Ah, nosso antigo Elon Musk, o que o Brasil fez com o senhor.....?

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THAHEEEELLLLLL??????? ::lol4::

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Após 125 movimentos, o rei branco cai. Longa vida ao exército negro!!!

          Afastando-me um pouco do centro turístico, dou de cara com outra casa de banhos, o Balneário Dr. Mário Mourão. O prédio é menos belo do que o Thermas, porém, os serviços oferecidos no lugar são um pouco mais baratos. Neste local também fica a Fonte dos Macacos, com sua água fortemente sulfurosa (cheiro e gosto de ovo bem evidentes, arrisquei um gole e um arroto para dar a impressão de que estava "peidando pela boca". Não, não tive infância ::lol4::::bruuu::)

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É um costume rotineiro lavar o rosto, mãos, pernas e pés na fonte dos macacos, os velhinhos adoram

          Para finalizar o dia, fui conhecer a fonte dos amores. O local é pequeno e belo, e a estátua do jovem casal é um detalhe naquele pedaço de natureza. Existem duas principais estórias a respeito do "casal" da estátua, e a crença de que se um solteiro beber daquela água, logo se casará. E se for casado, a Poços de Caldas sempre retornará. E esta profecia provavelmente atrai grande estima, porque rima.

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          No terceiro e último dia em Poços, fui ao Mercado Municipal atrás de lembrancinhas. Em matéria de produtos coloniais, o mineiro não brinca em serviço, e dá para encontrar de quase tudo naquele pequeno espaço comercial. Adquiri as lembrancinhas, e quase 2kg de doce de leite (o que é quase loucura para quem vai fazer o caminho da fé e precisa do mínimo de coisas na mochila :lol:). 

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          Nesse dia, queria conhecer a Pedra Balão e o Dedo de Deus, pedras de formatos curiosos visitáveis a uns poucos quilômetros da cidade. Mas como o sol estava forte demais, e não sabia se no local haveria internet para chamar um carro por aplicativo, pulei esta atração. Mas fica a dica. Por outro lado, visitei o Jardim japonês, que fica nas dependências da cidade. Fruto de uma colaboração de uma grande empresa de fertilizantes, o espaço possui uma caracterização oriental simples. É possível alugar kimonos e réplicas de wagasas e espadinhas (aquelas bem vagabundas pro peão pagar de samurai) para ficar caracterizado e fazer ensaios, por exemplo. A cereja do bolo do jardim, a casa de chá, foi destruída pela ação de vândalos, recentemente, e estava em fase de recuperação, o que tirou um pouco do brilho do lugar. Mas há a fonte dos três desejos, ponto tradicional para fotos. 

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Por favor, traga-me amor, saúde e inteligência. 

          Após esse passeio, fui atrás de um rango, e descansei no hotel. De tarde fui ao Museu Histórico e Geográfico de Poços de Caldas, onde é contada parte da história da cidade (obviamente). Visita rápida. E para fechar, por que não experimentar a fama da cidade? Um banho nas místicas águas seria o gran finale para esta visita, o que fez eu retornar ao Balneário Dr. Mourão.

 

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          Impressões de Poços: é o tipo de lugar que gosto, um contato tremendo com a natureza, boa arborização do centro, limpeza considerável das ruas, atrativos próximos, sensação de tranquilidade, e com várias opções de atividades. Algo que gostaria de ter tido a oportunidade de fazer era trilha de MTB, pois a cidade e seu entorno possui muitas trilhas para essa atividade. Também houveram lugares que não visitei, como a cachoeira véu das noivas, a represa Bortolan, a cachoeira das antas e seu entorno, o parque Walter World, além da pedra balão e dedo de Deus mencionados anteriormente, maaaaas, essas coisas sempre nos motivam a retornar. Voltaria, sem dúvidas.

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06-08/08: Rolezinho em Águas da Prata

          Após alguns dias em Poços, era hora de levantar acampamento e seguir para a base do ramal principal do Caminho da fé, Águas da Prata. Mas, chegar da maneira tradicional não teria graça, e só iria começar a jornada no dia 09/08, então, o que fazer?

          Nas minhas pesquisas prévias, tomei conhecimento de uma rota de ferrohiking entre o pequeno bairro de Cascata, na divisa do estado, até Águas, de aproximadamente 17km. Seria um bom exercício para as pernas, e um verdadeiro off the beaten path da região. Peguei os horários de ônibus, e saí pela parte da madrugada, de Poços para a divisa dos estados.

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Essa viatura circulou e parou bem pertinho enquanto eu fazia os registros, pensei que iria rolar um puta interrogatório suspeito e zikar meu passeio ::lol4::

          O bairro de cascata pertence a Águas da Prata, é bem isolado e meio largadinho, com aquele ar de periferia/bairro rural. Bateu receio de cruzar com nóia, mas graças a Deus, apesar de tudo fechado naquela hora da manhã, era somente eu cruzando as ruas. Eis que encontro a estação (aparentemente abandonada) de Cascata. Avisos de proibição de pedestres Ignorados #thuglife, mais umas olhadas para ver se estava sendo observado, horário de início memorizado, e começava a andar nos trilhos.

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          Num primeiro momento a trilha é fechada, sem muito a observar a não ser a próxima curva. Pela quantidade de cascalho característico das vias ferroviárias, só poderia andar pelos dormentes do trilho, tornando o ritmo lento. Li que era comum encontrarem animais atropelados nesse trecho, entretanto não foi o caso na minha passagem.

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          Após quase uma hora do cooper matinal, a paisagem começa a mudar, e a vegetação se dispersa do lado direito (sentido Águas), oferecendo as primeiras visões daquele sobe-desce característico da região. Avistava algumas fazendas, a SP-342, e um belo horizonte sendo acordado, aos poucos, pelo sol da manhã.

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          Neste ponto, não demora muito e o mirante da Prata e a Ponte do Tajá são avistados, uma das partes "emocionantes" desta trilha. Isso porque a pequena ponte é "vazada", tem aproximadamente uns 150m de extensão, e 25m de altura. Comparado com um viaduto mula preta da vida (ferrovia do trigo), esta é uma brincadeira de criança, porém, com a possibilidade de se ouvir o apito do trem de carga chegando no momento da travessia (pois este não tem um horário definido), a pequena brincadeira ganha um belo tempero. Parei, contemplei o horizonte, tirei umas fotos e comecei a atravessar a ponte, atento a quaisquer sons atípicos. Sem problemas. Para quem tem problemas com pontes ou alturas, há uma trilha lateral segura. Ainda atravessei a ponte uma segunda vez.

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          Após a travessia, notei que chegava no início da ponte um pequeno grupo feminino. Ótimo, alguma companhia para o caso de incidentes é sempre útil, mas não esperaria elas atravessarem a ponte, pois o sol estava começando a tomar conta de tudo, e o calor de um dia ensolarado logo iria incomodar, então tratei de seguir caminho.

          Passada mais uma hora, entro em um pequeno túnel de aprox. 60m. Acreditem ou não, escutei vozes lá dentro. Não sei se estava perto de uma fazenda, se haviam pessoas em cima da passagem, se algum efeito do eco levava vozes distantes para dentro da estrutura, ou se havia algo sobrenatural em curso. Não nego, deu um pequeno nervosismo, e logo tratei de deixá-lo para trás ::mmm:

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          Após mais uma hora e meia aproximada, começo a escutar sons de água. Sabia que dos trilhos podia entrar na Trilha das Sete Quedas, ponto quase que obrigatório para quem está na região. Stan em dia ensolarado estava pedindo por um banho gelado, porém, não sabia a extensão da trilha, e quanto tempo gastaria aqui, então neste primeiro momento, decorei o local da entrada e segui meu caminho. 

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É interessante memorizar esta curva após uma grande elevação, a trilha das sete quedas começa aqui.

          Era em torno de 11 da manhã quando cruzei com os primeiros transeuntes que vinham em sentido contrário, estes indo para as sete quedas. Um rapaz trazia um cachorro aparentemente feliz, e uma moça carregava um gato enjoado numa daquelas mochilas para pet. Senti pena do gato, trilha em dia ensolarado não é lugar para esses bichanos.

          Finalmente às 13 horas, alcançava meu destino, a estação de Águas da Prata (apesar de ter andado pela rua nos metros finais por medo de ser multado por sei lá, algum guardinha de passagem :lol:)

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          Comemorações feitas, restava agora procurar um almoço, a hospedagem, e informações sobre a peregrinação. Por ser sábado, a AACF - Associação dos Amigos do Caminho da Fé estava fechada, porém, havia feito a reserva prévia pelo booking na Casa do Fábio, que coincidentemente era parceira do caminho. Consegui as informações desejadas com o anfitrião (muito gente boa, diga-se de passagem) e a credencial do peregrino, obrigatório para a emissão do certificado mariano na basílica de Aparecida. Como as coisas acontecem, não?

          Com isso, só restava fazer as compras para as refeições dos próximos dias, e curtir o tempo disponível. Nesse período, conversei bastante com o Sr. Fábio sobre todo tipo de assunto, ouvi a história de vida dele, e pude compartilhar curiosidades sobre meu estado, Amazonas, que raramente chegam ao conhecimento do sulista. 

          No domingo, esperava encontrar algum movimento no pequeno centro turístico de Águas da Prata que basicamente é um amontoado de quiosques próximos da Fonte Vilela, famosa por derramar a "água mais radioativa das américas". Nas dependências, os macacos-prego, mal-acostumados com os restos de comida dados pelos turistas, chegam pesado quando veem que o movimento está bom no local :lol: Aqui é um bom ponto para devorar os derivados de milho vendidos.

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Mais uma fonte de água de qualidade, fazia questão de andar meia hora da pousada até aqui para recarregar a garrafinha

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Já é da rotina das moças dos quiosques a pequena gangue exigindo "pedágio". Os peludos até possuem nomes.

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A água dança e anuncia a renovação da vida

          Em Águas da Prata tem e ao mesmo tempo não tem muita coisa para se fazer. Além dos quiosques, da fonte, e um mirante na cidade, há algumas cachoeiras no entorno, boa parte delas afastadas. Como ainda era de manhã, e o dia prometia sol forte, resolvi voltar aos trilhos de trem e fazer a trilha das sete quedas. No caminho, pude ver alguns carros antigos retornando do evento de Poços de Caldas para seus lares, oferecendo ao expectador um túnel do tempo. Foi lindo de ver =D

           A trilha das sete quedas tem uma dificuldade de fácil para intermediário. Sinalizada com tinta nas árvores, um pequeno esforço para subir em pedras e raízes de árvores se faz necessário, enquanto o visitante vai subindo o curso d'água. Apesar da região estar passando por um período de seca e as quedas estarem fraquinhas na ocasião, haviam pontos legais e bonitos para aquele banho gelado (do tipo entrar na água e sair com o corpo dormente ou dolorido de frio ::Cold::).

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Não sei se é a segunda ou a terceira queda, só quem conhece saberia dizer com exatidão

          Após uma hora e meia, mais ou menos, consigo chegar na sétima queda. O esforço valeu a pena, pois a paisagem cativa

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          A volta seria cansativa, porém, há o pulo do gato: da sétima queda há um ramal de acesso que termina quase que nas dependências da cidade. É possível chegar de carro na sétima queda, inclusive, porém há uma porteira onde é feita a cobrança dos visitantes no caminho. Era um "semi-alívio", pois meus joelhos reclamaram um pouco nessa trilha. Na volta, quase me perco na floresta de eucaliptos, vi umas trilhas de MTB super da hora, e tive que fazer uma bela descida de desnível acentuado no meio de plantações de café. Uma aventura e tanto.

          No terceiro dia, o clima estava dando sinais de uma mudança drástica: chuva fraca e tempo fechado na região. Por um lado era um alívio para a vida local, uma vez que havia meses que não chovia, e por outro eu precisaria me preparar para a possibilidade de começar a grande caminhada embaixo d'água. Isso não seria exatamente um problema, pois tinha capa de mochila e uma jaqueta impermeável. 

          Nesse dia, em virtude da chuva, não pude fazer muita coisa, a não ser desejar boa viagem para os bicigrinos de saída, observar a tranquilidade da cidade em uma tarde de segunda, e refletir bastante sobre a jornada que começaria no dia seguinte.

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09/08/22 - 22/08/22 - A jornada

          Após uma noite mal dormida, preocupações acerca do peso da mochila (quando saí de Manaus ela pesava quase 8kg), e uma bela crise de ansiedade, eis que me despeço do seu Fábio na manhã nublada de terça. Passo na fonte Vilela para mais uma abastecida na água, realizo uma pequena oração na base da primeira ladeira que iniciaria os 30km que me separavam de uma cama quentinha em Andradas, e começo oficialmente a peregrinação. A chuva não cairia naquele dia.

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Partiu?

          Como muitos ciclistas haviam deixado a cidade no dia anterior, imaginava que o primeiro trecho seria bastante solitário. Entretanto, após o primeiro quilômetro, encontro um casal aparentando os 5.0 mais à frente. Alcanço eles e a boa e velha conversa de trilha inicia. O homem, Sr. Wilson, estava realizando pela sétima vez a jornada. Conseguiu convencer a esposa (Srta. Ângela) a acompanhá-lo dessa vez, o que achei o máximo. Os filhos não puderam vir. Apesar de o esposo estar em um ritmo mais lento para a sua senhora ir se acostumando, não demorou muito para que eles me deixassem para trás. Isso porque além de eu parar bastante para tirar fotos ou contemplar algum lugar, estava "moldando" meu fiel cajado. 

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Achei bonito o simpático casal com o suporte de um ao outro (além do Divino, claro), fiquei me perguntando se teria esse prazer de refazer o caminho acompanhado no futuro...

          Um ponto interessante: em alguns lugares é comercializado o cajado de bambu (para quem não tem o bastão de trekking), mas por vários motivos, optei por arriscar em um dos vários bambuzais que surgem na estrada. Logo nos primeiros quilômetros vi um pedaço enrolado numas vinhas que chamou a atenção. Parecia lance de videogame, quando o item do herói surge cravado em uma pedra numa clareira escondida :lol: . O cajado/bastão é altamente recomendado, pois como o caminho possui MUITA subida/descida, o item dá um pequeno suporte ou alívio para as pernas, além de ajudar a espantar animais, medir profundidade de poças d'água, dar porrada em infiéis entre outros usos. Quase uma toalha!

          Esse trecho é marcado por muitos km em campos de fazendas, até que em determinado ponto, nas proximidades do Pico do Gavião, começamos a ganhar altitude. Com isso, surgem muitas oportunidades de observar os campos, morros e afins que compõem aquelas terras. Claro, é uma parte cansativa também, ainda mais para iniciantes. No meio da subida, encontro a Cachoeira Ponte de Pedra. Era um bom ponto para arriscar um banho, e o local é conveniente para camping, inclusive (coisa rara no caminho). 

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          Nessa altura, os ombros começavam a reclamar. Estava andando há 3 horas, e o erro do excesso de peso estava começando a se manifestar. Apesar da barrigueira estar bem firme na lombar, estava trazendo aproximadamente 10kg nas costas (porque resolvi comprar quase 2kg de doce de leite em Poços para a galera de Manaus, fora lembrancinhas, água, lanche de viagem extra, etc, e não, não deixo de comprar essas coisas nas minhas viagens ::lol4::). Ainda tinha pensado em despachar pelo correios de Águas parte do volume, porém, tinha receio de extravio, e não podia me dar o luxo de pagar quase 200 reais inesperados para tal. Para vc ter ideia, o recomendado para carregar é no máximo 6kg. Cada vez que os ombros reclamavam, perguntava a mim mesmo qual era o peso da cruz de Cristo como forma de motivação, e dava uma pausa para descanso. 

          Após a bifurcação que leva ao pico do gavião e os pontos de vôo de asa-delta, encontro a primeira capela/apoio da estrada. Estas são uma constante na via, alguns trechos possuem mais pontos, outros menos, porém, são um alívio para quem precisa descansar, carimbar a credencial, usar o banheiro, etc. Muita gente aproveita para deixar peças de roupa ou medicamentos para quem vier a precisar, também. Bem legal. Algumas possuem bica, o que é um alívio para quem está precisando de água.

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          Após passar por mais uma floresta de eucaliptos, começo, aos poucos, a descer. Os terrenos de fazenda voltam a aparecer, dessa vez com algumas Seriemas como coadjuvantes. Após uma curva para o desvio de uma estrada, avisto Andradas entre dois morros (de uma forma bastante conveniente). A maioria dos pontos de descanso são assim, aparecendo de repente após uma curva ou ladeira. E a aparição engana, pois ainda faltariam umas 2 horinhas para descer a íngreme ladeira de pedras e barro até o ponto final. 

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          Chego às 16:20 nos limites urbanos de Andradas, após 9h10 de caminhada. A Pousada Dora Moia seria meu repouso do dia. A dona Dora, bondosa como se esperaria apenas de uma mãe, conversou bastante enquanto servia a janta e por vezes pedia para eu comer mais :lol:. Na pousada estavam somente eu e outra peregrina, Srta. Ana, nordestina guerreira na casa dos 7.0, e veterana no ramo, uma vez que já tinha feito o Santiago de Compostela.

          Pelo horário, infelizmente não teria como passear na terra do vinho mineiro. 

          O dia seguinte começou com chuva fraca (não daquelas que impedem a saída, mas o suficiente para molhar). Resolvo sair juntamente com a dona Ana, após um breve registro e despedida.

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          No meio da distração da conversa, acabamos errando uma rua e perdendo 30 minutos do dia após notar a ausência de setas :lol: mas no final deu tudo certo. Após 2 horas, já estávamos entrando em uma estrada de terra que na verdade estava um verdadeiro lamaçal com direito a atoleiro (o que pegou um fusquinha de passagem). Nesse trecho apareceram duas duplas de cachorros, aparentemente perdidos, o que me deixou triste, pois é comum eles seguirem peregrinos e se afastarem de seus locais de origem, o que me obrigava a espantá-los e torcer para que eles achassem um lugar seguro.

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De Andradas para a BR-319, só nortista vai entender essa referência

          O ritmo, que já era lento, teve que virar "a passo de tartaruga", em virtude do risco de escorregões. Muitos veículos passaram nesse trecho, alguns respeitavam nossa presença, outros passavam com velocidade desnecessária, resultando em banhos de lama, maaas, fatos da vida. Em um trecho de plantação de café, resolvo parar para esperar a dona Ana, que vinha no seu próprio ritmo, quando avisto mais duas figuras chegando. Era o casal simpático do primeiro dia, que tinha saído bem depois da gente, de outro hotel da cidade. Conversamos, e nos despedimos, uma vez que cada um precisava realizar sua jornada pessoal ao seu ritmo próprio. 

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O primeiro e último registro dos únicos peregrinos do dia. Rostos e histórias de vida tão distintas, rumo a um objetivo comum.

          Após horas de chuva fraca, o céu começava a abrir bem no momento em que chegava no ladeirão da Serra dos Lima. Mais uma subida de 40 minutos que resultaria em um lindo mirante com direito à última vista de Andradas...

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Deus é bom o tempo todo...

          Apesar do sol, estava ventando bastante, o que dava aquele frio gostoso para a tarde. Não tardo a encontrar a pousada da Dona Natalina, uma das pioneiras do caminho da fé. Infelizmente era longe demais de Andradas para eu ter descansado aqui no dia anterior, e longe demais do bairro de Barra, onde queria concluir a caminhada do dia. Mas aproveitei para "almoçar" o velho pão com ovo do peregrino, e pude conversar com a anfitriã, que estava recolhida em sua cozinha do lado do forno à lenha para fugir do friozinho. A boa senhora ainda me ofereceu café e torresmo para animar a conversa. O coração deu uma apertada por não poder ficar. Mas há quem me diga que "se você não parou na dona Natalina, você não fez o caminho da fé direito", então, fica a recomendação. Dona Ana ficou por ali, cansada e com fome, o que significaria que eu andaria só novamente.

          Havia uma festa num barzinho adiante, com direito a som alto, motos barulhentas e a macharada assando churrasco e jogando cartas. De certa forma era cômico, pois lembravam aqueles esteriótipos de caipiras estadunidenses, só faltava a garrafa com 3 "xis" desenhados :lol: . Mas eram gente boa. 

          Após uma grande descida, chego aos limites do escondido bairro de Barra, com uma paisagem natural de tirar o fôlego. Fiz alguns registros, e de tão lindas as fotos, me emocionei por um tempo, mal acreditando que estava naquele lugar. 

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          Chego na pousada João e Joelma às 17h00, após mais 9 horas de caminhada (o motivo, a estrada de lama mencionada anteriormente), com alguma luz do dia para brincar com os cachorros da pousada, mestiços de border collie super espertos e trabalhadores (um desejo de vida é criar um border, mas estes são raríssimos no norte). Para espantar o frio, a janta do dia seria um magnífico churrasco com a boa e velha comida de interior. Nessas horas queria ter dois estômagos ::love::

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Aquele interior onde viveríamos os últimos anos com mais saúde, fraternidade e ar puro, e menos problemas de cidade grande...

          No dia seguinte, levanto cedo para o café, o pagamento, e ainda ganho de uma das anfitriãs um imã do caminho da fé (que não encontrei em lugar nenhum para venda, diga-se de passagem). Muita gente para em Ouro Fino, terra do menino da porteira, porém, quis estender o trajeto até Inconfidentes, capital do crochê, o que me daria a distância aproximada do primeiro dia (+30km).

          Logo no início a gente coloca as perninhas para trabalhar no morro do sabão, deixando Barra para trás. Tive uma amostra da generosidade do mineiro (mais do que já havia visto) quando paro na pousada Santa Luzia para carimbar a credencial e o Sr. Zacarias, sem nenhuma obrigação, pausa seu trabalho para me oferecer água, café e queijo. Nós, pessoas da cidade, acostumadas com o que há de pior na humanidade, ficamos meio sem graça, nos perguntando se merecíamos aquele tratamento. Também notei que muitas pousadas estavam em reforma com a adição de quartos para atender a grande demanda de peregrinos e bicigrinos nos meses de alta temporada (o gentil senhor me informou que em Julho a pousada recebeu uma média de 100 pessoas diferentes por dia, só para carimbar a credencial). 

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Já foi mais longe...

          Algum tempo depois, a estrada muda para uma bela paisagem do horizonte, de onde já é possível ver um pequeno pedaço de Crisólia, bairro vizinho de Ouro Fino. Mas faltaria bastante chão, ainda.

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O mais refinado "número 1" possível do caminho, que paisagem sensacional

          Parte da trilha agora acompanharia a estrada de asfalto que levava à Crisólia. Era só olhar para trás que dava para ter noção do "tanto" de chão percorrido. Aliás, o caminho é isso, no lembra da dimensão dos desafios e problemas que antes considerávamos gigantescos, agora deixados para trás, superados. 

          Sem muitas surpresas na estrada, chego no perímetro urbano e dou de cara mais uma vez com os amigos Wilson e Ângela, que saíram depois de mim, mas conseguiram me alcançar. Aparentemente eles parariam para um descanso e almoço, enquanto que eu seguiria para Ouro fino, após os carimbos coletados. Em um dos pontos, conheço o pequeno Peregrino, um cão que, como tantos outros, se perdeu seguindo peregrinos, e acabou sendo adotado pela dona do mercadinho parceiro, agora vivendo dias tranquilos

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          Em Crisólia, aparentemente não havia nada em particular para observar, então segui meu caminho para a terra do menino.

          Após mais uma horinha de estrada de terra, sou alcançado uma segunda vez pelo Wilson e Ângela (para uma senhora que nunca fez o caminho, estava muito bem), e alcançamos, juntos, a famosa porteira gigante.

          Ouro fino é mais urbano, comparando com vários outros pontos do caminho. Para quem está de passagem, é interessante procurar os monumentos que fazem referência à triste estória do boiadeiro, o menino, e o boi sem coração. Infelizmente esse foi o último dia em que vi o simpático casal, pois eles apertariam mais o passo, deixando-me bastante para trás.

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Será que pegar no ovo do boi sem coração daria alguma sorte nas escolhas do mercado?

          Deixando Ouro fino para trás, uma atração que por vezes passa batido é a Estrada dos Santos Negros. O nome é autoexplicativo, e é interessante conhecer histórias de santos, menores ou mais conhecidos, como São Benedito (sem contar a Nossa Senhora Aparecida em si).

          Nesse ponto do dia ensolarado e calorento, o primeiro carro de apoio passa por mim, oferecendo água, transporte de mochila, etc. Como estava bem naquele momento, recusei educadamente.

          Apesar das várias surpresas do dia, a caminhada foi bastante longa, e chego nas dependências de Inconfidentes às 17:30 (o maior tempo da viagem, apenas 11 horinhas) com ombros doloridos, pernas reclamando, e o friozinho da noite começando a se manifestar. Apesar dos apesares, a entrada da cidade, com suas indicações dos outros caminhos religiosos e o monumento ao peregrino tornam a chegada mágica.

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          A capital do crochê chama a atenção pela decoração das árvores na rua principal do pequeno centro comercial. Não é muito difícil ver lojas de roupas e outros produtos têxteis. Por eu ter chegado praticamente no pôr do sol, não pude conhecer melhor o centro comercial, nem comer o lendário pastel de vento do Bar do Maurão, outro ponto obrigatório para quem está de passagem. Apesar disso, a cidade é bonita, limpa, e uma voltinha, mesmo pela parte da noite, para provar o tão comentado pastel de milho da região, valeu a pena.

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Todo tipo de itens de crochê, bordado, etc, se duvidar acharia até capa para mochila de crochê

          Vendo o forasteiro aparentemente perdido, um dono de uma barbearia me chama para oferecer ajudar e dar umas direções. O sr Célio coincidentemente era meu anfitrião para a noite, pois era na pousada dele, Santa Luzia, que tinha feito reserva.  Engraçado como existem pessoas virtuosas que fazem o bem sem olhar a quem, ele nem estava imaginando que aquele peregrino perdido era seu hóspede.

          No dia seguinte, antes de sair, participo de um café animado com o Célio, onde ele me conta histórias do caminho, e de como ele, juntamente com outras pessoas, começaram a fazer essa rota antes mesmo da oficialização do caminho. Recebi 500 dicas de todo tipo no processo.

          Na saída, noto que não consegui comprar uma lembrancinha da cidade (meus vícios de viagem são imãs de geladeira e souvenirs, daqueles de mesa), e as poucas lojas abertas às 7 da matina vendiam coisas grandes demais para a já sobrecarregada mochila. Mas como o caminho, assim como o céu, opera de maneiras misteriosas, aconteceu uma coisa, no mínimo curiosa.

          Voltando para a estrada de terra que iria até a cidade de Borda da mata, sou parado por um carrinho vermelho de onde uma moça simpática sai com uma cestinha. Pensei que era mais um carro de apoio ou coisa do gênero, mas a moça estava vendendo...chaveiros artesanais (!) ela me falou que vende os chaveiros que a filha cria, e fica de olho nos peregrinos de passagem naquela hora do dia, pois alguns viajantes (assim como eu) não conseguem comprar lembrancinhas. Eu não sei como que a bendita dona teve essa ideia, mas a vida favorece os espertos. Admirado pela estratégia de venda, resolvo comprar dois chaveirinhos tricotados, que enfim seriam as lembrancinhas oficiais de Inconfidentes.

          A primeira parte deste trecho consiste de um pequeno bairro rural, até que chegamos na primeira capela, que devo admitir, é um dos apoios mais bonitos de todo o caminho. A capela de Nhá Chica é extremamente organizada, limpa, e dedicada a um descanso e reflexão matinal. Aliás, há também o caminho de Nhá Chica, que começa em Inconfidentes.

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Mesmo neste pedaço de terra batida, o local é impecavelmente limpo e bonito, vontade de dormir aqui.

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          Após o breve descanso e contemplação, hora de seguir em frente. Passo pela Cachoeira/Corredeira da Onça, cujas águas estavam bem convidativas para aquela manhã ensolarada. Mas como não tinha ideia do tempo que faltava para a próxima cidade, e como teria todo o trabalho de me trocar na beira da estrada onde passavam vários carros, pulei essa tentação gelada. Fica para a próxima.

          Antes de chegar em Borda, um marco interessante que fiz questão de registrar foi os 100 primeiros quilômetros percorridos. Imagine só, alguém que sempre fez no máximo 8, 10 km de trilhas, completando toda uma distância nesses 3 dias! Bem que dizem que cada dia do caminho é diferente do outro, cada dia uma surpresa a mais, e que experiências assim apenas elevam nossos limites e nossa percepção pessoal.

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          Às 14:20 chego nas dependências de Borda da Mata, cidade de importância na área têxtil, porém sem o mesmo charme de Inconfidentes. Realizo o check-in no Hotel Virgínia, bem colado ao pequeno centro comercial, e aproveito o horário para procurar um almoço e conhecer as dependências da praça central, também bonita e organizada. No final das contas cheguei à conclusão de que deveria ter tomado um banho de corredeira e chegado umas duas horinhas mais tarde na cidade, mas, devemos aceitar o que não pode mais ser mudado e seguir em frente.

          Aparentemente nessa região o frio aperta, comparando com outros lugares onde tinha passado (tirando Barra). Os termômetros já avisavam. E isso com dias de sol forte. Será que pegaria negativo em Campos do Jordão?

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          Saindo no friozinho matutino de Borda, a pequena subida já seria um pequeno “esquenta” para um dos pontos mais belos e icônicos do caminho, a Porteira do Céu. Além disso, outro fator interessante deste trecho são as primeiras plantações de morango, característica da região produtora. Ver a geada matinal evaporando nos campos e os regadores dos morangos espirrando água em mim tornaram esse trecho maravilhoso...

          ...até começar o subidão até a porteira. A gente vai subindo, subindo, divide espaço com os ciclistas que precisam ir “na primeira”, e vai colocando esforço e fé a cada passo. No caminho, uma parada, a casa do Senhor Xavier, importante apoio para ciclistas e peregrinos, com um “café solidário”, onde há os itens e o seu coração determina o valor a ser pago por eles. Um teste de humildade e agradecimento.

          Depois de mais um tempo, chegamos ao ápice do morro, nas dependências da porteira. Fazendo companhia aos grupos de ciclistas, atualizando o zap zap pelo wi-fi ali presente, e contemplando a belíssima passagem dos campos e plantações mineiras, mal podia acreditar que estava naquele lugar, tão “namorado” em fotos de internet.

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E pensar que os cansaços passados sequer são vistos nessa altura do campeonato....

          Fiquei aproximadamente 1 hora ali em cima. Saindo da porteira, e chegando na Capela de São Peregrino, uma surpresa: morangos, provavelmente deixados pelos fazendeiros locais, para o deleite dos peregrinos e bicigrinos de passagem. E nem estavam feios! Agradeci por aquele presente de generosidade, comi alguns, deixei outros num ponto favorável para os próximos transeuntes, e fui embora. Mais lá na frente, mal acreditei quando vi duas caixas de morangos com doce de leite e nutella (AAAAAAAAAAA!). A tentação de acabar aquela caixa e cochilar na sombra de uma árvore era grande, porém o bom senso de não arriscar uma "caganeira" e deixar o excesso para os que passarem depois falava mais alto :lol:

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          Logo após parar em um apoio para almoçar pão com ovo, suco de morango e mais pastéis de milho, chego em Tocos do Moji às 13:40. A pequena "vila" estava em reforma na sua rua central, o que tirava um pouco da beleza local. O dono do hostel onde iria ficar estava ausente por motivos desconhecidos, então, para não ficar na rua, acabei fechando de última hora com a Pousada do Peregrino, para surpresa da dona, que não tinha visitantes. Após a roupa lavada, e um descanso de final de tarde, resolvo dar uma andada na cidade, com suas crianças brincando, barzinhos cheios de locais contando seus causos, e a segurança total de um lugar onde o crime mais hediondo deve ser o de roubo de galinhas. E isso é ótimo, para alguém acostumado com a maldade da cidade grande à espreita. Janto num restaurante/pousada parceiro do caminho chamado Beira Rio, onde a comidinha caseira estava "de morrer" ::dãã2:: nossa, Deus abençoe a comidinha de interior.

          Domingo, 14/08, dia dos pais. Levanto cedinho e saio da pequena vila adormecida rumo a Estiva, "terra do morango". Não tinha curumim em casa para me homenagear (um manauara que passou dos 30 e não teve filho é tão comum quanto um mineiro que não fala uai). Não tenho pai há mais de uma década, e a mãe fez parte desse trabalho. Atualmente não temos exatamente a relação mais amorosa do mundo. Mas, era oportunidade de reflexão e de agradecimento à criação que me foi dada. Fiquei me perguntando sobre o quão diferente seriam as coisas se não tivesse perdido meu pai para o vício em bebidas e um acidente de trânsito. O gosto dele por documentários de animais e balneários de certa forma influenciou esse meu espírito aventureiro da atualidade. 

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          Eu não sabia, mas estava prestes a fazer um dos percursos mais CHATOS da jornada :lol: chato em termos de cansaço, pois apesar de serem apenas 22km, uma coisa que não costumam contar por aí é que o Pântano dos Teodoros é um sobe-desce-sobe-desce morro com direito a desnível bem acentuado (a passo de tartaruga embaixo de sol forte). Depois da Luminosa, achei esse trecho particularmente punk. Mas é uma visão pessoal, claro. 

          A primeira metade do caminho é bem tranquila, com bastante bairro/comunidade rural. Um dos pontos mais agradáveis foi a padaria recreio, aquele comércio BEEEEM raiz com direito a "sorvete" de suspiros que mais parecem isopor, teta de nega, broa de coco e biscoitos de polvilho gigantes, balinha bola de futebol, entre outros :lol: a prosa com o sr Afonso, balconista, e um ciclista que mora na região foi bem animadora.

          Logo após, cruzo com os primeiros andarilhos em dias, locais que estavam fazendo peregrinação para outro lugar do qual não me recordo. Desejo-lhes boa viagem, pois ficaria um tempinho na lanchonete Jack e Bruno, onde comprei uma lembrancinha super legal do caminho da fé, e a dona do lanche/pousada me ofereceu um suco de morango por conta da casa. O Luiz, garoto do campo esperto e bom de papo, ajudou a animar o ambiente. 

          Como alegria de pobre dura pouco, deixei esses locais para começar a serra do pântano. Havia ali uma pousada com um belo mirante onde muita gente gosta de se hospedar. Talvez numa próxima.

          Apesar do esforço para cruzar esse trecho, há de se concordar que a vista é maravilhosa. Se criaram o azul-celeste, acredito que a origem seja no interior mineiro.

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O centro de Estiva fica escondido no outro lado.

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Aquela tarde de domingo na qual vc fica se perguntando "o que vim fazer aqui?!"

          Após umas duas horas aproximadas de travessia, chego na capela do Beato padre Donizetti reclamando, sem água, cansado e com a fome começando a se manifestar. Nessa hora, um carro com uma família passa na frente, oferecendo água. Na lista de prioridades do dia, água com certeza estava no topo, então fiquei pensativo se havia alguma força operando naquele lugar. Agradeci a Deus, à família gentil, desejei-lhes boa viagem, e parti para a descida longa que concluiria o trecho do dia. 

          Cheguei em Estiva às 15:05, e apesar do horário, era domingo, logo não tinha praticamente nada aberto. A única coisa que iria abrir para janta era pizzaria, ou lanche, ou restaurante com os preços lá em cima, então coloquei na cabeça que seria o "dia da miséria" :lol:  fiz o check-in na famosa Pousada Poka, e como janta, tive que devorar uns pães de queijo/salgados numa padaria próxima. Achei a praça de Estiva bonita, porém suja de lixo, e uma coisa curiosa é que presenciei um bando de adolescentes fazendo "rolezinho" na praça, ao melhor estilo "roupa de marca falsificada, óculos, boné e cordões brilhosos" ::lol4:: sério, isso ainda existe?

          A segunda chegou, e com isso mais uma semana repleta de novas visões e aventuras. O destino seria Consolação, a 20km apenas. Mal deixo as dependências, e cruzo com um apoio muito elaborado, a Capela de São Bento. Com ferramentas para pequenos consertos de bike, uma música agradável de fundo e "frases do dia" para reflexão, achei o local muito agradável para ficar por uns minutos. Eis que então o Sr. Júnior Marques, responsável por tudo aquilo e projetos interessantes no Caminho da Fé como a instalação de placas motivacionais e pontos de apoio, surge e conversa comigo, presenteando-me com uma linda medalha de São Bento, de quem ele é devoto. Apesar de não ser católico, já tinha algum conhecimento das inscrições do objeto, e pessoalmente o acho bonito, com boas mensagens de fé e afastamento do mal. Além do mais, era um presente com a melhor das intenções, então resolvi que o guardaria com cuidado e carinho. 

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          Motivado, segui para a Serra do Caçador, o obstáculo que separa Estiva de Consolação. Já tinha lido que ele era difícil de atravessar e tudo mais, mas pessoalmente o achei bem tranquilo, com subidas leves e oportunidades de ter belas visões daquela vastidão mineira. Um dos melhores pontos do trecho é a capela de Santa Rita de Cássia.

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A recompensa por uma boa caminhada. Deus e a Mãe que me perdoem, mas essa vai pro Tinder

          Acredito que esse seja um dos trechos onde mais vi capelas (São Bento, Santa Rita, Santa Cruz e São Jorge), então achei esse espaço farto de locais para descanso. Decidi deixar em uma das capelas alguns medicamentos para quem precisasse, uma vez que minha saúde estava ótima durante todo aquele tempo. 

          Antes de chegar em Consolação, bato a marca dos 159 km percorridos, ou seja, a metade do ramal principal. Cheio de orgulho e confiante, vou chegando na pequena e escondida cidade de Consolação. Esperava que minha fome e sede fossem consolados, isso sim.

          Chegando na Pousada e Rancho Caminho da Fé, fui convidado pelo anfitrião a dormir lá, mas educadamente recusei, pois já tinha intenção de dormir no centro da cidade. Faço essa menção pq o tratamento dado ali foi de gentileza tamanha. Mas não poderiam reclamar de espaço vazio, pois um grupo de romeiros estava no local, já me chamando para beber e bater um bom papo (impressão minha ou romeiro é cachaceiro por natureza? Alguns apoios para romeiros ficavam em bares ::lol3::). Mas foi gostosa a conversa com aqueles senhores, com suas origens simples, bolhas nos pés, pouca coisa nas pequenas bolsas, a companhia um do outro, e um propósito tão nobre. Adorei contar coisas sobre meu estado e ver a reação deles, também.

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Eeeeeta povo guerreiro

          Chego em Consolação, de fato, às 14:30, e me acerto com uma funcionária da Pousada Casarão. Literalmente, aquele casarão de aspecto histórico foi adaptado para receber hóspedes, o que achei bem legal. Antes da noite chegar, resolvo subir sozinho num pequeno mirante, o Rochedo da Independência, onde supostamente foi realizada uma missa na época da independência do Brasil, e haviam inscrições gravadas cuja autoria é desconhecida. 

          Tive um dos melhores pores do sol da viagem naquele dia, com uma bela visão da pequena cidade.

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          A noite foi regada a mais comidinha caseira no forno à lenha, dando-me a certeza de que iria ter uma "depressão pós-viagem" habitual. 

          No dia seguinte, o destino seria Paraisópolis, um dos últimos pontos de Minas Gerais, e o ponto de origem mínimo para quem quer garantir o certificado mariano da basílica. O trecho inicial é bastante plano, seguindo parte da estrada de asfalto, e finalmente nas estradas de terra que acompanham as pequenas fazendas locais. A ponte sobre o rio Capivari aparentemente marca uma divisa entre Consolação e Paraisópolis, um ponto bonito para descanso e contemplação.

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          A segunda parte do trecho contempla uma subida gradual ao redor da Pedra Branca, que na verdade parece-me muito escura :lol:.  Na região existem algumas pousadas e cachoeiras, o que sugere que é interessante a pessoa dar uma parada por aqui. Ficaria para a próxima.

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Dizem que a fé move montanhas. Aqui ela move o peregrino ao redor ou por cima dela, mesmo.

          O ponto mais bonito e tranquilo desse trecho, a meu ver, é a Capela de Santa Luzia, no alto de um campo de fazendas. Após esse ponto, segue uma longa e gradual descida até o destino do dia.

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Alguém colocou bastante amor nesse espaço...

          Conforme vamos nos aproximando de Paraisópolis, já conseguimos ver no horizonte alguns fragmentos da região da Serra da Luminosa, tão temida por ciclistas e peregrinos. Seria esse pesadelo todo? A partir do dia seguinte iria descobrir. Ao chegar na Seta Amarela, lanche e restaurante bem famoso, pude contemplar à distância a parte plana da conhecida Pedra do Baú, que planejava conhecer. 

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          Após esse breve momento de descanso, não ando muito e chego em Paraisópolis às 14:30. Reparo que meu corpo já estava condicionado para chegar quase sempre nessa faixa de horário, apesar das diferentes características dos trechos. As dificuldades moldam a gente e nos dão força. Pois bem. Mais uma vez chego na pousada almejada, e dou com o nariz na porta, sem resposta aos chamados e apertos de campainha. Mas, como sabia que estava andando em um mês tranquilo, não demoraria a encontrar outro lugar. E de fato, após andar um pouco na praça central da cidade, hospedo-me no Hotel Central, onde sou recebido muitíssimo bem. Com isso, só restava andar no centro comercial, almoçar, e descansar, pois não havia nas proximidades da cidade pontos de interesse.

          O dia seguinte marcaria o primeiro dia de Luminosa (de Paraisópolis até as dependências de Campos do Jordão, após concluir a serra, são um pouco mais de 40km, coisa que jamais faria de primeira). Iria parar no distrito de Luminosa propriamente dito. A partir daqui as hospedagens vão dando uma encarecida, então é bom se programar com antecedência e ver qual a que melhor te atende. 

          O primeiro trecho acompanha parte da MG-295, até entrar novamente nas estradas de terra. Prepare a câmera e os olhos, pois este é um dos trechos mais belos do caminho. 

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          É nesse trecho também em que saímos brevemente de Minas e entramos em SP, num letreiro isolado no meio de um grande terreno descampado. Será que seria assaltado 500 metros mais à frente? Apesar disso, aqui era um ponto ideal para a pausa do segundo café da manhã (sim, eu sigo a dieta dos hobbits Merry e Pippin ::otemo::)

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Um dos melhores apoios do peregrino é onde ele sente que nada mais é necessário naquele momento...

          Depois do marco da divisa SP-MG, vamos entrando para valer na Luminosa. E o desnível começa também. Essa primeira parte é "tranquila", pois as subidas eram acompanhadas de um pouco de reta, como uma escada. E isso até chegarmos no bairro de Cantagalo, pertencente a São Bento do Sapucaí. Gostei do Empório Sabor da Roça, pois o sanduíche do peregrino ali servido é um pouco mais consistente do que os pães com ovo servidos em muitos lugares (não desmerecendo os pãezinhos com ovo, também deliciosos). Abastecido, sigo em frente, e dou de cara com a plaquinha dos 118km restantes, o que marcaria meus 200km andados.

          Avançando e subindo mais um pouquinho, eis que encontramos novamente a divisa dos estados, ao passo que a trilha começa a descer, e temos a falsa sensação de estarmos finalizando a subida. De volta à terra do pão de queijo ::love::

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De volta a Minas, grazaDeus :lol:

           Mais um pouco e teria uma visão maravilhosa daquele "vale" no meio das grandes elevações, com Luminosa como uma pequena coadjvante. Com isso, atinjo minha meta diária novamente às 14:30, já me acomodando na pousada capela, uma casa adaptada para receber viajantes.

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Nossa, como não ficar feliz acordando com uma vista dessas?

          Quando a noite chega, avisto luzes nos pontos mais altos, onde aparentemente era o tal bairro do quilombo. Teria que subir mais aquilo, porém, era uma preocupação para o dia seguinte. Só me restava sintonizar uma rádio de músicas clássicas (o único momento em que me permiti ouvir música no caminho, e naquela região só consegui pegar 3 frequências :lol:) e curtir o frio de inverno em uma cama quentinha naquele ponto no meio do breu.

          O próximo dia seria a despedida definitiva de Minas, mas não chegaria em Campos do Jordão propriamente dito, e sim no bairro de Campista, beeeem longe das mansões de luxo e do centro turístico. Mas ainda seriam cansativos 21km, e nesse trecho pude conhecer a fama da serra, com um desnível de quase 1 fucking km!!

          Mas primeiro, um cafezinho regado a muitos sorrisos, com aquilo que o interior tem de melhor.

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...oh Minas Gerais.....quem te conhece não esquece jamais, oh Minas Gerais...

          A primeira parte é aquecimento, onde nos afastamos de Luminosa para a base de um dos morros, local de uma pequena cachoeira. A partir daí, segue um verdadeiro zigue-zague até pegarmos uma certa altitude. No caminho, passei pela conhecida pousada da dona Inês,  onde um grupo de ciclistas nordestinos estavam se preparando para sair.

          A pousada é privilegiada pelo mirante que oferece. Entretanto, não é o melhor lugar para tirar fotos. A gente sobe, sobe, sobe, sobe mais um pouco, achamos que chegamos no cume, e adivinha? Mais subida. E isso é por algumas horinhas. Mas o visual é bonito, muito bonito.

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Não se engane, não é um passeio no parque: um pagamento de esforço e fé se faz necessário. Mas neste ponto, o cansaço some, as dores são ignoradas, e o tempo para por um instante...

          No meio de um trecho de floresta fechada, escuto um som incomum, e começo a olhar com mais frequência para trás, achando que viria um caminhão pesado. Mas percebo que é uma "tratociata", aparentemente rumo à Aparecida, a julgar pelas bandeiras e imagens de Nossa Senhora. Parecia aqueles comboios ciganos ou pioneiros, com as carruagens de crianças, móveis de dormir e senhoras/idosos sendo puxados pelos tratores. Uma cena e tanto!

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          Mais um pouco de subida, e chegamos na terceira divisa dos estados, de onde despeço-me definitivamente de Minas.

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O sorrisinho era só para posar, pois o coração já estava pesando ::hein:

          A partir daqui, a paisagem muda, pois já começo a dar de cara com os primeiros pinheiros, característicos desta região de altitude. Também nesse ponto, uma enorme ventania começa a se manifestar, dando o receio de chuva. Após mais um tempinho, chego em um ponto que me faria parar, refletir e sentir um misto de alegria, orgulho, e tristeza, junto e misturado.

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Se desse para colocar trilha sonora, seria aquela "musiquinha triste" do chaves. Enfim, os 100km finais...

          Ao me levantar, um carrão branco passa por mim, e uma simpática família pergunta se estou bem. Digo que sim e que só aceito um pouco de água, se eles tivessem. Lúcio, o motorista e filho da família, praticamente jogou água, isotônico e paçocas para mim :lol:. Agradeci grandemente e decorei seu nome, pois iria orar por todos com quem cruzei no final da jornada. Por pouco não vieram as lágrimas masculinas, após ter sido deixado a sós novamente. Mais um gesto de nobreza e empatia encontrado no caminho. 

          Após a divisa dos estados, vem uma parte INCRIVELMENTE CHATA: ir para a estrada aberta e andar por mais 10km até Campista. Andar na estrada não é legal. Andar ao meio-dia com o sol nas alturas e o mormaço da pista de asfalto não é legal. Andar após uma belíssima subida não é legal. Sorte dos ciclistas, cujas bicicletas fariam todo o trabalho por eles!

          Passo pela entrada do parque da pedra do baú, que gostaria de visitar. Seriam mais 8km de estrada (ida e volta), mais as trilhas do parque. E a descida até Campista. Decidi que não o faria naquele dia. E dada a distância, não voltaria de Campista para fazê-lo no dia seguinte. São as dicotomias e decisões das nossas vidas. Felizmente algumas não são permanentes, uma vez que poderia voltar novamente à região e conhecer o parque. Já outros aspectos da vida são mais difíceis de voltar atrás. Um relacionamento finalizado, uma palavra proferida, ou erros que levam a acidentes. 

          Em determinada parte da descida, resolvo sentar, cansado, e passo a olhar os carros de passagem. Os olhos pesam, mas não sei se seria prudente arriscar um cochilo ali, então trato de levantar e seguir caminho. Até que às 14:10 (o que achei muito cedo, a julgar pela dificuldade do trecho), chego nas dependências do bairro. Chego na pousada Refúgio Campista, e pela primeira vez na viagem encontro uma hospedagem lotada. Um grupo de ciclistas estava hospedado, ocupando todos os quartos disponíveis. Felizmente, a anfitriã tem uma irmã (dona Sônia) que também tem sua própria hospedagem. Iria ficar ali. E amigos, que hospedagem! Quartos belos, cama confortável demais, um cheiro delicioso de roupa lavada no ambiente, uma janta caseira MARAVILHOSA, E a receptividade da dona Sônia foram ingredientes para o que chamo de "o sono mais pesado que tive em toda a viagem".  Nunca dormi tão bem naquele mês de agosto, ao ponto em que tive uma daquelas experiências em que estava lúcido no sonho, queria acordar, mas não acordava "de verdade", até tentar algumas vezes. Seria o corpo, não querendo sair de jeito nenhum daquele lugar? Ou seria um feitiço travestido de paraíso, como a casinha de doces de João e Maria? ::lol3::

          Seja como for, fica a menção honrosa da pousada da dona Sônia (na verdade ela tem outro nome, mas o ideal é que entre em contato com o refúgio campista para pegar este contato). 

          Pois bem, sabe a ventania que estava dando quando chegava nas dependências de Campos? Então....

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          O dia iniciou com uma belíssima neblina/chuvisco, mas como eu tinha visto no pai dos burros que a previsão era esta, não cheguei a me assustar (e até agradeci, pois chegaria em Campos com uma vibe de inverno de verdade). Mais uma bela coincidência, até porque esse era o dia em que pretendia visitar a pedra do baú (e com essa neblina seria perda de tempo).

          O dia de caminhada deveria ser curto, pois de Campista até o Refúgio dos Peregrinos, meu próximo ponto de descanso, são apenas 14km. Com a neblina, que ficava mais espessa conforme eu ganhava altitude, e aquele frio matinal, esse foi o dia em que caminhei com mais vigor. Na metade do trecho há a Paradinha do Pita, ponto estratégico para um lanchinho e um descanso. Aliás, de Luminosa para cá o número de capelas no caminho praticamente zerou.

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Quando a neblina é espessa, o coração determinado vira farol (claro que é fácil falar isso com uma estrada a seu favor, né?)

          Chego às 09:50 no perímetro urbano de Campos, e pelo horário, considerei que poderia adiar por um tempo a chegada à pousada. Com isso, desloco-me ao Pórtico da cidade, um dos pontos mais registrados por quem está de passagem. Apesar da pequena briga por espaço com outros turistas, consigo meu querido registro.

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          Após isso, resolvo seguir pela avenida Frei Orestes Girardi, conhecida também como avenida principal. Costumam dizer que Campos é uma cidade mercenária e cara, e queria analisar isso. Bom, a mesma coisa que observei quando estive em Gramado constatei aqui: tem algumas armadilhas para turista, porém, fique longe do centro turístico que fica tudo bem. Almocei bem e pagando pouco nas proximidades do mercado municipal da cidade, por exemplo. 

          Com uma vontade de me livrar do peso nas costas, e tirar as roupas de peregrino para as roupas de "pseudorico", apresso-me para a pousada, onde sou muito bem recebido pela família que administra o lugar. E com isso, dedico 1 dia e meio de descanso em Campos para aproveitar o clima frio, as várias marcas de chocolate, a elegância das roupas de inverno, as folhas de plátano, o fondue, entre tantas outras coisas. Não entrarei muito a fundo nesta parte da viagem.

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          Foi uma estadia curta e maravilhosa na cidade, apesar de ter faltado visitar muito lugar: ducha de prata, parque das cerejeiras, bosque do silêncio, ou mesmo o Pico Itapeva. Mas, tais lugares só motivam a voltar. Sim, voltarei. O legal é que conheci dois lugares serranos charmosos com fama de caro: Campos e Gramado. Agora faltaria Monte Verde, conhecida como a "Suiça mineira". Mas essa é outra história.

          Na manhã de domingo, continuo minha jornada. Importante destacar que há duas rotas a partir de Campos: o lado de Pindamonhangaba e o lado de Guaratinguetá. Optei por fazer o lado de Guaratinguetá (Gomeral), pois o caminho aparentemente é mais in natura, mais tranquilo e menos perigoso, uma vez que cheguei a ler episódios de assalto nas dependências de Pindamonhangaba. 

          Resolvo pegar o ônibus que segue para o horto florestal/parque estadual de Campos do Jordão. Este trecho é polêmico, pois há quem acredite que "pular" parte do caminho da cidade não é uma "trapaça". Bom, tinha ido ao horto no dia anterior, então quis pegar novamente o ônibus para o ponto da trilha por uma questão de segurança, pois vi que a estrada para o horto é estreita demais, sem acostamento, e o ônibus de passagem ocupa quase que o espaço inteiro para um andarilho passar, enfim, por mais que não fosse problema para mim fazer aquele trecho, optei por começar do horto, que disponibiliza parte de seu espaço para a travessia. 

          Com mais uma incrível coincidência, chego em Campos na neblina e saio embaixo de sol. Pegaria um tempo bom nesse dia. Por incrível que pareça, ainda é possível subir mais um pouquinho, atingindo os quase 2000m acima do nível do mar. De um dos mirantes, é possível ver parte de Campos, a vegetação de altitude, e mesmo algumas regiões encobertas por neblina e nuvens mais baixas.

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BOM DIA CAMPOS!!!!

          Esse dia foi bastante movimentado em termos de ciclistas, um grupo atrás do outro. Ganhei mimos em dois momentos dos carros de apoio, onde me deram bananas, água e coca-cola ::love:: Sou agradecido a essas boas almas. Fiquei pensando como planejaria fazer o caminho em duas rodas também, embora o tempo de conclusão seja bem menor (de 4 a 6 dias dependendo do pique).

          Andando mais um pouco, o sol começa a sumir, enquanto sou pego pelas nuvens mais baixas. Era lindo de ver o "mar" de nuvens", tão comuns aos montanhistas. E assim começo a descida até Gomeral.

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          Depois de uma grande subida, agora era a vez da grande descida, aquele zigue-zague cauteloso em um terreno super pedregoso. Porém, estava animado com os vários mirantes que apareciam. Às 14:15, chego no pequeno bairro rural, onde me deliciaria com uma bela truta à paulista. A pousada Aconchego seria meu local de descanso.

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Aparecida finalmente à vista (e o fim da jornada também...)

          A segunda veio, e como um aquecimento para o último dia da jornada, tomo um delicioso café da manhã ainda no escuro, no mirante de um restaurante que a anfitriã (dona Fran) administra, enquanto vejo as luzes das cidades sumindo, e a luz do sol abraçando o vale do Paraíba. 

          Os últimos 21km foram marcados por uma estrada rural bem plana, o fim das grandes subidas/descidas, e curiosamente uma bela cólica intestinal ::lol3:: após umas duas horinhas de provações, encontro um local santo (com banheiro) para um "pequeno exorcismo", e feliz, vou tocando em frente. 

          Chego nos limites de Potim sem grandes novidades aqui a não ser uma grande estrada de terra, até chegar na parte urbana da cidade. Apesar dos menos de 10km, ainda faltariam umas duas retas para alcançar Aparecida, de fato. À distância, já conseguia ver o imponente templo.

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          Atravessando a ponte do rio Paraíba, origem da história da Santa, dou de cara com um dos vários monumentos religiosos que enfeitam a cidade: o primeiro milagre de Nossa Senhora, a pesca. Haviam mais 4 monumentos dos milagres da santa espalhados nas principais rotatórias da cidade. Para quem está no caminho da fé, a pesca e o milagre da ceguinha são pontos de encontro certo. 

          Por fim, a chegada e a conclusão desta jornada. Uma tarde ensolarada de segunda, sem movimento no estacionamento do grande templo. Uma figura solitária com seu cajado fixava o olhar à casa da imagem da Mãe. Dessa vez as lágrimas não queriam sair. Talvez elas já tivessem saído durante o caminho, em algumas ocasiões. Acredito que orgulho e uma sensação de que conseguirei superar quaisquer problemas daqui para frente definiam aqueles instantes.

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          Após os procedimentos para a emissão do certificado mariano, só restava descansar no hotel reservado, e conhecer a cidade. Passei mais um dia em Aparecida para conhecer o templo, a cidade do romeiro, o porto Itaguaçu, o morro do cruzeiro, entre outros locais. A manhã do dia seguinte também foi dedicada à orações e agradecimentos a Deus pelas pessoas que apareceram no caminho (além de uma viagem segura). Como não poderia levar meu cajado para casa, e não queria descartá-lo, após tanto tempo me dando suporte, optei por deixá-lo "plantado" numa área de mata do morro do cruzeiro, esperando que ali ele ficasse até um retorno futuro...

 

Considerações finais

          O caminho é uma experiência ímpar na vida de quem o faz. Acredito que não importa a crença (ou a suposta falta dela), ou o propósito real (esporte, turismo, pagamento de promessa, etc). De alguma forma ele toca no íntimo da pessoa, levando-a a refletir sobre a vida, passando por um relativo período de simplicidade. O conteúdo da sua mochila, que deveria ser pouco, é tudo o que você precisa. Pratique o desapego. 

          Tem um relato do caminho no mochileiros que faz uma comparação muito boa do caminho com a vida em si, e vou referenciá-lo com outras palavras. No caminho, temos origens, gostos, sonhos e propósitos diferentes. Mas passamos "pelo mesmo barco", tal como é a vida. O final do caminho é a basílica, ao passo que o final comum a todos é outro. Alguns passam depressa, outros ficam por um tempo em nossa companhia. Todos marcam nossa vida de alguma forma. Assim como eles marcaram nossa passagem, também devemos descobrir o potencial de marcar a passagem de outras pessoas. Há dias bons e ruins, há dores, assim como há risadas e sorrisos. De alguma forma, durante os dias da peregrinação, a basílica é esquecida, pois viver é isso, aproveitar o caminho....viver é não pensar no fim, e sim aproveitar o presente que nos é dado a cada amanhecer.

          Sou agradecido a cada proprietário(a) de pousada, cada dono(a) de lanche, padaria, quiosque, etc, ao povo mineiro que tem uma receptividade tão gostosa, assim como os paulistas que também foram quase anjos, que contribuíram para uma experiência tão formidável. Claro, para muitos há a compensação financeira, pois não dormimos de graça na casa dos outros :lol: mas, a gente sente o acolhimento, a motivação, o espírito do "vou te oferecer isso sem compromisso", muitas vezes motivados pela fé e a energia transmitida por peregrinos e bicigrinos de passagem. Se fosse morador da região, viraria voluntário, sem pensar duas vezes.

          Voltarei a fazer o caminho. Anualmente não dá, por não ser morador da região. Mas quem sabe daqui a 3 ou 5 anos....o que será que vai ter mudado daqui para lá? A expectativa motiva o retorno, mas, como o objetivo está lá na frente, melhor deixá-lo, por ora, pra escanteio, e dar uma saidinha pela rua daqui de casa, onde a vida ocorre...

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Editado por StanlleySantos
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