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  1. Bom pessoal, depois de deixar de relatar diversos mochilões porque demorava a escrever e esquecia muuuuitas informações, resolvi começar logo o relato dessa trip que eu e meu amigo (Diego) fizemos para esse lugar absolutamente incrível que possuímos aqui do ladinho de nossas casas!!! O objetivo desse relato não é apenas o de passar as informações, mas de tentar MOTIVAR o maior número de pessoas a irem a esse local que é FANTÁSTICO e que AINDA (mas em processo de) não é sugado pelas empresas. Fiquem a vontade para tirar QUAISQUER dúvidas. Se algo ficou meio difícil de entender, só falar que tento explicar de outra forma EDIT 1 (28/07/18): ADICIONADO MAPA DA TOPOGRAFIA E DISTÂNCIAS Nesse mapa abaixo, as estrelas vermelhas são os possíveis locais de entrada no parque. Exceto a seta que está escrito "Camp Fracês", que é um acampamento que não estava plotado no mapa! O QUE LEVAR? Pra dar um norte a alguns que não tem ideia do que levar, aqui vai a lista do que levei e do que poderia ter deixado para trás ou levado a mais: - Mochila Quechua de 75L; - Mochila de ataque levada no peito (não façam isso de levar uma mochila na frente, por favor kkkkk. Foi a pior burrice por um lado, mas por outro a câmera estava a todo momento protegida e de fácil acesso. Todavia, se eu voltasse lá, não faria isso kkkk); - 2 bastões de caminhada (ajudam ABSURDO, ainda mais para passar em determinados locais inundados ou com barro); - Comida liofilizada Moutain House (MUITO boa, mas não é fundamental), salame, chocolate, frutas secas + amendoim; - Barraca Azteq Nepal 2 (frente a outras que vimos por lá, aguentou ABSURDAMENTE bem); - Isolante inflável Thermarest; - Saco de dormir North Face Aleutian (Conforto: -3ºC, Limite: -9ºC e extremo: -28ºC. Um bom saco de dormir faz sua noite ser absurdamente agradável. O Diego usou um que não era para temperaturas tão baixas e passou algumas noites de desconforto); - Capa protetora da mochila (que se foi com o vento e é desnecessária. Como já tive vários estresses despachando mochilão, resolvi colocá-la para despachar e passei um rolo de papel filme – aqueles de comida mesmo – em volta, mas não adiantou. A proteção já chegou com alguns furos no destino); - Fogareiro JetBoil (muito bom pra economia de gás, praticidade, fazer um chá/café de forma bem rápida (e na “potência” mínima do gás), levando de 2 a 3 minutos para ferver 400ml de água com temperatura entre 0 e 5ºC); - Corta vento (superior e inferior); - Máscara facial + touca (grazadeus o Diego tinha um sobrando, pois esqueci o meu rsrs) - Luvas (nos salvou de voltar para casa com todos os dedos, mesmo que ainda não estejam 100%); - 2 Fleece (um eu nem usei e sumiu L. Ou seja, 1 dá conta do recado) - 15 cuecas (-.- ... isso se deve a um aperto que passei em uma viagem, mas TOTALMENTE desnecessário essa quantidade. Umas 5 ou 6 já está ótimo); - Calça térmica (te permite usar uma bermuda por cima, daí nos locais que começa a esquentar demais – dentro de florestas –, fica bom, não aquece muito); - Duas bermudas (aquelas de academia – uma seria o suficiente); - 6 Camisetas (3 ou 4 seriam suficientes); - Botas de caminhada (ajudou MUITO. Não faria de forma diferente); - Chinelos (ao chegar ao acampamento, ajudam a deixar o pé “respirar”); - Óculos de sol - Kit Emergência (diversos remédios, agulha e linha “cirúrgica”, tesoura, pinça, etc); - Kit Banho + creme hidratante (Isso ajuda MUITO a noite antes de dormir. A pele fica absurdamente seca devido ao vento incessante) - Protetor Solar (Não usamos muito, mas dependendo do dia pode ajudar bastante); - Chapéu pra proteger do sol (nem encostei nele, kkkk. Era o tempo todo de touca e máscara); - Lanterna de cabeça (Foi totalmente desnecessária, mas numa emergência pode ajudar. Lá temos em torno de 16h de luz, então 22:30h ainda está relativamente claro); - Kit de fotografia (T5i, 18-55mm, 70-200mm, limpa lentes – importante -, duas baterias – não foi nem metade de uma –, carregador, adaptador, 2 SD card de 16 gb cada e 1 de 32 gb. No total foram umas 1300 fotos em .RAW) - Sugiro colocar separadamente as coisas de dentro do mochilão em SACOS DE GELO, isso mesmo. Tudo ficará impermeabilizado e você não terá que se preocupar com isso pelo resto da viagem (lógico que eu não fiz isso – vacilei –, mas o Diego fez e teve uma tranquilidade absurda com relação à chuva durante todo o circuito). A MOTIVAÇÃO: Essa vontade de conhecer Torres del Paine veio depois de fazer um mochilão pela Patagônia (chilena e argentina) há 4 anos atrás. Eu e minha esposa fizemos algumas trilhas em El Chaltén, visitamos El Calafate, etc. Durante as pesquisas, me interessei por TdP, mas como estávamos com pouco tempo para esse mochilão, resolvemos deixar para outra vez, mas JUREI que iria voltar e fazer o circuito O um dia. AS EMPRESAS: Vocês não podem deixar de saber que antes de ir pra lá, vocês precisam de antecipação, planejamento e muita, mas MUITA paciência. Lá existem 3 empresas para se reservar as áreas de camping ou os “lodges”. São elas: Fantástico Sur, Vértice Patagonia e CONAF, sendo esta última governamental e responsável pela gestão de vários parques nacionais, incluindo TdP. Definidas as datas dos voos de ida e volta, começamos a correr atrás das reservas dos campings. Nesse ponto, vale um adendo: · O Circuito O só pode ser feito no sentido Anti-horário. Logo, deve-se fazer as reservas dos campings nesse mesmo sentido. Conseguimos fazer as reservas com a Fantastico Sur sem problema algum. Não havíamos decidido por nenhum acampamento da CONAF (que são de graça, todos). As reservas que faltavam eram apenas as da VERTICE PATAGONIA e é aí que começa a dor de cabeça. Um a dois meses antes da viagem, começamos a fazer as reservas. Inicialmente a Vertice estava com a página em manutenção. Ao voltar, possuía um sistema de reservas pelo próprio site, mas que desde o primeiro dia (literalmente), não funcionava. Então, a outra forma seria enviando um e-mail com o número de pessoas, data e locais que gostaria de reservar e, se eles lessem o seu e-mail, te responderiam com o passo-a-passo para realizar o pagamento. Bom, enviávamos o e-mail e nada. Como foi chegando o dia do voo de ida, começamos a procurar informações no Tripadvisor e lá uma pessoa havia informado que eles possuíam mais 7 e-mails. Começamos a bombardeá-los com e-mails, mas não obtivemos nenhuma resposta (havia a confirmação de leitura, mas não nos respondiam). Apesar de vermos várias pessoas mudando as datas da viagem ou até cancelando o voo, decidimos ir e lá procuraríamos a agência física da empresa (nem o telefone eles atendiam). Caso não conseguíssemos fazer a reserva pela Vertice, faríamos apenas o circuito W (que já estava reservado pela Fantastico Sur) e iríamos para El chaltén, uma cidadezinha argentina bem pequena e aconchegante que fica a 400km de Puerto Natales e que tem vários trekkings de dificuldade variada e de vários dias, ou seja, tem para todos os gostos! Dia 1 – Porto Alegre – Punta Arenas – Puerto Natales Embarcamos em POA para a conexão em Buenos Aires e Santiago com a ideia firmada que iríamos tentar chegar à cidade e ir à agência física da Vértice (o Google informava que estava permanentemente fechada e não atendiam o telefone. MAS, não confiem nesse tipo de informação do Google!!!). Bom, como desgraça pouca é bobagem, o voo de POA para Buenos Aires atrasou e perdemos a conexão para Santiago!!! Maravilha, que mais podia dar errado?! Maaas há males que vem para o bem! Nesse meio tempo de espera no aeroporto de Buenos Aires enviamos mais um e-mail para essa maldita empresa e embarcamos para Santiago. Eis que, ao pousar em terras chilenas, abrimos o e-mail e vimos uma resposta dizendo que nossas reservas estavam feitas mas para garanti-las teríamos que pagar em 48h. Como chegaríamos em Puerto Natales no dia seguinte, deixamos para efetuar o pagamento in loco e não ter mais nenhum estresse. Aqui vale ressaltar sobre a aduana chilena que são bem chatos com comidas e/ou qualquer coisa de origem vegetal ou animal (eu já havia sentido na pele isso alguns anos atrás). Sabendo disso, resolvemos declarar o que trazíamos e deixar que eles decidissem. Foi nessa que o Diego perdeu 5 salames que estava trazendo para o circuito. Segundo o fiscal, o salame era defumado e só poderia entrar se fosse COZIDO. Comigo ele perguntou o que eram as comidas liofilizadas e eu disse que eram como o macarrão instantâneo (vulgo miojo ahaha). Mesmo fazendo uma cara de desconfiado, deixou passar. Passamos a noite no aeroporto de Santiago e embarcamos pela SkyAirline para Punta Arenas. · Sugiro, quando forem pegar voos domésticos no Chile, procurar por esta empresa. Apesar de não darem nenhum lanchinho (kkkk), pagamos US$120,00 Santiago-Punta Arenas (ida e volta/pessoa). Ao chegar no aeroporto de Punta Arenas, havia um ônibus indo para Torres del Paine direto do aeroporto, mas não tínhamos pesos chilenos suficientes (deixamos de trocar no aeroporto de Santiago e no de Punta Arenas não tem casa de câmbio. Aquela famosa economia porca, pois poderíamos ter trocado o suficiente para o ônibus e, em Puerto Natales, trocaríamos o resto). Então, saímos perguntando o preço para ir para o centro da cidade e ouvimos dois israelenses pechinchando com um taxista. O Taxista pedia 10.000CLP. Sugerimos que dividíssemos o valor em 4 pessoas e todos aceitaram. · Em Punta Arenas não existe uma rodoviária única a todas as empresas. Cada uma possui a sua “estação”, a sua garagem e você precisa ir naquela que irá pegar o ônibus. Ao chegar à cidade, trocamos R$900,00 a 190CLP/real, uma boa cotação e que não acharíamos mais. Todavia, a cotação do dólar pouco variou de Punta Arenas para Puerto Natales (algo em torno de 5 a 10 pesos/dólar). Trocamos o dinheiro e saímos correndo para a Buses Fernandez. Por sorte, o ônibus ainda não havia saído. Acabara de fechar as portas, apenas. Pedimos pelo amor de deus para que abrissem e nos deixassem entrar kkkkk. Com cara de bravo, deixaram. Durante o trajeto havia wi-fi no ônibus, mas era pago. E caro. Nos cobraram 8.000 CLP/pessoa o trecho. Todas as empresas giram em torno disso, não tem muita diferença não. Chegamos em Puerto Natales 3 horas depois, numa viagem LINDA. Sugerimos que se mantenham acordados hehehehe. Deixamos nossas coisas no hostal Vaiora, que já estava reservado (US$20/pessoa). Um hostal bem simples, mas limpinho e aconchegante. Erramos o caminho ao chegar. Começo do treinamento. Andamos 1km para o lado errado, mais 1km para voltar, mas pelo menos vimos esse fucking Dog fotogênico hahaha · Vale lembrar que ao pagar em dólar, não existe a necessidade de pagamento de 19% do IVA (desde que mostre o papel que recebeu na entrada ao país), um imposto que eles deixam passar para incentivar o turismo e para aumentar a quantidade de dólar americano no mercado chileno. Na sequência fomos direto à Vertice fazer o pagamento da reserva (fica na Calle Manuel Bulnes, 100. Há duas, mas a certa é essa). Ao chegarmos, os atendentes estavam lá tranquilões, como se nada estivesse acontecendo. Milhares (literalmente) de pessoas desesperadas e eles super de boa, mas ok. Dissemos que queríamos fazer o pagamento da nossa reserva para o circuito O. Inicialmente a atendente não levou a sério (não acreditou que tínhamos a “autorização” daquela reserva), então mostramos o e-mail deles próprios. Pagamos e fomos fazer as compras de equipamentos que nos faltavam. Compramos um bastão, caneca com mosquetão (super indico. A caneca era FODA. Não sabemos dizer como, mas as bebidas quentes que fazíamos nela simplesmente NÃO PERDIAM CALOR hahahaha. Também pela facilidade de deixa-la pendurada e a qualquer água corrente que víamos no circuito, parávamos para beber), poncho da NTK (pelo amor de deus, não comprem isso!!! Material de péssima qualidade. Rasgou inteiro nos 20 primeiros minutos de trekking) e gás. Aproveitamos para passar no supermercado e na loja de frutas secas para comprar as guloseimas que faltavam. · A loja de frutas secas é excelente! Tem muitas variedades e num preço bem acessível. A loja chama Itahue e fica na Rua Esmeralda, 455B. Voltamos para o hostal, deixamos tudo, tomamos um banho e saímos para jantar. Mandamos uma pizza, mas cabiam duas kkkkk. Voltamos para arrumar as mochilas e dormir. Dia 2 – P. Natales – Torres Del Paine (1ª noite: Camping Serón) Pegamos o ônibus na rodoviária por volta das 07:30 e chegamos na entrada da Laguna Amarga umas 9:20. Ao chegar, todos devem desembarcar do ônibus e fazer a entrada no parque. Nessa etapa, pega-se uma fila enorme (todos os ônibus chegam juntos). Se der sorte de ser dos primeiros ônibus, ótimo, caso contrário vai esperar um pouquinho. Caminho para TdP: Após todos fazerem a entrada e o pagamento (21000CLP ou uns US$35 – aceitam os dois), todos devem assistir a um vídeo de 2 minutos aproximadamente, falando tudo o que pode e o que não pode fazer no parque, inclusive o valor e pena das transgressões. Após isso, todos voltam para os ônibus. Os que vão ficar na Laguna Amarga já podem pegar suas mochilas e iniciar o trekking ou então pagar 3000CLP para pegar outro ônibus que andará por 15 minutos (7,5km) até a área do Camping Central/Las Torres. Fora isso, o ônibus que estava lá parado espera os que vão para as outras duas entradas (Pudeto ou Sede Administrativa) voltarem para seguir viagem. Chegando à entrada da LasTorres tem uma lojinha com alguns artefatos de trekking, para aqueles que esqueceram de algo ou para os que tem muito dinheiro. Desde esse momento percebemos como as coisas seriam absurdamente caras em qualquer lugar dentro do parque!!! Por exemplo, uma coca-cola de lata de 350ml custa 2000CLP, algo em torno de 11 reais. Uma bolacha menor que Trakinas também tem o mesmo valor. A única coisa que eu vi que era RAZOÁVEL de se pagar (mas não era barato), foi no Camping Grey, que tinha um chocolate Prestígio por 500 CLP, algo em torno de 3 reais. Não comprei, me arrependi, pois não haveria outra oportunidade desse tipo kkkkk. Bom, começamos então em direção ao Camping Serón. É meio complicado de achar o caminho inicial. Não tem NENHUMA placa indicando a direção (algo que constatamos depois, foi que o Circuito O por ser menos procurado/turístico, não tem a mesma infraestrutura do W, mas essa foi a melhor coisa que poderíamos ter! J). Ficamos esperando ver se haveria algum fluxo de pessoas para algum lugar e em alguns minutos achamos o caminho. Começou uma leve subida e, nossa fiel e inseparável CHUVA. Como ainda estávamos sem experiência no que se trata de patagônia, desesperamos e começamos a colocar os anoraks e o bendito poncho (aquele que indiquei para não comprarem). Mas por que comprei essa droga? Para proteger a mochila com material fotográfico que estava no meu peito. Foi só eu colocá-lo e puxar a cordinha do capuz que começou o rasga rasga. Então peguei o que sobrou desta droga e só embrulhei a mochila (6300CLP jogados fora). No final do dia iríamos perceber que não precisa desse desespero. A chuva que cai, juntamente com o clima seco e o vento forte, não é o suficiente para molhar. O que molha já seca em segundos/minutos. E todo o resto da viagem foi usando esse aprendizado, ou seja, não colocávamos mais o anorak para proteger da chuva ou neve, mas sim do vento. O caminho do Central para o Serón é bem tranquilo. Em alguns momentos tivemos que atravancar pelo mato porque estava impossível de passar pela trilha. Muito barro! Uma das coisas que ajuda a ficar assim é que muitos cavalos vão até o Serón e isso piora absurdamente a trilha, mas nada que impeça de continuar. O tempo previsto era de 4h, mas fizemos em umas 5h, fomos bem tranquilos nesse primeiro dia. Chegando no camping, largamos as mochilas num canto, definimos onde iríamos montar a barraca, a montamos e fomos comer. Nesse camping existem algumas plataformas para se montar a barraca, mas não sabemos se era para todos ou teria algum preço diferenciado (eu particularmente não gosto. Como é em campo aberto – diferente do camping Francês que só tem plataformas mas é dentro da floresta –, facilita que o vento destrua a barraca se der uma rajada muito forte e entrar por baixo da plataforma, pois ela é como se fosse um estrado de cama). Após comermos e descansarmos um pouco, demos uma andada pela área. Há um local abrigado para cozinhar, algo que ajuda bastante!!! Os campings que não possuíam isso, juntando-se ao fato de o vento não parar um segundo, faziam com que preparar a comida se tornasse algo trabalhoso e chato, já que é um momento de socializar e descansar. Após jantarmos, fomos dormir e, algumas horas depois, começou uma chuva constante que seria nossa companheira até acordarmos. Pontos negativos desse lugar: Havia UM banheiro e UM chuveiro para mais de 20 pessoas. O banheiro estava em estado deplorável... o chuveiro não sei se era quente. Não tomamos banho esse dia. 3º Dia – Camp Serón – Camp Dickson Bom, deveríamos acordar 06:00h (depois percebemos que era desnecessário), mas ficou uma chuvinha tão boa desde a meia-noite que não conseguimos acordar. Acordamos umas 07:30h e ficamos enrolando dentro da barraca até as 08h. Esse dia andaríamos bastante, cerca de 19km (~6h), mas o nível de dificuldade era tranquilo, uma vez que a maior parte seria com pouca variação de altitude (mínimo de 170m e máximo de 330m). Levantamos, arrumamos todas as coisas e deixamos só a barraca por desmontar, torcendo pela chuva parar de cair (o que mais baixava o moral era guardar a barraca com chuva, pqp! Kkkk). Enquanto comíamos, a chuva parou! Como a barraca estava molhada da chuva e de manhã é sempre bem frio, foi difícil enrolá-la, as mãos doíam de tanto frio! Mas vamos que vamooos. Nessa parte do circuito o rio Paine nos acompanha a todo o momento pela direita e também tem umas belas montanhas no começo, mas com o tempo nublado pouco conseguimos ver. Rio Paine: É nessa trilha que fica a Guarderia Coirón que vai verificar se você possui reserva no Dickson para poder prosseguir no Circuito O. Não possuindo, o guarda parque te mandará voltar. Paramos diversas vezes para comer, descansar, observar. Como sempre, chega uma hora que o vento cansa, porque não para... então ele te obriga a pegar a trilha novamente hehehe. Esse dia foi o primeiro dia que sentimos o peso da mochila. O trapézio já estava pedindo um intervalo. Como só faltavam uns 4km fizemos uma longa parada pra descansar e tirar algumas fotos! Valeu muito a pena... O Camp dickson dá pra ver de longe. Fica num lugar bem plano, circundado pelo Rio Dickson. Quase no final da trilha tem um “mirador” que se consegue ver as construções do camping, o lago e o glaciar ao fundo, mas pra chegar lá ainda tem uma subidinha bem tranquila, mas uma descida íngreme. O bonito desse lago é que diversos icebergs se desprendem do glaciar e vem parar pertinho do camping. Com uma boa luz do sol dá pra tirar ótimas fotos! Pensamos em brincar um pouco e entrar no lago, mas nessa área o vento é bem mais forte do que havíamos pego até então e como todos sabem, o problema não é NA água, é depois de sair dela kkkkk. Assim que chegamos fomos ver se tinha água quente e... TINHA! Um lugar bem apertado, mas sem problema algum. Não batia vento!! Kkkk Tomei um banho rápido, montamos a barraca e saímos bater umas fotos e conhecer os arredores. No Camp Serón não lembro de ter nada a venda; já no Dickson tinha alguns biscoitos, chocolates, etc, coisa bem básica mesmo. Nada de refeições. Voltando das fotos fomos jantar. Era mais ou menos assim as refeições: eu fazia um pacote liofilizado pela manhã, comia metade no café e guardava a outra metade para a trilha (tem um sistema ziploc na própria embalagem). Durante a trilha comia a outra metade e algumas guloseimas. A noite fazia um outro pacote para a janta e um chá bem quente antes de dormir, elevava o moral ABSURDAMENTE! fikdik heheheh. Após isso, fomos dormir e já concluímos que a medida que íamos para traz das montanhas (pensando no sentido da chegada), a temperatura diminuía e o vento aumentava. Essa noite o vento castigou, pois é uma região com árvores num dos lados, mas de onde vem o vento não tem nenhuma barreira. Dormimos mal pra caramba, mas logo logo acostumaríamos com o vento. Detalhe: No Camping Dickson, não há local abrigado para se fazer a refeição. Existem várias mesas espalhadas, mas nenhuma construção para se abrigar do vento. 4º Dia – Camp Dickson – Camp Los Perros Bom, esse dia acordamos com uma tranquilidade absurda. Teríamos que andar apenas 9km, cerca de 4h. Começamos a rotina de arrumar tudo e guardar a barraca. Aproveitamos a manhã de sol para tirar umas fotos do lago Dickson e da geleira ao seu fundo, mas as nuvens como sempre impediam a luz do sol de deixar o lugar mais bonito. Café da manhã no Dickson: Não faz maaaaal!!! O lugar já era maravilhoso por natureza! Essa caminhada foi excelente. Só o comecinho que pega bastante, pois é uma subida relativamente íngreme e parece que não acaba nunca! 90% da trilha é dentro de bosques, ou seja, algumas horinhas sem o vento de arrancar o couro da gente! A paisagem se alterna entre muitas árvores e as montanhas nevadas ao fundo e quando as copas dão uma brechinha...fica mais ou menos assim: Quase chegando ao Camp Los Perros, começa novamente uma subida, mas o problema dessa subida é que é SÓ PEDRA!! Isso acabava cansando um pouco e forçava as articulações. A dica nesse trajeto é fazer com bastante calma e tranquilidade. Fazer algumas paradas ajuda a descansar e a aproveitar a vista! J Esse trajeto é sem vento, mas quando se chega na parte mais alta, aí segurem seus gorros, óculos ou o que tiver solto: ao subir sobre a colina para observar o glaciar Los Perros ao fundo do lago, virá uma rajada de vento que desce da ravina e passa por sobre o lago, atingindo essa colina! Já na parte mais alta e pouco antes de chegar ao acampamento, tem uma geleira ao fundo. Pequena, mas com sua beleza. Uma seta dizia que o caminho estava fechado. Fomos ao acampamento deixar as mochilas e fazer o “check-in” e foi nesse momento que o guarda-parque daquele camping falou que o Paso John Gardner estava fechado e não deveria nos deixar passar, mas como já havíamos chegado até ali, seria a mesma distância de voltar e, por fim, acabou nos deixando seguir o circuito. Glaciar: Como chegamos muito cedo no acampamento e não tinha mais o que fazer, veio o ócio e, todos sabem, “mente vazia, oficina do capiroto”. Resolvemos desconsiderar o aviso e fomos até o mirador que fica em frente ao glaciar. Perigo, na real, só tem se você der mole. Basicamente é um terreno íngreme com muitas pedras soltas, à beira de uma grande queda. Se for sempre jogando o corpo para dentro do terreno e “sentindo” o chão antes de jogar o peso todo, sem problemas. Fomos, voltamos e ficou tudo bem. Seguimos para o acampamento. Esse camping é excelente! Não bate um vento, pois fica no meio das árvores. Durante a noite você ouve o vento chegando pelo barulho das copas e espera a hora de atingir a barra (como era em qualquer outro camping), mas a melhor parte é que ele nunca chegava! Hahahah. E você pode dormir tranquilamente. A partir desse dia comecei a me “acostumar” com o vento na hora de dormir, mas mesmo assim o sono não melhorou muito. Essa era a noite que teríamos que dormir o máximo possível e com mais qualidade, pois no dia seguinte seguiríamos até o Camp Grey, que daria um total de 24km (11h de caminhada, pelo mapa), incluindo a transposição do famoso e temido Paso John Gardner. 5º dia – Camp Los Perros – Camp Grey (o dia da emoção) Acordamos depois de uma noite relativamente bem dormida. Estava bem frio e chovendo, mas as árvores seguravam um pouco a água. Arrumamos as mochilas e fomos tomar café. Nós já sabíamos que esse seria o dia mais difícil (só não sabíamos que teríamos uma surpresa: uma nevasca) de todo o circuito, então comemos bastante no café da manhã e já deixamos tudo preparado para o meio da trilha. Assim que fomos tomar o café, percebemos, em cima de uma das mesas, um verdadeiro BANQUETE, com direito a tudo que imaginarem, TUDO. Naquele momento algo chamou nossa atenção: Meu deus, como alguém resolve trazer tanta comida assim para esse circuito?!?!?!? Nós estávamos contando cada grama de comida e equipamento e eles trazem tudo isso? Bom, foi nesse momento que observamos o seguinte: · Existe uma forma de contratar uma EQUIPE para fazer esse circuito O com você (ou com um grupo). Sempre vai, junto ao grupo, um guia e um ajudante. Além disso, existem mais 3 “sherpas” (sim, o mesmo nome daqueles que carregam os equipamentos dos que querem escalar o Everest) que só são responsáveis por carregar o geralzão. Como assim? Quando o grupo sai, eles ficam para trás desmontando as barracas, sacos de dormir, etc. Quando terminam, começam a correr (LITERALMENTE) até o próximo camping, para chegarem antes do grupo e montar tudo que tiver que montar. Eles levam quilos e quilos de comida e equipamento, cozinham e preparam lanches para o dia seguinte (separados em sacos ziploc) para cada integrante do grupo. Não temos ideia do quanto se paga por isso, nem perguntamos, mas não deve ser barato... Após tomarmos café, vimos vários desses guias desmontando as barracas e as levando para dentro do refeitório para que secassem e posteriormente dobrassem. Resolvemos fazer o mesmo. Já na saída do camping começam as subidas. Estas, que seriam nossas fiéis escudeiras ao longo de todo esse dia de caminhada kkkkk. Esse comecinho é totalmente dentro de um bosque, então estava bem tranquilo. Foi aí que começamos a ver granizo no chão. Já começamos a imaginar que logo logo veríamos neve. Não deu uns 20 minutos e começou a nevar sobre a gente! Maior felicidade kkkk À medida que subíamos começamos a ver maior acúmulo de neve, o que começava a dificultar a trilha. Continuamos na trilha que estava bem sinalizada, mas em um determinado momento acabamos pulando uma estaca laranja e chegamos num lugar que passava um rio por baixo do gelo! Já viu né? Frio, água e pé não combinam NADA! Paramos e começamos a olhar em volta... a estaca que então havia sido deixada para trás, estava mais para baixo e fomos até lá para evitar esse rio. Após alguns minutos de caminhada, começamos a nos dar conta do quão difícil seria o trajeto: um vento absurdo (ainda algo em torno de 60 a 70 km/h) já dificultava o nosso progresso mesmo sobre pedras e uns 30 cm de neve. E o que acontece quando se junta neve caindo e vento forte? Você não consegue olhar para a frente! O que acabávamos fazendo era seguir a trilha do grupo que estava à nossa frente (cerca de 300m), olhando para baixo, no máximo procurando a próxima marca laranja que indicava o caminho a seguir. Continuamos subindo e subindo... Não acabava nunca!!! Víamos o grupo com o guia no topo de uma montanha. Imaginávamos que aquele local seria o Paso ou estaria muito próximo dele, mas não. E pior, toda aquela neve batendo no nosso rosto, aquele vento baixando a sensação térmica e a neve acumulada aumentando, iam deixando o trajeto mais difícil ainda! Foi a partir de uma das placas que informa a distância e a elevação daquele local que a “brincadeira” começou a ficar séria... Já não víamos mais o grupo (com guia) que estava na nossa frente. As pegadas que deixavam na neve? Já haviam sumido! As estacas alaranjadas estavam começando a ficar encobertos pela neve acumulada. O vento? Só aumentava! Foi nessa hora que a CALMA falou mais alto. Paramos atrás de uma pedra, respiramos, pensamos e comemos. Retomamos a trilha... À medida que subíamos o vento aumentava numa proporção astronômica! Só conseguíamos olhar para baixo. Ao chegar numa estaca laranja, olhávamos para o horizonte, achávamos a próxima, baixávamos o rosto e íamos olhando para baixo. Lembram da subida? Ainda estava lá!!! Kkkkkk o peso das mochilas deixava TUDO mais difícil. À medida que pisávamos na neve, afundávamos. Na maior parte do tempo eram necessários dois passos no mesmo lugar para conseguir progredir. A neve estava na altura dos joelhos já. Num determinado momento o Diego, que estava na frente, parou e me falou que estava preocupado com suas mãos. Nesse momento, me dei conta que eu também tinha mãos! Kkkkkk a partir daí, também percebi que já não sentia a ponta de todos os dedos, mesmo com a luva. Primeiramente tentei achar o problema, pensando que a luva estivesse molhada, mas não! Era a neve acumulada, juntamente com o vento, que estava baixando a temperatura. Tirei a neve, coloquei as duas mão atrás da mochila que estava no meu peito e comecei abrir e fechar as mãos. Em alguns minutos havia voltado ao normal e falei para o Diego fazer o mesmo. Entretanto, à medida que usávamos os bastões para nos ajudar na neve (e acreditem, eles fazem uma diferença ABSURDA nessa situação), as pontas dos dedos voltavam a doer absurdamente. Mantivemos o ritmo. Mais pra cima? Mais TUDO! Mais vento, mais neve... e vocês já sabem. Devido à nevasca não conseguíamos ver além de 15m e aqui deixo a minha crítica ao parque: as estacas que indicam o caminho nesse trecho (O MAIS CRÍTICO DO PARQUE) são escassas. Em alguns momentos você tem que chutar uma direção e ir. O que nos ajudou numa das situações mais críticas desse trecho foi que a neve encobria as pegadas do grupo, mas os buracos dos bastões ficavam visíveis! Seguimos os buracos e logo em seguida achamos o caminho novamente. Chegando próximo do Paso, a preocupação com as mãos aumentava, mas outra coisa estava nos tomando mais a atenção: O vento. Simplesmente não conseguíamos avançar!!! Dávamos 3 passos para a frente e o vento nos empurrava 5 para trás ou nos derrubava! Vendo que não conseguiríamos competir com ele, começamos a engatinhar até chegar próximo de uma encosta rochosa onde o vento diminuiu e conseguimos chegar ao outro lado da montanha, aonde vimos o IMENSO Glaciar Grey, em toda sua infinita extensão. Após passar pelo topo o vento diminuiu consideravelmente. Sabíamos que a partir daquele ponto seria apenas descida. A partir de então foi o inverso. Era descida que não acabava mais! Em determinado momento, não era mais possível descer caminhando, de tão escorregadio que estava. Acabamos descendo de esquibunda kkkkkk. Nesse momento, juntamos a alegria de ter sobrevivido com as brincadeiras na neve. Enquanto descansávamos, um dos sherpas estava descendo (também de esquibunda kkkk), parou e nos ofereceu um chá quentinho. Aceitamos e conversamos um pouco. Ele disse que nunca havia visto essa parte do circuito, dessa forma. Era novidade para ele, mesmo já trabalhando nisso há alguns anos. Chegamos ao Camp Paso. Tinha uma infraestrutura bem básica. Fizemos um café, dividimos uma caixinha de leite condensado inteiro e recuperamos as energias. Energia recuperada, retomamos a descida. Nesse dia meu joelho começou a gritar!! Era descida que não acabava mais... Depois de algumas horas de caminhada, chegamos às pontes que são bem conhecidas (as pessoas que fazem o W pernoitam no Grey só para poder subir até essas 3 pontes que tem entre o Camp Paso e o Camp grey). O dono do hostel que viríamos a ficar em P. Arenas trabalhou para a Vértice e disse que antigamente no lugar dessas pontes, haviam escadas. Com o derretimento do gelo, a água descia e levava a escada embora. Assim, os guarda-parques iam lá e colocavam CORDAS temporariamente. Imaginem a dificuldade de subir, através de cordas, com uns 20kg a mais de equipamento, um barranco de uns 6m. Felizmente não são mais escadas, mas 3 pontes que balançam MUITO! Como estávamos cansados da travessia, a neve não parava de cair e o vento também não parava de soprar, acabamos passando meio que batido, sem ter apreciado muito bem essa parte. Depois de algumas horas de descida chegamos ao Camp Grey. Com uma boa infraestrutura, o Grey tinha uma cozinha bem espaçosa e fechada. O banheiro masculino eram duas privadas e duas duchas (chuto que o feminino era a mesma coisa). Bem pouco, pensando que esse Camping faz parte de uma das pernas do W e fica lotado de turistas. Mirador no Camp Grey: Não saiam daí! To be continued... hahahahah
  2. Prelúdio – Dientes de Navarino, Trekking do Fim do Mundo. [align=center][/align] Sempre tive atração por locais remotos, me atraía a sensação de como era estar na última cidade do continente (Puerto William, não Ushuaia) e melhor ainda, qual seria a sensação de fazer um trekking remoto, inóspito e selvagem na Patagônia. Foi lendo o Lonely Planet - Trekking In The Patagonian Andes que soube da existência do circuito de Dientes de Navarino e fiquei mais empolgado ainda com a publicação do roteiro nos guias de trekking do Guilherme Cavallari. Sendo assim ainda consegui reunir bons amigos de caminhada, Ronald e LH e a minha esposa Roberta para encarar este desafio. Desafio sim, pois Dientes não tem nada a ver com Torres Del Paine, El Chalten, Refúgios de Bariloche (já fiz todos esses citados) onde, na maioria deles você conta com apoio, comida, cama, e até banho quente! Já Dientes não, pela proximidade do Cabo de Hornos, mal tempo, frio, chuva e ventos antárticos são quase que uma garantia e não se tem para onde correr. Na trilha encontramos somente uma pessoa, a qual estava trabalhando na demarcação da mesma! O circuito pode ser feito em 4 ou 5 dias (optamos por 4 dias) de caminhada e apesar das distâncias não serem longas e não haver grandes desníveis, o terreno é muito irregular e a caminhada não rende, pois sempre se caminha por pedras, encostas e sobe-desce de pasos de montanhas, bosques com inúmeras árvores tombadas e também muitas áreas de charcos enlameados. Em alguns trechos não há marcação alguma e o caminho não é tão óbvio assim. Tem de estar bem preparado, encarar e também claro, desfrutar de suas magníficas paisagens, lagunas, montanhas e bosques multicoloridos. Bom, abaixo segue o esquema relatado para se alguém quiser (e eu incentivo, não vão se arrepender) a repetir a viagem. Dia 1 – Sexta-Feira, 9/3/2012 – São Paulo / Buenos Aires Saímos Roberta, Ronald e eu do aeroporto de Guarulhos pela Aerolíneas com destino a Ezeiza, Buenos Aires. Chegando lá, fizemos câmbio (cotação horrível) e fechamos um taxi (Ar$ 250) para o Aeroparque de onde tomamos o primeiro voo do dia para Ushuaia. Dia 2 – Sábado, 10/3/2012 – Buenos Aires / Ushuaia [align=center][/align] Chegamos em Ushuaia quase 10 da manhã. O taxi para o hostel saiu por Ar$20. O hostel que escolhemos foi La Casa de Alba (http://www.lacasadealba.com.ar/), diária em quarto privado por Ar$300. O hostel é simples, mas é bem limpo, silencioso e tem um bom café da manhã. Fica a uns 10 minutos de caminhada do centro e a Dona Alba agiliza muita coisa para os hóspedes, desde táxi até passeios. Neste dia fechei o barco para Puerto William com a agência Fernandez Campbell (http://www.fernandezcampbell.com/) (Us$125 ida + Us$8 taxas portuárias). A cabine de atendimento dele fica no porto de Ushuaia. São lanchas rápidas e muito confortáveis ao contrário dos botes infláveis da Ushuaia Boating. Além disso, a lancha nos deixaria direto na cidade de Puerto Williams, sem a necessidade de usar van, caso optássemos pela Ushuaia Boating. E outro detalhe, somente Fernandez Campbell possui saídas aos domingos. No restante do dia, andamos pela cidade, pegamos um tempo ótimo, céu azul o tempo todo. Comemos empanadas nas casas de comida próxima a Rua Perón, longe do centro comercial. São as melhores e mais baratas, pois não é para turista e sim para os locais. Indicação da Dona Alba. Ao fim do dia encontramos o LH que chegou o voo da noite e saímos para tomar umas e fechar os últimos detalhes da trilha. Fotos: http://diarionamochila.multiply.com/photos/album/265/Ushuaia_-_ARG Dia 3 – Domingo, 11/3/2012 – Ushuaia / Puerto Williams [align=center][/align] Saímos de Ushuaia para Williams às 14h. O trajeto leva em torno de 1h30min. Demoramos mais na aduana chilena, pois não havia ninguém para recepcionar a gente! Imaginem esta cena... você chega num país e não há ninguém para carimbar seu passaporte, realmente chegamos no fim do mundo! Enfim, após algumas ligações dos barqueiros vieram os agentes para fazer os trâmites de alfândega. Revistaram nossas mochilas para saber se havia algo orgânico e nos levaram até o prédio onde tivemos nossa entrada na cidade liberada. Júlio do Hostel Akainij (http://www.turismoakainij.cl) já nos esperava lá para nos levar à casa dele, que por sinal fica próximo, aliás tudo é próximo lá. Gostei bastante do hostel, apesar da água quente não estar funcionando bem, mas tanto Gabi quanto Julio são pessoas muito simpáticas e o quarto privativo é bem aconchegante e o café da manhã é excelente. Tudo por Us$50 o quarto. Nosso problema agora era encontrar algo para comer. Como era Domingo, todos os 2 restaurantes da cidade estavam fechados. Sorte encontrar um mercadinho aberto onde compramos pães, frios e cervejas. Além disso, a Roberta perguntou e descobriu que em frente ao mercado havia uma senhorita chamada Paty, Dona do Hostel Pusaki, que servia jantar mediante reserva e foi o que fizemos. Antes do jantar eu e o Ronald saímos para bater perna na cidade, estava bem frio e ventando, prévia do que encontraríamos na trilha. Desde a cidade é possível avistar o Cerro Bandera e os picos de Dientes de Navarino, nosso destino para o dia seguinte. Fomos ao museu que conta a história dos índios Yaganes, visita que vale muito a pena, e lá conheci uns americanos que haviam concluído o circuito e nos alertam pela quantidade de charco na trilha e também sobra e temível descida do Paso Virginia. Andamos mais um pouco pela vila, típica vila militar, casas idênticas, veículos militares a mostra como exposição, grandes navios, etc... povo muito simpático e que gosta de conversa. Já me sentia adaptado ao fim do mundo, ainda mais tomando uma cervejinha Austral. De volta, compramos algumas bebidas no mercado e voltamos a casa de Paty para jantar. Estava excelente, ela preparou uma salada com King Crab e mais umas costelinhas de boi com arroz. Tudo por Us$ 20. Por coincidência os americanos estavam lá e conversamos mais um pouco sobre a trilha e conseguimos pegar algumas dicas valiosas. Terminado o jantar, fomos aos Carabineiros para nos registrar para o Trekking. Lá você informa seus dados, passaporte, a data de ida e volta da caminhada. Além disso, ainda eu tinha mais um objetivo em Williams, o qual era conhecer o Micalvi Yatchi Club. Este lugar é sensacional, é um bar-barco onde claro, tomamos mais umas Austral e apreciamos o lugar. Viajantes do mundo inteiro, inclusive Amyr Klink, decoram o local com flâmulas de seus respectivos barcos, expedições ou países. Valeu muito a pena a visita. [align=center][/align] Fotos: http://diarionamochila.multiply.com/photos/album/267/Puerto_Williams_-_CHI Dia 4 – Segunda-Feira, 12/3/2012 – Trekking Dientes de Navarino – Laguna Del Salto – Dia 1 [align=center][/align] Enfim começamos a caminhada, passamos pela Plaza De La Virgem, continuamos pela estrada cercada por bosques até chegarmos ao começo da trilha para o Cerro Bandera, onde há uma placa com indicação do caminho. A trilha inicia por um bosque, caminho aberto e fácil de caminhar até chegamos ao topo do Cerro Bandera, após vencer 600m de desnível. Paramos um pouco para descansar a apreciar o visual ali mas foi uma péssima ideia, muito vento e frio... quase congelamos. Tratamos de continuar a trilha que entrou por uma encosta muito íngreme de montanha e foi assim praticamente até o fim do dia. Sempre acompanhando a Laguna Del Robalo à direita e o pico de Los Dientes à frente. Sempre na encosta, Chegamos até a Laguna Del Salto e descemos a pirambeira com o máximo de cuidado. O local foi excelente para acampar, pouco vento, bem protegido e água e muito visual. [align=center][/align] Fotos: http://diarionamochila.multiply.com/photos/album/268/Dientes_de_Navarino_-_Laguna_del_Salto_-_Dia_1 Dia 5 – Terça-Feira, 13/3/2012 – Trekking Dientes de Navarino – Laguna Escondida – Dia 2 [align=center][/align] Já começamos o dia subindo uma piramba enlameada. Passamos pelo Paso Primero e depois Paso Austrália. Fizemos uma descida perigosa por gelo e enfim chegamos ao Paso de Los Dientes onde começamos a ter visão sul da ilha. Como o tempo estava ótimo, foi possível ver o arquipélago de Hornos. Seguimos a esquerda de uma linda lagoa até uma bifurcação que iria para Lago Windhond, outra opção de trilha que há por lá. Adentramos em um trecho de bosque colorido e vimos a Laguna de Los Dientes, por difícil decisão elegemos este lugar o mais lindo de toda a travessia. Descansamos por um bom tempo lá até retomar a caminhada por um bosque (trecho confuso, quase não há marcações), pois tínhamos que descer ao nível da lagoa e contornar o Cerro Gabriel e enfim chegar à Laguna Escondida. Não vou me estender no relato para tentar detalhar a beleza do local, pois as fotos já o fazem. Acampamos num local meio exposto na Laguna e com poucos pontos de fixação. Resultado, noite mal dormida devido aos fortes ventos. A barraca do LH (que na verdade estava emprestada pelo Bob) teve suas varetas envergadas, tamanha era a força do vento. [align=center][/align] Fotos: http://diarionamochila.multiply.com/photos/album/269/Dientes_de_Navarino_-_Laguna_Escondida_-_Dia_2 Dia 6 – Quarta-Feira, 14/3/2012 – Trekking Dientes de Navarino – Laguna Martillo – Dia 3 [align=center][/align] Iniciamos o dia caminhando pela borda da lagoa e descobrimos pontos melhores para se acampar, mais ao fim da lagoa. Cruzamos um rio por cima de uma castoreira e começamos a andar numa sucessão de bosques e rochas até iniciar a subida do Paso Ventarrón, onde encontramos a única pessoa durante a trilha toda. Fugiu-me o nome dele, mas era um guia local que estava trabalhando na demarcação da trilha. Por coincidência, mostrei uma foto do livro do Guilherme Cavallari e ele disse que era ele na foto e havia sido ele quem guiou o Guilherme na publicação do livro, que coincidência! Muito solicito, nos forneceu dicas valiosas, pois pretendíamos avançar ao máximo o dia de hoje e conseguimos obter informações de onde acampar, mais próximo ao Paso Virgínia. Após terminar a subida do Paso, demos de cara com um local belíssimo. Um vale com inúmeras lagoas e picos nevados ao fundo. Beleza cênica! O problema que para descer o paso teríamos que andar pela encosta íngreme novamente. Neste local devido aos fortes ventos, já li relatos de pessoas que despencaram morro abaixo e se quebraram inteiro. Ainda bem que não foi o nosso caso e conseguimos chegar inteiros ao vale. Em outra bela lagoa paramos para fazer nosso almoço e descansar para encarar a subida do Paso Guerrico. Este subida na maior parte é por mata fechada e a descida bem mais tranquila. Fomos andando pela margem esquerda da “hermosa” Laguna Hermosa até enfim cruzar o riacho e chegar ao local de acampamento da Laguna Martillo. Como nossa ideia era avançar o máximo possível e ainda tínhamos muito tempo, continuamos margeando a laguna por um trecho bem difícil de pedras e charco. A trilha sobe se afastando um pouco da laguna para contorná-la e em seguida descemos para acompanhar a margem de um rio. Chegamos num bosque excelente para acampamento, bem protegido e o visual das montanhas estava magnífico naquele momento. A Roberta sugeriu pararmos por ali e como já havíamos avançado pelo menos umas 2h ficamos o resto do dia cozinhando e curtindo o visual. [align=center][/align] Fotos: http://diarionamochila.multiply.com/photos/album/270/Dientes_de_Navarino_-_Laguna_Martillo_-_Dia_3 Dia 7 – Quinta-Feira, 15/3/2012 – Trekking Dientes de Navarino – Paso Virgina – Dia 4 [align=][/align] Como combinado, levantamos às 5h da manhã, em pleno breu tomamos nosso café a luz de lanterna, sorte que a chuva da noite e o frio nos deram uma trégua. O dia seria puxado e o mais difícil, por isso decidimos partir cedo a fim de terminar naquele dia a trilha. Começamos a andar 7h em ponto e já pudemos ver a piramba da subida do Paso Virgina. Para chegar a sua base, andamos por charcos e por lagunas, uma delas era a Rocallosa que como o próprio nome diz é cheio de pedras que dificultam muito o avanço. Qualquer vacilo era um pé torcido. Enfim chegamos à base do Virginia e pra variar mais lama. O trecho inicial é difícil, vamos tomando cuidado para não se afundar na lama e vamos ganhando altitude aos poucos, afinal eram quase 500m de desnível. Após vencer o trecho do bosque enlameado, vem o que? Encostas de montanha que a Roberta tanto adora... porém o visual vai ficando cada vez mais magnífico. Pudemos observar Ushuaia, a estância Haberton e também o conjunto de montanhas conhecidas como Montes Lindenmayer. Ao final da subida tem-se a impressão que estamos na Lua. Pedra por todos os lados e uma superfície plana por onde andamos por alguns KM, até enfim chegar à famosa descida do Paso Virgínia. Aqui eu entendi o porquê que todo mundo recomenda utilizar bastões na trilha e também o porquê que eu lia frases do tipo “Mais assustadora do que perigosa”. Como a Roberta sofre com alturas já estava fazendo um psicológico nela e mostrando a “trilha” que deveríamos fazer. O Ronald arriscou ir à frente acompanhado pelo LH. Quando vi o Ronald sentando na trilha, logo no começo, escorregando e sem conseguir ficar de pé... pensei, “fudeu, vamos todos se arrebentar aqui!!!”. Sorte que ambos se ajudaram e conseguiram vencer este trecho técnico e o LH foi me orientando como descer enquanto eu segurava a Roberta para não entrar em pânico da maneira que dava, tentando transmitir segurança para que ela desse um passo por vez. Na base da motivação consegui que ela vencesse seus medos e caminhasse, mesmo que devagar. Perguntava várias vezes se ela queria um banho e uma cama quente à noite, não havia outra opção, teríamos que descer! Passado este trecho, o restante foi mais tranquilo e sem sustos até chegar a Laguna de Los Guanacos. Local onde fizemos mais uma parada para restabelecer o físico e principalmente o psicológico. Contornamos a laguna e fomos seguindo o curso do rio até chegar a Laguna de Las Guanacas, onde seria o último ponto de acampamento para quem faz em 5 dias. Como estávamos de acordo com o planejamento por termos levantado cedo, decidimos continuar e cruzar o último trecho de bosque até o pesqueiro, fim da trilha. Todas as informações que tínhamos sobre este bosque eram unânimes. Estava terrível, sem trilha, lamaçal e sem marcações, pois havia muitas árvores tombadas, nas quais estavam as marcações. Pelo menos tínhamos uma direção, uma bússola e um mapa. Nosso objetivo era tocar sempre para Nordeste, contornado as árvores tombadas e tentando nos manter na encosta da montanha e não margear o rio, pois aí sim segundo informações teríamos vários problemas com obstáculos naturais. Por sorte (ou competência de navegação, ou os dois) conseguimos identificar algumas poucas marcações que serviram de alento para nós. Continuamos sempre na direção por umas 3h de caminhada dentro do bosque, até enfim sairmos num pasto onde conseguimos ter uma navegação visual a partir daqui, pois a estrada já estava visível a nossa frente. Nem bem chegamos à estrada, já conseguimos carona para o centro da cidade com duas senhoras em uma Van, parece que a sorte do dia não tinha fim mesmo. Percorremos os 7km restante até a cidade onde pegamos nossas coisas no Akainij Hostel (não continuamos lá pois não haviam mais vagas) e migramos para o Pusaki Hostel da Paty, a qual nos esperava com uma deliciosa janta de frutos do mar. Antes passamos nos Carabineiros para dar baixa de nossa retorno e também passamos no Shila Turismo para confirmar nossa passagem de volta para Ushuaia. O hostel tem um ambiente legal, ela prepara a comida para todos os hóspedes e serve na mesma mesa. Muito legal a interação, havia chilenos, um austríaco, um lituano e nós. A Paty é muito simpática e gosta de beber um vinho com a galera e também gosta de música brasileira, pois a Roberta teve que explicar qual o sentido do “Ai Se eu Te Pego” para ela depois de uns vinhos e outros. Parece que a onda Michel Telló chegou até ao fim do mundo também! Nesta Babel no fim do mundo, bebemoramos a noite toda o sucesso da travessia. [align=center][/align] Fotos: http://diarionamochila.multiply.com/photos/album/271/Dientes_de_Navarino_-_Paso_Virginia_-_Dia_4 Dia 8 – Sexta-Feira, 16/3/2012 – Puerto Williams / Ushuaia [align=center][/align] Acordei na ressaca brava, mas não me impediu de dar mais umas voltas na cidade de Puerto Williams. Desocupamos o hostel e fomos para a Shila Turismo por volta do meio-dia para fazer os trâmites de alfândega e pegar nosso barco de volta para Ushuaia. Em Ushuaia voltamos para a Casa de Alba e fomos comer no El Turco (fuja dessa merda!) Dia 9 – Sábado, 17/3/2012 – Ushuaia - Glaciar Martial [align=center][/align] As montanhas amanheceram brancas, resultado na nevasca da noite anterior e da manhã de sábado. O céu azul deixou o tempo perfeito para uma visita ao Glaciar Martial (pelo teleférico, claro... nada de andar!). Em pleno verão, Ushuaia chegou a marcar -5º ! Era tudo o que desejávamos pra aproveitar o Glaciar. Comemos no Bodegon Fueguino, gostei bastante da comida, preço e do atendimento. Fotos: http://diarionamochila.multiply.com/photos/album/266/Glaciar_Martial_-_Ushuaia Dia 10 – Domingo, 18/3/2012 – Ushuaia - PN Tierra del Fuego [align=center][/align] Logo pela manhã nos despedimos do LH. Enrolamos mais um pouco no hostel e fomos para o Parque Nacional Tierra de Fuego. O clima não estava lá grande coisa, muito vendo e a chuva se alternava com as nuvens cinzentas. De qualquer modo fizemos a Senda Costera, tomamos umas Quilmes no Lago Roca e depois voltamos para a cidade para enfim, degustar um Tenedor Libre de Cordero Fueguino no restaurante La Terraza (é bom dar uma gorjeta antes para o parrilheiro, gentileza gera gentileza!). Como já havia visitado Ushuaia anos atrás, estava mais focado em desfrutar a culinária mesmo! Dia 11 – Segunda-Feira, 19/3/2012 – Ushuaia [align=center][/align] O Ronald ainda se arriscou a caminhar, foi subir o Jaraguá com neve de Ushuaia, conhecido também como Cerro Guanaco. Teve sorte pois o tempo estava bom, aberto. Eu e a Roberta continuamos nossa epopeia etílica, visitamos o bar mais antigo de Ushuaia, o Bar Ideal. Aqui acho que presenciei uma das cenas mais globalizadas da viagem. Estávamos em Ushuaia, em um típico pub irlandês, o qual estava tocando Bossa Nova. Comemos hamburgers americanos, bebendo a Quilmes Argentina e de repente toca o celular de uma portenha ao lado com o ringtone de “Ai Se Eu Te Pego” (de novo ela). À noite fomos comer uma truta no restaurante Tante Nina, muito bom também. Dia 12 – Terça-Feira, 20/3/2012 – Ushuaia [align=][/align] O Ronald partiu logo cedo. Nós ainda tínhamos o resto do dia pois nosso voo só sairia a noite. A Roberta fez questão de me surpreender e reservar um almoço no Cerro Castor, no restaurante La Morada Del Aguila (http://www.cerrocastor.com/). Sim, lá só atende por reserva. Por ser bem afastado da cidade, a comida é preparada por demanda e na ocasião estávamos a sós no restaurante. O local é bem aconchegante e foi a melhor comida que provei na viagem e também não achei caro, Ar$100 pelo Cordeiro Fueguino, à vontade. No local há algumas cabanas para alugar, fiquei com vontade de retornar lá em uma outra ocasião, a região do Cerro Castor é magnífica, cercada de boques coloridos e de montanhas, além claro, da excelente comida. Voltamos para a cidade, fizemos algumas compras finais, arrumamos a mala e deixamos Ushuaia debaixo de uma chuva gelada, quase virando neve. Não tivemos problemas com os voos e chegamos em Sampa na quarta-feira, pela manhã. Tracklog do Circuito Dientes de Navarino: http://pt.wikiloc.com/wikiloc/view.do?id=2674988
  3. O Cerro San Lorenzo é a terceira e última etapa de minha viagem de 2 semanas por Aysén. Está descrito como Campamento De Agostini, no livro Trekking in the Patagonian Andes, do Lonely Planet, de autoria do saudoso Clem Lindenmayer. A montanha é a segunda mais alta da Patagônia chilena, com 3.706 metros. Foi escalada pela primeira vez pelo padre De Agostini, em 1943, que provavelmente gostava muito mais de montanhas do que de missas. Ele foi um grande explorador da região. A mais alta é o Cerro San Valentín, 4.070 m, que fica no Campo de Gelo Norte. Dia 21/03/2016 – segunda – Cochrane/Fundo San Lorenzo Parti 11 horas com uma van que faz o transporte subsidiado ($ 1.800). Algumas das regiões de Aysén são tão isoladas que o transporte coletivo tem que ser subsidiado pelo governo, porque se não a iniciativa privada não tem interesse em fazer a linha ou se explorar vai ter um custo tão elevado que não vai ter passageiro. Foi uma solução que o governo chileno encontrou para manter populações nestes lugares isolados (pequenos fazendeiros sem automóveis). Esta van só faz o trajeto duas vezes na semana (segundas e quintas). Saltei cerca de 60 km depois, com 1:10 de viagem. Uma placa a beira da estrada indica o começo da estrada 4X4 que vai para o Fundo San Lorenzo, meu objetivo deste dia. Comecei a subida as 12:30. No caminho a laguna Corazón. Mais acima visualizamos o formato que dá nome a laguna. Logo em seguida uma encruzilhada. Tomei a direita. Placa e uma bandeirola indicam a direção do Fundo San Lorenzo. No caminho um vaqueiro (tropeiro) me alcançou, o Elia. Ele trabalha no Fundo e estava indo para lá. Informou que com mais uma hora e atrás do cerro que divisava no platô adiante a SE estava a sede da fazenda. Segui exatamente a trilha do carro mas me parecia que haviam atalhos para quem fosse a pé. Cheguei a sede com 2:15 depois que saltei da van. Uma ponte peatonal cruza o rio Tranquilo pouco antes de chegar na sede. O Elia estava sentado num banco tomando chimarrão e me ofereceu o té de mate. O pessoal desta região (Cochrane e adjacências) é conhecido como os gaúchos chilenos. Eles imigraram do outro lado dos Andes, onde hoje é território argentino quando, por acordo, aquela parte chilena foi cedida a Argentina (boa parte do sul da Argentina era do Chile até o início do século XIX). Eles vieram com os costumes gaúchos. Há alguma diferença. O chimarrão é tomado numa cumbuca menor que a da Argentina/Uruguay e Brasil, a bomba também é menor e não usam água fervendo. O modo de vestir e de ser é idêntico. Conversamos um pouco e depois escolhi um local para armar a barraca entre as árvores atrás da casa. Não tem eletricidade exceto uma gerada por painéis solares para o rádio transmissor. Mas tudo é movido a lenha: os fogões e o chuveiro quente. O camping tem um ótimo banheiro e duchas quentes. A vista para o fundo do vale, direção S-SW, é linda, o Cordón San Lorenzo com a torre de Feruglio e uma série de glaciares que alimenta a laguna del Tranquilo, que dá origem ao rio de mesmo nome (mas não achei o rio assim tranquilo não). Depois que armei a barraca chegaram os donos numa pickup, o casal Luis Soto e Luci Gomez, com três jovens voluntários. Conversei com o Luis, falando que dia seguinte iria para o refúgio e que na volta gostaria de comer um cordeiro asado al palo. Eles tem 300 ovelhas e 50 cabeças de gado além de cavalos. Os cordeiros são apenas para consumo próprio e dos turistas. A lã é vendida para uma cooperativa. Em torno de 15 de maio eles irão para um vale mais abaixo para passar o inverno e levarão todos os animais (inclusive as galinhas). Apenas deixam um gato na casa para impedir os ratos de fazerem a festa (e evitar o hantavírus). Andei um pouco nas imediações e fui preparar a janta no quincho (construção típica chilena que é uma área coberta externa a casa onde fazem refeições, churrascos, enfim, festas). O quincho tem um fogão a lenha, cozinha e uma grande mesa diante de uma lareira. Não precisei usar o fogareiro, usei o fogão. É muito legal esta coisa de cozinhar a lenha. E aquece o ambiente. Com a comida liofilizada na verdade bastaria um cartucho de gás de 230 gramas para 2 semanas na Patagônia. Vou ter de doar o outro cheio, que comprei por precaução. Noite com temperatura agradável (acho que estou acostumando...), mas com ráfagas de viento. Dia 22/03/2016 – Fundo San Lorenzo/Refugio Toni Rohrer 9,5 km. 325 m de aclives. Saí as 11:00. Como ficaria no refúgio deixei a minha barraca montada. Tomei rumo NE para sair da área da fazenda e contornar um cerro e descer para um vale que ruma SE, onde corre o Arroyo San Lorenzo. O fundo deste vale já é território argentino. Após meia hora aproximadamente cheguei a uma cerca que protege uma área onde se planta avena. Não se pula esta cerca. Vira para a direita seguindo a cerca até seu final e aí dobra a esquerda passado a seguir em frente entre a cerca e as encostas do vale. Ao final, sobe um pouco para encontrar uma porteira junto a umas lengas. Pula a cerca e continua seguindo para o fundo do vale, SE. Há uma outra porteira mais adiante que temos que passar. O Luis Soto me aconselhou a fechar cuidadosamente as tranqueras (porteiras) caso contrário os cavalos abrem com os dentes (espertos...). Há várias trilhas de gado paralelas e nenhuma sinalização. Mas o sentido é óbvio. Teremos que seguir até encontrar o vale onde nasce o Arroyo San Lorenzo, o primeiro que se abrirá a direita, já visível. A trilha vira uma só e passa pertinho das margens do arroyo. Após 1:20 o terreno plano se torna uma ladeira e começamos a subir o estreito vale a direita, rumo S/SW. Como o vale é estreito o Arroyo San Lorenzo acavala dentro de um cânion mais estreito ainda. Em poucos momentos é possível observar o arroyo furioso lá embaixo, devido a altura e a existência de alguns degraus de rocha antes do paredão que despenca para o rio. Ali nem caiaque com vaselina passa. Entrei num maravilhoso bosque de lengas, O vale é de uma lindeza só. O San Lorenzo ainda está escondido atrás de uma curva. Mas adiante ele aparece majestoso. Com 3 horas cheguei no refúgio. Local excepcional, com linda vista do Cerro. Um banquinho de madeira permite lanchar com aquele vistão. O refúgio, embora não muito grande, é o mais bonito e funcional que já visitei. Eu estava sozinho, era todo meu!!!! Projetado e construído pelo Luis Soto dá gosto ficar nele. Fiquei espantado com o fogão de ferro, a lenha, na cozinha. Que trabalheira deve ter sido para subir com ele até aqui (foi dividido e colocado no lombo de cavalos, mas nas subidas íngremes 4 homens tiveram de carregá-lo). Tem o nome do alpinista Toni Rohrer, suiço, a pedido da esposa dele, para homenageá-lo. Ele morreu na descida do San Lorenzo, após fazer cume. Cerca de 6 pessoas já morreram em sua encosta. Os dois últimos, famosos esquiadores, foram fazer um documentário, morreram em uma avalanche (A. Fransson e J.P. Auclair, + setembro/2014). A cozinha do refúgio estava decorada por bandeiras de países e por placas comemorativas. Uma delas era do Niclevicz, que fez cume em janeiro/2015, junto com o peruano E. Espinoza. Mais um brasileiro esteve por lá (Marquinhos). A NOLS parece que conduz expedições anuais para o cume. Pena que não trouxe minha bandeirinha do Brasil, para deixar na parede. Fiz um passeio para a laguna do glaciar e fiquei pelo vale admirando a paisagem, tirando fotos. Mas não pude cruzar vários dos riachos que desciam das geleiras acima. Aquela hora da tarde, com o “calor” do dia já estavam com uma vazão grande. Há um roteiro para uma laguna mais acima e que segue para o Paso del Comedor e a Brecha de la Cornisa (2.266 m). Apenas para alpinistas experientes. Possivelmente por passar por geleiras com gretas. Não quis subir ao menos um trecho, pelo adiantado da hora. Vi também o antigo e agora deteriorado refúgio que foi feito por De Agostini. Acendi a lenha e comecei a esquentar água para a janta e para o banho. Tomei banho de bacia (estava sozinho). Comi a janta sentado no banquinho, com aquele visual. Tirei fotos e fiz uns time-lapses. Dia 23/03/2016 – quarta – Refúgio Toni Rohrer/Fundo São Lorenzo. Choveu e esfriou bem durante a noite, rajadas de vento fortes. A previsão do Mountain Weather Forecast estava certíssima outra vez. Previu frio, neve e rajadas de até 60 mph. De manhã começou a nevar, mas poucos flocos. Na montanha é que o pau estava comendo. Mal dava para enxergar ela. Saí 10 horas. Com o tempo ruim não valia a pena fazer passeios nas redondezas. Desci o vale debaixo de vento e um pouco de neve. Com pouco menos de 3 horas estava de volta ao Fundo. Tive que me agasalhar bem no caminho, inclusive com luvas, devido ao vento frio e forte. Cheguei meio espantado vendo o Elia, o Luis Soto e a Luci trabalhando duro, tranquilamente, debaixo de vento e chuva como se fosse um dia ensolarado. Para comemorar jantei um cordeiro delicioso feito pelo Luis no forno. Não pode ser al palo porque estava chovendo, ventando e nevando ocasionalmente. Jantamos juntos, ele ofereceu um vinho para acompanhar. Dia 24/03/2016 – quinta – Fundo San Lorenzo/Cochrane Levantei 7:30. Luci me chamou para comer uns pãezinhos que tinha feito no dia anterior, com marmelada. Os simpáticos voluntários (o francês Olivier, sua namorada, a chilena Heloisa e Thomas, também chileno) estavam comendo cordeiro no desayuno! Muito legal esta coisa do trabalho voluntário. Vinham percorrendo a Carretera Autral de bike e trocando alojamento e comida por trabalho voluntário. O casal passou uma ou duas semanas trabalhando também como voluntários no Parque Patagônia. Tirei mais umas fotos e parti as 9:30. Dia bonito. Na altura da laguna Corazón encontrei com um caminhão da Municipalidad de Cochrane que vinha abastecer o trator que estava trabalhando na estrada de rípio até a fazenda. Haveria uma Carrera de Aventura San Lorenzo – bike, caiaque e corrida - em comemoração ao aniversário de Cochrane (a cidade foi fundada em março de 1954, com apenas 10 casas). Precisavam melhorar a estrada para os carros subirem para San Lorenzo. Cumprimentei-os no que o motorista parou e me disse que na volta me daria carona. Assim o fez e acabei voltando mais cedo, sem precisar usar a van, que só passaria as 13 horas. Os chilenos daqui são gentis e oferecem carona como se fosse a coisa mais natural do mundo. Em Cochrane ainda consegui de volta o dinheiro que paguei antecipadamente da passagem de van. Comi e me acomodei num hostel barato ($ 8.000). Amanhã 6:30 embarque no busão para 6 a 7 horas de viagem para Coyhaique. De lá para Santiago e Brasil no domingo, fim de férias. Dicas Vale a pena ficar quatro dias. Um dia na chegada, no Fundo, e dois dias no Refúgio Toni Rohrer explorando os arredores. O quarto dia para a volta. E encomenda o cordeiro! Camping com ducha quente e uso do quincho com fogão a lenha, $ 6.000/dia/pessoa Refúgio Toni Rohrer, $ 3.500/dia/pessoa Cordero para um, $ 12.000. A simpatia e a gentileza não tem preço. Tudo isto junto, a beleza do lugar, do vale e do Cerro San Lorenzo, o refúgio e a cordialidade e gentileza do Luis Soto e de sua esposa Luci fizeram este o ponto alto da viagem, até mais que o Cerro Castillo. Adorei o lugar e o pessoal. Além da natureza, conhecer a vida dos colonos gaúchos da região. Chave de ouro para encerrar duas semanas em Aysén! Van (minibus) as terças e quintas de Cochrane para o Fundo, saída 11:00. Volta nos mesmos dias. Tem que estar na estrada as 13:00. Checar antes se houve mudança no horário. Livro: Trekking in the Patagonian Andes, Lonely Planet - A grande referência da Patagônia. Opa! Não esqueçam de levar uma bandeirinha do Brasil e colocar no refúgio. Está faltando! Este relato, com fotos está no: https://aventurebox.com/ptofte/cerro-san-lorenzo-aysen-chile/report
  4. Chover no molhado é fácil e pouco agrega. Por isso, nunca relatei nada antes, apesar de participar do fórum em pontualidades desde 2011. Mas desta vez como fiz uma trip realmente pouco conhecida, vale a divulgação. Vou principalmente apontar o caminho a quem queira ir até lá. RESUMO RÁPIDO A QUEM QUER FAZER A VIAGEM Se você vai no Chile, Atacama, TDP, etc, bem... pare uns dias a mais em Santiago. Provavelmente seu aéreo nem vai mudar de preço, mas você vai adicionar uma aventura incrível em sua viagem. Eu fiz trekking nas montanhas dos andes, autossuficiente, sem guia e no meio do inverno. Não é coisa para inexperientes mas também não é destinado apenas a super heróis. Se você já fez trilhas na Mantiqueira, já teve contato com vento e frio fora do pais, como patagônia, Bolivia ou Peru e consegue fazer essas coisas sem guia, sozinho, você está totalmente preparado para os andes invernal. Apenas complemente preventivamente seu conhecimento com esses vídeos: Comprei crampons e não os usei em nenhum momento, para usar seria necessário uma neve muito dura ou gelo. Comprei piolet também e esse teve sua utilidade, mas teria sobrevivido tranquilamente sem. Mesmo que pareça que será apenas um peso morto, não vá lá no meio do inverno sem eles. Piolet e crampom DEVEM te acompanhar. Pessoalmente, eu já fiz uma meia dúzia de trilhas na américa do sul, (TDP, Chalten, Tierra del Fuego, Peru, Pucon, escalei o Villarrica guiado, Sudeste Brasil). Isso me rendeu experiência muito mais que suficiente para ir sem medo. Ainda que alguns achem que eu já sei tudo, tive meus novos aprendizados em campo. As dicas abaixo, são bem comprovadas, aprendidas durante o percurso. Se quiser entender a dica, algumas podem parecer estranhas, você terá que ler o relato. Abra os links abaixo. Essas informações foram as únicas fontes de informações efetivas que tive para planejar a viagem e foram suficientes. http://www.andeshandbook.org/senderismo/ruta/534/Travesia_Integral_de_la_sierra_de_Ramon http://pt.wikiloc.com/wikiloc/view.do?id=2218762 http://www.yerbaloca.cl/ DICAS - Tenha certeza que vai se hospedar em um local que aceita tomar conta das suas coisas enquanto você está na trilha. - Não leve comida do Brasil, apenas se for essencial por logística ou tempo. Supermercado chileno é sensacional, tem muitos produtos que os nossos mercados nem sonham. - Pegue busão para sair do aeroporto (centropuerto ou turbus). Barato e rápido te deixa no metro por muito pouco dinheiro. - Compre um BIP! no metro. BIP! é o cartão de transporte público chileno. - Melhor época é a primavera. No inverno também é muito bom, recomendo. NUNCA vá no verão ou outono, porque apesar de possível, não tem agua nenhuma e o calor deve ser insuportável. - Agua só se derreter neve. Leve um filtro de papel para tirar os detritos e use uma panela de inox ou titânio para melhorar o gosto horrível que o alumínio deixa. - Levar um funil para não desperdiçar agua. - Leve dinheiro para pagar o ônibus da volta baixando pelo Los Azules, não aceita BIP! - GPS para a descida do San Ramon via Los Azules, não é opcional. Sem GPS, você VAI SE PERDER. Não é impossível, mas vai ter sofrimento. Pelo menos foi assim no inverno, com a neve tampando caminho. - O Chile tem isenção de impostos em muitos produtos, como piolet. Pode comprar sem medo equipamentos de montanha, você vai ver que eles tem um preço muito semelhante aos EUA. - O rio do parque Yerba Loca é venenoso, pegue toda água do lado direito quando sobe (oeste), ou derreta neve. Previsão do tempo: http://www.windguru.cz/pt/index.php?sc=552853 Agora vc já sabe tudo que precisa para ir pra lá. Apenas para diversão coletiva, vamos ao relato. AQUECENDO MOTORES Fui a Santiago do Chile em 21 de julho de 2015 e lá fiquei até 1 de agosto. Nesses dias, evitei a cidade de 5 milhões de habitantes que concentra quase um terço da população chilena. Permaneci o máximo que pude nas montanhas ao redor, mas bem longe das estações de esqui. Se quer saber algo de mercado municipal, museu, passeios.... você está no relato errado. Eu não optei ir em meio do inverno, em meio das férias e altíssima temporada, eu fui obrigado. Paguei um aéreo supercaro, não haviam opções boas nem baratas de hospedagem. Já que fui obrigado, abracei o capeta. Se quer ler um relato de alguém que foi e gastou pouco, vai dar dicas de hostel e restaurantes, sinto muito. Sai de SP a noite e dormi no chão do aeroporto do Paraguai. Tudo isso pra economizar uma grana no aéreo, que gastei apenas R$1500, acredite, esse preço super faturado, foi uma verdadeira pechincha. A fusão da LAN e TAM já mostra que o passageiro teve muito a perder. Cheguei em Santiago ao meio dia do dia 22 de julho. Perdi minha carne desidratada na chegada do aeroporto. Explico, eu desidrato comida em casa, só achei que não teria problemas, porque em experiência anterior, entrando no Chile de carro, foi permitido. Questionei, eles alegaram que a carne devia ter uma etiquetada pelo ministério bla bla bla, dizendo que foi cozida antes de ser desidratada. Era o caso, mas sem o carimbo ou etiqueta, era um produto caseiro. Ignorei todos os taxistas, atravessei a calçada fui para direita para pegar o busão. Eu já tinha pesos chilenos no bolso, troco das viagens anteriores. Paguei ~CLP1.000 (aprox. R$ 5). Não demora 15 minutos, o alvoroço ao lado de algo enorme como uma rodoviária deixa claro que cheguei em uma estação do metro (pasaritos). Comprei um BIP!, que é um cartão de metro/onibus e o abasteci. Achava que estava apenas economizando, sendo mão de vaca evitando pegar taxi ou alugando carro. Descobri depois que na verdade o transporte público em Santiago é surpreendente. O google maps me indicou com maestria as baldeações de metro e cheguei facilmente ao apartamento que minha namorada havia alugado e ficado com a mãe e sobrinha, que já haviam partido. A parte radical da viagem dela ia começar agora com minha chegada. Descobri que os locais compram apartamentos e alugam por dia para turistas. Bacana, um ap só pra vc, mas, eles não tomam conta das suas coisas quando vc vai pra montanha.... ganhei uma tarefa adicional para o dia seguinte: mudar para um hostel. Tirei o dia de chegada para comprar comida, gás e equipamento. Fiquei impressionado com a variedade de alimentos que encontrei nos supermercados comuns de Santiago, várias comidinhas prontas, muito, mas muuuito MUUUUUITOOO melhor que o Brasil. Fui na tatoo (tatoo.cl) comprei gas, piolet e crampom. Crampom, apesar de ter sido inútil pra mim, não recomendo ir sem, vc pode pegar dias mais frios e a neve ficar dura, impossibilitando sua locomoção. Já o piolet tirei ele da mochila, cheguei a usar tanto para coletar neve, como para segurança de apoio. Saimos pela manhã do apartamento e levamos a mala para um hostel em providencia (bairro de Santiago). Eu não estava com saco de pesquisar ônibus a partir do novo lugar, então fui no básico, metro e taxi. O bolso pagou pela minha preguiça. Foram CLP20.000 (R$100) de taxi. Se eu tivesse pesquisado, não teria gasto nem metade.....mas........ começou a aventura! TRAVESSIA PROVINCIA – SAN RAMON DIA 1 – 23/jul Distancia 5,3km Desnível +900 Tempo 4:00 horas A troca para pousada me forçou a começar a aventura mais tarde. Tarde demais. Não ia dar tempo de chegar no cume do província no mesmo dia, não queria pegar pesado nem caminhar a noite, assim a aventura ia ter que durar um dia a mais. Mais um dia na montanha. Que sofrimento! A idéia era subir até o tal do Alto del Naranjo, um morrinho anterior que ganhou destaque popular por ter uma enorme arvore onde o pessoal acampa. Lá, pegaria neve, afinal é inverno e passaria uma boa noite, com garantia de vista de cima da cidade. Ótimo plano! Cheguei na entrada do parque, um guardaparque muito atencioso deu várias dicas, me cobra CLP 10.000 (R$ 50) pelo número de dias que disse que ia ficar em duas pessoas. Passou um celular de contato para emergência e também para avisar minha saída. Por último me dá uma má noticia: NÃO tem neve no alto del Naranjo. Eu ia ter que levar desde lá da guarita, o máximo de água possível. Ok, mas eu não tinha nem garrafa suficiente pra isso. Falei minha pretensão e toma outra má noticia: NÃO pode acampar no alto del Naranjo. Estamos tentando preservar o lugar Ele me deu dois problemas grandes, mas uma solução matadora: - Anda mais 20 minutos, acampa em um local chamado valle Suiço, não está no mapa, mas quando chegar lá você vai reconhecer. Lá é mais provável encontrar neve e tem uma linda vista pra cidade. E assim começou as 14:40. É uma subida sem dó, bem inclinada. Carregado, primeiro dia de trekking, acusei o golpe: Sobreaqueci!!! Sim, inverno nos andes. Um calor infernal. Como eu sabia que a coisa melhorava lá em cima, continuei, senão juro que tinha voltado pra traz. Sem garantia de agua ainda? Nem suar podia. Carregava um absurdo de blusas! Subia a passos de tartaruga. Chegando no Alto del Naranjo via uma coisinha de neve aqui e ali. Você pegava ela, e via que ela estava totalmente suja de terra. Local bonito, agradável e fácil acesso. Mas pequeno. Não admira que todo mundo acampe lá. O resultado é impacto elevado, daí a proibição de acampar lá. Continuamos tensos até o tal do valle Suiço. Não tinha nos mapas oficiais do parque, mas o ponto estava marcado em meu GPS. Quando cheguei as 18:40 no local e vi que tinha neve na encosta, foi um alívio. O local, excelente mesmo para acampar e com uma incrível vista. Mas tem seus inconvenientes: lama e bosta de gado. Armei barraca em local mais seco possível e sem bosta. Fui coletar neve. Minha lembrança de agua da patagônia, que é degelo da neve e dos glaciares, com um gosto maravilhoso me dava a certeza que seria uma experiência maravilhosa beber agua feita de neve. Quanta inexperiência! Insetos, folhagem, terra. Tudo escondidinho dentro daquela coisa branquinha e impecável. O alumínio da panela não só derrete a neve, mas também deixa a agua com um gosto estranho (passe papel branco em panela de alumínio. Ele sai cinza, é normal alumínio se desgrudar e ir pra comida). Tirar agua da panela e colocar dentro da garrafa é outra manobra difícil para quem não pensou em levar um funil. Lições aprendidas. - Levar um filtro (talvez de papel) para tirar os detritos da neve derretida. - Aluminio é leve e barato, muito obrigado, mas estou aposentando essa panela. Minha próxima panela de camping será de inox ou titânio. No caso do titânio, aceito doações. - Levar um funil para não desperdiçar agua. Ainda estava claro e não via a cidade, só nuvens. Santiago é de fato uma cidade cercada por altas montanhas, a poluição e as nuvens ficam presas lá. Então começa o anoitecer e o milagre acontece. Da pra ver tudo! Durante o dia, a poluição, nuvens, são iluminadas pelo sol e a cidade some. A noite, tudo fica visivel. Mesmo efeito de usar farol alto em neblina, muita luz, tudo fica branco. Curiosidade, durante a noite, dois corredores de aventura passaram pelo local. Foram até o cume e voltaram. Malucos. DIA 2 – 24/jul Distancia 4,2km Desnível +800 Tempo 4:40 horas Começa a pernada as 11:00. Durante a subida, ao longo do dia, fomos ultrapassados por 4 pessoas que faziam o cume do província em ritmo de bate-e-volta sem mochila. De cargueira, fotografando, demorava muito mais. Um dos caras na descida disse que faltava uma hora pro cume. Devo ter levado 3. A neve vai tomando conta a medida que sobe. Cavalos selvagens... o que eles faziam lá eu não sei. Mas pastavam em meio a neve. Águias e condores são comuns. Pegadas de bicho na neve em todo lugar. Que bicho? Sei lá qual bicho. Até que cheguei em um famoso ponto, que era minha preocupação desde os meus planos iniciais sentado no computador de casa: O paso de rocas. A montanha se estreita, abismos em ambos os lados e você tem que “escalar” uma passagem entre rochas. Que medo! Posso falar? Fácil. Sem dificuldade, subi de um lado e sair do outro é realmente tranquilo. Claro, só não tropece. Caiu? Sei lá se o piolet segura. A visão da medo, mas a pratica é bem tranquila. Acredito que a canaleta do Marins deve ser mais perigosa que isso. Depois disso é uma subida nevada até o falso cume. Falso? Pra mim aquilo era o cume! O cume verdadeiro é bem sem graça! O falso tem poste com pinduricos, vista ampla da cidade, muito legal.... uma verdadeira sensação de conquista! O cume verdadeiro, uns 100 metros mais a frente é apenas numericamente mais alto. Tem placas de homenagem, mas é só. O falso cume é demais! Foi quando cheguei no cume verdadeiro, que vi o dommo. Dommo? Sim! Teoricamente, você pode fazer esse trekking sem levar barraca! Dommo para quem não sabe é uma barraca de formato meia bola, feita de aço e madeira. Só não me pergunte o que fazer se você não levar barraca e a coisa toda estiver lotada... mas cabem 8 pessoas lá dentro. Se houver amor, 10 ou 12. Eram 15:40 quando abri a porta e.... como os chilenos são porcos! Uma sacola plástica enorme com casca de banana, frutas podres e outros lixos aberta na porta! Uma maça, que estava até mole, bem no meio do dommo. Que porquisse! Limpei tudo, havia uma vassoura lá dentro. Era mais de 2 quilos de lixo orgânico ou não. Me dei ao direito de não ser bom samaritano e carregar lixo alheio montanha abaixo. Fechei a sacola e deixei do lado de fora, embaixo do dommo. Mas, acabaram minhas críticas. Dommo inteiro, praticamente sem pichações! Nada quebrado, bem cuidado. Se fosse no Brasil, bem, não existiria mais o dommo. Apesar de estar em Santiago, com 5 milhões de pessoas, nenhum vândalo sobe a montanha. Só um ou outro porco eventual. No quintal do dommo, haviam vários iglus! Sim, iglus! Estavam todos derrubados, derretidos, mas estavam lá. Acredito que um grande grupo subiu lá, treinou construção na neve produzindo iglus e.... deixaram o lixo lá dentro do dommo. Haviam 2 bujões de gás no dommo, um deles bem cheio. Quase que por brincadeira, peguei o bujão que estava mais vazio e o usei para derreter neve e cozinhar. Havia um pouco de instinto no ato. Dali a 2 dias meu gás ia praticamente acabar e sem ele, nem agua para beber eu teria. Esse furto de gás me salvou. Eu apenas não sabia, ainda. Subimos no cume e vimos o pôr do sol. Nos preparávamos para dormir. Estávamos felizes, o dommo era nosso não dividiríamos com ninguém. Saiamos para fazer o xixi antes de dormir e... de lanterna na cabeça chega um casal chileno. Conversamos pouco, era realmente tarde, já íamos dormir. Dormir, aliás, demorou, porque eles chegaram tarde, tinham que derreter neve, cozinhar, se trocar, etc... Perguntaram por onde eu ia baixar, respondi a verdade: - Não sei. Indignados, “como assim, não sabe”? Não sei.... não escolhi ainda. Mas acho que vou descer pelo Los Azules, mas ir pelo minillas também me agradaria, eu ainda não decidi. Conversando, eles disseram que o caminho mais longo era o Los Azules, mas era uma baixada tranquila. Qualquer outros caminho de baixada era bem mais abrupto, alguns lugares bem expostos, citaram que havia um lugar que as pessoas passavam sentadas porque ninguém tem coragem de ficar de pé em um pico ventando com abismo em todos os lados... Nessa hora, acabaram minhas opções. A minha namorada ouvindo isso disse imediatamente: - vamos descer pelo Los Azules. Sinceramente, foi a melhor escolha. Você fica muito andando na crista da montanha, vendo Santiago o tempo todo. Descer pelos Los Azules era uma opção de descer vendo algo diferente. Vi diversos coelhos correndo na neve, o lugar é bem mais selvagem, você se isola e esquece que tem uma metrópole ao seu lado. É mesmo a melhor escolha. DIA 3 – 25/jul Distancia 5,1km Desnível +240 Tempo 5:40 horas Acordamos, nos arrumamos e saímos bem mais cedo que o casal, saímos as 9:30. Já tínhamos conquistado o Província, agora tinha que atravessar a crista até o San Ramon. Eu sabia que hoje era o filé da viagem. Sabia também que a jornada podia ser longa, umas 8 a 10 horas. Eu tinha então uma preocupação. A minha namorada tinha quebrado em Bariloche devido uma caminhada longa demais. Assim eu planejava sabotar o dia longo e quebra-lo em 2 dias curtos. Mas a essa decisão não seria minha. Poucos passos após a saída do refúgio, a jornada é ladeira abaixo. 200 metros de desnível abaixo, começa a caminhada em crista de montanha. Tão desagradável caminhar com vista 360 graus o tempo todo. Segue então uma subida gradativa e mal marcada até o Cerro Tambor, cujo cume tem uma estação meteorológica. Ao lado da estação uma área de acampar de babar! Pena que a caminhada até lá é muito curta. Seguimos. Então em um ponto tinha uma crista com uma passagem por pedras. Tinha que ficar de pé passando pela pedra com abismos em ambos os lados (será que era aquele o ponto que os chilenos falaram?). O receio tomou conta da minha namorada. Ela ficou estimulada vendo algumas pegadas na neve, bem na lateral da montanha. -Vamos pelo lado, é melhor.... OK, vamos pela lateral. Eu fui na frente. A coisa era estranha. A neve fofa demais, afundava até a cintura. Zero risco de avalanche, afundei o piolet e vi que não tinha mais do que um metro de neve. Minha lição de casa me ensinou que avalanches só ocorrem com mais de 5 metros de neve. Mas as pegadas eram espaçadas demais e com pés juntos. Montanhista canguru.... estranho. O tamanho não batia. Não eram pegadas humanas, mas de algum animal grande. Cavalo? Impossível. Após contornar a montanha na lateral, seguindo essas pegadas, começou uma crista, com neve bem mais firme. Agora descobri. As pegadas eram de puma. Pouco mais a frente, acaba a crista e temos uma forte descida. Não parecia que o caminho era por ali, mas, era uma crista, por onde mais seria? Era continuar ou continuar. E o GPS confirmava isso. Essa descida era algo realmente assustador. Eu não sabia se devia descer pela direita, lado mais rochoso pedrinhas pequenas e bem escorregadio ou pela esquerda onde era totalmente nevado, ambos lados estavam apimentados com um precipício. Não sabia se aquilo na neve eram pegadas ou neve se desprendendo indo para baixo do barranco. Optei pela neve. Piolet na mão. Foi bom viver, estava preparado para o meu fim. Mas depois de caminhar 10 metros, afundando até a cintura, estava claro que aquele era o caminho, e ele era muito fácil e seguro e como eu estava exagerando no cagaç, opa, no receio, que sentia a poucos segundos atrás. No meu GPS existia um ponto chamado “pirca donde acampamos”. Esse ponto, baixado do wikiloc era a aventura de dois chilenos que fizeram a travessia em dois dias. Secretamente, eu planejava dormir lá. Chegamos lá as 15:00, descansamos comemos, olhamos pra frente e para o GPS. Seria mais uma subida com uma travessia em neveiro. Calculamos mais 2 a 3 horas de caminhada. Era cedo demais para parar, mas poderia forçar e quebrar. Deixei ela decidir e decidiu por parar. Havia um lindo muro de pedras que poderia servir de abrigo de vento a uma barraca, mas só se ele não estivesse totalmente coberto por neve. Procurei outro ponto e tive que limpar o chão sujo com pedrinhas de todos os tamanhos e descobrir que as estacas da barraca não entravam no solo, muito pedregoso. Ventava forte e eu tinha que ancorar a barraca. Usamos pedras ancorando a frágil barraca chinesa. Sobre a barraca, comentei em outro fórum. post1101219.html#p1101219 O casal chileno apareceu depois que nos instalamos. Seguiram em frente, nos despedimos. Dormimos bem, apesar de ter ventado toda a noite. Hoje tive uma certeza. Minha bota marca Hightech, estava entrando agua. Pé molhado a zero grau. Não é a primeira vez que isso acontece, acho que descobri um padrão. Fica uma dica: Nunca guarde uma bota goretex no armário. Comprou, USE. Eu “poupava” bota, afinal, para trilhas no fim de semana não preciso de bota goretex, eu uso botas assim apenas em grandes viagens..... mas já vi que a estratégia é falha, bota guardada é bota molhada. DIA 4 – 26/jul Distancia 4,4km Desnível +278 Tempo 3:20 horas Mochila quase pronta, passa por nós meia dúzia de chilenos fazendo a travessia no fim de semana. Foram na frente, tinham pressa. Eu não. Estou de férias! A coisa começou preguiçosamente as 11:00 em um neveiro. Um sobe e desce leve, mas 100% em neve fofa. Quando a neve acaba, começa uma subida de respeito para o ataque final. Ventava muito, vento gelado, coloquei o cortavento. Apenas quem realmente me conhece sabe o que isso significa: Estava frio pra burro. Peguei o GPS e botei “cume San Ramon”. Isso foi um erro estupido, digno de troféu. Só descobriria o erro quando fosse tarde demais. Após uma subida brusca, entre terra deslizante neve, chegamos em um platô.Trilha? Que trilha? O caminho estava correto mas nada indicava. Então começa uma subida leve mas em terreno irregular e mal marcado. Assim se conduz ao cume do San Ramon. Conseguimos! Santiago estava aos nossos pés! Abrigados em um murinho, lanchamos e procuramos o caminho. Botei no GPS “Dommo San Ramon”... e olhei...bem, eu queria me matar. Burro! Estupido! Eu tinha carregado a mochila até o cume. Estava pesado. O imbecil passou pelo dommo e foi até o cume com a cargueira! Podia ter feito cume leve, sem preocupação, mas não... teve que ser estupido. Volta tudo. Vamos dormir no Dommo.. Quando eu cheguei no Dommo, o casal de chilenos estava saindo. Saiam tarde, era 14:30! Iam descer pelos Los Azules, disseram que chegariam na estrada depois das 23. Que encrenca... Entramos no Dommo e não parava de ventar. Estava frio de verdade. Havia, sei lá como e porque, um pedaço de gelo no interior do dommo, do tamanho maior que um tijolo baiano. No dia seguinte fomos embora e ele não derreteu uma gota, mostrando que no interior do dommo a máxima temperatura estava bem menos que zero grau. Eu derreti neve, cozinhava... inacreditável, o bujão de gás congelou e grudou no chão! Eu puxei com força e ele não saia de lá! Apenas no dia seguinte, após o café da manhã consegui tira-lo do chão. Estava vazio, ainda bem que roubei gás no Dommo do Provincia. No dia seguinte, ligaria o bujão no hostel, para ver apenas um minuto de chama. DIA 5 – 27/jul Distancia 21km Desnível -2.300 Tempo 10:20 horas O agradável seria quebrar o dia de hoje em dois dias. Era uma distância longa com descida pesada, mas sem gás, o que significa sem agua, quebrar em dois dias não era exatamente uma opção. Mesmo antes da descoberta do “estamos sem gás” falávamos em descer de uma vez. É uma travessia de 3 dias, e hoje era o 5º dia..... muita moleza né? Pelo menos hoje, vamos pegar pesado. Acordamos muito cedo e saímos junto do amanhecer as 9:00. Achei que seria uma navegação fácil, basta ir para oeste e depois que descer, ir para o sul até chegar na estrada, tudo bem marcado, bem tranquilo. Que engano! Até o refúgio Los Azules eu ia dar graças a deus por ter um GPS em minhas mãos. Eu não teria baixado daquilo de jeito nenhum sozinho, ou pelo menos ia me perder dezenas de vezes e levaria horas a mais. No alto da montanha, saindo do refúgio via algumas marcas e trilhas sentido oeste. Fui seguindo, sempre montanha abaixo, sem subidinha nenhuma, aguentando um fraco vento patagônico. Sim, tinha que parar, o vento me desequilibrava, pedras voavam. Só não fui derrubado no chão, mas faltou pouco. Conforme baixava, engraçado, as marcas e trilhas iam sumindo! Pior. Muitas vezes via caminhos bem marcados que iam para lugar errado. A geografia não ajudava, várias montanhas, as dezenas, sem a menor chance de olhar e sequer imaginar qual o caminho seria o correto. Acho que somando tudo, já fiz mais de mil quilômetros de trilhas diferentes mas ali, eu não fazia ideia, não por instinto, qual seria o caminho correto. Vendo o traçado no mapa, o caminho é oeste, mas tem um contorno pelo norte depois de ir em direção sul de olho, no instinto, não fazia ideia. Santo GPS! A pernada que ele deve ter me poupado pagou seu custo nesse dia. Cheguei no refúgio Los Azules e apenas a partir de lá a navegação por instinto, fácil e segura seria possível. Eu disse refúgio Los Azules mas na verdade, não sei bem o que é aquilo. Primeiro você vê as ruinas de uma casa de pedra, sem teto e com paredes a “meio mastro”. Depois, algo que parece ser uma fazenda, mas sem gados, sem plantação, toda coberta por meio metro de neve. Não sei se havia alguém ou se poderia acampar. Caminhada longa, apenas continuei descendo. Caminho óbvio, lama incrível. Grudava na bota, a ponto da bota ficar pesada. Eu digo pesada mesmo, levantava o pé e era tanta lama grudada que a bota havia dobrado de tamanho! Isso vai, até você chegar próximo do rio El Manzano. Depois fica ainda mais fácil, sempre beirando o rio, que cruzávamos várias vezes. Cruzamentos fáceis, do tipo que você passa o rio e sai de bota seca. Começa então uma estradinha de terra. Estava quase no El Manzano (acho que é o nome de um bairro). Cheguei junto com o pôr do sol. Ficaria escuro em poucos minutos. Para minha surpresa, a estrada de terra acabava em um portão intransponível fechado por cadeado! Leia de novo a palavra intransponível. Não era possível, pular cerca, passar por baixo, nada. GPS não dava a menor pista, nada daquilo estava no mapa. Mas o GPS ajudava a não andar em círculos. Tinha que encontrar um local para pular a cerca. Fui caminhando sentido leste, ora beirando cercas cheias de cachorros bravos em propriedades particulares, ora contornando geografia natural, como arvores. Até que achei um buraco para fuga! Pulamos a cerca, voltamos por uma rua inexistente no GPS. Escureceu, encontramos um ponto de ônibus. Acabou! Era 19:20, arrumamos a mochila, guardamos bastão, piolet, etc. Um cara local que estava no ponto explicou tudo, era um ônibus azul e branco (bem cordial, ele mesmo deu sinal pra ele parar). Seu ponto final era no metro, erro zero, baldeação gratuita. Esse busão não aceita cartão de transporte BIP! apenas grana, CLP 1.000 (R$ 5). Fim da aventura, comemos em um restaurante giratório, isto é, o chão roda dando uma vista 360 graus da cidade. YERBA LOCA EPILOGO “O que? Você vai pro parque da erva loca?” kkkkkkk Como ouvi essa piadinha...... Vou resumir, a água do rio ao lado oeste do vale, seu lado esquerdo, quando se está subindo, é cheio de sulfatos. Como eu colei em todas as provas de química, não sei bem o que isso significa, mas o conselho oficial é não beba, nem mesmo toque nessa agua. Acho que a agua é acida como agua de bateria. Essa agua deixa o gramado diferente e os animais que o comem ficam “agitados” e os vaqueiros começaram a falar que lá tem a erva louca.... Para beber, derreta neve ou pegue água do lado leste (lado direito de quem esta subindo a trilha). Há, uma sub-aventura: Eu esqueci de comprar gás! Já era noite quando me toquei, se perdesse tempo comprando gás, mataria meu dia, não sabia nem onde ir nos arredores para comprar. Minha solução foi simples, comprei meio litro de álcool 95% disponível facilmente no supermercado. Bebi uma cerveja, e fiz um fogareiro a álcool com a lata vazia. O resultado já era conhecido, já uso fogão a álcool no Brasil, muito melhor que o fogão a gás. Só não tinha certeza como se comportaria em ambientes abaixo de zero grau com muita neve para derreter. Derreti neve com essa latinha de cerveja, cozinhei e acredite, sobrou muito álcool. Como não posso levar pra casa, deixei queimando à toa no vento mais de 150ml enquanto desarmava a barraca no último dia. Realmente, fogão a álcool mostrou sua superioridade mesmo acima dos 3 mil metros com temperatura máxima abaixo de zero grau. Talvez eu aposente definitivamente meu fogão a gás... O modelo usado, é muito simples, fácil de fazer, confira o vídeo abaixo. Em casa já fiz e tenho outros modelos bem melhores. DIA 1 – 29/jul Distancia 11km Desnível +850 Tempo 5:45 horas Bom, dessa vez, deixei a preguiça de lado, e sai de pesquisa feita. Peguei ônibus certinho e fiquei realmente impressionado com Santiago. TODOS os pontos de ônibus tem uma placa, dizendo quais ônibus passam nesse ponto, e que ponto é esse (isso é, todos os pontos recebem um número/código). Você não precisa pedir ao motorista para parar no lugar X. Você olha o ponto de ônibus e já sabe exatamente onde você está e quantos pontos faltam ao seu destino! Desci na Plaza San Enrique e já dei de cara com os taxis. Eles tem uma tabela de preço especial para vários lugares, entre eles, Yerba Loca, CLP 20.0000 (R$ 100). É a mesma estradinha que vai pro início da travessia anterior, que é a mesma estradinha que vai para as estações de esqui, caminho para Farellones. Chegamos, pagamos a nossa entrada do parque, valores que não lembro, e o taxi nos levou até a tal de vila Paulina, onde achei que haveria, mas não vi um único humano. O mapa que peguei na portaria e que tem disponível na internet, tinha as distancias e tempos de trilha. Tudo completamente furado! Não foi destinado a quem carrega mochila cargueira. Não pense que estou velho, fora de forma e gordo (o que é tudo verdade). Saímos as 13:00 e um grupo de jovens chilenos saíram um pouco na frente. Acabei alcançando, ultrapassando e acampando bem mais a frente deles. Como levei muito mais tempo que sugeria o mapa, conclui assim que não sou eu, o mapa com o tempo que é muito mentiroso. Em teoria, com 3:30horas de caminhada, chegaria no setor La Lata. Uma área de acampamento que deveria ser interessante, com pircas de pedra, fontes de agua, mas não. Nada disso. Na prática foi quase 6 horas de caminhada, todas as pircas de pedra indicadas para acampar estavam cobertas por gelo e neve e nenhuma fonte de agua liquida disponível além do contaminado estero Yerba Loca. Consegui encontrar um gramadinho (único!) ao lado de uma estação meteorológica. Começou o suspense. Seria o fogão a álcool suficiente para derreter neve e fazer janta em um ambiente abaixo de zero? Sei que o maior ponto fraco do fogão a álcool é o vento, então fui pra dentro da barraca. Lá derreti 5 litros de água, suficiente para nós passarmos a noite e caminhar no dia seguinte. Fiz a janta também. Gostaria de ser preciso, mas de olho, gastei 100, no máximo 150 ml de álcool nesse dia. Fiz umas contas de cabeça, aproximadamente 120ml seria aproximadamente 100 gramas de peso. Eu tinha combustível para viver assim mais 4 a 5 dias. Conclusão rápida, para uso, 500ml de álcool é equivalente a um bujão de butano. No entanto, o conjunto fogão a álcool é mais leve (aproximadamente 500gramas tudo) enquanto que o conjunto fogão butano (aproximadamente 700 gramas tudo). Ao final da viagem, com todo combustível gasto, o álcool é uma latinha e uma PET vazia, 40 gramas todo, enquanto o fogão a gas com bujão vazio seria umas 250 gramas. Fogão a álcool mostrou-se, mesmo em ambiente extremo, tão bom quanto o butano, só que mais leve e mais barato. Acho que mudei definitivamente de equipamento de cozinha. Quando anoiteceu, foi fantástico! Era lua cheia. Em poucas palavras, não anoiteceu! O gelo e a neve eram rebatedores naturais de luz e eu estava cercado por encostas. Mesmo dentro da barraca era desnecessário o uso de lanterna. Com a bota molhada, isto é, congelada, e acredito com uma temperatura de -10C, cometi um ato heroico de sair para fazer umas fotos. DIA 2 – 30/jul Distancia 6km & 9km Desnível 0 & -850 Tempo 3:20 & 3:20 horas Hoje, foi o dia da derrota. A idéia era ir até o mirante ver de perto o tal do Glaciar Paloma. Subir leve, sem mochila e volta. Fácil! Com pouco tempo de caminhada, já estávamos no setor das cascatas de gelo. Não havia ninguém lá. Não via muitos sinais de pegadas na neve, indicando que pouquíssimas pessoas tinham subido até ali, todos se continham no La Lata. Mesmo o grupo de adolescentes que nos acompanharam, não haviam subido. Las cascatas, é uma cachoeira em um penhasco completamente congelada, famosa por criar condições ideais para escalada em gelo. Para mim, seria apenas foto, não sou escalador. Seguimos em frente, sempre subindo. Havia menos sinal ainda, aliás, nenhum sinal, de passos humanos. A geografia era uma encosta a esquerda, outra a direita e o rio no meio. O caminho, invisível, inexistente. Nenhum sinal. Andamos pela encosta. Muito perigoso, vez por outra, você pisa e afunda pisando em pedra, com risco de torcer o pé. Ou pisa em pedra que rola pela neve. O caminho correto estava oculto. Sem pircas, com neve que alternava repentinamente entre muito fofa e gelo. O caminho nos conduziu para baixo onde era plano. Era notável que o rio estava lá, em algum lugar, embaixo da neve. É bem possível cair afundado na neve, levar uma rasteira da agua e ser arrastado para baixo da neve onde você não conseguiria se levantar e morreria afogado. Mas esse perigo não estava ainda tão evidente. Minha namorada foi a frente em um local que parecia inocente. Dei um único passo em sua direção descendo de uma pedra e afundei na neve. Me joguei para tráz e vi a agua correndo. Ela tinha passado por uma ponte de neve. Eu peso mais, a ponte não me aguentou. Avisei ela, contornei por outro caminho, procurando pisar em pedras. Não achávamos um caminho de fato seguro para continuar. Decidimos voltar. Sei que se teimasse, daria tudo certo, iria pela encosta. Talvez tivesse que voltar cruzar o invisível rio de novo, e provavelmente daria tudo certo, mas, pra que arriscar? Voltamos. O gosto ainda é amargo. Fizemos uma sopa e cochilamos por uma hora. Eram 15:00 horas. Pra que passar outra noite aqui? Descer, ficar em lugar mais quente, com banheiro e torneira.... Convenci minha namorada que relutava por ter que andar a noite. No fim, foi uma ótima jogada. Tinha até mesa e banco na área de acampamento da villa Paulina. Curiosidade, minha molhada meia ficou em cima da bota, para secar, enquanto cochilamos e almoçamos. Quando a peguei, ela estava completamente dura, congelada. A ergui no ar. Nem parecia um objeto de tecido. DIA 3 – 31/jul Distancia 4,5km Desnível -200 Tempo 1:20 horas Desconfiei pelo barulho que ouvi durante a noite e confirmei de pela manhã. Acordamos com tudo debaixo de neve! A torneira da pia estava congelada, sem agua. Tive que pegar agua dentro da pia do banheiro. Acabou a aventura. Desarmamos tudo, mochila nas costas e caminhada leve até a portaria. Na portaria, conseguir transporte para voltar a cidade, deveria ser um suplício. Creditos no celular pré pago tinham acabado.... mas foi fácil resolver. Em menos de 10 minutos meu polegar arranjou uma carona. Sujeito simpático, ele trabalhava com sua VAN subindo turistas ao vale nevado. Descia sozinho, cedeu a carona. Deixou agente no centro, muito próximo do hostel. Gentileza gera gentileza, fui legal de volta. Dei espontaneamente CLP 20.000 (R$ 100), que foi o valor que pagaria em um taxi apenas para chegar de volta na Plaza.
  5. Na língua Mapuche, Huerquehue significa lugar de mensageiros. É um dos parques nacionais mais antigos do Chile e da América do Sul, sua história data de 1912, com a criação do Parque Nacional Vicuña Mackena, que englobava a área atual do parque e posteriormente, em 1967 foi criado oficialmente o Parque Nacional Huerquehue. O Parque Nacional Huerquehue foi uma grata surpresa! Inicialmente a ideia era fazer a Villarrica Traverse, mas devido à erupção do vulcão Villarrica, parte dessa travessia foi fechada e como não queria fazer só a metade dessa trilha, tive que partir para o plano B, e deixar a Villarrica Traverse para outra oportunidade. No hostel em Pucón, conheci o Bruno, brasileiro que estava no mesmo dormitório que eu. Ao mostrar meu trajeto em Huerquehue, ele disse que iria fazer uma parte das trilhas também e combinamos de irmos juntos no outro dia. O acesso ao parque é bem simples. A partir de Pucón, há ônibus diários pela Buses Caburgua, que saem da garagem dessa empresa, em frente à garagem da JAC Buses. Fomos no ônibus de 08:30 e levamos uma hora para percorrer os cerca de 35 quilômetros até o Parque Nacional Huerquehue. Assim que chegamos ao parque fomos nos identificar, indicar as trilhas que faríamos e pagar a taxa. Eu faria o Cerro San Sebastian mais a trilha das Termas Rio Blanco, pelo acampamento Renahue. O Bruno faria o Cerro San Sebastian. Informaram-nos que somente o Camping Olga estava aberto às margens do Lago Tinquilco. A guarda que nos atendeu ainda nos disse que com o clima daquele jeito não era bom irmos ao San Sebastian, pois estava muito nublado e não teríamos vista nenhuma. O Bruno disse a ela que a previsão indicava que o tempo abriria, e que mesmo com nuvens, subiríamos. Os guardas não nos deixaram subir o Cerro San Sebastian com as cargueiras, alegando que era perigoso e tivemos que deixá-las na guarderia. Eles nem imaginavam que a insistência em subirmos com as cargueiras era porque nossa intenção era subir com toda a tralha, pois se encontrássemos um lugar legal no topo, pretendíamos acampar lá. Mas como não conseguimos dissuadir os guardas, deixamos as cargueiras e subimos apenas com as mochilas de ataque com água e um lanche. Toda a trilha até o topo do San Sebastian é uma subida só, não há nenhum trecho plano, mas é relativamente tranquila, a maior parte por bosques de coigues, lengas e araucárias. O trecho final é por uma crista exposta, que às vezes fica estreita e com algumas pedras, exigindo um pouquinho de atenção, mas nada demais. A vista lá do alto é fantástica. Visualiza-se vários lagos, o Caburgua, o Tinquilco, o Chico, o Verde, o Toro e a linda Laguna San Manuel, com seu azul intenso. Além dos inúmeros vulcões. Ao norte os vulcões Sollipulli, Llaima, Sierra Nevada, Tolhuaca e Lonquimay, que eu tinha acabado de circundar. Ao sul o Lanin, Quinquilil, Quetrupillan, Mocho-Choshuenco e Villarrica. Depois de um bom tempo no topo, descemos tranquilamente, fazendo várias paradas para saborear as amoras silvestres. Pegamos nossas mochilas na guarderia e fomos até o Camping Olga, dois quilômetros à frente, no final do Lago Tinquilco. No camping havia um lugar para ascender uma fogueira e depois de jantar resolvemos fazer um foguinho pra aplacar um pouco do frio que começava a aumentar. Uma galera que estava acampada foi curtir o fogo, além de nós dois, duas alemãs e um grupo de chilenos que fizeram um churrasco ao lado da fogueira e ofereceram comida e cerveja pra todos nós. Ficamos até tarde comendo, bebendo e jogando conversa fora. Essa foi a noite mais fria em Huerquehue. Nas primeiras horas da manhã já estávamos com as mochilas nas costas e iniciando a trilha em direção aos lagos que havíamos visto do alto do Cerro San Sebastian. A tilha segue num bonito bosque, por uma subida longa, mas leve. Sempre em zig e zag e antes de chegar aos lagos, passa por um posto de controle dos guarda parques, e depois por duas cachoeiras que estavam quase secas nessa época do ano. Dali continua subindo até chegar ao primeiro lago, o Lago Chico, margeia esse lago e mais à frente chega à bifurcação que à esquerda vai para o lago Verde e á direita para o lago Toro. Fomos até o Toro e encontramos um francês, o Arthur, descansando às margens desse bonito lago. Aproveitei que o sol estava forte e dei um mergulho nas águas geladas do lago. Bruno e Arthur me acompanharam e também caíram na água. Depois do impacto inicial da água gelada, o banho ficou uma delícia. Devo ter ficado quase uma hora ali e depois de um lanche, voltei à trilha. Ali despedi-me de meu companheiro de trilha Bruno, que voltaria pra Pucón enquanto eu seguiria pro Renahue. A trilha segue margeando o Lago Toro e proporciona bonitas vistas tanto do lago, quanto das montanhas atrás dele. Alguns quilômetros à frente há a placa que sinaliza o caminho para a Laguna Huerquehue, bem menor e menos bonita que os outros lagos. Aqui também é o último trecho quem faz o Circuito Los Lagos, retornando pela Laguna Huerquehue, Laguna Los Patos e Lago Verde. A partir desse trecho a trilha é bem menos batida, o que mostra que a grande maioria faz apenas o circuito dos lagos, mas a trilha continua bem sinalizada. Uns vinte minutos à frente, logo após a Laguna Avutardas, alcancei o mirador Renahue, que dá uma bonita vista do vale do Estero Renahue até o Lago Caburgua à oeste e do cerro Araucano à leste e diversos morros ao norte. Identifiquei o domo que fica no Renahue e desse ponto em diante é só descida até o local de camping. Como cheguei muito cedo, armei minha tenda e tirei o resto da tarde pra curtir o lugar e preparar minha comida. O local de acampamento é bem bonito, mas havia bastante lixo em alguns cantos e o “banheiro” estava fechado por algum motivo. Vi que minha bota estava começando a abrir o bico e fiz uns remendos com silver tape pra bichinha aguentar o restante da pernada. Logo depois que armei a tenda, mais um trekker chegou ao acampamento, um alemão chamado Stephan, um cara de conversa tranquila e bem solícito, disse-me que era a 17ª vez que passava as férias no Chile e a 4ª vez que visitava Huerquehue. Conversamos bastante (com meu péssimo portunhol) sobre trilhas e ele me deu bastante dicas e informações sobre os trekkings que havia feito no Chile. Ainda recebemos a visita de cavalos e vacas. Dormi cedo e não acordei nenhuma vez. O vale é bem abrigado e nem ventou, nem fez tanto frio durante a noite. Após o café, decidi deixar a tenda armada e ir até as termas sem mochila. Conversei mais um pouco com Stephan e saí antes dele arrumar as coisas em direção ás termas. Existem dois caminhos até as termas a partir do Renahue, fui pela direita, passando próximo à Laguna Pehuen e voltei pelo outro lado. O caminho que passa pela Laguna Pehuen é um pouquinho maior e bem mais íngreme. As termas são legais, mas longe de toda a beleza que algumas pessoas me falaram lá em Pucón. O Stephan chegou bem depois de mim e ainda conversamos um pouco mais. Ele acamparia ali, eu voltaria pro acampamento da noite anterior, e depois de curtir o lugar por umas 3 horas, voltei pro Renahue. Durante o retorno, tive que refazer o remendo na bota. Outra tarde com direito a visita de cavalos e vacas e mais uma noite bastante tranquila, dessa vez só eu estava acampado ali. No dia seguinte, acordei e após arrumar minhas coisas segui em direção ao Lago Caburgua. Inicialmente a sinalização continua até uma casa onde vende alguns suprimentos, mas estava fechada. Após essa casa, a trilha não é mais sinalizada e pode ser confundida por inúmeras trilhas de animais que às vezes cruzam, outras vezes seguem em paralelo à trilha certa. Para não cometerem erros como cometi, tem uma dica importante. Logo após essa casa, há uma porteira e a trilha cruza o Estero Renahue para a margem esquerda verdadeira. A partir dessa travessia a trilha segue sempre pela margem esquerda verdadeira do Renahue, qualquer outra trilha que cruze o estero está errada. Passei por alguns pomares antigos, onde apanhei maçãs e ameixas pra comer no caminho, além de parar várias vezes pra comer amoras. Nessa parte da trilha é onde há mais amoras. Após uma longa cerca de madeira, há uma bifurcação onde errei o caminho. A trilha à direita é muito mais marcada, e tem inclusive uma pequena ponte pra cruzarmos o riacho, mas leva somente até uma casa, uns 2 ou 3 quilômetros à frente. À esquerda, ela sobe em direção sul e depois faz uma curva de 90º entrando num bosque e indo até o Lago Caburgua. Nas margens do Lago há uma pequenina estação energética e a partir daí são 13 quilômetros margeando o lago por uma estradinha de terra até a cidade de Caburgua. Só encontrei dois locais que davam acesso ao lago e suas águas limpíssimas, de um azul intenso. O restante é propriedade privada, algumas só o terreno, outras com bonitas casas de veraneio. Durante o trajeto tive que remendar a bota mais uma vez, e não sei se por estar pisando um pouco diferente do habitual, acabei ganhando uma enorme bolha de sangue na lateral do calcanhar do pé esquerdo. Assim que alcancei o asfalto, um carro se aproximava, levantei o dedo e o rapaz parou e me deu uma carona até Pucón. Era um topógrafo que disse estar medindo lotes nas margens do lago. Cheguei em Pucón cansado, fui até o Hostel onde tinha deixado boa parte das minhas coisas, tomei um banho e fui tomar uma cerveja gelada pra relaxar as pernas dessa magnífica caminhada.
  6. Pessoal: Logo antes do terremoto do Chile fiz a travessia do Villarica, também conhecido entre os Mapuches como Rucapillán ou casa dos espíritos. É um trekking maravilhoso de 5 ou 6 dias, 81 km, que atravessa todo o P.N. Villarica. Ele não é tão famoso como TDP ou El Chaltén por dois motivos: 1.não tem refúgios, temos que levar tudo; 2.boa parte dele é acima da linha das árvores, em terreno exposto a intempéries. Por isso o Lonely Planet no roteiro desta trilha tem uma advertência, o que não ocorre quando ele descreve as outras duas trilhas. Mas também diz que ele é incrivelmente cênico. Eu diria que é tão bonito quanto TDP ou El Chaltén, mas de uma beleza diferente. Enquanto TDP tem a grandiosidade e El Chaltén tem a arquitetura linda das montanhas, esta travessia tem os vulcões. Avistamos 6-7 ou mais vulcões na travessia, um deles ativo e passamos ao lado de crateras extintas. Adicionalmente entramos em florestas de araucárias e de coigües que parecem de conto de fadas, atravessamos paisagens lunares, campos de lava (escoriais), lagunas alpinas e cruzamos manchões de neve nos passos altos (mesmo no final de fevereiro!). Dia 18/02/2010 - Santiago Cheguei no aeroporto de Santiago as 21:30 horas. Rapidamente peguei o transfer da Tur Bus para o Terminal Alameda onde comprei passagem para Pucón as 23:30. O salón cama é muito confortável. São notáveis a eficiência e a falta de burocracia do Chile. Dia 19/02/2010 - Pucón Com o dia raiando entramos em Temuco. Mais uma hora chegamos em Villarica e mais meia hora em Púcon. Não tinha lugar certo para ficar em Pucón. Mas logo em frente ao terminal da Tur Bus um hostal com a bandeira do Brasil na janela. Opa, um bom sinal! Se brasileiros deixaram a bandeira foi porque gostaram. Na verdade a simpática dona é brasileira, de Campinas/SP. Vive numa ponte aérea Campinas – Pucón. A pousada Pucón Sur é boa e recomendo (22000 pesos alta estação). Saí para comprar os mantimentos, gás e para conseguir o transporte até a estação de ski do Villarica, junto a uma das empresas que fazem a subida do vulcão. Consegui junto a Tranco, por 5000 pesos (~US$10 = R$20). A Politur não podia dar certeza se haveria lugar antes das 17 horas pois a prioridade de assentos era para quem queria escalar. Não poderia esperar até esta hora para ter uma definição, daí preferi a Tranco. Dia 20/02/2010 Pucón – Estero Ñilfe Acordei 05:30 pois a van estava prometida para 06:00. Chegou as 06:30. Foi depois até a agência e pegou os escaladores. A van saiu lotada com o guia de pé (quem já pegou van no Rio sabe como é...). A Politur ao menos foi mais honesta dizendo que não poderia vender o lugar se ela estivesse lotada. Um casal de brasileiros sentou logo atrás, Pedro e a namorada. Iam subir o Villarica. Perguntaram o que ia fazer, respondi. Depois os comentários de praxe: se não era perigoso ir sozinho, etc... Tive de saltar da van na Guarderia da CONAF do PN Villarica para pagar meu ingresso (7000 pesos=28 R$) para um nº de dias ilimitado no parque. Lá recebemos um mapa com o parque e a trilha. Escala não muito boa 1:110.000. Mais ou menos 30 a 40 minutos chegamos a estação de ski. Me despedi dos simpáticos brasileiros e me afastei da galera (10 a 20 vans - acho que 100 pessoas deviam estar subindo o vulcão naquela manhã), fui até uma curva longo antes da estação, com uma placa indicando o início da trilha (“à Challupén”). Estava ainda frio na sombra da montanha. A subida do Villarica é um arremedo de alpinismo? Pode ser, mas é muito interessante: temos uma experiência do que seria uma escalada na neve e temos a oportunidade de ver a cratera de um vulcão ativo, por isso a maioria dos turistas em Pucón tenta fazer isto (35000 pesos chilenos= R$ 140). Pensei até em fazê-lo e apenas na descida iniciar a trilha do Villarica. É possível mas é bem cansativo. Quem sabe na volta, pois se ocorresse tudo como planejado teria um dia sobrando em Pucón. O começo da trilha é feita por um terreno pedregoso, com pouca vegetação, acima da linha das árvores. Um constante sobe e desce pelas encostas do vulcão. Apenas 9:15 tirei o casaco de fleece pois só então o sol bateu em mim. Mas ou menos nesta hora entrei nos pequenos bosques de coigües e, mais tarde, com araucárias. Estas árvores são lindas. Algumas bem grandes. Parecem árvores pré-históricas. O terreno é ondulado. Os maiores acidentes são os zanjónes, por onde desce a água das chuvas ou no degelo. Alguns deles tem um riacho perene. A trilha é bem visível e é demarcada por estacas de aço (um perfil em L) com marcas amarelas e numeração indicando a travessia. As estacas são altas (para evitar que a neve as cubra) e bem enterradas (para evitar que o vento as derrubem). Apenas em três pontos podemos fazer uma confusão: logo ao atravessar o Zanjón Pino Huacho tive a impressão que a trilha seguiria a direta. Na verdade sobe a esquerda (não errei porque o guia do Lonely Planet avisava). No Zanjón Challupén desci e demorei para perceber onde é que saia dele, subindo. Devemos seguir em diagonal, para cima até avistarmos uma placa. Me confundi pensando que a saída era um ponto sinalizado por um morão branco, um pouco antes. Logo em seguida, no bosque, errei e fui em direção as lagunitas Challupén (mais parecem brejos rasos). Perdi 40 a 60 minutos nesta história. O GPS me permitiu concluir qual o caminho certo. Basta também suspeitar quando passamos algum tempo (20 min) sem ver as estacas sinalizadoras (tem algo errado!). Entre dois bosques encontrei um chileno que vinha na direção contrária. Jovem, pareceu-me um pouco inexperiente e despreparado para trekking. Tinha duas mochilas, uma atrás e outra na frente ao invés de uma só de maior capacidade (as duas deviam ser muito desconfortáveis - novato sofre). Estava tirando um casaco camuflado pesado. Tinha uma faca grande presa na coxa. Não aguentei e perguntei se era para enfrentar os pumas. Estava fazendo apenas o trajeto Chinay- estação de ski. Cheguei as 15:30 mais ou menos no Estero Ñilfe. Lugar lindo para acampar. Parece que os chilenos preferem ir mais adiante (aqui escurece a partir das 21 horas), mas como o lugar era lindo preferi ficar. Achei um lugar privilegiado para armar a barraca no meio de umas lengas baixas. Tomei um banho de panela (quando tem sol podemos se dar a este luxo, mesmo com água gelada). Depois do choque inicial da água gelada fica uma delícia: passamos a absorver calor do ar a nossa volta. O local é lindo, pois é um pequeno prado com arbustos e uma vista muito bonita para SE. Atrás o vulcão Villarica. Um campo de lava negra ficava logo atrás da barraca. Pela primeira vez fiz um jantar com comida liofilizada. Eu apanhei. O negócio não saiu bom. A fome ajudou a descer. Um pôr-do-sol lindíssimo acima de um tapete de nuvens. Dia 21/02/2010 Estero Ñilfe - Rio Pichillancahue Comecei o dia preguiçoso. Sai 09:50. Levei apenas 1 litro de água mas me arrependi pois a primeira metade do trajeto é seca e não tinha certeza se no fundo dos esteros iria encontrar água. Um terreno lunar, com muitos campos de lava (terreno poroso que não deixa água na superfície). Cruza-se um grande campo de lava, o Escorial de Catricheo. Os tábanos volta e meia lhe enchem o saco (tábanos são mutucas grandes, turbinadas). Trecho de lava e o vulcão Lanin ao fundo. A SE se avista os cones duplos dos vulcões Mocho e Choshuenco durante quase todo o trajeto. Lanchei as margens do Estero Aihue. Caminha-se acima da linha das árvores até pouco antes de iniciar a descida para o Rio Pichillancahue, onde penetrei numa floresta basicamente de araucárias (linda). A descida para o rio é acentuada e acabei pegando uma cana quila para aliviar os joelhos, já que não estava com bastões de trekking. Ao chegar no rio, um alívio: o CONAF colocou uma ponte de troncos com guarda-corpo para auxiliar a travessia. Não que fosse difícil atravessá-lo. Mas a água é gelada, vai nos joelhos e a cor branca não permite ver o fundo. Assim teria de cruzá-lo de botas e elas não secariam até o dia seguinte. Achei um local lindo para acampar na margem esquerda (verdadeira) do rio, pouco depois da ponte, como sugerido pelo Lonely Planet. A barraca ficou abaixo de uma araucária, perto do rio. Circulo de pedra indicava o local onde campistas faziam a fogueira. Antes de anoitecer uma neblina, na verdade nuvens, começaram a subir pelo vale do rio. Pensei até que o tempo ia mudar. Apenas nuvens. Mas dava uma impressão maravilhosa de uma floresta mística. Uma linda floresta de coigües. Tomei outro banho de panela com água de glaciar. A janta saiu um pouquinho melhor (aprendendo!). A noite uma temperatura em torno dos 7-10º C dentro da barraca, mais o menos o mesmo que ontem. Uma noite de verão na Patagônia pode ser bem mais fria que a pior noite de inverno na serra gaúcha! Não vi ninguém neste dia. Dia 22/02/2010 – Rio Pichillancahue – Estero Mocho Superior Hoje é o dia mais puxado com bastante subida (1.150 m) e aproximadas 7 horas de trekking. Por isto sai mais cedo, por volta de 08:40. Pequena caminhada, 10 min para chegar num morrete. Passado o morro, mais 20 min para chegar numa estrada de terra (só para 4X4). A estrada sobe em direção a Chinay. Tudo isto dentro de um bosque de altas árvores. Em 40 min. se atinge um passo (logo depois de uma derivação a esquerda com um sendero para o Glaciar Pichillancahue) e começa a descida pela estrada até a Guarderia Chinay da CONAF. Após 1-1,5 de estrada cheguei na Guarderia, mas estava fechada. Nenhum guarda parque. Poucos metros após, a direita, começa a trilha para o estero Mocho. Cruza-se um pequeno riacho e começa a mais cansativa subida da jornada. Cerca de 2 horas e pouco por uma trilha mais fechada, cheia de carrapichos. A floresta de araucárias, mais em cima, é muito bonita, algumas árvores estão repletas de barba-de-velho. Tive a impressão que me dirigia para um colo, que nada. A trilha vai para a esquerda subindo pela crista. Só depois de um descampado originado num incêndio, onde lanchei, se entra num pequeno trecho de mata para finalmente emergir do outro lado da crista, num bonito prado, acima da linha das árvores com vista para SW, para o vale do rio Elevado. Anda-se um pouco neste prado para em seguida subir a esquerda para um colo. Neste ponto, cuidado. Dá impressão que devemos ir em frente, descendo, inclusive há pegadas descendo. Porém a trilha segue a direita subindo pelas cristas. E assim continuará. Apenas não sobe o cerro mais alto, o Los Pinos, com 1.774 metros. A trilha segue pela encosta esquerda deste cerro para novamente seguir por cristas mais baixas adiante, desta vez já com vegetação. Aproveitei para parar e fazer um lanche, com vista para o Norte, para o vale do Rio Palguín. Retomada a caminhada, sempre descendo. Quando saí das cristas a vegetação cresce e entramos numa floresta que desce para um colo. No meio deste colo uma trilha à esquerda que desce para o vale do Rio Palguín, que no mapa da CONAF aparece como “Sendero Estero Mocho”. Uma rota alternativa em caso de emergência. Logo após a bifurcação a trilha começa a subir a encosta florestada do vulcão Quetrupillán. Com mais 20 minutos chega-se num bonito local onde a floresta acaba e há um pequeno riacho correndo entre lajes de pedra, o Estero Mocho Superior. Local privilegiado: a NW a vista do Villarica esfumaçando. A Leste o vulcão Quetrupillán. Montei a tenda bem abrigada entre os arbustos. Encontrei só um casal de franceses acampados. Ela bem simpática, falava espanhol. Vinham em sentido contrário. Tomei meu banho de panela, aproveitei o sol para secar e fiz a janta tranquilo. A tardinha o tempo pareceu que ia mudar, mas foi só ameaça. Passeei pelo local. Muitos pontos perfeitos para acampar. Porém parece que na alta estação é muito frequentado. Muita gente descuidada, com muito papel higiênico visível perto demais do rio. Aquela imagem me fez ferver a água de beber, coisa que não fiz em acampamentos anteriores. Logo depois destes pontos abrigados, termina a linha de árvores e começa um bonito prado que segue até o vulcão Quetrupillán. Dormi com um pouco de frio a noite. Meu saco de dormir de pluma não é muito bom. Depois posto um comentário mais técnico sobre ele no tópico Equipamentos > Sacos de dormir, aqui no fórum Mochileiros. Depois posto os demias dias e mais fotos.
  7. Peguei um voo em Goiânia às 5:20 da matina com destino a São Paulo, onde às 14:00 saí rumo a Santiago, às 18:30 estava num coletivo com destino à estação de ônibus. Assim que comprei a passagem para Lonquimay, saí pra comprar umas coisinhas que ainda faltavam, pão e queijo encontrei numa padaria dentro da estação e o gás encontrei no Home Center Sodmac, a umas 6 quadras da estação, indicado pela vendedora da padaria. Há mais de 24 horas havia saído de casa, no interior de Goiás, e a falta de sono já estava incomodando. Embarquei no ônibus das 22:00 e dormi pouco durante as 9 horas e meia de deslocamento. Cheguei emMalalcahuello antes das sete, ainda escuro e bastante frio. Malalcahuello é a vila onde se inicia o Circuito Lonquimay, fica a uns 35km antes da cidade de Lonquimay e o ônibus te deixa na beira da estrada. Estava colocando a barrigueira na mochila pra jogá-la nas costas quando o homem que desceu junto comigo na vila me perguntou o que eu faria e respondi que era senderismo. Ele me disse que achava que a reserva estava fechada devido a um incêndio, mas que era pra eu me informar na CONAF e me indicou que caminhasse mais um pouco que veria a placa do lado esquerdo da rodovia. Menos de 1km a frente entrei Na guarderia, já grilando com essa história de incêndio, havia mandado um email pra reserva perguntando sobre as trilhas há uns 10 dias e não me responderam. Na guarderia havia um informativo que indicava que a oficina funciona das 08:30 às 18:00. Pensei bem e já que estava ali e não havia ninguém, resolvi fazer a trilha sem autorização. Peguei um pouco de água e fui pra trás da guarderia, onde o guia Lonely Planet indica o início do trekking, estava um pouco escuro, mas há uma placa e cerca de madeira no início da trilha. A trilha entra num bosque logo após essa cerquinha e começa a subir, pouco depois ela encontra com uma estrada e o caminho continua por essa estrada. Cheguei numa roleta de madeira e parei para tirar o anorak e a blusa de pluma, pois estava suando. O dia tinha clareado e não sei se pelas duas noites mal dormidas, ou pelo meu péssimo condicionamento físico, já estava cansado. A trilha é muito bem sinalizada e vai numa subida contínua por lindos bosques. Cheguei num mirador, onde construíram uma plataforma de madeira e de onde se tem a primeira visão do Vulcão Lonquimay, mais à frente outra plataforma voltada para o sul, com impressionante visão da Sierra Nevada e do Vulcão Llaima, no Parque Nacional Conguillio. Meu ritmo estava lento, mas devagar ia vencendo a longa subida. Assim que a trilha sai da linha das árvores há a sinalização de que é o fim do Sendero Piedra Santa e início do Sendero Laguna Blanca. À minha frente o Lonquimay e ao fundo Llaima e Sierra Nevada, sinceramente não sei pra que lado era a melhor vista. O terreno fica árido e a trilha arenosa, meio ruim de caminhar, a subida continua. Uma ave de rapina tirou uns rasantes da minha cabeça e em certo momento ficou paradinha uns três metros acima de mim, parecendo que queria me intimidar. Foi tão demorado que me permitiu fotografá-la ali logo acima de mim. Alguns minutos adiante, antes do entroncamento com o Sendero Coloradito há uma boa área de camping à esquerda, com água uns 50m abaixo, o ideal no primeiro dia é acampar aqui. Como estava receoso com os guarda parques e não tinha lugar pra esconder a barraca, resolvi continuar apesar do cansaço já pesar um pouco. No entroncamento com o Sendero Coloradito resolvi esconder parte das minhas coisas, pois carregando todo aquele peso eu estava sofrendo pra percorrer a trilha. Desci o Sendero Coloradito até o bosque ficar mais denso e escondi a bolsa que uso para transportar a mochila numa moita de bambuzinho com o que pude tirar da mochila. Deixei na mochila a barraca, o isolante, o saco de dormir, um anorak, a blusa de pluma, um short e uma camiseta, 5 porções de comida, um pouco de pão e queijo, as coisas de cozinhar e barras de cereal e proteína. Voltei pra trilha bem mais leve e um pouco mais animado. Assim que cruza o Sendero Coloradito, o Sendero Laguna Blanca passa por um bosque de baixas araucárias e entra no que considero a pior parte do trekking, uma sobe e desce sem fim, forte, por um terremoto arenoso e estéril, que vez ou outra faz a gente deslizar um pouco pra baixo. Primeiro a trilha sobe seguindo à esquerda, contornando o PortezueloHuamachuco, e após passar pelo PortezueloPancutra, desce e depois segue à direita, subindo em direção ao Paso Lonquimay. Novamente a trilha encontra com uma estrada, que tinha vários sinais de rastros de motos. E o caminho é seguindo essa estrada. Essa parte do circuito é um longo trecho sem fontes de água. Eu já estava desanimado e com os pés doendo, resmungando em pensamento, não estava nem curtindo a trilha. Sinceramente, estava pensando que merda que eu estava fazendo ali. Ter feito um percurso tão longo e duro no primeiro dia foi muita burrice. Do passo pude ver o primeiro sinal do incêndio, havia fumaça no Vale de Nalcas, mas nada de chamas. Nessa hora pensei se deveria voltar ou continuar em direção ao incêndio, resolvi continuar e se mais a frente houvesse perigo eu retornaria.Dali tinha um bom visual dos campos de lavas do Lonquimay e de algumasmontanhas ao norte. Segui trilha abaixo, agora descendo, até a área de acampamento no Estero Laguna Verde, armei a tenda no local mais escondido no qual cabia a danada. Cheguei tão cansado que após armar a barraca e inflar o isolante, deitei pra descansar um pouco e acordei quase meia noite, com um frio danado e varado de fome. O céu estava espetacular. Devorei umas barras, vesti o agasalho, entrei no saco de dormir e peguei no sono muito rápido. Acordei antes das 5:00 e resolvi cair na trilha. Enfiei tudo na mochila e comecei a caminhar ainda no escuro, com um frio de rachar. Mesmo com todo o frio, resolvi continuar de short, pois tinha uma pequena assadura na virilha. Também apareceram umas bolhas nos dedos dos pés.Em compensação, estava de agasalho de pluma, anorak, gorro e luvas. A trilha continua pela estrada, com o Cajón La Holandesa à direita. Uma hora e meia depois do acampamento chequei no local indicado no guia onde o caminho abandona a estrada e continua por uma trilha. A estrada faz uma curva à esquerda e a trilha segue reto. Nessa parte há bastante pontos de água, toda hora cruzamos córregos e outras aguinhas. Por volta das 11:00 horas da manhã ouvi barulho de caminhões e de helicóptero e entrei no bosque pra me esconder. Não vi nem os caminhões nem o helicóptero, mas a partir daí fiquem bastante tenso, pois havia sim a possibilidade de ser pego e não fazia nem ideia do que a CONAF poderia fazer comigo, como seria a punição num caso desses. Comecei a caminhar com muita cautela, entrando na vegetação sempre que dava e parando pra ver se escutava algo. Isso atrasou bastante minha pernada. Antes de chegar à confluência do Rio Lolco com o Estero Lancu, a trilha passa muito próximo à uma casa, o que me deixou ainda mais tenso. Cheguei ao Rio Lolco quase 14:00 horas e como há casas nas proximidades e é uma área aberta, decidi ir até a área de camping no Salto Holandesa. Segui a estrada que vai pela margem direita (verdadeira) do Rio Lolco, uns 20 minutos depois ouvi o barulho de um carro, olhei pra trás e vi um carro se aproximando. Levantei o dedo e o carro parou. Era um casal e seu filho e se prontificaram a me dar carona na hora. A mulher desceu e abriu o porta malas pra eu colocar a mochila e depois sentou no banco traseiro. Eram o Jaime, sua esposa e seu filho Augustin. Sentei na frente e tratei de abrir o vidro pra não intoxica-los com meu cheiro de três dias sem banho. Uns 4 ou 5 km a frente vi o caminho para o Salto Holandesa, depois passamos por umas lagunas menores e mais à frente paramos nas margens da Laguna Escorial, achei feia. O casal era um poço de simpatia. Seguimos adiante e paramos num mirador, onde fizeram uma plataforma de madeira, pra eu tirar algumas fotos. Pra mim, esse local oferece as melhores vistas do trekking. Continuamos pela estrada e o Jaime me perguntou o que eu estava fazendo e onde estava hospedado. Menti dizendo que estava num camping fora da reserva e que tinha seguido a estrada até o outro lado da reserva e agora estava voltando. Entramos numa estrada de asfalto que leva à estação de esqui e passamos pela guarderia, onde acho que não precisa parar, pois não há nenhuma cancela. O Jaime me perguntou onde era o camping e apontei pra uma porteira mais ou menos 1km depois da guarderia. Ele parou, peguei a mochila e fui no caminho da porteira. Assim que o carro seguiu, continuei pelo asfalto e pouco abaixo vi uma propriedade que parecia abandonada do lado direito no sentido de quem vai a Malalcahuello. Na ânsia de fugir das perguntas do Jaime, esqueci meu chapéu no carro. Pulei a porteira e uns metros à frente tinha uma casa que acredito estar abandonada, pelo estado que se encontra, no fundo passa um pequeno riacho. Ali preparei minha refeição, conferi o estado deplorável dos meus pés e descansei até pouco depois das 18:00 horas, quando fui sem a mochila até a guarderia e conferi que já não tinha ninguém lá. Não encontrei o HostelLonquimay Extremo, descrito no Lonely Planet como local de acampamento. Busquei a mochila e adentrei na trilha, que segue em direção ao Lonquimay por um bosque até quando começa a subir o Portezuelo Colorado, a partir daí a trilha segue pelo terreno seco, arenoso e sem árvores que circunda o vulcão. Esse trecho é fácil e com pouquíssima subida. Cheguei ao entroncamento do Sendero Laguna Branca já bem escuro e pouco abaixo fui procurar minhas coisas. Demorei pra encontrar, já estava pensando que alguém tinha achado e levado embora. Já tardão da noite, descendo pelo Sendero Coloradito o fato mais hilário do trekking, minha lanterna iluminou dois olhos brilhantes no meio do caminho, uns 20 a 30 metros adiante, levantei os bastões e gritei e o animal ao invés de se afastar, veio na minha direção, fiquei paralisado imaginando que poderia ser um puma, meu coração foi a mil, mas pra minha sorte, quando a luz revelou o bicho, era um cachorro. Santo cachorro! Ou seria maldito?Ele me acompanhou um pouco e depois sumiu. Acampei numa grande área aberta ali perto e, pela manhã, depois de tomar meu desaiuno, segui abaixo pelo vale do Rio Coloradito. Bem perto de onde dormi, havia uma placa e a porteira marcando o limite da reserva. Pulei a porteira e o alívio tomou conta de mim, já não havia mais problema se alguém me encontrasse, estava fora da reserva. Segui pela estrada que vai passando por várias casas, cruzei com uma senhora que vinha subindo em sentido contrário e mais abaixo haviam umas pessoas descarnando uma vaca. Uns minutos depois, antes das 10:00 horas, alcancei o asfalto que liga Malalcahuello a Curacautin. Ainda consegui uma carona com um caminhoneiro chamado Marcos, que me vendo com a cabeça ao sol, me deu um boné. Ele me deixou em frente à CONAF e me aproximei fingindo nunca ter estado lá. Apresentei-me e conheci as pessoas que estavam na oficina, o Manoel, a Andrea e outras duas pessoas e perguntei sobre o Circuito Lonquimay. O Manoel me informou que devido um incêndio, o circuito estava cerrado, mas que algumas trilhas estavam abertas. O Sendero Tolhuaca estava fechado, os demais estavam abertos, mas que por segurança estava proibido acampar dentro da reserva. Ele disse que eu poderia acampar ali no fundo. À tarde conversamos bastante, perguntei sobre a subida ao Lonquimay e ele me disse que estava aberta, mas que eu deveria ir até a outra entrada da reserva, onde se inicia a subida. Disse também que é bastante puxado e que se leva o dia todo, que o ideal é começar por volta das 4 ou 5 da manhã por causa da incidência do sol. Sugeriu que se eu quisesse tentar, poderia ir com o pessoal da reserva que leva o guarda parque até a guarderia às 08:30 e que se eu terminasse até às 17:00 horas também poderia voltar com eles. Analisei a possibilidade, lembrei-me o quanto aquela face era íngreme,e devido ao estado dos meus pés, ao horário inapropriado e ao risco de ter que voltar os 12km desde a guarderia caminhando, resolvi não tentar a subida. Tomei um banho de panela na torneira atrás da casa do administrador da reserva, à noite fui dar uma volta na vila pra tentar comer uma pizza num local indicado pelos funcionários, mas infelizmente o lugar estava fechado. Voltei à CONAF, preparei um miojo e caí na tenda para uma noite maravilhosa de sono. No outro dia fui numa pequena trilha o Sendero TresArroyos, que começa atrás da casa do administrador da CONAF. Trilha curta e com um visual mais ou menos. Voltei, arrumei minhas coisas, despedi-me do pessoal e fui até o ponto de ônibus esperar o transporte pra Curacautin. Acho que o pessoal ficou pensando que eu era louco, ir até lá e não tentar percorrer os senderos. Eles nem imaginam que percorri aquelas trilhas num frenesi maluco.
  8. Pretendo fazer esse trekking em março de 2015 e como encontrei pouquíssimas informações sobre esse circuito, decidi criar esse tópico para troca de informações. O circuito Lonquimay consiste na circunavegação do Vulcão Lonquimay, num percurso de 95,5km, com acúmulo de 3.050m de aclive, abrangendo a Reserva Nacional Malalcahuello e a Reserva Nacional Nalcas, na Região de Araucanía, norte da Patagônia Chilena. O trekking passa por florestas de araucárias, lengas e raulí, por campos de altitude e por campos de lava, cruza dois passes de montanha, o Paso Lonquimay de 1762m, entre os vulcões Tolhuaca e Lonquimay e o Paso Lolco de 1813m. Durante o trekking, há possibilidade de escalar o Vulcão Tolhuaca (escalada técnica) e o Vulcão Lonquimay (escalada não técnica), sendo necessário um dia para cada escalada. O trekking tem como pontos inicial e final a Vila de Malalcahuello, entre as cidades de Curacautín e Lonquimay. Minha maior fonte de informações é o Guia Lonely Planet - Trekking in The Patagonian Andes, que diz se tratar de um trekking por uma paisagem pós-erupção fascinante.
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