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  1. Após trabalhar no feriado de carnaval, assim que chegou quinta-feira estava eu partindo rumo a uma bela caminhada pelo Sul de Minas, na Serra da Mantiqueira, no total foram nove dias de pura diversão, tranquilidade e paz rural. Fiz meu planejamento ao meu modo, mas no decorrer do périplo eu soube que alguns trechos fazem parte do Caminho dos Anjos, e eu estava o fazendo ao contrario. Bom, como eu já havia visitado e me encantado por Aiuruoca, decidi começar por lá novamente e conhecer a Cachoeira do Batuque. Segue um relato! 27/02/2020 - 06/03/2020 - Roteiro: Dia 1: Ônibus de São Thomé das Letras até Aiuruoca. Caminhada do centro de Aiuruoca até a Cachoeira do Batuque. Pernoite no Abrigo do Batuque R$40,00 (Distância 6km) Dia 2: Abrigo Batuque em Aiuruoca até o centro de Alagoa. Pernoite na Pousada Pica-Pau R$50,00 – (Caminhada de 25km) Dia 3: Cachoeira Zé Pena + Corredeira de Itaoca até a Pousada Casarão R$90,00 com café e refeição (Caminhada de 20km) Dia 4: Pico do Santo Agostinho ou Pico do Garrafão – altitude 2380 metros (Caminhada de 20km) Pernoite Pousada Casarão R$90,00 Dia 5: Cachoeira do Facão e Cachoeira do Veloso – (Caminhada 7km) – Pernoite Pousada Casarão R$90,00 Dia 6: Cachoeira Ingá e Camping do Formigão Amarelo – Pernoite R$20,00 – (Distância 19km) Dia 7: Cachoeira do Escorrega (Caminhada 19km) – Pernoite Chalé Formigão Amarelo R$20,00 Dia 8: Descanso no Formigão Amarelo – diária R$20,00 Dia 9: Ônibus para Itamonte centro (R$6,00) Dia1 Mapa Aiuruoca até Batuque: https://goo.gl/maps/TFtxScMJkXp2hHoC8 Atrasado pra pegar o ônibus das 07h30, saí praticamente correndo em direção ao ponto e cheguei no exato momento em que o ônibus passava, só deu tempo de tirar a mochila das costas e subir os degraus. Não deu 30 minutos e uma vontade horrível tomou conta de mim, com aquele sacolejo todo, de repente, eu queria era urinar, foi aí que tive que me concentrar até chegar a Cruzília, quase uma hora de puro desespero. Também me vem um latão sem banheiro e eu estava sem jeito de pedir pra parar na estrada, até esperei alguma deixa, mas depois de sobradinho ninguém mais desceu ou subiu. Umas 08h50 pensei em descer de vez e ir andando até Cruzília, mas sabia que ia melar a viagem já desde o inicio, pois a previsão em Cruzília era de chegar 09h10 e as 09h20 já saia um ônibus para Aiuruoca pela viação Sandra. Contudo, aguentei e a minha chegada em Aiuruoca transcorreu perfeitamente. Logo quando desembarquei, me pus a almoçar no mesmo self service de outrora, o Restaurante Central. Além de comida boa é com preço justo. R$16,00. Vale a pena! Com isso, foi só seguir caminhada até a Cachoeira do Batuque, essa cachoeira eu não havia visitado das duas vezes em que estive em Aiuruoca e nesta ocasião eu fui direto e somente pra ela, no que diz respeito a minha passagem em Aiuruoca. Vou contar pra vocês que a previsão do tempo não estava nada boa para se fazer caminhadas, os dias estavam chuvosos e não costumo dizer que é um dia ruim, até porque chuva é sempre bem vinda, uma dádiva, uma benção. Por isso eu disse que só não era apropriado para as andanças, mas “era o que tinha pra hoje” e assim se fez. O jeito foi proteger o que não podia molhar e bora walking and singing in the rain... Segui sentido Vale do Matutu, ou seja, pela rua à esquerda da Igreja Matriz até encontrar a estrada de chão batido e após 5km, virei à direita, no local tem placas indicando o Vale do Matutu e as pousadas, mais alguns metros adiante e tomei à direita novamente pra chegar até o Abrigo Batuque. Fui bem recepcionado e mesmo na chuva eu parti pra Cachoeira do Batuque, distante uns 30 minutos do abrigo. De cara, após passar uma porteira, começa uma subida num morro, daí se encontra uma via mais demarcada e com 10 minutos se encontra a placa indicando o início da trilha mais fechada até as quedas. Foram mais 15 minutos de caminho autoguiado até se chegar na imensa, surpreendente e bela Cachoeira do Batuque! Devido à chuva não fiquei mais que 30 minutos por ali, e voltei pro abrigo. Bom, já devo adiantar que é mais que indicado se hospedar no Abrigo Batuque. Cachoeira do Batuque - fev/2020 Legenda1: acesso ao Abrigo Batuque ------- Legenda2: subir o morro ida cachu Legenda1: virar à esquerda -------- Legenda2: inicio da trilha, esquerda Dia 2 Mapa Batuque até Alagoa: https://goo.gl/maps/2SLAZXdBBcTpb2S28 Acordei cedinho, com tempo nublado e uma garoa fina, aquele aspecto do dia que não dá vontade de nada fazer. No entanto, eu tinha o anseio de caminhar, de pegar estrada, parecia um remédio que tinha que tomar na hora exata, mas sem hora marcada. Bom, eu ainda estava com uma “carga” pronta pra ser despejada a cada passo dado. O dia prometia o trajeto mais longo do meu planejamento, seriam pelo menos 25km do Batuque até o centro de Alagoa. Assim, ainda com o sorriso na boca comecei a pernada. Voltei, como se tivesse indo pro centro de Aiuruoca, às 06h25, mas logo tomei uma curva acentuada para a direita. As placas indicavam as distâncias até cada bairro/povoado. Neste momento nem reparei muito e nem tirei uma foto, depois de 5 minutos eu pensei comigo que deveria ter tirado uma foto só pra ter uma referência a mais. Em todo esse trajeto eu tive o Rio Aiuruoca como testemunha, ele sabe que com uns 14km eu tive que abandonar de vez a ideia de andar com tênis e usei um chinelo. Liberdade para meus pés, pois o calçado anterior estava apertado, após certo tempo de uso (meses) e não laceou, uma pena. E com o tênis molhado agravou mais a situação, ainda acho que demorei bastante pra trocar. Passaram-se poucos carros por mim, a estrada em muitos trechos estava em condições difíceis de percorrer com carro. Bom, foi chuva por vários dias, e nesta ocasião não tinha sido diferente. Mesmo assim a paisagem se fazia bonita em certos trechos, no Povoado Tamanduá eu parei no mercadinho pra abastecer de alimentos, fiz meu lanche e depois segui novamente. Já tinha se passado das 9h. O meu ritmo era de boa, até porque os trechos de lama não permitiam uma velocidade maior. Nesse momento eu ainda tentava evitar me “sujar” muito. Ao chegar no Bairro Nogueira, fiz mais uma parada. Na verdade eu não estava cansado e não se tem tantas subidas nem descidas íngremes e logo me acostumei com a chuva no corpo. Após atravessar o bairro de Campina, que se mostrou um lugar bem bonito, diga-se de passagem, eu pausei de novo. Sempre parando num abrigo ou ponto de ônibus e dessa vez do lado de uma placa que indicava 5km pra chegar em Alagoa. Opa, quase lá! 12h10 eu já estava numa subida, uma lotação escolar subindo também encalhou bem na minha frente, a motorista abandonou por ali e continuou a pé até seu destino, o qual eu não sabia, mas o carro estava vazio, não tinha estudantes. A ideia de tirar o chinelo nas lamas mais profundas foi ganhando força até que uma hora já tava descalço direto mesmo, porém sempre prestando atenção por onde pisava. Passei o bairro Ouro Fala e ao chegar no centro, depois das 13h, procurei a Pousada Pica Pau, ao tocar a campainha uma senhora me atendeu, me apresentei e assim fechei a pernoite. Corri pra um banho, pois eu estava todo enlameado e andava assim na cidade e todos me olhavam, estranho rs. Após uma boa ducha, fui almoçar de fato no restaurante ao lado da pousada, chama-se Restaurante Pica Pau. Agora, imagina uma comida saborosa... muito bom mesmo e era self service por R$15,00. Pra esse dia só descanso... Dia 3 Mapa Alagoa até Zé pena: https://goo.gl/maps/SMueaH63SD1Tm1nH9 Mapa Zé Pena até Itaoca: https://goo.gl/maps/cSD1eh2ZtxPKpT2CA Mapa Itaoca até Casarão: https://goo.gl/maps/4uBVk6PySQD5BfHQ9 Mais um dia nublado, mas despertei empolgado ainda, além da expectativa de chegar a Pousada Casarão, eu teria duas cachoeiras para visitar, a do Zé Pena e a Corredeira Itaoca. Com isso, daria em torno de 20km de caminhada. Voltei mais pro centrinho até dobrar na rua Jose F. Ribeiro, já em estrada de chão, (barro e lama rs), prossegui mais uma andança. Nesse dia eu já comecei a andar descalço logo de cara, já não ia ficar me preocupando muito. Até a Cachoeira do Zé Pena seriam 5,7km e uma bifurcação à esquerda. Na estrada eu passava por muitos pastos e o silêncio imperava, só os pássaros cantavam. Ainda sem muitas subidas nem descidas. Eita Rio Aiuruoca que baita companhia, com 3km veio a bifurcação e tomei o caminho da esquerda, tem até uma placa e no fundo se avista mais um povoado. Assim, com mais 2km eu estava próximo da cachoeira. O acesso fica atrás de uma casa, tem uma ruazinha de acesso, nesse dia estava bem lamaceira mesmo. Ainda bem que tinha uns trabalhadores e pude perguntar o caminho. Já digo que o acesso até a cachoeira tava bem dificultoso, a grama do pasto alta, muita lama e pouca sinalização, mas quando avistei a placa “welcome”, atravessei o curso d’água e na outra margem consegui chegar na queda. Como a correnteza tava bem forte devido as chuvas, só contemplei, comi meu lanche em pé mesmo, fotos e voltei. Legenda1: atravessar o leito do rio -------------------------- Legenda2: Cachoeira Zé Pena O mesmo caminho, mas agora eu ia virar a primeira esquerda pra seguir até a Corredeira Itaoca e passar bem pelo povoado mesmo. Lugar muito simpático, não parei pra prosear mas acenava cumprimentando. Cada vez mais lama e cada vez mais rural. A chuva vinha intermitente. Os passos eram lentos e olhos atentos! Depois de 5km na mesma estrada, virei à esquerda pra já estar na rua da corredeira Itaoca, a corredeira é bem visível! Legenda1: Panorama Corredeira Itaoca ----------------------- Legenda2: Araucárias no caminho Faltavam mais uns 8km até a pousada casarão, mas ainda uma parte hard me aguardava, uma subida de 1km pra chegar até a estrada principal que liga Alagoa até Itamonte (LMG-881), muita cautela para atravessar, um pouco de dificuldade pois parecia que não andava, pisei num grampo e sorte que não furou profundo a sola do pé. Ali pensei, O que eu tô fazendo aqui? Haha. As vezes bate esse pensamento, mas é bom, imagina se fosse tudo flores? Ao vencer esse trecho que considerei difícil, saí na estrada e de cara um mercadinho, fiz umas compras e mais uns 6km até pousada, só que agora com asfalto e chuva também! Têm placas indicativas pra se chegar na pousada Casarão, e de lei que lá cheguei bem sujo, mesmo assim fui muito bem recepcionado pelo Joãozinho e sua família. Ali eu iria permanecer por 3 dias super agradáveis onde deu o tom da magia e tranquilidade dessa viagem. Após batermos um papo, fui me ajeitar, pois mais tarde já tinha janta! Na pousada Casarão eles fazem com que os hospedes se sintam em casa. Vale muito a pena passar por lá, seja qual tipo de viagem for a sua, o lugar tem uma ótima estrutura e chalés família, casal, etc. Bom, confira nas redes e verás. Dia 4 Mapa pico google: https://goo.gl/maps/YUXWA61rnJwAMX8G8 Após um sono muito confortável, acordei com uma sensação ótima pra se iniciar o dia. Eu havia marcado o café da manhã as 07h com a dona Ana, e assim pude me fortalecer pra subir o Pico do Santo Agostinho ou Pico do Garrafão, que tem no seu cume 2380 metros de altitude. O céu permanecia nublado, mas não se tinha mais chuvas. O café da manhã é muito bem servido e contem, é claro, o famoso queijo parmesão artesanal de Alagoa, no dia anterior o Joãozinho havia me mostrado parte da produção e me encantei, uma pena que dessa vez eu não ia comprar pois ia pesar demais na minha mochila, senão ia trazer umas peças comigo. A jornada do dia seria o ponto alto da minha caminhada, alto em todos os sentidos. Muito eu esperava por esse momento e assim me pus a caminhar rumo ao Parque Estadual Serra do Papagaio. Após passar alguns sítios e chegar numa igreja, logo tomei à direita e a subida já se mostrou acentuada e constante. E era isso mesmo, já dizia o ditado quem tá na chuva é pra se molhar. No meu caso só fui presenciar chuva na volta da trilha. Foram quase 7km até a porteira que marca o inicio da trilha, ou seja, dali não se passa mais carro. Eu estava acompanhando um mapa wikiloc e em certo ponto me confundi um pouco depois de adentrar a porteira, mas a dica é: a trilha sobe sentido oposto ao de uma casa bonita e é subindo o morro beirando uma cerca. Legenda1: à direita e inicio aclive --------------------- Legenda2: à esquerda pro pico Legenda1: pico santo agostinho encoberto --------------------------- Legenda2: primeiro morro vencido Após vencer esse morro e com algumas paradas para recompor o fôlego, cheguei na placa indicando “Vale do Garrafão”, um pouco mais de subida até se estabilizar, foi um trecho de quase 3km, a trilha super tranquila de se guiar. Eu sempre atento aos passos pra não pisar em nada que não deveria. O visual estava neblinado o tempo todo, só por um momento que pude visualizar à minha direita o Pico do Papagaio, mas ainda foi pouco perante todo potencial de visual que aquela região tem. Logo adiante, e quase chegando na parte final da trilha, consigo visualizar o Pico do Santo Agostinho, mas rapidamente a neblina o cobriu novamente. Nesse último trecho a trilha se faz por uma mata fechada pra depois abrir nos campos de altitude. Eis que após 3h30min de caminhada, cheguei no grande topo do Pico do Santo Agostinho (ou Pico do Garrafão). Lá no alto andarilhei, vi todas as possibilidades de visual (neblina) e também as possibilidades de acampamento, realmente é muito bacana o espaço pra acampar lá no topo. Legal de lembrar sempre de manter uma preservação e seguir uma boa conduta em meio a natureza. A única coisa que me incomodava era o meu tênis! Complicado mesmo, e fazia tempo que não passava por isso. Se não fosse tal incomodo minha volta seria bem mais tranquila, no entanto tive que fazer diversas paradas e andar todo torto rs. Contudo, com 3h de trilha eu estava de volta na Pousada Casarão, de lei aquele merecido descanso! Legenda1- inicio vale do garrafão 2,7k ----------------------------------- Legenda2- visu do Pico Papagaio Pico Santo Agostinho ou Pico do Garrafão Dia 5 Mapa Cachoeira do Facão: https://goo.gl/maps/cpZ7gTBPjtbSGWXX8 Já é Março, nesse dia acordei um pouquinho mais tarde, no planejamento inicial eu havia deixado pra ir até as principais cachoeiras do bairro quilombo, mas resolvi alterar e fazer um pouco mais light, afinal de contas eu fiquei bem satisfeito com o rolê até então. Por isso o novo plano era ir até a Cachoeira do Facão e depois a Cachoeira do Veloso, passei também pela Cachoeira Boa Vista, que fica bem no acesso ao Bairro do Engenho, porém a trilha se mostrou bem fechada, eu tava light rs. Andei uns 7km ao todo. Conforme os dias iam se passando o tempo ia abrindo de pouco em pouco, A Cachoeira do Facão que era chamada de Cachoeira da Usina antes, fica a 3km da Pousada Casarão e é só pegar a estrada sentido Alagoa e virar no Bairro Companhia. Ao descer a rua, tem uma placa indicando a trilha no meio do pasto. Trilha demarcada e depois vem um trecho íngreme, tem até umas cordas de apoio em momentos mais críticos, mas no geral é uma trilha curta e tranquila. Legenda 1 - entrada trilha cachoeira facão ----- Legenda 2 - entrada trilha cachoeira facão Legenda 1 - Cachoeira do Facão por cima ----------------- Legenda 2 - cachoeira facão por baixo Queda bonita, Cachoeira do Facão A outra cachoeira era a do Veloso, pra ir eu tive que voltar a pousada e seguir por mais uns 500 metros e pronto, à direita tem uma trilhinha e então segui pelo leito do rio pra se chegar na queda mais acima, parece ser meio fechado, mas é tranquilo. E do lado da pousada! Legenda 1: trilha saindo da estrada -------------- Legenda 2: Uma Queda, Cachoeira Veloso Dia 6 Mapa Casarão até Formigão: https://goo.gl/maps/kPbxhpotyVD4RfBy8 Minha última manhã na Pousada Casarão, mais um café da manhã farto e ainda pude fazer um lanche para a caminhada do dia. O destino era o Camping Formigão Amarelo em Itamonte e dar uma passada antes na Cachoeira Ingá, no bairro Quilombo. Bom, a queda eu só vi de panorama mesmo. Segui a estrada e agora com fone de ouvido eu entrei numa brisa muito dez, pus minha playlist pra funcionar e assim fiz uma caminhada agradável por demais. Veja bem, Minas Gerais ajuda também, muitas montanhas ao redor, o clima rural ameno, respirando aquele ar puro por dias já. Eis um cara mais uma vez transformado pela caminhada, eu mesmo. Com 1 hora e 30 minutos de caminhada, uma rapaz me ofereceu uma carona. Aceitei e assim pude bater um bom papo até chegar ao camping formigão amarelo, foi mais uns 10km de estrada, que ora era asfaltada ora de terra ainda. Quando começou a descida de serra eu fiquei atento e ao passar o Mercadinho do Bairro Cachoeira, veio o portão do camping, pedi pra descer e já me despedi, poxa adiantou um bom lado! Bati palmas e ninguém me atendia, o portão tava aberto e então adentrei pra ver se a recepção era mais pra baixo. O camping apesar de bem estruturado estava com ar de que não tinha ninguém ali por um tempo, voltei pro portão e lá tem um chalé bem do lado, vi que tinha umas roupas e resolvi chamar novamente. Daí então apareceu uma senhora e disse que estava hospedada lá e que os proprietários estavam viajando. De prontidão ela disse que ia pegar o número do whats app deles e me passou também a senha do wifi. Logo entrei em contato, e demonstrei interesse de pousar no chalé de baixo, que era rústico de madeira. A diária era de R$20,00. Só fui checar se estava aberto e sim, estava. Confirmado e então era só eu entregar o dinheiro no centro de Itamonte, pois lá eles têm uma funcionária numa lan house. Chamei a senhora novamente, mas acho que ela não me ouviu, então resolvi descer. Só deixei as coisas, relaxei um pouco e com um tempo de sobra, fui ver como era o acesso a Cachoeira da Conquista, e não estava muito a fim de fazer trilhas longas, pois estava de chinelo, não queria usar aquele tênis mais nunca rs. Quando fui sair o portão estava trancado, ou seja, a senhora saiu e nem percebeu que eu estava por lá. Arrumei um jeito de sair e segui rumo ao bairro da conquista. Descendo à direita do camping, logo virei à esquerda e segui numa boa em mais um povoado rural. Muita tranquilidade por sinal, muitos pastos e aos poucos a vista da Serra da Mantiqueira ficava mais linda. Nessa tarde o tempo já estava ensolarado. Andei por uns 40 minutos e logo percebi que não tinha nada de sinalização da Cachoeira da Conquista. Enfim, conforme o mapa que eu tava mostrava de fato o começo de um leito do rio, mas de acordo com algumas informações que colhi teria mais uns 40 minutos de trilhas. É, realmente não dava naquele momento. Uma pena! Andei mais um pouquinho subindo mais só pra ver se não tinha alguma placa mais acima e do nada me deparo com uma moça na beira da estrada, sentada e ouvia um som. Era a mesma senhora que me atendeu no camping, que coincidência. Ela estava rezando ali e logo voltei pra não atrapalhar! Assim, foi essa breve caminhada pelo bairro. Passei no mercadinho do bairro Cachoeirinha e fiz um rango/ lanche para aquela tarde! Na paz. Nesse dia eu devo ter andando uns 10km. Dia 7 Mapa Formigão até Cachoeira Escorrega: https://goo.gl/maps/FqbvfZNNWn9mDKnJ9 Mais uma manhã que eu acordo extremamente bem, e realmente apesar da boa disposição eu fiz mais uma mudança no roteiro, a intenção era ir para a grande Cachoeira da Fragaria, porém de ida e volta daria uns 40km e mesmo que conseguisse alguma carona ainda ficaria muito para caminhar. Então resolvi ir para a Cachoeira do Escorrega, distante menos de 10km do camping e assim peguei estrada, bem de manhã. Sentido Itamonte eu segui por uns 5,5 km, até que avistei a placa Usina dos Bragas, então tomei à direita rumo ao Bairro do Morro Grande. Mais 600 metros fiz uma curva à direita de novo e então em 2km eu estava próximo da Cachoeira do Escorrega, já perto da cachoeira tem uma placa indicativa. Se for de carro cobra-se estacionamento, coisa de R$5,00. Com uma água bem gelada, que não tive coragem de testar o tobogã natural, o lugar guarda sua beleza. São varias quedas para poder refrescar num dia de calor, ali parece que costuma lotar nos finais de semana. Bati umas fotos, comi meu lanche e fiquei numa boa ali! Paz maior não existe, o sol já era bem presente no dia. A caminhada foi sensacional! Vale muito a pena. Caminhada do dia: ida e volta uns 20km. Legenda 1 - indo pra Cachu Escorrega, direita ------------ Legenda 2 - Usina dos Braga Legenda 1 - esquerda, poucos metros ---------------------- Legenda 2 - primeira corredeira Cachoeira do Escorrega - Itamonte - MG Dia 8 e Dia 9 Tirei o dia pra descansar já que o camping era propicio para isso. Recomendo o Camping Formigão Amarelo, eles contam com algumas atividades como tirolesa no próprio local, tem uma cozinha comunitária, churrasqueira, banheiros com chuveiros quentes e preço bom! Esta a 13km do centro de Itamonte. Na minha estadia, pude refletir na pura tranquilidade, por ora comecei a relembrar a leitura de Walden ao visualizar o chalé de madeira, só que em meio aos eucaliptos o bosque. No centro de Itamonte eu ia embarcar no ônibus para São Lourenço e depois, para Três Corações (passou por Cachoeira do Carmo, Jesuania, Lambari, Cambuquira). E, por fim, embarquei num ônibus para São Thomé das Letras. Tomei ciência de um ônibus que ia até o centro de Itamonte, horário único, as 07h, a um custo de R$6,00. Esse ônibus sai de Alagoa as 06h e volta às 15h. Fica aí a dica. (o preço de Alagoa até Itamonte eu não sei). É bom até pra mim, pois quem sabe logo poderá ter outros passeios por essa região que tanto me agrada! Faltou com certeza a Cachoeira da Fragária, mas ainda darei um jeito de visita-la e emendando com outro pico. Assim é Pé de Natureza! Até a próxima!
  2. A Travessia da Serra da Chapada O tempo estava muito bom quando embarcamos na rodoviária de Campinas com destino à Caxambuno sul de Minas. Estávamos no feriado da páscoa e por isso mesmo nosso ônibus sofreu um atraso de meia hora e só acabou partindo lá pelas 10:30 da noite. Enquanto o ônibus deslizava suave pela rodovia D. Pedro I, eu tentava sem sucesso dormir um pouco, maldito ar condicionado o jeito foi tirar com muito custo, minha blusa do fundo da mochila. Depois de serpentear por várias cidades do Sul de Minas, finalmente, às 03 da manhã, chegamos à Caxambu. Pequena cidade mineira que faz parte do circuito de estâncias hidrominerais, mas o nosso destino era realmente a cidade de Baependi, uns cinco quilômetros à frente e como o ônibus para lá só sairia às 06 da manhã, tratamos logo de aproveitar o tempo de espera para tirarmos uma soneca e para isto bastou apenas esticar o isolante ali mesmo no chão da rodoviária, e como uns mendigos, escançar o esqueleto. Antes das 06 estávamos de novo de pé. Para confirmar o horário do ônibus, perguntei a uma senhora que estava no ponto com uma mala enorme. A mulher não sabia do horário, mas nos contou quase toda sua vida e depois do longo papo, eu ainda a ajudei a colocar sua mala no carro da sua filha que havia vindo buscá-la . A mulher ainda pediu para que sua filha nos levasse até Baependi, coisa que recusamos, não queríamos incomodar, além disso, nosso transporte acabara de chegar e em pouco mais de 20 minutos nos deixou no destino pretendido. Baependi é uma pequena cidade, talvez solitária em outros dias, mas neste feriado da semana santa, estava cheia de jovens que voltavam das festividades religiosas. Nossa intenção era chegar até o Bairro da Vargem, e de lá subir a Serra da Careta até o Pico do Chapéu, atravessar a Serra da chapada e alcançar a Serra do Papagaio e consequentemente o próprio Pico do Papagaio, a 50 km e três dias de Vargem. Depois desceríamos do pico até a cidade de Aiuruoca e de lá de volta para casa, mas nessa travessia descobriríamos que querer não é poder e os acontecimentos do destino se encarregaria de mudar nossa rota. Foi na minúscula rodoviária que descobrimos que o bairro da vargem ficava a mais de 40 km de Baependi, e para piorar não havia ônibus para lá por causa do feriado, e mesmo em dias comum, só existe um horário por dia. O jeito era tentar uma carona, mas soubemos que seria quase impossível conseguir uma, pois o local é muito isolado e quase ninguém vai para aquelas bandas. Fomos aconselhados a ir até o povoado de São Pedro, distante 18 km e de lá conseguir que alguém nos levasse até o bairro da vargem. Durante a caminhada à São Pedro havia a possibilidade de conseguirmos a tal carona, pois ônibus para lá também não havia. Diante da situação o jeito foi pôr os pés na estrada, e em pouco mais de dez minutos já deixávamos para trás as últimas casas da cidade e adentramos na área rural. Sobre nossas cabeças sobrevoavam os papagaios que davam nome a tal serra que iríamos tentar cruzar no final da nossa travessia. Caminhávamos em ritmo forte. Parávamos apenas para de vez em quando apreciar a paisagem. Vimos também um filhote de uma cobra coral desfilando com desenvoltura no meio da estrada e notamos ainda que seria mais fácil sermos sequestrado por um disco voador, do que conseguirmos uma carona naquela estrada, perdida naquele fim de mundo. Depois de quase três horas de caminhada e com o sol já nos castigando os miolos, resolvemos tomar um banho em uma pequena lagoa de águas limpas que encontramos à beira da estrada. Depois de um banho gelado e de devorar alguns doces, voltamos a caminhar. Subirmos uma estrada muito íngreme, encontramos um dos poucos moradores de alguns sítios à beira do caminho. Perguntamos a ele se a vila de São Pedro estava muito longe. E ele como bom mineiro nos respondeu. “É logo ali”. Levamos mais uma hora e meia para chegar na única mercearia da vila, onde tomamos uma Coca-Cola de um litro, aliás, a garrafa ainda era de vidro, coisa que não existe mais em São Paulo. São Pedro é um minúsculo povoado, com meia dúzia de casas. Vive atualmente do artesanato de bambu, pois com a crise da Parmalat, praticamente a pecuária se extinguiu. Percebemos que carona seria quase impossível, tentamos então conseguir um carro para nos levar até vargem. No povoado só tinham dois fusquinhas, e assim mesmo um não estava disponível, pois estava servindo a comunidade, que tentavam consertar os canos de água que descem da montanha e abastecem as casas. Seu Antônio, o dono do outro fusca nos disse que estava sem gasolina. Comecei a perceber que não seria fácil chegar ao pé da montanha. Foi quando der repente apareceu mais um carro na localidade, mais um fusquinha, é claro. Explicamos a situação para o dono do carro, e ele disse que não podia nos levar, pois tinha que levar sua filha na festa da cidade. Mas se prontificou a ceder um pouco de gasolina para que seu Antônio nos levasse. Empurramos o velho carro do seu Antônio para fora da garagem, pois não queria pegar. Chamar aquele carro de velho é ofender os velhos. O carro é daqueles que você bate uma porta e cai a outra, o assoalho é todo furado, pneu aparecendo o arame, e por aí vai. Colocamos o combustível e seguimos viagem, mas não para vargem e sim para um sítio no pé do Pico do chapéu. Estávamos seguindo a dica de um caboclo que encontramos no caminho. A estrada era horrível, subidas intermináveis e buracos que quase engoliam o carro. Mas o velho fusca não decepcionou, subiu parecendo um jipe. E foi assim que às duas horas da tarde chegamos finalmente ao pé da montanha. Agradecemos ao seu Antônio e pegamos logo a trilha. Passamos por um sítio, aonde tomamos uma água fresca, pegamos algumas informações e seguimos em frente. Olhando de baixo, parecia ser fácil chegar ao topo da montanha. Como na natureza as aparências sempre enganam, o que lá de baixo parecia cerrado, na verdade era uma densa floresta, que tivemos que rasgar no peito. E quando lá chegamos, descobrimos que teríamos que escalar. Cansados, ralados, picados por insetos e arranhados pelos arbustos, agora teríamos que nos pendurar naquele paredão com aquelas mochilas pesadas nas costas. Como não adiantava nada ficar lamentando, tomamos um pouco de água, abastecemos nossos cantis e feito aranhas nos agarramos à parede e fomos escalando em livre, puxando mato, trepando em pedras escorregadias e nos enfiando em fendas perigosas. A temperatura começou a baixar depressa, a neblina começou a fechar o topo da montanha, não podíamos nos demorar muito pois poderíamos acabar ficando presos e teríamos que dormir ali mesmo. Nos apressamos e chegamos logo ao lado de uma solitária formação rochosa, que provavelmente seria o nariz da grande carranca. Em mais dez minutos emergimos ao topo do Pico do chapéu, ponto culminante ali da Serra da Careta com mais ou menos 2030 m de altitude O topo é bem plano, mas o terreno é meio irregular, por isso demoramos um pouco para achar um local bom para acampar. Montamos nossa barraca e tratamos logo de preparar o jantar. Que aliás, não passou de uma mera sopa, enriquecida com um pedaço de língua de porco, já que o Luís fez o favor de tomar toda água do seu cantil, sobrando assim só a água do meu. Foi por isso que optei pela sopa, além de nos alimentar, podia também nos reidratar. E enquanto nossa sopa cozinhava, aproveitei para vestir minha blusa e também para dar uma olhada no meu mapa e já ir tentado adivinhar o caminho que pegaríamos no dia seguinte. Antes das sete da noite eu já tinha me recolhido em meu saco de dormir, foi um dia longo e cansativo e no outro dia teríamos que acordar bem cedo. “Divanei, Divanei, nós vamos cair no abismo, cara “. Com esta frase fui acordado de madrugada pelo Luís, o sujeito estava sonhando e falava dormindo. Voltei a dormir. “Divanei, tem alguma coisa mexendo aí fora “. Desta vez o indivíduo não estava dormindo. Por isso fiquei meio puto. O que ele queria que eu fizesse? Queria que eu me levantasse dali e fosse ver se era uma onça, um urso ou lobisomem rondando nossa barraca? Disse para ele voltar a dormir, pois era só o vento fazendo barulho na barraca e nas panelas. Às cinco da manhã já estávamos de pé, e enquanto esperávamos o sol nascer, tratamos logo de desmontarmos a barraca e arrumarmos as mochilas, pois sabíamos que estávamos umas quatro horas atrasados e tínhamos que tirarmos a diferença apertando nosso passo na trilha. O dia clareou e avistamos de cima da montanha, todos os vales ao redor encobertos por nuvens. Uma visão espetacular, que faz valer qualquer esforço. Quando se está no topo de uma montanha você se sente o dono do seu próprio destino. Parece que somos invencíveis, inatingíveis, deuses de nós mesmo. Nosso próximo passo era descer o pico do chapéu e encontrar a trilha no vale, a trilha que teríamos pego se tivéssemos vindo por Vargem, mas mesmo antes de começar a descer, ouvi uma proposta que me deixou totalmente surpreso. “Divanei, vamos voltar “ Eu sabia que não seria fácil terminar aquela travessia porque estávamos com uma descrição muito rústica e tosca da trilha, mas desistir antes mesmo antes de ter tentado, não fazia parte dos meus planos. Fiquei imaginando qual seria o medo do Luís. Talvez ficar perdido naquele mar de montanhas, talvez não ter forças para terminar a caminhada. São apenas suposições, pois é difícil saber o que se passa na cabeça de alguém numa hora dessa, mesmo sabendo que o meu companheiro de aventuras ainda era debutante na arte de enfrentar desafios incertos. Consegui convence-lo a seguir em frente. Descemos o vale e adentramos na mata, encontramos o riacho descrito, aproveitamos para matar a sede e comer alguma coisa. A trilha estava confusa, as vezes não levava a lugar algum, tivemos que usar muito a intuição de trilheiros para podermos sair dali. Ao saírmos da mata uma coisa não nos agradou muito, havia baixado uma neblina na serra e não avistávamos mais nada, se já estava difícil navegar, agora com a neblina seria quase impossível. Por não ser mais um principiante em trilhas, deduzi que ela passaria logo, e assim que o sol esquentasse ela desapareceria. Acertei na mosca, em meia hora já podíamos avistar toda a beleza do Pico do Chapéu, que havíamos deixado para trás. Depois de subir até uma montanha próxima, pudemos avistar toda a extensão da Serra da Chapada, por onde teríamos que seguir durante todo o dia. A navegação continuava complicada, caminhávamos por dedução, as vezes sem termos certeza se estávamos no caminho certo. Mas era só dar uma olhada no mapa, corrigir a direção e continuar seguindo em frente, navegando, mesmo que às escuras. A possível chuva, o vento, a neblina, os pequenos córregos a serem transpostos, aquela dorzinha nas pernas, a preocupação em achar água para o jantar, o local ideal para o acampamento. É impressionante como as preocupações nos lugares selvagens são tão diferentes das preocupações que temos aqui nas cidades. Na natureza nos sentimos menos fúteis, é lá que conseguimos exercitar nossos sentidos por inteiro. Sentimos os cheiros, prestamos atenção no sol e na lua, escutamos o barulho dos pássaros e da água correndo sobre as pedras, é lá que nossas mãos tocam a terra, é lá que sentimos o gosto pela vida, é lá que resgatamos a essência da liberdade, perdida há muito tempo. A nossa jornada continuou. Perde-se aqui, acha-se ali, até tropeçarmos no fabuloso Rio Piracicaba. Não, esse rio não tem nada a ver com aquele famoso rio, daquela famosa música. Esse rio é de águas cristalinas, exuberante, nasce aqui no alto da serra e desce montanha abaixo em cachoeiras gigantescas. Antes de chegarmos nas cachoeiras paramos em suas margens para comermos algo. Sentamos em frente a um rancho, que parece ter sido construído ali apenas para indicar que o lugar tem um dono, que por sinal deve morar a quilômetros dali. A habitação é rústica, feita de madeira, passa um ar de simplicidade, ao lado da casa despenca uma pequena cachoeirinha e nossa trilha seguiu o leito do rio e em vinte minutos alcançamos a Cachoeira do Estoco. Uma queda d’água com uns 100 metros de desnível. E em mais dez minutos chegamos à espetacular Cachoeira do Juju, que despenca quase em queda livre de uma altura de 130 metros. É de lá da cachoeira que também se avista o gigantesco Morro Bicudo, que contornamos sem perceber sua real altura. Tomamos um belo banho de alguns segundos na cachoeira do Juju, a água estava um pouco fria. Voltamos a confusa trilha e para variar nos perdemos de novo, mas também logo achamos o caminho. Claro que para isso foi preciso cruzar mais um mato no peito. Vencido esse pequeno sacrifício, nosso próximo objetivo era encontrar uma trilha, cuja única descrição que tínhamos era a de seguir para sudeste depois que atravessássemos a mata. E assim fizemos, seguimos para sudeste sem desgrudar o olho da bússola, e depois de meia hora morro a cima, encontramos a tal trilha. Comemorávamos em silêncio cada vez que achávamos o caminho certo. Nossa trilha adentrou na mata cerrada e seguiu plana e gostosa de ser trilhada. Enquanto caminhávamos alegres, uma tempestade caiu sobre nossas cabeças. Saímos da mata e avistamos um pequeno sítio em um vale a beira de uma pequena cachoeira. Casa de madeira, chão de terra batida, fogão à lenha, sem energia elétrica ou qualquer outro aparelho que lembre modernidade. Em volta da casa um pequeno estábulo, uma plantação de milho e alguns bois e cabritos. Não há estradas para se chegar até aqui e as distâncias se contam em dias, dias de caminhada. Encontramos aqui dona Maria e seu sobrinho, um menino de cinco anos. Ao chegarmos à casa fomos recebidos com um balde de café para cada um, o que veio bem a calhar, pois estávamos bem molhados. Ficamos sabendo que o marido de dona Maria estava sendo operado da próstata e por este motivo não se encontrava ali. Dona Maria, 65 anos, fala pouco, nota se uma vergonha em seu rosto, talvez pelo total isolamento. Ela nos disse que morre de medo de ficar ali sozinha. Medo de que? Perguntei eu. “ Medo das onças ” respondeu ela. Ela ainda nos contou que são frequentes os ataques de onças aos cabritos e bezerros. Enquanto eu tentava decifrar mais uma vez o confuso mapa, um dos cabritos, que infelizmente a onça não comeu, teimava em tentar comer a minha mochila. Assim que cessou a chuva, nos despedimos da dona Maria e voltamos à trilha. Atravessamos o riacho no fundo do vale e começamos a subir pela íngreme trilha, que em quinze minutos nos deixou no topo. Meia hora depois chegamos ao mirante, aonde pudemos avistar todo o vale do rio Santo Agostinho. Tínhamos informação de uma trilha perpendicular à trilha principal e realmente a encontramos. Era uma trilha quase toda coberta pela vegetação rasteira, que parecia não levar a lugar algum. Seguimos até uma cerca de arame, conforme a descrição do roteiro. Pulamos o arame e descemos até o vale e demos de cara com o rancho abandonado, o tal Rancho do Rio do Charco. O rancho foi construído para servir de apoio aos viajantes a cavalo que passavam raramente por ali cruzando a serra. Foi ali que encontramos um homem a cavalo, que estava pescando nas águas do riacho. Ele nos levou até o encontro do Rio do Charco com o Rio Santo Agostinho, onde obrigatoriamente teríamos de cruzar e retomar a trilha do outro lado. O rio estava muito cheio devido as fortes chuvas que caiu na parte da manhã. Tentei cruza-lo em vários pontos, mas sem obter qualquer sucesso. Já passava das 02 horas da tarde e nada de achar uma solução para o nosso problema. Foi quando decidi me arriscar e saltar de uma margem para outra, aproveitando uma língua de rocha que se estendia até a metade do rio. O máximo que podia me acontecer era cair na água e ser arrastado pela correnteza, ou quebrar a perna no tronco solto do outro lado do rio. Tomei distância e saltei. Foi um pulo certeiro, mal molhei minhas botas. Quando me preparava para ajudar o Luís a fazer a travessia, ouvi uma frase, que foi dita alto e em bom som. “Divanei, eu quero voltar “. Era o próprio Luís, com uma cara de medo e apreensão, com os olhos esbugalhados, meio que perdido do tempo e no espaço, sem saber o que estaria fazendo ali. Havíamos chegados até ali com muita dificuldade, cansados, estávamos muito, mas desistir quando iríamos cruzar a melhor parte da trilha era de doer. Minha vontade era de seguir em frente, mas percebi que seria impossível. O cara já estava psicologicamente abalado, perdera o tesão pela trilha. Arrastá-lo comigo seria perigoso. A melhor decisão seria mesmo voltar, a montanha está ali a milhões de anos e não iria a lugar algum, haveria uma nova oportunidade no futuro e arriscar a vida de alguém apenas para satisfazer seu próprio ego seria desumano. Desolado, chateado e um pouco decepcionado, voltamos a encontrar a tal estradinha que seguiria para o sul, rumo a Cidade de Alagoa. Quando digo estrada, é só jeito de falar, pois se trata de uma mera trilha um pouco mais larga e que há vários anos não recebe nenhum veículo, e mal consegue dar passagem à cavalos. Fomos seguindo nossa viagem pelos altos e baixos da serra, cruzando pequenas matas e pequenos riachos de águas transparentes. O lugar era bonito, mas como eu estava um pouco desanimado por ter abandonado a trilha, pouco curti. O que eu queria naquele momento era arrumar um lugar para tomar um banho e comer uma comida quente. Finalmente, depois de penosa caminhada de quase 05 horas chegamos ao vale que dava acesso a cidadezinha, e em alguns minutos chegamos ao nosso destino. Alugamos um quarto em uma pensão e comemos uma maravilhosa comida mineira. Dormimos como poucas vezes havíamos dormidos em nossas vidas. Alagoa é uma minúscula cidade, praticamente um vilarejo. Meia dúzia de ruas e não mais que isso. Seu nome vem de uma grande lagoa que existia tempos atrás no alto da cidade e que hoje também não existe mais. Em volta, vária montanhas dão um charme todo especial ao lugar, mas sem dúvida alguma sua maior atração é sua gente. Povo hospitaleiro, cordial, e que tratam as pessoas de fora como se fossem da sua própria família. Poucos foram os lugares por onde passei, nas viagens que já fiz, e que eu encontrei seres humanos tão fabulosos e maravilhosos. Se eu tivesse passado por estas serras distantes e beleza nenhuma tivesse encontrado, só o contato com estes últimos representantes da verdadeira espécie humana, a viagem já teria valido a pena. Acordamos pela manhã renovados, e fomos logo tentar saber o horário do ônibus para Itamonte, cidade a 40 km de Alagoa. Descobrimos que neste lugar distante de tudo só existe ônibus uma vez por dia, e hoje, domingo, ele sairia as 13:30 horas. O jeito foi dar uma volta na cidade atrás de outro meio de transporte. Depois de andarmos muito por quase dois minutos, chegamos na saída da cidade, ou entrada, e conseguimos uma carona até a cidade de Itamonte. A estrada que liga as duas cidades é de terra e toda esburacada, e o trajeto leva mais de duas horas. No caminho descobrimos que o senhor que nos deu a carona, morava em Cajamar, perto da capital paulista. Acho que por ter ido com a nossa cara ele nos ofereceu mais uma carona até São Paulo. E depois de umas cinco horas de viagem adentramos na quarta maior cidade do mundo. Ele nos deixou em frente à rodoviária, local aonde embarcamos direto para Sumaré, de volta para casa. Desci na rodovia Anhanguera, que fica a 2 km de casa, e enquanto caminhava ia pensando em tudo que havíamos passado. Eu não estava mais frustrado, havia aprendido uma lição, saber desistir na hora certa não era sinal de fracasso, mas sim uma virtude. Aprendi a respeitar o limite dos outros, aprendi que não se pode decidir tudo sozinho e que a opinião dos outros também conta, afinal de contas, como já disse, a trilha sempre vai estar lá e sempre haverá uma nova oportunidade. Divanei Goes de Paula- abril/2004 OBS: Um mês depois voltei para tentar concluir a travessia por toda a Serra do Papagaio, atravessei o Rio do charco e subimos ao espigão da Serra, mas ao chegarmos ao Retiro dos Pedros fomos apanhados pelo mal tempo e sem enchergar um palmo à frente do nariz , ficamos vagando sem rumo na serração e fomos obrigados a navegar com bússola até que um dia e meio depois atingímos o próprio PICO DO PAPAGAIO, mas na sua parte inferior, aonde encontramos uma trilha que nos devolveu à civilização , no Vale do Matutu. Hoje cruzar essas serras tornou-se brincadeirinha de criança, novas tecnologias, mapas de satélites, cartas modernas e gps ao alcanse de todos.
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