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Olá a todos,

 

Publico aqui, para conhecimento de todos, um email de uma amiga que acaba de chegar em Cuzco depois de dois dias de sufoco em Aguas Calientes. O conselho dela é que: "não façam o mesmo que eu fiz". Mas aguardar o helicoptero pode ser mais sufocante, até por que tem 2000 pessoas ilhadas no Machu Pichu e até agora apenas 75 sairam de lá, resgatadas pela Defesa Civil do Peru.

Bom, leiam abaixo e entendam.

 

texto de Julia Zuza:

 

---------- Mensagem encaminhada ----------

De: Júlia Parreira

Data: 27 de janeiro de 2010 14:10

Assunto: Estou em Cusco sa e salva

 

 

Ei pessoas,

 

nao sei que notícias andam chegando ao Brasil sobre Machupicchu, mas a situacao está realmente caótica. Fui pra lá num dia de chiva fina e neblina, num trem super bacana. Conheci a cidade perdida que é maravilhosa, parece algo de mentira aquelas construcoes feitas com tanta perfeicao no alto de uma montanha. Subi no Waynapicchu e nem precisei de mascar folha de coca ou tomar o chá. Lá pelo meio dia a neblina deu uma tregua e pude ver Machupicchu direitinho. Maravilhoso! As montanhas ao lado sao uma coisa de chorar, me deliciei. As 16h comecou a chover e todos descemos pra Águas Calientes. E aí comecou a novela.

 

Para chegar lá só há uma forma, q é pelo trem. Estava temporariamente impedida por causa da chuva, pois a água cobriu os trilhos. As pessoas estavam ainda dentro dos trens esperando pra sair, mas as 19h foi comunicado q os trens só sairiam amanha. Eu fiquei junto com uma costa riquenha q conheci em Machupicchu sozinha e dormimos essa noite dentro do trem. Havia uns 2000 turistas ilhados e muitos dormiram na própria estacao. Os que saíram pra dormir em pousadas no outro dia de manha nao podiam entrar na estacao e a gente nao podia sair. Dormimos no vagao e havia mais 3 mineiros lá. Nao nos deram comida nem água, minha sorte é q eu tinha levado muito lanche.

 

No outro dia de manha, nao nos disseram nada e aí comecou a mobilizacao dos argentinos. Nossos hermanos fizeram barulho e um senhor virou o "organizador do motim".

Fizeram reivindicacoes como comida pra gente, ligacoes pras embaixadas de cada país, remédios pra quem precisasse e coisas do tipo. Eles sao chatos, reclamoes e barulhentos, mas por causa disso acho q a situacao melhorou. Nos serviram lanches e vi onde estava a comunidade brasileira. Dei meu nome pro Alexandre ligar pra embaixada brasileira. Interessante ver todos unidos independente da língua falada tentando sair do aperto, tentando se ajudar. Depois fomos colocados de novo nos trens mas nao saimos. Veio entao a notícia q mandariam helicópteros pra nos retirar dali. O rio estava furioso, violento. Fomos entao pruma espécie de campo de futebol de lá e admito q estava achando até intereessante sair de Machupicchu com a ajuda do exército peruano. Fora q seria a primeira vez q eu iria andar de helicóptero. Mas nao foi bem assim.

 

Nos avisaram q quem sairia primeiro seriam mulheres, criancas, idosos e doentes e aí me senti no Ensaio sobre a Cegueira. Peruanos falando com os responsáveis pelo trem que deviam ter prioridade pois eram da nacao, aquele tanto de gente sentada no chao sobre o sol (tirei fotos), todo mundo sem saber o q fazer direito e meio perdido. Avisam entao q somente 1- eu disse 1!!! helicóptero seria mandando pra retirar as pessoas aquele dia e saí com a Damaris da Costa Rica do campo. Anadamos por Águas Calientes, mandei email, liguei pra família e vimos o tal helicóptero chegar. Nessa altura já havia barracas improvisadas na praca, como na guerra. Eita!

 

Já tinha dado pra ver q nao iríamos sair de lá tao cedo e o meu voo pro Brasil era no dia seguinte. Sentamos num banquinho e vi uns amigos da Damaris q estavam saindo do campo de futebol e disse pra ela ir lá conversar com eles e ver o q tinha acontecido. Eu e minha boca grande... Por causa dessa ideia passei o maior sufoco da minha vida.

Ela foi lá e eles disseram q apenas 9 pessoas tinham sido recolhidas e no dia seguinte mandariam mais helicópteros. Queriam ir a pé pra Santa Teresa, pois tinha chegado andando até Águas Calientes. Iam ver se dava pra ir, pois havia água no caminho. Como eu tava preocupada em perder o voo e pensando q passaria dias em Águas Calientes, topei a parada. Fomos nós 4 nos aventurar pelo tal caminho.

 

O caminho seria passar pelos trilhos do trem e depois uma estrada até a cidade de Santa Teresa, cerca de 3 h caminhando. Blz. Comecamos a andar e nos disseram q em certos trechos a água vinha até o meio da perna. Uns diziam q era até a canela, outros até a cintura, mas fomos caminhando. Até q a água apareceu. Galera, o rio tinha encontrado com os trilhos, mas disseram q dava pra passar. O Raul, um peruano e único homem q tava com a gente (eu, e mais 2 da Costa Rica) ia na frente ver se dava pé e cmo deu, fomos andando com nossos bastoes. A água em certos momentos vinha até o meio da perna msm, todo mundo andando com medo e segurando firme pra passar. Foram 2 momentos com água assim por cerca de uns 50 metros. Punk rock total. E eu pensando q o pior tinha passado. Depois disso e feliz por ter vencido essa barreira, tinha a parte da estrada. E detalhe: a caminhada comecou as 4 da tarde e já deviam ser umas 7 da noite, quase escurecendo.

 

De novo nos falaram q a estrada estava em muitos pedacos bem perigosa pq a chuva tinha derrubado o caminho. Do lado dela, o rio Urubamba com toda sua forca e destruicao.Nao tínhamos lanterna e falaram pra gente caminhar bem próximo do canto, pra nao acontecer nada. Qdo eu vi q a gente teria q caminhar mais cerca de 2h e meia, numa estrada q nao existia, sem lanterna e com o rio ali do lado, pensei q nao ia dar pé. Nunca senti tanto medo na minha vida. Rezei muito e comeco a desconfiar q Deus existe msm. Obviamente nao encontramos com ninguém fazendo o tal trajeto. Teve uma hora q estávamos passando por um lado e ouvimos e vimos a terra do outro lado sendo engolida pela água do rio, uma coisa terrível. Depois tivemos q descer um barranco segurando nuns galhos e eu pensando cmo faríamos qdo definitivamente escurecesse.

 

Por causa do medo enorme q eu tava sentindo, eu caminhava na frente de todo mundo e nao parei pra tomar água nem comer. Caminhei cmo nunca na minha vida e parei só pra esperar os 3 descansarem. Pra quem nao pratica nenhum esporte, tava com um tenis errado pra caminhada ainda por cima molhado e sem meia com 2 mochilas e sem comer direito há quase 1 dia, eu me senti uma maratonista do primeira linha. Pelo caminho do lado da mata uns vagalumes e só a luz do céu msm. Todo mundo caminhando em silencio e eu entao so conseguia caminhar e caminhar. Meu medo era cair a noite e ficar preso na estrada na chuva- tinha comecado uma chuva fininha- e sei lá o q podia acontecer. Sei q conseguimos caminhar até Santa Teresa e chegamos lá simplismente as 9 e meia da noite. Ninguém se machucou ou se feriu. Qdo vi as luzes da cidade foi um dos momentos mais felizes da minha vida e agradeci demais. Sentamos, comemos e fomos dormir. Nao dava msm pra chegar a Cusco de madrugada. Só fui sentir dor qdo sentei e vi q uma feridinha q eu tinha no pé tinha atritado demais com o tenis e virado quase uma queimadura. 2 bolhas no calcanhar e no mindinho e um cansaco gigante, além de dor no tornozelo direito. Mas isso nem se compara ao q eu passei na estrada de noite caminhando.

 

Acordamos e pegamos uma van pra Santa Maria e de lá um onibus pra Ollantaytambo e depois uma van pra Cusco. Muito desmoronamento na estrada, algumas pontes impedidas, onibus cheios. Mas eu tava bem e iria chegar em Cusco, entao nada disso importava. De Ollantaytambo pra Cusco descemos pois um pedaco da estrada tava alagado e vimos combois de turistas chegando. Disseram q só uns 200 foram resgatados.

Eu e Damaris juntas, firmes e fortes. O outro casal ficou em Ollantaytambo pq a moca tinha machucado o pé na caminhada e tava com o tornozelo bem inchado. Cheguei em Cusco cmo uma fugitiva da guerra, suja, mancando, com sono e fome. Mas cheguei!!!!!!!!!

 

Hj vou ver se consigo remarcar meu voo e pegar o dinheiro da passagem do trem no trajeto da volta de Machupicchui q nao fizemos. A empresa Inca Rail dos trens foi super prestativa e nos deu um bom suporte, recomendo a quem vier aqui (sem chuvas pelamordedeus) ir com eles. Servico primeira linha.

 

E eu q nao sou fa de esportes de aventura... rs Vou virar triatleta em breve!!!

Mas sem ser corridas no meio da mata de noite por favor! Quero saber dos brasileiros q conheci aqui q fizeram a trilha inca. Soube q 4 pessoas (3 argentinos e 1 peruano) morreram na trilha e fiquei preocupada.

 

Enfim, é isso. Aventura total! Inesquecível.

 

bjos

  • Membros de Honra
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Parabéns para a sua amiga.

 

Mesmo com o perigo da trilha e a irresponsabilidade de fazer o trajeto adentrando a noite sem no mínimo 1 lanterna, esses aí tiveram muita coragem. Saber se virar frente à imprevistos e não ficar sempre dependendo dos outros é uma atitude que eu tiro o chapéu.

 

História para contar pro resto da vida.

 

Intééé

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