No primeiro post sobre o Marrocos, um pouco dos perrengues e surpresas que encaramos desde a travessia do Estreito de Gibraltar até a cidade imperial de Fez.
Entrada do porto de Algeciras, Espanha
Fez, quinta-feira, 3 de novembro de 2016 (7° dia).
Pegamos o ônibus em Málaga, na Espanha, pontualmente e dentro do período previsto desembarcamos na cidade portuária de Algeciras, de onde partiria o ferry boat que nos levaria até o Marrocos. A travessia feita com a empresa espanhola Baleària, além de ter sido a opção mais econômica (sem levar em conta o cardápio a bordo que é “uma facada”), foi bem tranquila e em menos de duas horas já atracávamos no porto de Tanger Med.
Poeta López Anglada, o ferry que nos levaria (teoricamente) a Tânger
Panorama de Algeciras: a cidade portuária não tem muitos atrativos
Chegada ao porto Tanger Med
Atravessamos o Estreito de Gibraltar sem grandes problemas, mas bastou pisar em solo marroquino para coisas insólitas começarem a acontecer. Fabricio quase foi barrado na imigração por um agente mal-encarado que cismou com a mochila dele (minha cara de árabe me fez passar batido pela primeira vez), a comunicação era difícil (a maioria das pessoas só fala árabe ou francês) e descobrimos depois de algum tempo que o PORTO de Tanger Med ficava a quase uma hora de distância da CIDADE de Tânger, de onde deveríamos pegar um trem para Fez. Depois de muita mímica de um motorista insistente, pegamos um táxi compartilhado com mais duas pessoas e fomos escutando calorosas conversas em árabe durante todo o trajeto (Ainda me pergunto qual era a pauta daquela conversa. Política, certamente).
Motorista do nosso táxi compartilhado e a conversa animada. Pena que não entendíamos nada!
Na Estação de Tânger perdemos o trem para Fez por cinco minutos (cinco malditos minutos!) e descobrimos que o próximo só passaria dali a quatro horas! Pegamos outro táxi com um motorista gente boa chamado Youssef até o terminal da empresa CTM para pegarmos um ônibus mais “turístico”. Segundo Youssef os ônibus tradicionais da rodoviária, apesar de baratos, são antigos e pouco confiáveis.
Estação Ferroviária de Tânger
No intervalo entre a chegada no terminal e a espera do ônibus (dali a três horas…), fomos beber um chá de hortelã (hábito adquirido em Granada) e conhecemos um figuraça chamado Mustaf que falava árabe, francês e espanhol (só que tudo ao mesmo tempo!). Para passar o tempo, Mustaf, que era careca e tinha um bigode respeitável, nos levou até seu carro (que parecia algo mais ou menos da década de 30) e nos mostrou uma penca de fotos antigas de sua família em todos os pontos maravilhosos do Marrocos: Chefchaouen, Fez, Marrakech e mais um monte de lugares que não fazíamos ideia de onde ficava. “Vocês tem que conhecer!” Mal sabia ele que tínhamos apenas cinco dias e estávamos correndo contra o relógio.
Tradicional chá de hortelã
Mustaf me viu fumando um cigarro e lançou aquele olhar internacional de desaprovação: “Isso faz mal, meu filho! Bom mesmo é isso aqui!” E tirou de dentro do porta luvas um cachimbo fino de uns trinta centímetros (que provavelmente estava recheado com aquela famosa erva marroquina). “Querem experimentar?” Pô, Mustaf, se não fosse o medo ser sequestrado, ter meus órgãos retirados e vendidos no mercado negro (além claro, do risco de perder o ônibus) eu até iria… (Risos)
No terminal da empresa (não é uma rodoviária, é como se fosse a garagem de uma única empresa) tivemos o primeiro contato com o tradicional banheiro marroquino (é, aquele mesmo com um furo no chão) e com os oratórios muçulmanos reservados para as cinco orações diárias.
Um banheiro que exige uma ótima mira!
Depois de ter passado duas das cinco horas de viagem até Fez, o super recomendado ônibus “turístico” resolveu pifar. Sim, no meio do nada, já anoitecendo e sem ninguém que falasse, pelo menos, inglês! A medida em que as pessoas iam descendo do ônibus para checar o que estava havendo, a tensão aumentava… Discussões em árabe, o motorista atrás do ônibus falando no celular, curiosos parando para ver o que tinha acontecido, uma senhora esbravejava com os outros passageiros, ameaçava começar a chover, uma verdadeira cilada! Vendo que não éramos dali, alguns passageiros tentaram uma comunicação (Como eu me arrependo de não ter me dedicado a aprender decentemente francês). Até que alguém arriscou algumas palavras em inglês e (ufa!) estávamos salvos! Pelo que entendi, demoraria trinta minutos para a chegada do próximo ônibus. Por fim, ficamos mais DUAS HORAS esperando…
As estradas marroquinas
Ônibus quebrado no meio do nada!
O motorista pedindo socorro
Chegamos à Fez depois da meia-noite e descobrimos, com a ajuda de nossos solícitos novos amigos marroquinos do ônibus que nosso hostel estava fechado. Sim, isso tudo inacreditavelmente estava acontecendo no mesmo dia! Eles nos colocaram em um táxi e indicaram ao motorista que nos deixasse em um hotel bem localizado e barato.
Chegamos ao Hotel National quase uma hora da manhã e fomos recebidos pelo simpático Mohammed, o recepcionista noturno. O ambiente exterior era hostil e amedrontador àquela hora mas, por total falta de opção, fechamos uma noite por 7,5 euros cada. Que dia!
Hotel National: nosso muquifo favorito!
4 aprendizados dessa história:
- O porto de Tanger Med NÃO fica no centro de Tânger! Mas a paisagem costeira do caminho é belíssima.
- Por que cargas d’água você vai querer viajar de ônibus no Marrocos se os trens atendem de modo eficiente a quase todo o território? Não, não faça isso! Vá de trem! Compre as passagens antes e em hipótese alguma se atrase. Conselho dado.
- Como assim você vai para um país onde a primeira língua é árabe, a segunda é francês e você não sabe pedir socorro em nenhuma das duas?! Amiguinhos, aprendam pelo menos o básico (é sério!).
- Marroquinos de uma forma geral são carrancudos e desconfiados, mas no fundo são todos boa praça. Se não fossem nossos amigos do ônibus, passaríamos por maus bocados procurando um hostel fechado, tarde da noite, no meio da medina.
Esse é o primeiro post sobre o Marrocos, em breve mais detalhes sobre Fez e Marrakech!
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