Por Fábio Okipney
Sabbath
O termo período sabático vem de “Sabbath”, sabá ou sabat, o dia semanal de descanso que é observado em diversas crenças. O termo deriva do hebraico shabat, “cessar”, que foi pela primeira vez usado no relato bíblico do sétimo dia da Criação. Nos últimos anos o termo entrou no mundo corporativo significando uma “pausa na carreira” em pró do atingimento de algum objetivo de cunho pessoal. Muitas pessoas entram em um “período sabático” para uma experiência no exterior, seja aprendendo um novo idioma, seja fazendo um curso de especialização ou MBA. Outras pessoas tiram um tempo sabático para se dedicarem aos filhos, a algum parente que demanda atenção especial ou mesmo para refletirem sobre a vida e suas prioridades. Recentemente vem crescendo o número de pessoas que tiram um tempo sabático para uma viagem a destinos pouco tradicionais e exóticos, e este foi o meu caso.
Há tempos eu planejava fazer um período sabático para conhecer alguns países que estavam na minha lista, mas que por questões de distância e tempo eram pouco práticos de visitar. No final do ano de 2017 tive a oportunidade que tanto esperava. Fiz uma viagem de seis meses e conheci dez países entre Ásia, Oriente Médio e Europa. O estilo da minha viagem foi o de “mochileiro”. Saí do Brasil com apenas bagagem de mão, um par te tênis, um par de Havaianas, algumas peças de roupas e muita disposição para enfrentar o desconhecido. Meu primeiro destino foi Bangkok, na Tailândia. Após mais de 32 horas entre voos e longas conexões finalmente cheguei à “Terra dos Sorrisos”, como é conhecido esse lindo país de população super simpática. Os outros países que visitei foram Malásia, Singapura, Índia, Irã, Turquia, Ucrânia, Polônia, República Tcheca e Alemanha.
Para ficar dentro do meu orçamento, eu dormia sobretudo em albergues de juventude, também chamados de “hostels”, como também na casa de desconhecidos, através da comunidade internacional de viajantes denominada Couchsurfing. Estas escolhas não apenas me permitiram economizar durante a viagem, mas também conhecer inúmeras pessoas de diferentes países do mundo, além de vivenciar o modo de vida dos habitantes dos países pelos quais eu passei.
A seguir listo as principais lições aprendidas durante meu semestre sabático, e que podem ser aplicados no mundo corporativo.
1- Planejamento
Para iniciar uma viagem longa e com diversos destinos diferentes como a que fiz, é necessário estudar sobre os lugares onde se deseja visitar. O país exige visto para brasileiros? Qual é a moeda local e cotação em relação ao Real? Quanto em média eu espero gastar nesse país? Onde ficar e por quanto tempo? Qual é o clima da região durante minha estadia? É preciso também pesquisar passagens aéreas, buscar bons preços de hospedagens, meios de locomoção dentro do país, entre outros. Trata-se de um bom exercício de planejamento, uma das funções principais do administrador, o que certamente é fundamental no mundo dos negócios.
2- Tomada de decisões
O mundo é enorme e é virtualmente impossível conhecer tudo durante uma vida. Existem possibilidades infinitas de lugares a se visitar. A Tailândia, por exemplo, possui centenas de ilhas, e decidir quais delas conhecer pode ser uma tarefa difícil. Escolher um albergue em uma região da que facilite o acesso ao transporte público ou ficar na parte mais badalada da cidade? Quantos dias ficar em determinado país? Comprar uma passagem com meses de antecedência ou deixar para comprar em cima da hora? Pode parecer brincadeira, mas viajar a longo prazo exige um grande esforço mental no quesito tomada de decisões, o que pode levar a algum tipo de estresse e desconforto. Durante seis meses na estrada, eu precisava quase que diariamente tomar algum tipo de decisão, desde de qual ponto turístico visitar, quanto tempo ficar em determinada cidade, qual albergue escolher, entre outros. Vale também contar com a opinião de outros viajantes, o que ajuda muito nessas escolhas. No mundo corporativo não é diferente. Muitas vezes precisamos tomar decisões importantes, e ouvir o que os outros têm a dizer pode facilitar muito esse processo.
3- Gestão de recursos
Como disse no começo desse artigo, eu viajei como “mochileiro” durante seis meses, o que significa fazer escolhas econômicas que caibam dentro de um orçamento x. Para começar, eu precisei levar apenas o essencial comigo em bagagem de mão, pois despachar malas em viagens aéreas pode duplicar o preço da passagem. Meia dúzia de camisetas, um par de tênis, um par de Havaianas e mais algumas mudas de roupas foram mais do que suficientes para viver durante esse período. Ao longo do tempo, eu precisei comprar novos artigos, mas a cada compra eu tinha de me desfazer de algo que eu já possuía. A questão não era apenas financeira, mas também o peso da bagagem. Precisei também praticar o desapego de coisas materiais, como me desfazer de algumas roupas que eu gostava, mas que não estavam de acordo com o clima local. Dinheiro e tempo também são recursos finitos e que precisam ser administrados de perto. É muito fácil perder o controle dos gastos quando estamos empolgados em uma viagem. Existem inúmeros atrativos que dragam o nosso dinheiro em um piscar de olhos. Não é porque um determinado ponto turístico é muito visitado que ele é necessariamente interessante para mim. Às vezes perdemos um dia para visitar uma atração que na verdade é muito parecida com várias outras que já vimos. É o famoso “mais do mesmo”. Gastamos dois recursos valiosos, tempo e dinheiro, com algo que não agregou. Nas empresas precisamos deixar de lado aquilo que não é realmente necessário ou urgente para focar nas prioridades e otimizar a utilização dos recursos. Time is Money, como diz o velho ditado em inglês.
4- Sair da zona de conforto
Mochilar dentro de um orçamento é um ótimo exercício para quem está cansado de uma rotina e quer uma mudança. No entanto, apesar do glamour e das lindas fotos no Instagram, é necessário estar aberto a novas experiências, as quais podem ser bastante desconfortáveis em certos aspectos. Compartilhar um quarto de 12 camas com estranhos, andar em meios de transporte precários em países subdesenvolvidos, mudar a dieta alimentar, ficar doente, se perder e não encontrar ninguém que fale inglês dar informações, carregar mochila pesada nas costas, saudade da família e dos amigos são apenas algumas das muitas situações que levam muitas pessoas a desistir. A rápida adaptabilidade é muito importante, sobretudo quando visitamos países com características tão diferentes uns dos outros. A Tailândia é majoritariamente budista, a Malásia, sua vizinha, muçulmana. Na Índia predomina o Hinduísmo, na Ucrânia o Cristianismo Ortodoxo e na Polônia o Catolicismo. A religião influencia bastante nos hábitos do país, desde vestimentas até alimentação. No Irã, homens não podem usar bermuda em público e as mulheres devem cobrir a cabeça com um lenço, inclusive turistas. É preciso ser bastante flexível para os mais diversos tipos de situações. As empresas também necessitam de pessoas que sejam flexíveis. Quantas vezes vi no mundo corporativo pessoas em disputa por causa de sua cadeira preferida? Ou mesmo ficarem chateadas porque foram mudadas de lugar, ou porque mudaram sua carteira de clientes. Cada vez mais é preciso estar disposto a sair da zona de conforto. Isso traz crescimento não apenas profissional, como também pessoal.
5- Praticar idiomas
Trata-se de uma surpresa das mais agradáveis da viagem, fazer novos amigos dos mais diferentes países do mundo. O que quase todos têm em comum? O inglês como segunda ou primeira língua. Para se aventurar no mundo, não é necessário conhecer o idioma de cada país por onde vamos passar, mas é muito importante possuir um nível razoável de inglês, pois é a língua internacional do viajante. Minha experiência diz que a grande maioria dos backpackers possui um nível muito bom de inglês, isso quando eles não são falantes nativos. A partir do momento que sai do Brasil o inglês se tornou o meu idioma principal. Por seis meses eu falava inglês diariamente, pois era forçado a tal. Além do mais, também conheci diversos espanhóis e franceses, com os quais eu falava em suas línguas nativas. Quem busca praticar alemão também irá encontrar uma quantidade enorme de alemães viajantes. Em um mundo globalizado, cada vez mais as empresas precisam de pessoas proficientes não apenas em inglês, como também em outras línguas. Mochilar irá te ajudar a aprimorar vários idiomas.
6- Quebrar paradigmas
O que vem à sua mente quando ouve falar sobre o Irã? Arma nuclear, guerra e terrorismo? Apesar das tensões políticas e da ditadura religiosa que vigora no país desde 1979, esse foi um dos países mais incríveis que eu já visitei. O povo iraniano tem uma cultura milenar de hospitalidade e faz de tudo para que os viajantes se sintam bem-vindos. Além disso, o país é muito seguro, bonito, bem cuidado e possui uma ótima infraestrutura. Conheci pessoas lá que marcaram minha vida. A Tailândia é um país budista, correto? Sim, mas o sul do país é muçulmano e ultraconservador. Na Alemanha, apesar de ser um país desenvolvido e a quarta economia do mundo, muitos estabelecimentos só aceitam pagamento em espécie. Em sua vizinha, Polônia, menos desenvolvida, vários estabelecimentos aceitam pagamento através da tecnologia NFC. Esses são apenas alguns exemplos que mudam a maneira como vemos o mundo. Devemos aprender a julgar não pelas aparências ou pela fama, mas analisar as circunstâncias como um todo. Um cliente pode parecer possuir um baixo potencial comercial, mas uma vez entendendo suas necessidades podem se tornar o principal cliente de uma carteira. Algum colega de trabalho pode não ser bem-querido por parte da equipe, mas dando-se a chance de conhece-lo(a) melhor pode ser um dos membros mais eficientes do time.
7- Flexibilidade
Confesso que não gosto de fazer as coisas no improviso. Gosto de planejar minhas viagens com meses de antecedência, pesquisar hospedagem, passagens aéreas etc. No entanto, para uma viagem de longo prazo o excesso de programação e a rigidez podem tornar-se uma armadilha. Meus três primeiros meses de viagem já estavam programados antes de eu sair do Brasil. Eu havia comprado algumas passagens aéreas e feito reservas de hospedagens. Acabei mudando meus planos para adaptar meu roteiro após o início da viagem. Ainda sobre flexibilidade, através do Couchsurfing dormi em diferentes tipos de superfícies que me foram oferecidas, as quais nem sempre eram muito confortáveis, mas valeu muito a pena estar ali para provar a hospitalidade e aprender como vivem as pessoas naquele país. Às vezes é preciso passar por um pouco de desconforto para um bem maior. O mesmo se aplica no mundo corporativo. A rigidez pode ser um deflator no desenvolvimento profissional e no atingimento das metas.
8- Agir sob estresse
Pode ocorrer de passamos por surpresas nada agradáveis quando estamos viajando. O trem noturno pode atrasar por horas, a acomodação reservada pode ter sido cancelada pela propriedade. Perder-se em um lugar e não encontrar ninguém para ajudar. O segredo é não entrar em pânico, respirar e pensar em alternativas, afinal de contas ficar nervoso não irá resolver nada. Passei por várias situações de estresse durante esses seis meses, até mesmo situações que me senti ameaçado ou em risco, sem ninguém para me socorrer. No final consegui pensar em alguma alternativa e tudo deu certo. Saber trabalhar sob estresse é uma das características mais buscadas no mundo corporativo nos dias atuais. Quantas vezes o deadline está apertado, o cliente demandando, e o projeto atrasado? São tipos de situações corriqueiras no mundo dos negócios.
9- Tomar riscos calculados
Durante esses seis meses de viagem participei ativamente no Couchsurfing, onde podemos nos hospedar na casa de outros membros da comunidade ou mesmo apenas conhecer pessoas que irão nos apresentar sua cidade. Algumas vezes senti que a oferta não era de muita boa-fé, e outras vezes confiei na pessoa mesmo sem possuir referências. Em todo caso, é preciso sempre ter prudência quando estamos em território desconhecido. Carteira e passaporte estavam sempre comigo em todos os momentos, ou quando havia um locker no hostel os deixavam ali, desde que com meu cadeado. Felizmente nada de mal me aconteceu. Em algumas cidades não se deve falar com desconhecidos que se aproximam do nada nas ruas, pois é muito provável que seja algum tipo de golpe. Ser capaz de calcular o risco do negócio é de extrema importância no mundo corporativo.
10- Networking
Para quem é tímido, o que não é o meu caso, viajar como mochileiro é uma ótima oportunidade para se tornar mais desinibido e comunicativo. A situação nos força a conhecer novas pessoas, seja para visitar juntos novos pontos turísticos, seja para praticar idiomas ou conhecer novas culturas. Operíodo sabáticos viajantes são em quase sua totalidade abertos a novas amizades. Em seis meses de viagem conheci centenas de pessoas dos mais diferentes países do mundo e dos mais diferentes estilos de vida, algumas das quais se tornaram minhas amigas. Nas empresas é muito importante o trabalho em equipe. É importante criar um ponto de conexão com os colegas de trabalho para poder desenvolver em harmonia projetos, assim como conhecer o seu cliente para estabelecer parcerias comerciais.
11- Aprender diariamente
Quando viajamos, estamos sempre aprendendo algo novo, seja uma nova palavra no idioma local, seja uma informação cultural, um fato histórico, entre outros. Isso enriquece grandemente nosso conhecimento e visão de mundo. Semelhantemente, a atualização profissional constante é muito importante. Ler um blog da área, assistir a palestras, seminários e ler livros relacionados com a atividade ajudam a expandir as ideias e crescer no conhecimento.
12- Lidar com frustrações
Aquele ponto turístico lindo nas fotos não é tão maravilhoso quando o visitamos pessoalmente. Chove no único dia disponível para ir àquela praia. O trem atrasa horas e horas. Perder um voo. Pagar caro para algo que não vale o preço. Esses pequenos exemplos de coisas que acontecem durante uma viagem podem arruinar temporariamente o humor de qualquer um. É importante ter em mente quem nem sempre as coisas acontecem conforme o planejado, e estar aberto a pensar em alternativas é fundamental. Perdeu o voo? Talvez seja possível pegar um ônibus. Está chovendo? Passar o dia lendo um pode ser uma boa opção, até mesmo para descansar o corpo e a mente. No mundo corporativo também temos que lidar com diversas frustrações e pensar em alternativas. Aquele cliente deixou de fazer negócios? Vamos atrás de uma reconquista. Pode ser também a hora de buscar novas parcerias comerciais. O projeto falhou? Vamos recomeçar. Nem tudo está perdido, mas também ninguém disse que seria fácil.
Confira (aqui) o “A vida que vale a pensa ser vivida”, texto no qual eu falo um pouco sobre como começou minha paixão por viajar e como comecei a viajar.
Mais no https://www.instagram.com/budgetraveler/
Meu instagram agora é @budgetraveler
Oi Fábio! Vamos atualizar no post 🙂
É uma conta privada né? Só vê as fotos quem está logado…
Abraço!
Eu mudei meu Instagram para @budgetraveler
Esse endereço de insta não existe! Adoraria entrar em contato com ele!!
O melhor artigo que já vi relacionando o mundo corporativo e a vida pessoal, mostrando que a empresa é mais humana do que se imagina. Vou compartilhar com toda certeza…foi brilhante!