Tibagi: Trilhas, rapel e uma viagem ao centro da terra no Guartelá

Tibagi, no interior do Paraná, é a modesta guardiã de ricas histórias, lendas misteriosas e de uma das melhores aventuras do mundo.

A gente costuma admirar o longínquo, “a grama do vizinho”. A gente costuma, porque somos preguiçosos e acomodados por natureza, a deixar pra depois as coisas que nos pertencem mais, as que estão do nosso lado e “não vemos”. É quase cultural assim como o carinho de mãe que desprezamos por tantas e tantas vezes, seja por vergonha pública ou por mera “falta de tempo” pra velha.

A verdade é que a ingratidão crônica nasce como uma flor feia em cada um de nós. E enquanto regamos, dando vida a esse jardim pálido, matamos nossas próprias raízes. Quando queremos dizer que algo é muito bom, dizemos: “isso é padrão gringo”. Quando pensamos em Carnaval, sonhamos com Salvador ou com o Rio de Janeiro; Carnaval em Tibagi? Onde diabos fica Tibagi? Aventura é no Atacama, na Nova Zelândia; arvorismo em Tibagi? Cara, onde fica Tibagi?

Tibagi

Senta aqui, meu jovem. Eu vou lhe contar.

A 200 quilômetros de Curitiba (PR), na região que literalmente rasga os Campos Gerais, está o portal de entrada do Parque Estadual do Guartelá. É a morada de uma garganta gigantesca que se estende por 30km e exibe penhascos com até 450 metros de profundidade: o Cânion Guartelá. O sexto mais longo do mundo e o maior do Brasil, morada do Rio Yapó, legado santificado de seus ancestrais indígenas.

Para conhecer esse pedaço lindo do quintal sulista, é preciso apenas ter vontade. A entrada é gratuita, e uma trilha autoguiada (5km), muito bem conservada e com vários pontos de água potável, leva o coração aventureiro pelas entranhas do parque que é tela para inscrições rupestres deixadas ali. Aproximadamente uma hora caminhando por quedas d’água e panelões naturais para banho, até o ponto final no púlpito rochoso de onde se pode admirar a cachoeira que escorre rente à “Ponte de Pedra” construída pela mãe de todas as engenharias: a Natureza.

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A mais que obrigatória PARADA DO GUARTELÁ

Às margens da estrada, de frente para o trevo de acesso ao parque, está a Parada do Guartelá. Uma lanchonete que serve almoços rancheiros especiais e, claro, um cardápio que atiça a gula dos exploradores de plantão. Temperos por conta de atividades como rapel, cascading, rafting, trilhas longas, e cavalgadas.

Por lá atendem o simpático casal Fredy e Renata, e seu time sensacional que joga bem na cozinha, com os panelões fervilhantes com cheiro de roça, pilotados por Josefina; e nas cordas bem amarradas pelo instrutor que anda mais pelas paredes que pelo chão, o Piré. Perto dali, seguindo por uma estradinha de barro ao interior do interior, o Camping da Maria, com amplo terreno sombreado por grandes árvores e cascatas no jardim. Mora mal, a Dona Maria. É assim com o agraciado povo de Tibagi.

Rafting no Rio Tibagi

O Rio Tibagi passa entrelaçando a cintura da cidade homônima, suas águas há pouco tempo serviam de palco para o treinamento da Seleção Brasileira de Canoagem. Então, por que não se jogar por ali num barco inflável, remando correnteza abaixo? Foi o que fez conosco a Tibagi Aventuras. Entramos na Kombi preta e partimos sacolejando para encarar as corredeiras, claro, com direito a muita adrenalina e um final apoteótico, deixando o corpo boiar levado pelo leito caramelizado do rio.

Mas era feriadão de Carnaval em Tibagi. O pau estava comendo na praça central. Uma matinê infantil aquecia a chegada da noite na quermesse agitada, com direito a show do Patati e Patatá cover. Barracas com comida gorda incrível, quiosques de caipirosca em balde e, obviamente, chope gelado. Encharcados e cuspindo água das botas, ficamos por ali aproveitando uma inusitada e inesquecível Festa de Momo. Afinal, o legal é contar histórias de enredos incomuns, e nesse quesito, o Carnaval de Tibagi põe o carioca no bolso.

Rafting no Rio Tibagi
Rafting no Rio Tibagi

Viagem ao centro da terra

Que aficionado por mapas nunca quis acordar pra vida num conto do Julio Verne? Pois então, em Tibagi é possível sentir esse gostinho. Recém descoberta – há coisa de uns cinco anos no máximo – a “Fenda do Nick” é uma fantástica falha geológica com mais de um quilômetro de extensão e um metro e meio de largura. Um corredor verde, úmido e rochoso; um solo amolecido com cheiro de mata nativa, numa hipérbole geográfica: a fronteira entre a crosta Terrestre e o manto, onde as pedras suam o calor do magma.

Fenda do Nick
Fenda do Nick

Pelo aumento gradual de sua profundidade, foi necessário dividi-la em três níveis, sendo que os dois primeiros são percorridos a pé e o terceiro, bom, o terceiro é o mais interessante: 55 metros, 18 andares, pra descer amarrado a uma corda, com os pés nos paredões lisos; sentado do ar, praticando o que certamente é um dos rapéis mais incríveis e únicos do mundo. Em TIBAGI, filhão.

Mas por que um nome meio estrangeiro pra fenda? Convenhamos, o nome não é dos melhores, mas o significado dele mata essa questão. Sabe quando a vacina leva o nome do cientista? Quando o invento é batizado com o sobrenome do inventor narcisista? A Fenda do Nick leva o nome do seu desbravador, nada mais justo. Contudo, não, ele não é um australiano ruivo com um chapéu esquisito, nem mesmo um ianque com sede por ouro, louco para roubar uma riqueza ancestral latina e expô-la no Museu de Ciências Naturais de Nova York.

Fenda do Nick
Fenda do Nick

Nick foi o indomável, bravo e destemido cãozinho que acabou caindo na fenda. Sucumbiu em nome da arqueologia, geologia, ou da bela chance que temos hoje de “rapelar” por aqui; quase esmagados pela estreita abertura dos generosos movimentos tectônicos que vieram passar um feriado em Tibagi e acabaram deixando marcas eternas no solo sagrado do Guartelá.

Confira mais aventuras do Mochila Crônica no blog www.mochilacronica.com e pelo Insta @mochilacronica

Fenda do Nick
Fenda do Nick
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Fim do Rafting no Rio Tibagi

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